APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000387-39.2019.4.03.6144
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: VINICIUS LAPA SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RONALDO DOS SANTOS - SP403539-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000387-39.2019.4.03.6144 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: VINICIUS LAPA SANTOS Advogado do(a) APELANTE: RONALDO DOS SANTOS - SP403539-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Senhor Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de apelação da parte autora em face de sentença que julgou improcedente o pedido de anulação do ato de exclusão a bem da disciplina, bem como de reintegração ao Exército, com o pagamento de indenização por danos morais. Os honorários advocatícios foram fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 3º, I, do mesmo Código, observando-se os termos do parágrafo 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil. Aduz o autor, em suas razões, que a anulação do ato de exclusão a bem da disciplina é medida que se impõe, tendo em vista os seguintes argumentos: (a) inexiste prova da materialidade do suposto delito praticado pelo apelante; (b) violou-se a ampla defesa, pois não foi observado o art. 53 do Regulamento Disciplinar do Exército, não tendo sido o autor intimado da punição imposta, não sendo suficiente a publicação em Boletim de Acesso Restrito, ressaltando que tal fato impediu o apelante de tomar ciência da punição disciplinar imposta, bem como de recorrer; (c) violou-se o contraditório, pois a autoridade que aplicou a punição disciplinar não intimou o sindicado da sua concordância com o parecer do sindicante, e mesmo assim o licenciou à bem da disciplina, sem lhe dar oportunidade de ser ouvido em audiência; (d) a nota de punição não foi elaborada de acordo com o modelo do Anexo II e a publicação foi feita em boletim interno da OM, violando o frontalmente o previsto no art. 34, I, do Decreto nº 4.346/2002 (Regulamento Disciplinar do Exército; (e) deve ser observada a descaracterização da transgressão quando há tipificação como crime ou contravenção penal; (f) não há nos autos da sindicância laudo de constatação ou laudo definitivo que comprove que a substância transportada pelo apelante era droga, ou no caso do RDE, proibida; (g) a justa causa para instauração da sindicância só se justificaria se a substância encontrada com o apelante fosse atestada por perito oficial como sendo droga; (h) os conceitos de honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe previstos no Regulamento Disciplinar do Exército e utilizados como fundamento para aplicar o licenciamento à bem da disciplina ao apelante são totalmente subjetivos, dependendo da interpretação de cada Comandante, o que ofende os ditames constitucionais, especialmente o princípio da legalidade. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000387-39.2019.4.03.6144 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: VINICIUS LAPA SANTOS Advogado do(a) APELANTE: RONALDO DOS SANTOS - SP403539-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Senhor Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): O art. 142, da Constituição de 1988, prevê que as Forças Armadas (constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica) são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, destinando-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Nos moldes desse art. 142 § 3º, X, da ordem de 1988 (na redação dada pela Emenda nº 18/1998), os membros das Forças Armadas são denominados militares, sendo que “a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.”. O art. 142, §3º, X, da Constituição, delimitou o âmbito da reserva absoluta de lei (ou estrita legalidade) e recepcionou vários diplomas normativos, dentre eles a Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), a Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), e a Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército), com os correspondentes regulamentos. A solução jurídica do problema posto nos autos deve se dar pelos atos normativos vigentes à época da ocorrência do objeto litigioso, razão pela qual não são aplicáveis as disposições da posterior Lei nº 13.954/2019 (DOU de 17/12/2019). Em vista do art. 3º da Lei nº 6.830/1980, os membros das Forças Armadas compreendem servidores na ativa ou na inatividade. Os militares da ativa são: a) de carreira; b) temporários, incorporados ou matriculados para prestação de serviço militar (obrigatório ou voluntário) durante os prazos previstos na legislação e suas eventuais prorrogações; c) componentes da reserva, quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados; d) alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e) em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas. Por sua vez, os militares em inatividade abrangem: a) os da reserva remunerada, quando pertençam à reserva das Forças Armadas e percebam remuneração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviço na ativa, mediante convocação ou mobilização; b) os reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores e estejam dispensados, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remuneração da União; c) os da reserva remunerada e, excepcionalmente, os reformados, que estejam executando tarefa por tempo certo, segundo regulamentação para cada Força Armada. A exclusão do serviço ativo das Forças Armadas (com consequente desligamento e inatividade) pode se dar por vários motivos, elencados no art. 94 da Lei 6.880/1980: transferência para a reserva remunerada (art. 96 e seguintes, podendo ser suspensa na vigência do estado de guerra, estado de sítio, estado de emergência ou em caso de mobilização); reforma (art. 104 e seguintes, marcando o desligamento definitivo); demissão de oficiais (art. 115 e seguintes, com ou sem indenização das despesas efetuadas pela União com a sua preparação, formação ou adaptação); perda de posto e patente (art. 118 e seguintes, em casos de o oficial ser declarado indigno ou incompatível ao oficialato); licenciamento (art. 121 e seguintes, para militares de carreira, da reserva ou temporários, após concluído o tempo de serviço, por conveniência do serviço, ou também a bem da disciplina e outras hipóteses legais); anulação de incorporação ou desincorporação da praça (art. 124, em casos de interrupção do serviço militar ativo previstas na legislação); exclusão da praça a bem da disciplina (art. 125 e seguintes, mesmo que o militar tenha estabilidade assegurada, em caso de infrações descritas na legislação); deserção (art. 128, atrelada à tipificação criminal correspondente); falecimento (art. 129); e extravio (art. 130, em casos de desaparecimento do militar). O marco temporal do desligamento é a publicação do ato oficial correspondente em Diário Oficial, em Boletim ou em Ordem de Serviço de sua organização militar, e não poderá exceder 45 dias da data da primeira publicação oficial; ultrapassado o prazo, o militar será considerado desligado da organização a que estiver vinculado, deixando de contar tempo de serviço, para fins de transferência para a inatividade. O problema posto nos autos cuida de militar temporário licenciado a bem da disciplina, matéria regida pelo art. 121 da Lei nº 6.880/1980: Art. 121. O licenciamento do serviço ativo se efetua: I - a pedido; e II - ex officio. (...) § 3º O licenciamento ex officio será feito na forma da legislação que trata do serviço militar e dos regulamentos específicos de cada Força Armada: a) por conclusão de tempo de serviço ou de estágio; b) por conveniência do serviço; e c) a bem da disciplina. § 4º O militar licenciado não tem direito a qualquer remuneração e, exceto o licenciado ex officio a bem da disciplina, deve ser incluído ou reincluído na reserva. § 5° O licenciado ex officio a bem da disciplina receberá o certificado de isenção do serviço militar, previsto na legislação que trata do serviço militar. Nesse contexto jurídico-militar, o Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/1980), nos arts. 28 e 31 preceitua a observância dos integrantes das Forças Armadas, respectivamente, à ética militar e aos deveres militares: Art. 28. O sentimento do dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, com a observância dos seguintes preceitos de ética militar: I - amar a verdade e a responsabilidade como fundamento de dignidade pessoal; II - exercer, com autoridade, eficiência e probidade, as funções que lhe couberem em decorrência do cargo; III - respeitar a dignidade da pessoa humana; IV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes; V - ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados; VI - zelar pelo preparo próprio, moral, intelectual e físico e, também, pelo dos subordinados, tendo em vista o cumprimento da missão comum; VII - empregar todas as suas energias em benefício do serviço; VIII - praticar a camaradagem e desenvolver, permanentemente, o espírito de cooperação; IX - ser discreto em suas atitudes, maneiras e em sua linguagem escrita e falada; X - abster-se de tratar, fora do âmbito apropriado, de matéria sigilosa de qualquer natureza; XI - acatar as autoridades civis; XII - cumprir seus deveres de cidadão; XIII - proceder de maneira ilibada na vida pública e na particular; XIV - observar as normas da boa educação; XV - garantir assistência moral e material ao seu lar e conduzir-se como chefe de família modelar; XVI - conduzir-se, mesmo fora do serviço ou quando já na inatividade, de modo que não sejam prejudicados os princípios da disciplina, do respeito e do decoro militar; XVII - abster-se de fazer uso do posto ou da graduação para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros; XVIII - abster-se, na inatividade, do uso das designações hierárquicas: a) em atividades político-partidárias; b) em atividades comerciais; c) em atividades industriais; d) para discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnica, se devidamente autorizado; e e) no exercício de cargo ou função de natureza civil, mesmo que seja da Administração Pública; e XIX - zelar pelo bom nome das Forças Armadas e de cada um de seus integrantes, obedecendo e fazendo obedecer aos preceitos da ética militar. (...) Art. 31. Os deveres militares emanam de um conjunto de vínculos racionais, bem como morais, que ligam o militar à Pátria e ao seu serviço, e compreendem, essencialmente: (...) III - a probidade e a lealdade em todas as circunstâncias; IV - a disciplina e o respeito à hierarquia; V - o rigoroso cumprimento das obrigações e das ordens;(...). A transgressão disciplinar e a responsabilização do militar em face dos preceitos estabelecidos também estão previstas no Estatuto dos Militares: Art. 42. A violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime, contravenção ou transgressão disciplinar, conforme dispuser a legislação ou regulamentação específicas. (...) Art. 43. A inobservância dos deveres especificados nas leis e regulamentos, ou a falta de exação no cumprimento dos mesmos, acarreta para o militar responsabilidade funcional, pecuniária, disciplinar ou penal, consoante a legislação específica. (...) Art. 47. Os regulamentos disciplinares das Forças Armadas especificarão e classificarão as contravenções ou transgressões disciplinares e estabelecerão as normas relativas à amplitude e aplicação das penas disciplinares, à classificação do comportamento militar e à interposição de recursos contra as penas disciplinares. Por sua vez, o Decreto nº 4.346/2002, que aprova o Regulamento Disciplinar do Exército (R-4), conceitua a transgressão militar como toda a ação praticada pelo militar contrária aos preceitos estatuídos no ordenamento jurídico pátrio ofensiva à ética, aos deveres e às obrigações militares, mesmo na sua manifestação elementar e simples, ou, ainda, que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe, a teor do disposto nos arts. 14 e 15, verbis: “Art. 14. Transgressão disciplinar é toda ação praticada pelo militar contrária aos preceitos estatuídos no ordenamento jurídico pátrio ofensiva à etica, aos deveres e às obrigações militares, mesmo na sua manifestação elementar e simples, ou, ainda, que afete a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe. § 1o Quando a conduta praticada estiver tipificada em lei como crime ou contravenção penal, não se caracterizará transgressão disciplinar. § 2o As responsabilidades nas esferas cível, criminal e administrativa são independentes entre si e podem ser apuradas concomitantemente. § 3o As responsabilidades cível e administrativa do militar serão afastadas no caso de absolvição criminal, com sentença transitada em julgado, que negue a existência do fato ou da sua autoria. § 4o No concurso de crime e transgressão disciplinar, quando forem da mesma natureza, esta é absorvida por aquele e aplica-se somente a pena relativa ao crime. § 5o Na hipótese do § 4o, a autoridade competente para aplicar a pena disciplinar deve aguardar o pronunciamento da Justiça, para posterior avaliação da questão no âmbito administrativo. § 6o Quando, por ocasião do julgamento do crime, este for descaracterizado para transgressão ou a denúncia for rejeitada, a falta cometida deverá ser apreciada, para efeito de punição, pela autoridade a que estiver subordinado o faltoso. § 7o É vedada a aplicação de mais de uma penalidade por uma única transgressão disciplinar. § 8o Quando a falta tiver sido cometida contra a pessoa do comandante da OM, será ela apreciada, para efeito de punição, pela autoridade a que estiver subordinado o ofendido. § 9o São equivalentes, para efeito deste Regulamento, as expressões transgressão disciplinar e transgressão militar. Art. 15. São transgressões disciplinares todas as ações especificadas no Anexo I deste Regulamento. As punições disciplinares estão previstas no art. 24 do Regulamento, da menos grave à mais grave: Art. 24. Segundo a classificação resultante do julgamento da transgressão, as punições disciplinares a que estão sujeitos os militares são, em ordem de gravidade crescente: I - a advertência; II - o impedimento disciplinar; III - a repreensão; IV - a detenção disciplinar; V - a prisão disciplinar; e VI - o licenciamento e a exclusão a bem da disciplina. O art. 32 do R-4 disciplina o licenciamento e exclusão a bem da disciplina, nos seguintes termos: Art. 32. Licenciamento e exclusão a bem da disciplina consistem no afastamento, ex officio, do militar das fileiras do Exército, conforme prescrito no Estatuto dos Militares. § 1o O licenciamento a bem da disciplina será aplicado pelo Comandante do Exército ou comandante, chefe ou diretor de OM à praça sem estabilidade assegurada, após concluída a devida sindicância, quando: I - a transgressão afete a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe e, como repressão imediata, se torne absolutamente necessário à disciplina; II - estando a praça no comportamento "mau", se verifique a impossibilidade de melhoria de comportamento, como está prescrito neste Regulamento; e III - houver condenação transitada em julgado por crime doloso, comum ou militar. O art. 6º do R-4 conceitua honra pessoal, pundonor militar e decoro da classe, in verbis: Art. 6º Para efeito deste Regulamento, deve-se, ainda, considerar: I - honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor o militar, perante seus superiores, pares e subordinados; II - pundonor militar: dever de o militar pautar a sua conduta como a de um profissional correto. Exige dele, em qualquer ocasião, alto padrão de comportamento ético que refletirá no seu desempenho perante a Instituição a que serve e no grau de respeito que lhe é devido; e III - decoro da classe: valor moral e social da Instituição. Ele representa o conceito social dos militares que a compõem e não subsiste sem esse. É certo que a penalidade imposta em caso de transgressão disciplinar deve ser precedida de procedimento apuratório que observe os ditames legais e constitucionais. O art. 5º da Constituição Federal assegura, nos incisos LIV e LV, respectivamente, as garantias constitucionais relativas ao devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório nos âmbitos judicial e administrativo. Nesse sentido, colaciono arestos do E. Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça: Agravo regimental no agravo de instrumento. Servidor. Militar. Sindicância. Negativa de prestação jurisdicional. Não ocorrência. Processo administrativo disciplinar. Demissão. Princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Ofensa reflexa. Legislação infraconstitucional. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Esferas penal e administrativa. Independência. Exclusão da corporação. Comando-Geral da Polícia. Competência. Possibilidade. Precedentes. 1. A jurisdição foi prestada pelo Tribunal de origem mediante decisão suficientemente motivada. 2. A Corte de origem concluiu, com base na legislação infraconstitucional e nos fatos e nas provas dos autos, que não houve violação dos princípios da ampla defesa e do contraditório, uma vez que a sindicância seria mero procedimento investigatório e que no PAD teria sido oportunizada defesa ao ora agravante. Concluiu, também, que houve apuração da falta disciplinar que resultou na demissão do militar e que a Administração dispunha de elementos comprobatórios bastantes, havendo essa sanção administrativa sido aplicada dentro dos ditames legais e de forma fundamentada. 3. Inadmissível, em recurso extraordinário, a análise da legislação infraconstitucional e o reexame de fatos e provas dos autos. Incidência das Súmulas nºs 636 e 279/STF. 4. Esta Corte já assentou a independência entre as esferas penal e administrativa. 5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o art. 125, § 4º, da CF somente se aplica quando a perda da graduação for pena acessória de sanção criminal aplicada em processo penal, não ocorrendo, como no caso dos autos, quando o Comando-Geral da Polícia aplicar pena de demissão após apuração de falta grave em processo administrativo disciplinar. 6. Agravo regimental não provido. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXPULSÃO DE POLICIAL MILITAR. TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE E OFENSIVA AO DECORO PROFISSIONAL. RECEBIMENTO DE VANTAGEM INDEVIDA. DESNECESSIDADE DE INDICAÇÃO MINUCIOSA DOS FATOS INVESTIGADOS E CAPITULAÇÃO. LEGALIDADE DO PAD E ADEQUABILIDADE DA SANÇÃO CONSIGNADAS PELA CORTE DE ORIGEM. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A Corte de origem analisou toda a controvérsia de maneira fundamentada, não havendo como acolher a tese recursal de deficiência na prestação jurisdicional. Observa-se que toda a controvérsia foi minuciosamente analisada pela Corte de origem, confirmando a sentença de improcedência. 2. Somente após o início da instrução probatória, no âmbito do PAD, a Comissão Processante poderá fazer o relato circunstanciado das condutas supostamente praticadas pelo Servidor indiciado, capitulando as infrações porventura cometidas; precisamente por isso não se exige que a Portaria instauradora do Processo Disciplinar contenha a minuciosa descrição dos fatos que serão apurados, exigível apenas quando do indiciamento do Servidor. 3. A análise do Processo Administrativo colacionado aos autos, como consignado pelas instâncias ordinárias, não evidencia a existência de qualquer irregularidade nos atos de investigação administrativa. Regularmente instaurado o PAD, dos autos se infere que os acusados participaram, efetivamente, de toda a fase instrutória, onde foram regularmente colhidos os elementos probatórios capazes de respaldar a indicação de existência de infração disciplinar. Observados, assim, durante a tramitação do procedimento, os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. 4. O que se verifica da leitura do acórdão é que, ao contrário do que alegam os recorrentes, sua punição foi devidamente fundamentada nas provas testemunhais e materiais produzidas no Processo Administrativo Disciplinar. 5. Agravo Interno dos Particulares a que se nega provimento. (STJ, AgInt no AREsp 551.882/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/12/2018, DJe 04/02/2019) ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAL MILITAR ESTADUAL NÃO ESTÁVEL. LICENCIAMENTO EX OFFICIO A BEM DA DISCIPLINA. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA DEVIDAMENTE ASSEGURADO. SÚMULA VINCULANTE N. 5 DO STF. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. MÉRITO ADMINISTRATIVO. AFERIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Recurso ordinário em mandado de segurança, pelo qual a impetrante visa a anulação de procedimento que culminou em seu licenciamento ex officio a bem da disciplina, pelo incurso no art. 30, §1º, da Lei n. 11.817/00 (Código Disciplinar Militar dos Militares do Estado de Pernambuco), combinado com o art. 109, §2º, alínea "c" da Lei n. 6.783/74 (Estatuto dos Policiais Militares do Estado de Pernambuco), por ter a mesma praticado transgressões que afetam o sentimento do dever, da honra pessoal, do pudonor militar e do decoro da classe militar. 2. Considerando que não se faz necessária a presença de advogado no processo administrativo disciplinar, consoante preconiza a Súmula Vinculante n. 5/STF, bem como por ter sido a procuradora da impetrante intimada da oitiva das testemunhas, não há que se falar em nulidade pela falta de intimação. Precedentes: MS 15.313/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18/11/11; MS 13.955/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJe 1/8/11; MS 13.395/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJe 18/11/08. 3. Sobre a razoabilidade e proporcionalidade da pena aplicada esta Corte vem se posicionando no sentido de que, no âmbito do controle jurisdicional do processo administrativo disciplinar, é vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito do julgamento administrativo, cabendo-lhe, apenas, apreciar a regularidade do procedimento, à luz dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes: RMS 32.573/AM, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 12/8/11; MS 15.175/DF, Rel. Min. Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 16/9/10; RMS 20537/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ de 23/4/07. 4. No caso em análise, tendo-se aplicado a sanção após efetivo exercício da garantia ao contraditório e à ampla defesa, e estando a decisão fundamentada na constatada gravidade dos fatos e os danos que delas provieram para o serviço público, a análise da proporcionalidade implicaria indevido controle judicial sobre o mérito administrativo. 5. Recurso ordinário não provido. (STJ, RMS 33.281/PE, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/02/2012, DJe 02/03/2012) Assim, o procedimento apuratório sancionador deve estar em consonância com as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, ainda que de forma sumária, como se dá na esfera militar. Importa salientar que o mérito do processo administrativo está no âmbito do poder discricionário da administração pública. Desse modo, não cabe ao Judiciário escrutinar os critérios de conveniência e oportunidade da administração ao decidir pela aplicação da punição em razão da prática de transgressão disciplinar. Cabe-lhe apenas examinar a legalidade do ato administrativo, que goza de legitimidade juris tantum. Nesse sentido, é o precedente deste E. TRF: 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000465-12.2018.4.03.6130, Rel. Juíza Federal Convocada DENISE APARECIDA AVELAR, julgado em 07/01/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 14/01/2020. No caso dos autos, o autor foi incorporado ao Exército em 1º/03/2016. Por meio da Portaria nº 029-S/1.5, de 10/05/2017, expedida pelo Comandante do 22º Batalhão Logístico Leve do Exército Brasileiro, foi instaurada Sindicância, autuada sob nº 0080787.00007485/2017-80, cujo objeto é “ melhor esclarecer os fatos relatados no Processo de apuração de transgressão disciplinar nº 031, de 6 de abril de 2017 e no Processo de apuração de transgressão disciplinar nº 030, de 6 de abril de 2017 (...) buscando avaliar a condutas dos militares, para aferir se houve indício de crime ou transgressão disciplinar, bem como se são atentatórios contra a honra pessoal, pundonor militar e decoro da classe ou a hierarquia e disciplina, conforme estabelece o inciso I, do §1º, do art. 32 do Regulamento Disciplinar do Exército, juntamente com o nº 02 do art. 141 do Regulamento da Lei do Serviço Militar” (Num. 122838692 - Pág. 2; Num. 122838692 - Pág. 5; Num. 122838709 - Pág. 5). Consta do Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar nº 030-Cia Log Mnt, (Num. 122838692 - Pág. 24), datado de 6/4/2017, o seguinte relato do fato em que se envolveu o autor: “Participo o referido militar ter trazido para o interior do aquartelamento do 22º B Log L substância entorpecente proibida em 03 abr 17, e depois transportar consigo a referida substância para o 1º Esqd c L (Valença - RJ) durante a realização de missão externa (Ap Dto) na mesma data, conforme declaração feita ao Asp Gabriel Pinheiro em 04 abr 17. O autor foi cientificado da lavratura do formulário na mesma data, tendo apresentado a seguinte justificativa, redigida de próprio punho: “Eu adiquiri a droga com minha namorada tenho em mente que eu coloquei no bolso de traiz da minha calsa conduzi a calsa para o quartel, e depois para missão do apoio direto.” (id. Num. 122838692 - Pág. 25). Em 19/05/2017, o autor foi notificado acerca da Sindicância, tendo-lhe sido oportunizada vista dos autos, apresentação de defesa prévia, arrolamento de testemunhas, acompanhamento de depoimentos, oferecimento de alegações finais e prática de demais atos necessários ao exercício do contraditório e da ampla defesa. Foi ainda informado da data, hora e local da audiência para sua inquirição e para o depoimento da testemunha e do outro sindicado. Em sua inquirição, realizada no dia 25/05/17, o autor assim se manifestou a respeito dos fatos: (...) conheceu uma moça conhecida de sua irmã, que começou a namorar com ela e ela fumava maconha. Que numa sexta feira anterior à partida para o apoio direto, saiu com ela. Que neste dia tanto o ele (...) como sua namorada fumaram maconha. Que esta moça lhe passou certa quantidade de maconha, mas que ele (...) não lembra se havia colocado no bolso de sua calça. Mas que acredita na namorada e provavelmente tenha mesmo colocado no bolso de sua calça, pois ela (...) afirma que ele próprio colocou no bolso de trás de sua calça uma quantidade de maconha. Que na sexta feira ele (...) voltou pra casa e na ocasião em que estava montando a suas coisas para partir para o apoio direto ele (...) colocou a mesma calça onde estava a droga para levar para missão. Que na segunda-feira levou a calça para o apoio direto. Que no dia em que foi abordado pela polícia havia saído para um bar com o Cb Do Carmo e no momento em que estavam pedindo informação para melhor conhecer a cidade de Valença/RJ foi abordado pela polícia. Que na verdade a polícia ia abordar outra pessoa e acabou abordando tanto ele como o Cb Do Carmo. Perguntado se é verdade o que lhe está sendo imputado no presente Processo, de que trouxe para interior do 22º B Log L e depois conduziu consigo substância entorpecente para o 1º Esqd C L, respondeu que sim. (...). Perguntado para confirmar qual substância entorpecente estava portando no momento da abordagem policial, por ocasião do apoio direto em Valença/RJ, respondeu que estava com maconha. Perguntado se sabe dizer a quantidade de maconha que estava conduzindo, respondeu que era muito pouco, aproximadamente 01 (um) grama. (...). Perguntado que procedimentos foram adotados durante o momento em que estavam no distrito policial, respondeu que foi realizado o boletim de ocorrência em que o depoente (...) assumiu que estava de posse da droga encontrada, no qual ficou registrada a situação de usuário de droga. Perguntado se tem ciência de que tal conduta, no caso o porte de drogas é atentatório contra a honra pessoal, pundonor militar e o decoro da Instituição ou da classe, respondeu que sim. (...) (Num. 122838693 - Pág. 1/2). Consta que o apelante foi notificado a apresentar defesa prévia, por escrito, ou arrolar testemunhas, em 25/05/2017 (DIEx nº 008-Sind - id. Num. 122838693 - Pág. 3). Em 29/05/202017, o autor foi comunicado da emissão de ofício requerendo cópia do Boletim de Ocorrência ao Comandante do 1º Esquadrão de Cavalaria Leve, em 02/06/2017 (Num. 122838694 - Pág. 1). Em resposta, foi juntada aos autos da Sindicância cópia do “Livro de Parte Diária PAR do Permanência da 3ª Cia”, oriundo da Polícia Militar do Estado do rio de Janeiro, (Num. 122838694 - Pág. 3), onde se extrai o relato de que “após busca pessoal foi encontrado no bolso de Vinicius uma embalagem plástica contendo erva seca picada. Foram apoiados pelo CB PM Costa e SD Marciel na abordagem(...)Após perícia foi constatado 0,7g de “maconha” e Vinicius foi enquadrado no art. 28 da Lei 11.343/06 e responderá por Posse e Uso de Entorpecente" (Num. 122838694 - Pág. 4). Foi certificado o decurso do prazo para apresentação de defesa escrita pelo autor (Num. 122838694 - Pág. 5). Em 12/06/2017, foi encerrada a instrução e, na mesma data, o autor foi notificado a apresentar alegações finais e ter vista dos autos. O autor quedou-se inerte e foi novamente certificado o decurso do prazo para apresentação das alegações finais (id. Num. 122838694 - Pág. 7/11). Em seguida, foi elaborado, em 17/06/2017, relatório pelo Militar encarregado da sindicância, cuja conclusão foi a seguinte (Num. 122838694 - Pág. 12/16): 1. Em relação ao Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS, sindicado, da Cia Logística de Manutenção, apurou-se os seguintes fatos: a. que há, em tese, em suas atitudes, indícios de crime, pois o militar em questão foi encontrado, durante uma abordagem policial, no dia 04 de abril de 2017, na cidade de Valença/RJ, no seu momento de folga, à noite, por ocasião da missão de apoio direto no 1º Esquadrão de Cavalaria Leve, com uma certa quantidade de substância entorpecente (...), motivo pelo qual foi enquadrado no artigo 28 da Lei 11.343/06 e responderá por posse e uso de entorpecente, conforme Boletim de Ocorrência anexado aos autos; b. foi registrado em seu depoimento, como sindicado, que o Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS já fez uso, algumas vezes, da substância entorpecente maconha, o que vem corroborar, em tese, que a intenção do militar, ao estar portando tal substância naquela ocasião, era continuar, por um eventual vício e de maneira contumaz, fazendo uso da mesma. c. Outrossim, ficou claro e evidenciado na sua confissão, por ocasião do Processo de Apuração de Transgressão Disciplinar que está respondendo, e no seu depoimento, como sindicado, que o Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS introduziu, em área militar, substância entorpecente, caracterizando, dessa forma, tipicamente uma transgressão disciplinar prevista no nº 109 do Anexo I do RDE; d. Como consequência desse comportamento totalmente reprovável, do Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS, tanto no meio civil como no meio militar, isso afeta, sobremaneira, a sua honra pessoal perante seus superiores e pares, denota total falta de respeito pela Instituição e demonstra a completa falta de comprometimento em pautar a sua conduta como um profissional correto. Portanto, esses fatos apurados demonstram, na sua essência, que são atentatórios contra a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro da classe; e e. Por último, em relação ao Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS, este sindicante sugere, pelo teor dos fatos apurados, que se dê, como repressão imediata, início ao processo de licenciamento a bem da disciplina do referido militar, como estabelece o inciso I, do § 1º, do Art. 32 do Regulamento Disciplinar do Exército, juntamente com o nº 2, do Art. 141 do Regulamento da Lei do Serviço Militar. Em 03/07/2017, foi proferida a Solução de Sindicância nº 0080787.00002462/2017-98 (Num. 122838709 - Pág. 2), em que o Comandante do 22º Batalhão Logístico Leve concordou com o parecer do sindicante e determinou: "a. Publicação da presente solução em Boletim Interno; b. Licenciar à bem da disciplina o Sd EP VINICIUS LAPA SANTOS, da Cia Log Mnt, por praticar conduta atentatória ao pundonor militar e a dignidade da classe, conforme o previsto no nº 2, do Art. 141, do Decreto nº 57.564, de 20 de janeiro de 1966 (...) combinado com o Inciso I, do § 1º, do Art. 32, do Decreto nº 4.343 de 26 de agosto de 2002 (RDE); c. Arquivamento dos autos." Conforme sua folha de alterações, o autor foi licenciado a bem da disciplina em 31/07/2017 (Num. 122838699 - Pág. 12). Posteriormente, em 16/01/2019, o autor requereu, em âmbito administrativo, a anulação da Sindicância, o que foi indeferido em 31/01/2019 (Num. 122838712 - Pág. 1/15). Como se vê, o licenciamento a bem da disciplina foi adotado após regular processo administrativo, tendo sido observado o devido processo legal, assegurando-se ao autor o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, não se vislumbrando na espécie quaisquer vícios de ilegalidade. Ficou demonstrado nos autos que o autor, em abordagem policial, foi flagrado com substância cannabis sativa, tendo sido lavrado boletim de ocorrência, com enquadramento no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, por posse e uso de entorpecente (Num. 122838709 - Pág. 42). O apelante confessou que introduziu em área militar referida droga ilícita. A conclusão da Sindicância foi no sentido de que a ação do militar afetou sobremaneira sua honra pessoal perante seus superiores e pares, com desrespeito à instituição, sendo atentatórios contra a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro de classe. A autoridade militar, após concluída a Sindicância, entendeu que o uso de entorpecente é incompatível com a atividade militar, observando-se, dos autos do processo administrativo, que estão devidamente motivadas as razões que concluíram pela conduta antinormativa e exigibilidade de conduta diversa, o que se afigura coerente com a decisão pelo licenciamento do autor a bem da disciplina, por transgressão que afeta a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe , com fundamento no art. 32, § 1º , I , do Decreto nº 4.346/2002, não se olvidando, neste exame, das peculiaridades que cercam a vida castrense, regida que é pela hierarquia e disciplina, a impor restrições a quem opta por seguir carreira militar. Quanto à alegação de que houve indicação inadequada, pela autoridade militar, como sendo o autor incurso no item 109 do anexo I do R4, descrita como “fazer uso, ter em seu poder ou introduzir, em área militar ou sob jurisdição militar, bebida alcoólica ou com efeitos entorpecentes, salvo quando devidamente autorizado, não afasta a indicação", entende-se que referida menção não afasta a conduta reprovável que poderia ser enquadrada, de toda sorte, no item 108 do Anexo I do R4, qual seja “ter em seu poder ou introduzir, em área militar ou sob a jurisdição militar, armas, explosivos, material inflamável, substâncias ou instrumentos proibidos, sem conhecimento ou permissão da autoridade competente”. No que diz respeito à possível irregularidade formal da Nota de Punição, por não ter observado o modelo descrito no Anexo II do Decreto nº 4.346/2002, não prospera o inconformismo do apelante, pois, no caso, não foi elaborada Nota de Punição, já que o autor foi licenciado a bem da disciplina, nos termos do artigo 32, do R4, que determina a sua aplicação imediatamente após a conclusão da sindicância, quando a transgressão afetar a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe. Também não prospera a alegação no sentido de que seria o caso de descaracterização da transgressão quando há tipificação como crime ou contravenção penal. Isso porque tratam-se de condutas diversas, já que, na esfera administrativa, o autor foi licenciado por ter introduzido, em área militar substância entorpecente proibida, o que feriu, segundo o juízo da autoridade militar, a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe, o que não corresponde exatamente à conduta descrita no art. 28, da Lei nº 13.343/2006, cujo tipo penal é: "Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar". Por derradeiro, afaste-se a alegação de que não havia justa causa para a Sindicância. As esferas administrativa, civil e penal são independentes entre si, não sendo necessário, no caso, laudo de constatação para se apurar a natureza e a quantidade da droga. Como bem observado pelo Magistrado a quo o laudo de constatação “é requisito para a lavratura de auto de prisão em flagrante, situação diversa da mera instauração de sindicância administrativa. Nos termos do artigo 2º, das Instruções Gerais para Elaboração de Sindicância no Âmbito do Exército Brasileiro (EB10-IG-09.001): Art. 2º A sindicância é o procedimento formal, apresentado por escrito, que tem por objetivo a apuração de fatos de interesse da administração militar, quando julgado necessário pela autoridade competente, ou de situações que envolvam direitos. A sindicância foi instaurada para: “(...) melhor esclarecer os fatos relatados no Processo de apuração de transgressão disciplinar nº 031, de 6 de abril de 2017 e no Processo de apuração de transgressão disciplinar nº 030, de 6 de abril de 2017 (...)” (id. 14437171). Não há dúvidas de que a condução do autor, então Soldado Efetivo Profissional do Exército Brasileiro, à delegacia de distrito policial e seu enquadramento no artigo 28, da Lei nº 11.343/06, é fato de interesse da administração militar. Presente, portanto, a justa causa para a instauração da sindicância.”. Assim, tem-se pela legalidade do licenciamento a bem da disciplina, considerando a existência do fato tido pela autoridade militar como transgressão disciplinar, a ofender a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe, o que se encontra no âmbito do poder discricionário da administração pública, não cabendo ao Judiciário adentrar no mérito do ato administrativo, escrutinando critérios de conveniência e oportunidade no caso concreto. Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o percentual da verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora É como voto
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA UNIÃO DA 3ª REGIÃO
(STF, AI 817415 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-055 DIVULG 21-03-2013 PUBLIC 22-03-2013)
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. LICENCIAMENTO A BEM DA DISCIPLINA. SERVIDOR MILITAR. EXÉRCITO. SINDICÂNCIA. TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR. PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. RECURSO DESPROVIDO.
- A Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares) preceitua que a violação das obrigações ou dos deveres militares constituirá crime, contravenção ou transgressão disciplinar, conforme dispuser a legislação ou regulamentação específicas. Além disso, dispõe que a inobservância dos deveres especificados nas leis e regulamentos, ou a falta de exação no cumprimento dos mesmos, acarreta para o militar responsabilidade funcional, pecuniária, disciplinar ou penal, consoante a legislação específica.
- A transgressão disciplinar e a responsabilização do militar estão previstas no Estatuto dos Militares, assim como no Regulamento Disciplinar do Exército (R-4).
- O procedimento sancionador deve estar em consonância com as garantias constitucionais, ainda que de forma sumária, como se dá na esfera militar. E o mérito do processo administrativo está no âmbito do poder discricionário da administração pública, de modo que não cabe ao Judiciário escrutinar os critérios da administração ao decidir pela aplicação da punição em razão da prática de transgressão disciplinar. Cabe-lhe apenas examinar a legalidade do ato administrativo, que goza de legitimidade juris tantum.
- Ficou demonstrado nos autos que o autor, em abordagem policial, foi flagrado com substância cannabis sativa, tendo sido lavrado boletim de ocorrência, com enquadramento no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, por posse e uso de entorpecente. O apelante confessou que introduziu em área militar referida droga ilícita. A conclusão da Sindicância foi no sentido de que a ação do militar afetou sobremaneira sua honra pessoal perante seus superiores e pares, com desrespeito à instituição, sendo atentatórios contra a honra pessoal, o pundonor militar e o decoro de classe. A autoridade militar, após concluída a Sindicância, entendeu que o uso de entorpecente é incompatível com a atividade militar, observando-se, dos autos do processo administrativo, que estão devidamente motivadas as razões que concluíram pela conduta antinormativa e exigibilidade de conduta diversa, o que se afigura coerente com a decisão pelo licenciamento do autor a bem da disciplina, por transgressão que afeta a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe , com fundamento no art. 32, § 1º , I , do Decreto nº 4.346/2002, não se olvidando, neste exame, das peculiaridades que cercam a vida castrense, regida que é pela hierarquia e disciplina, a impor restrições a quem opta por seguir carreira militar.
- Assim, tem-se pela legalidade do licenciamento a bem da disciplina, considerando a existência do fato tido pela Autoridade Militar como transgressão disciplinar, a ofender a honra pessoal, o pundonor militar ou o decoro da classe, o que se encontra no âmbito do poder discricionário da Administração Pública, não cabendo ao Judiciário adentrar no mérito do ato administrativo, escrutinando critérios de conveniência e oportunidade no caso concreto.
- Apelação desprovida.