APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031061-69.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO
APELANTE: EUCATEX S A INDUSTRIA E COMERCIO
Advogado do(a) APELANTE: EDUARDO DIAMANTINO BONFIM E SILVA - SP119083-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031061-69.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO APELANTE: EUCATEX S A INDUSTRIA E COMERCIO Advogado do(a) APELANTE: EDUARDO DIAMANTINO BONFIM E SILVA - SP119083-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por Eucatex S.A. Indústria e Comércio em face da r. sentença que denegou a segurança nos autos do Mandado de Segurança Preventivo, com pedido de liminar em face de iminente ato coator do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM SÃO PAULO, objetivando provimento jurisdicional que resguarde direito de distribuir dividendos obrigatórios, previsto no artigo 202 da Lei nº 6.404/76, afastando a incidência das sanções previstas na Portaria da RFB nº 1.265/15, que remete ao artigo 32 da Lei nº 4.357/64. Aduz que, por ser sociedade anônima de capital aberto, está obrigada a cumprir as formalidades da Lei nº 6.404/76 e, dentre estas, encontra-se o dever de deliberar, ao fim do exercício social, os dividendos obrigatórios dos acionistas, conforme artigo 202 do referido diploma legal. Narra que, por esta razão, aprovou as Atas da Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária realizadas em 2016, 2017 e 2018, deliberando pelo pagamento de dividendo mínimo obrigatório até o final dos respectivos exercícios, a critério da companhia. Afirma que foi editada a Portaria RFB nº 1.265/15, que, dentre outras medidas, previu a "aplicação de multa à empresa e a seus diretores e demais membros da administração superior, na hipótese de irregular distribuição de bônus e lucros a acionistas, sócios, quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos, pela inobservância do disposto no art. 32 da Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964" (art. 1º, VIII). Sustenta que tal ato, embora cite o artigo 32, da Lei 4.357/64, nele não possui amparo, pois ele não vedaria a distribuição de dividendos obrigatórios, mas apenas de bonificações. Defende, ainda, que bonificação não se confunde com lucro ou dividendo, devendo ter tratamento diferente; que o legislador vetou do texto legal a expressão "dividendo"; e que a Portaria extrapola os termos da lei e viola o Princípio da Legalidade. Foi proferida sentença, extinguindo o processo sem resolução de mérito, por falta de interesse de agir face ao entendimento de que a via processual do mandado de segurança teria sido utilizada de forma inadequada - para discutir dispositivo de lei/ato normativo em tese, o que é vedado pela jurisprudência pátria. Essa E. Corte, considerando que o mandado de segurança pode ser impetrado em caráter preventivo, nos termos do art. 1º, §3º da Lei nº 12.016/2009, determinou a anulação da sentença e o processamento do "writ". A Receita Federal do Brasil apresentou informações , em que asseverou que o ato administrativo hostilizado foi praticado em plena sintonia com o ordenamento jurídico, já que o art. 2º, VIII, da Portaria RFB nº 1.265/2015 traz expressamente a expressão "distribuição de (...) lucros", com amparo no art. 32 da Lei nº 4.357/1964, que prevê a vedação de "b) dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos". Afirmou também que a Lei nº 6.404/1976, ao dispor sobre as sociedades por ações, não restringe a divisão dos lucros às pessoas elencadas no inc. VIII do art. 2º da Portaria RFB nº 1.265/2015 aos “dividendos” e cita como exemplo o art. 152 da referida norma legal. O MM. Juiz a quo, JULGOU IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial e DENEGO A SEGURANÇA, nos termos do inciso I do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos da Súmula nº 105 do Superior Tribunal de Justiça e da Súmula nº 512 do Supremo Tribunal Federal, bem como ante o disposto no artigo 25 da Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009. Custas na forma da lei. Em razões recursais, requer a reforma do decisum para que seja concedida a segurança, e consequentemente afastada eventual aplicação da sanção prevista na Portaria RFB nº 1.265/2015, conferindo à Apelante o justo direito de distribuir os dividendos obrigatórios relativos aos exercícios de 2015, 2016 e 2017, em consonância com o art. 202 da Lei das S.A. Com contrarrazões, vieram os autos. O ilustre Representante do Ministério Público Federal opina pelo regular prosseguimento do feito (Id. num. 182974836). É o Relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031061-69.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO APELANTE: EUCATEX S A INDUSTRIA E COMERCIO Advogado do(a) APELANTE: EDUARDO DIAMANTINO BONFIM E SILVA - SP119083-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Mandado de Segurança é uma ação constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXIX da Constituição Federal e na norma prevista na Lei 12.016 de 2009, e tem por objeto a proteção de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão, por ato ou omissão de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. É o que se depreende da leitura do inciso LXIX, do artigo 5º da Constituição Federal: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparável por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público". Trata-se de recurso de apelação interposto em face da r. sentença sob o ID nº 178928715 - , que, pelo mérito, denegou a segurança, cuja questão envolve matéria tributária (provimento jurisdicional a resguardar o direito de distribuir dividendos obrigatórios, previsto no artigo 202 da Lei nº 6.404/76, afastando a incidência das sanções previstas na Portaria da RFB nº 1.265/15, que remete ao artigo 32 da Lei nº 4.357/64). Como bem observado na r. sentença: “O primeiro dispositivo de lei que autorizou a penalização do contribuinte pela distribuição de lucros e bonificações enquanto em débito perante a União Federal ou suas autarquias de previdência e assistência social (haja vista que, à época, ainda não existia o INSS) foi o artigo 32 da Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964, que ostentava a seguinte redação: “Art. 32. As pessoas jurídicas, enquanto estiverem em débito, não garantido, para com a União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, por falta de recolhimento de imposto, taxa ou contribuição, no prazo legal, não poderão: a) distribuir ...(vetado)... quaisquer bonificações a seus acionistas; b) dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos; c) (vetado). Parágrafo único. A desobediência ao disposto neste artigo importa em multa, reajustável na forma do art. 7º, que será imposta: a) às pessoas jurídicas que distribuírem ou pagarem ...(vetado)... bonificações ou remunerações, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) das quantias que houverem pago indevidamente;b) aos diretores e demais membros da administração superior que houverem recebido as importâncias devidas, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) destas importâncias”. (grifos nossos) A Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, outorgou ao Instituto Nacional do Seguro Social o poder-dever de multar o contribuinte que, estando em débito perante a Seguridade Social, distribuísse bonificação ou dividendo a acionista, assim como cotas ou lucros a sócio-cotista ou membro da alta administração, conforme artigo 52, abaixo transcrito: “Art. 52. À empresa em débito para com a Seguridade Social é proibido: I – distribuir bonificação ou dividendo a acionista; II – dar ou atribuir cota ou participação nos lucros a sócio-cotista, diretor ou outro membro de órgão dirigente, fiscal ou consultivo, ainda que a título de adiantamento.Parágrafo único. A infração do disposto neste artigo sujeita o responsável à multa de 50% (cinqüenta por cento) das quantias que tiverem sido pagas ou creditadas a partir da data do evento (...)”. A inovação efetivamente trazida pelo artigo 52 da Lei nº 8.212/91, no que tange à regra-matriz de lançamento e exigência da penalidade em análise, foi a inclusão expressa da distribuição de dividendos dentre as situações em que a sanção deveria ser aplicada, previsão esta que, como visto anteriormente, inexistia na Lei nº 4.357/64. Aos 29 de dezembro de 2004, foi editada a Lei nº 11.051 que, dentre outras alterações no Sistema Tributário Nacional, modificou, em seu artigo 17, o já citado art. 32 da Lei nº 4.357/64, que passou a vigorar com a seguinte redação: Art. 32. (...) § 1º. A inobservância do disposto neste artigo importa em multa que será imposta: I – às pessoas jurídicas que distribuírem ou pagarem bonificações ou remunerações, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) das quantias distribuídas ou pagas indevidamente; e II – aos diretores e demais membros da administração superior que receberem as importâncias indevidas, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) dessas importâncias. § 2º. A multa referida nos incisos I e II do § 1º deste artigo fica limitada, respectivamente, a 50% (cinqüenta por cento) do valor total do débito não garantido da pessoa jurídica”. A norma acrescida trouxe uma garantia ao contribuinte, atendendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, ao dispor que a multa poderia equivaler, no máximo, a 50% (cinqüenta por cento) do valor total do débito não garantido da pessoa jurídica quando da distribuição dos lucros. Outrossim, com as alterações da Lei nº 11.941/2009, restou estabelecido, pelo 52 da Lei nº 8.212/91, que: Art. 52. Às empresas, enquanto estiverem em débito não garantido com a União, aplica-se o disposto no art. 32 da Lei no 4.357, de 16 de julho de 1964. I - (revogado); II - (revogado). Parágrafo único. (Revogado). Com base na legislação acima mencionada, a Portaria RFB nº 1.265, de 03/09/2015, fixou procedimentos para a Cobrança Administrativa Especial no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, citando-se, in verbis, o artigo 2º, inciso VIII: "Art. 2º Ao sujeito passivo que, intimado, não regularizar os CT abrangidos pela Cobrança Administrativa Especial, serão aplicadas as seguintes medidas, conforme o caso: (...) VIII - aplicação de multa à empresa e a seus diretores e demais membros da administração superior, na hipótese de irregular distribuição de bônus e lucros a acionistas, sócios, quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos, pela inobservância do disposto no art. 32 da Lei nº 4.357, de 16 de julho de 1964; É de se concluir que, para as pessoas jurídicas distribuírem os lucros, elas devem estar em dia com os débitos junto à União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, ou com a exigibilidade suspensa (garantido), sob pena de não poder distribuir quaisquer bonificações a seus acionistas ou dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos, conforme previsão do artigo 32 da Lei n° 4.357/1964. Assim, nos termos da teia normativa acima exposta, a Secretaria da Receita Federal, diante da irregular distribuição de dividendos por empresa com débitos em aberto junto ao Fisco, deve aplicar a sanção cominada. (...)" Conforme consignado na r. sentença acima, não foi prevista medida de coação direta para o pagamento de tributo, como bloqueio e retenção de bonificações ou participação nos lucros, que configurariam atos executivos ou cautelares para tal efeito. A técnica legislativa consistiu em instituir norma de proibição de dada conduta (distribuir bonificações aos acionistas, ou dar e atribuir participação nos lucros a sócios ou quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos), prevendo multa, em caso de descumprimento, calculada sobre 50% do valor distribuído, dado ou atribuído, mas limitado a 50% do valor do débito não garantido pela pessoa jurídica. Por consequência do exposto, a livre distribuição de bonificações e atribuição de participação nos lucros somente sujeitará a pessoa jurídica à multa se o débito fiscal, além de não ter sido impugnado em relação à sua exigibilidade fiscal, ainda não tiver sido objeto de garantia, nos termos da legislação própria. Observa-se que o legislador não cometeu qualquer excesso, na medida em que, embora evidenciado que bonificações e lucros devem ser apurados, além de distribuídos e atribuídos, somente depois de cumpridas todas as obrigações da pessoa jurídica, mormente os débitos fiscais, o que se estabeleceu não foi sequer a obrigação de pagamento, mas apenas o de garantia do débito fiscal exigível, de acordo com a legislação tributária, de que é acessória a exigência ou obrigação de que trata a presente norma. A norma legal, interfere, portanto, de forma muito pontual e mínima na esfera jurídica da disponibilidade patrimonial das pessoas jurídicas, fazendo-o somente quando essencial para a própria proteção do crédito tributário, dai porque não cabe cogitar de quaisquer das ofensas constitucionais invocadas, sobretudo, mas não apenas, as relacionadas aos princípios do devido processo legal, razoabilidade, proporcionalidade e proibição de excesso. De fato, como assentado, várias são as razões que se somam para a conclusão de que não procede as alegações da apelante. Ainda que se tratasse, em primeiro lugar, de preferência em favor do crédito público, prevendo pagamento de um em detrimento do pagamento do outro, não poderia tal medida ser reputada inconstitucional, dentro da inteligência constitucional dos valores estabelecidos pela Constituição que, mesmo ao adotar o regime da livre iniciativa e da propriedade privada, não excluem a exigência de seu exercício segundo princípios de responsabilidade e função social. Ademais, cabe reiterar que a norma, em exame, não exigiu o próprio pagamento do tributo pelo contribuinte, mas apenas a oferta de garantia para os débitos fiscais, medida que se revela proporcional e razoável à vista da natureza jurídica do crédito focado e protegido. O contribuinte é instado a adotar postura responsável na administração financeira, com reserva de meios e recursos, ou garantia para satisfação oportuna do crédito tributário, antes de distribuir bonificações e lucros. Também, a previsão legal não permite concluir que se trate de garantia para débito fiscal em qualquer situação, mas apenas para aqueles cuja exigibilidade fiscal não tenha sido suspensa, por outro modo, dirigindo a tutela para situações específicas, de forma adequada, razoável e proporcional. E, por último, porque se a pessoa jurídica não possui meios ou disposição para a mera garantia do débito fiscal, dentro do alcance que resulta da norma no contexto exposto, resta evidente que a proteção do crédito tributário tem todo o sentido, pertinência e adequação, enquanto medida razoável e proporcional na tutela protetiva estabelecida pelo legislador que - cabe reiterar - não impõe o pagamento, nem torna nula a distribuição, dação ou atribuição de bonificação ou participação de lucros, mas apenas sujeita à sanção pecuniária o descumprimento da regra de proteção do crédito tributário. Com efeito, o objetivo da sanção prevista nos referidos dispositivos legais é coibir a sonegação de tributo nos casos em que haja meios para o seu pagamento e que o devedor, porém, opte por distribuir lucros beneficiando tão somente seus sócios em detrimento do Fisco.Assim, não é caso de admitir sequer a relevância ou plausibilidade jurídica da tese de inconstitucionalidade, por confisco no valor da multa, de que trata o preceito secundário da norma impugnada, com a redação dada na vigência da atual Constituição Federal. Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial: "DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ARTIGO 32 DA LEI 4.357/1964, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.051/2004. DISTRIBUIÇÃO DE BONIFICAÇÕES OU LUCROS A SÓCIOS. PESSOA JURÍDICA EM DÉBITO, NÃO GARANTIDO. MULTA. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O artigo 32 da Lei 4.357/1964, com a redação dada pela Lei 11.051/2004, não previu medida de coação direta para o pagamento de tributo, como bloqueio e retenção de bonificações ou participação nos lucros, que configurariam atos executivos ou cautelares para tal efeito. A técnica legislativa consistiu em instituir norma de proibição de dada conduta (distribuir bonificações aos acionistas, ou dar e atribuir participação nos lucros a sócios ou quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos), prevendo multa, em caso de descumprimento, calculada sobre 50% do valor distribuído, dado ou atribuído, mas limitado a 50% do valor do débito não garantido pela pessoa jurídica. 2. Não procede a alegação de não-recepção do artigo 32, caput e alíneas a e b, da Lei 4.357/1964, primeiro, porque a preferência em favor do crédito público, prevendo 'pagamento de um em detrimento do pagamento do outro, não poderia tal medida ser reputada inconstitucional, dentro da inteligência constitucional dos valores estabelecidos pela Constituição que, mesmo ao adotar o regime da livre iniciativa e da propriedade privada, não excluem a exigência de seu exercício segundo princípios de responsabilidade e função social, nada sendo mais representativo de tal comprometimento do que o cumprimento de deveres e obrigações tributárias. 3. Em segundo lugar, situando corretamente a questão jurídica, cabe reiterar que a norma, em exame, não exigiu o próprio pagamento do tributo pelo contribuinte, mas apenas a oferta de garantia para os débitos fiscais, medida que se revela proporcional e razoável à vista da natureza jurídica do crédito focado e protegido. O contribuinte é instado a adotar postura responsável na administração financeira, com reserva de meios e recursos, ou garantia para satisfação oportuna do crédito tributário, antes de distribuir bonificações e lucros. 4. Em terceiro lugar, a previsão legal não permite concluir que se trate de garantia para débito fiscal em qualquer situação, mas apenas para aqueles cuja exigibilidade fiscal não tenha sido suspensa, por outro modo, dirigindo a tutela para situações específicas, de forma adequada, razoável e proporcional. 5. Em quarto lugar porque se a pessoa jurídica não possui meios ou disposição para a mera garantia do débito fiscal, dentro do alcance que resulta da norma no contexto exposto, resta evidente que a proteção do crédito tributário tem todo o sentido, pertinência e adequação, enquanto medida razoável e proporcional na tutela protetiva estabelecida pelo legislador que - cabe reiterar - não impõe o pagamento, nem torna nula a distribuição, dação ou atribuição de bonificação ou participação de lucros, mas apenas sujeita à sanção pecuniária o descumprimento da regra de proteção do crédito tributário. 6. Por fim, não se trata de impor exigência ou sanção a outro, que não os responsáveis pela obrigação principal ou acessória, pois tanto o dever de fazer, como a sujeição à multa pela violação da norma, são dirigidas à pessoa jurídica e seus administradores (incisos I e II do § 1ºdo artigo 32 da Lei 4.357/1964, com a redação dada pela Lei 11.051/2004), sem afetar o recebimento de bonificações e lucros, que não são retidos nem tornados indisponíveis pelo Fisco, em prejuízo dos acionistas, sócios, quotistas, administradores e muito menos de empregados ou trabalhadores, cuja participação nos lucros, aliás, não restou atingida por tal preceito legal. 7. Não há previsão legal de apreensão ou bloqueio de tais recursos da pessoa jurídica destinados a terceiros (bonificações e lucros), e não são punidos, com multa, por tal recebimento, os acionistas, sócios e quotistas. Ainda que o inciso II do § 1º do artigo 32 da Lei 4.357/1964, com a redação dada pela Lei 11.051/2004, refira-se à imposição de multa a "diretores e demais membros da administração superior que receberem as importâncias indevidas", tais pessoas não são terceiros na prática da infração, já que, como administradores, concorrem para a decisão, tomada pela pessoa jurídica, de não garantir o crédito tributário com violação, pois, da disposição legal e com a percepção, ao mesmo tempo, de vantagem própria, na condição de beneficiários da distribuição de tais lucros, o que, de forma adequada e proporcional, justifica a previsão legal de sua responsabilidade patrimonial. 8. É clara a distinção existente entre as situações versadas nas súmulas (Súmulas 70, 323 e 547/STF), e a disciplinada no preceito legal, ora impugnado, que apenas cuida da prévia garantia, na forma da legislação tributária, de débito fiscal, exigível, como se extrai da intelecção normativa, para a distribuição de bonificações e atribuição de participação nos lucros da pessoa jurídica. 9. Não se trata, tampouco, de norma que enseje a violação dos valores sociais do trabalho e livre iniciativa (artigo 1º, IV, CF); isonomia (artigos 5º, caput, e 7º, XXXII, CF); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (artigo 5º, XIII, CF); direito de propriedade com sua função social (artigo 5º, XXII, CF); pessoalidade da pena (artigo 5º, XLV, CF); presunção de não culpabilidade (artigo 5º, LVII, CF); devido processo legal (artigo 5º, LIV, CF); participação nos lucros (artigo 7º, XI, CF); e livre iniciativa e livre concorrência (artigo 170, caput, incisos II e IV, CF). 10. Apelação desprovida."(AMS 00253985020064036100, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/10/2015 ..FONTE_REPUBLICACAO:.) "TRIBUTÁRIO. MULTA. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS OU DIVIDENDOS POR PESSOA JURÍDICA EM DÉBITO COM A UNIÃO OU SUAS AUTARQUIAS PREVIDENCIÁRIAS. CONSTITUCIONALIDADE DAS PENALIDADES. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O INTERESSE PRIVADO. LUCRO QUE DEVERIA SER APURADO DEPOIS DE PAGOS OS TRIBUTOS DEVIDOS. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE OU DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. Não conhecido agravo retido por falta de reiteração nas razões de apelação. Impetrante que insurge-se contra as penalidades dispostas no art. 32 e seus parágrafos da Lei 4.357/64, com a redação que lhes deu a Lei 11.051/2004, que estabelecem multas para as pessoas jurídicas que, estando em débito para com a União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, distribuírem bonificações ou derem participação de lucros a seus acionistas, quotistas, diretores ou dirigentes. Não é despida de razoabilidade a lei que, procurando conciliar os interesses público e privado, veda a distribuição de lucros ou bonificações a sócios, quotistas, diretores ou dirigentes, no caso de existência de débito para com a União e suas autarquias previdenciárias. Estando definitivamente constituídos os débitos, deve prevalecer o interesse público no recebimento dos tributos, em detrimento do interesse particular dos sócios, diretores e dirigentes, pois, a rigor, o lucro somente deveria ser apurado depois de pagos os débitos tributários. Havendo inconformismo da pessoa jurídica com a exigência dos tributos, deve recorrer aos meios legais disponíveis para impedir, em cada caso concreto, que as cobranças se consumem. Todavia, não se pode acoimar de inconstitucional a imposição de penalidade à distribuição de lucros ou dividendos, nas hipóteses em comento, conforme já asseverou esta Corte em outros julgados. Apelação improvida." (AMS 2007.61.00.007178-6/SP, Relator Juiz Federal Convocado RUBENS CALIXTO, Terceira Turma, j. 30/06/2011, D.E. 25/07/2011 – grifos nossos) "TRIBUTÁRIO. DISTRIBUIÇÃO DE BONIFICAÇÕES LUCROS. DÍVIDA NÃO GARANTIDA COM A UNIÃO E O INSS. VEDAÇÃO LEGAL. PREVALÊNCIA. 1. Ao contribuinte em débito com a União ou o INSS, cuja dívida não estiver devidamente garantida, é vedado a atribuição de participação nos lucros e a distribuição de bonificações, sob pena de incorrer na multa estipulada na Lei nº 4.357/64, com a redação introduzida pela Lei nº 11.051/04. 2. O intuito da legislação é apenas vedar a distribuição de lucros e bonificações em prejuízo do recolhimento de tributos devidos ao erário, não se evidenciando as supostas violações dos princípios invocados pelo contribuinte. 3. Apelação desprovida." (AMS 2005.61.00.006490-6/SP, Relatora Desembargadora Federal CECÍLIA MARCONDES, Terceira Turma, j. 30/09/2010, D.E. 19/10/2010 – grifos nossos) Diante do exposto, nego provimento à apelação. É o Voto.
EMENTA
MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. MULTA. DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS OU DIVIDENDOS POR PESSOA JURÍDICA EM DÉBITO COM A UNIÃO OU SUAS AUTARQUIAS PREVIDENCIÁRIAS. CONSTITUCIONALIDADE DAS PENALIDADES. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O INTERESSE PRIVADO. LUCRO QUE DEVERIA SER APURADO DEPOIS DE PAGOS OS TRIBUTOS DEVIDOS. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE OU DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. Conforme consignado na r. sentença acima, não foi prevista medida de coação direta para o pagamento de tributo, como bloqueio e retenção de bonificações ou participação nos lucros, que configurariam atos executivos ou cautelares para tal efeito. A técnica legislativa consistiu em instituir norma de proibição de dada conduta (distribuir bonificações aos acionistas, ou dar e atribuir participação nos lucros a sócios ou quotistas, diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos), prevendo multa, em caso de descumprimento, calculada sobre 50% do valor distribuído, dado ou atribuído, mas limitado a 50% do valor do débito não garantido pela pessoa jurídica.
2. Por consequência do exposto, a livre distribuição de bonificações e atribuição de participação nos lucros somente sujeitará a pessoa jurídica à multa se o débito fiscal, além de não ter sido impugnado em relação à sua exigibilidade fiscal, ainda não tiver sido objeto de garantia, nos termos da legislação própria.
3. Observa-se que o legislador não cometeu qualquer excesso, na medida em que, embora evidenciado que bonificações e lucros devem ser apurados, além de distribuídos e atribuídos, somente depois de cumpridas todas as obrigações da pessoa jurídica, mormente os débitos fiscais, o que se estabeleceu não foi sequer a obrigação de pagamento, mas apenas o de garantia do débito fiscal exigível, de acordo com a legislação tributária, de que é acessória a exigência ou obrigação de que trata a presente norma.
4. A norma legal, interfere, portanto, de forma muito pontual e mínima na esfera jurídica da disponibilidade patrimonial das pessoas jurídicas, fazendo-o somente quando essencial para a própria proteção do crédito tributário, dai porque não cabe cogitar de quaisquer das ofensas constitucionais invocadas, sobretudo, mas não apenas, as relacionadas aos princípios do devido processo legal, razoabilidade, proporcionalidade e proibição de excesso.
5. De fato, como assentado, várias são as razões que se somam para a conclusão de que não procede as alegações da apelante.Ainda que se tratasse, em primeiro lugar, de preferência em favor do crédito público, prevendo pagamento de um em detrimento do pagamento do outro, não poderia tal medida ser reputada inconstitucional, dentro da inteligência constitucional dos valores estabelecidos pela Constituição que, mesmo ao adotar o regime da livre iniciativa e da propriedade privada, não excluem a exigência de seu exercício segundo princípios de responsabilidade e função social.
6. Ademais, cabe reiterar que a norma, em exame, não exigiu o próprio pagamento do tributo pelo contribuinte, mas apenas a oferta de garantia para os débitos fiscais, medida que se revela proporcional e razoável à vista da natureza jurídica do crédito focado e protegido. O contribuinte é instado a adotar postura responsável na administração financeira, com reserva de meios e recursos, ou garantia para satisfação oportuna do crédito tributário, antes de distribuir bonificações e lucros.
7. Também, a previsão legal não permite concluir que se trate de garantia para débito fiscal em qualquer situação, mas apenas para aqueles cuja exigibilidade fiscal não tenha sido suspensa, por outro modo, dirigindo a tutela para situações específicas, de forma adequada, razoável e proporcional.
8. E, por último, porque se a pessoa jurídica não possui meios ou disposição para a mera garantia do débito fiscal, dentro do alcance que resulta da norma no contexto exposto, resta evidente que a proteção do crédito tributário tem todo o sentido, pertinência e adequação, enquanto medida razoável e proporcional na tutela protetiva estabelecida pelo legislador que - cabe reiterar - não impõe o pagamento, nem torna nula a distribuição, dação ou atribuição de bonificação ou participação de lucros, mas apenas sujeita à sanção pecuniária o descumprimento da regra de proteção do crédito tributário.
9. Com efeito, o objetivo da sanção prevista nos referidos dispositivos legais é coibir a sonegação de tributo nos casos em que haja meios para o seu pagamento e que o devedor, porém, opte por distribuir lucros beneficiando tão somente seus sócios em detrimento do Fisco.Assim, não é caso de admitir sequer a relevância ou plausibilidade jurídica da tese de inconstitucionalidade, por confisco no valor da multa, de que trata o preceito secundário da norma impugnada, com a redação dada na vigência da atual Constituição Federal.
10. Apelação não provida.