APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002723-84.2020.4.03.6110
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: MMS MULTIACOS METAIS E SERVICOS LTDA
Advogados do(a) APELANTE: RENAN VINICIUS PELIZZARI PEREIRA - SP303643-N, RUBENS ISCALHAO PEREIRA - SP71579-N
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002723-84.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: MMS MULTIACOS METAIS E SERVICOS LTDA Advogados do(a) APELANTE: RENAN VINICIUS PELIZZARI PEREIRA - SP303643-N, RUBENS ISCALHAO PEREIRA - SP71579-N APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de mandado de segurança impetrado por MMS MULTIAÇOS METAIS E SERVIÇOS LTDA, em face da UNIÃO FEDERAL objetivando que determine à autoridade impetrada a prorrogação dos vencimentos de IRPJ,CSLL,IRRF incidente na folha salário, por 90 dias, e das parcelas dos parcelamentos de tributos federais formalizados pela Impetrante, para recolhimento após 31/12/2020, ou após o término do estado de calamidade decretada pelo governo federal. Por meio de sentença, o MM. Juízo a quo denegou a segurança pleiteada ( ID n° 142455849) Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários, a teor do disposto no art. 25 da Lei n. 12.016/09. Interposto recurso de apelação pela impetrante, aduzindo, em síntese, que ante a situação de calamidade pública provocada pela pandemia da Covid-19, o que criou severas limitações financeiras ao setor empresarial, em virtude das medidas restritivas impostas à coletividade pela própria Administração. Pugna, ainda, pela necessidade de observância do disposto na Portaria MF nº 12/2012, analisada em conjunto do Decreto Estadual nº 64.879/2020, ambas com amparo na Lei nº 13.979/2020, bem como com aplicação analógica da Teoria do Fato do Príncipe, razões pelas quais, requer a reforma da sentença. Com contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal. O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002723-84.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: MMS MULTIACOS METAIS E SERVICOS LTDA Advogados do(a) APELANTE: RENAN VINICIUS PELIZZARI PEREIRA - SP303643-N, RUBENS ISCALHAO PEREIRA - SP71579-N APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Pretende a apelante ter prorrogados os prazos de recolhimento tributário, a título a prorrogação dos vencimentos de IRPJ,CSLL, IRRF incidente na folha salário, por 90 dias, e das parcelas dos parcelamentos de tributos federais formalizados pela Impetrante, para recolhimento após 31/12/2020, ou após o término do estado de calamidade decretada pelo governo federal, em virtude da pandemia da Covid -19. Forçoso verificar que a situação que se pretende alcançar descreve nitidamente a clara aplicação do instituto da moratória, tendo como respaldo norma infra legal, hierarquicamente inapta para tal fim. Sem menosprezar as inúmeras definições jurídicas para a moratória, destaco aquela disponível no Wikipedia, popularmente conhecida, que, de forma simples e objetiva a define, senão vejamos: Moratória (do termo latino moratoriuva[1] é um atraso ou suspensão: geralmente, de um pagamento. No direito internacional público, consiste no ato unilateral de um Estado em declarar a suspensão do pagamento dos serviços da sua dívida externa. Com relação ao direito tributário, é o prazo extraordinário concedido pela pessoa jurídica de direito público competente para a cobrança do tributo ao contribuinte, por meio de lei, a fim de que o mesmo parcele as suas dívidas tributárias com o perdão de alguns encargos legais.[1] No direito das obrigações, o credor concede moratória ao devedor quando permite um atraso no pagamento da dívida.[1] Especificamente no campo do Direito Tributário, impor a aplicação do instituto em questão requer o atendimento dos inúmeros requisitos elencados pela lei, especialmente pelos artigos 152 a 155-A do CTN, que dispõe, entre outras coisas, que a moratória pode ser concedida em caráter geral, pela pessoa jurídica de direito público competente para instituir o tributo a que se refira, resultando diretamente da lei, fato que não ocorreu. Dessa forma, tratando-se de hipótese de suspensão do crédito tributário, a legislação prevê a moratória como instrumento próprio para situações de calamidade, a qual deve ser interpretada literalmente, nos termos do art. 111, I, do Código Tributário Nacional. Sobre a moratória, dispõem os artigos 152 e 153 do CTN: Dessa forma, resta evidente ser defeso ao Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes, criar políticas públicas e resolver a situação das empresas casuísticamente conforme a necessidade, crise ou força maior, por mais grave que seja a situação do contribuinte. Em outro giro forçoso ressaltar que a Portaria MF 12 de 2012 não dispõe de mecanismos de aplicação geral, irrestrita e imediata, uma vez que limita de maneira clara o âmbito do seu raio de atuação, exigindo a identificação dos municípios abrangidos pelo Decreto de reconhecimento de calamidade pública, o que não se observa no Decreto n.64879 de 20 de marco de 2020, do Governador do Estado de São Paulo, bem como o início e o fim de sua aplicação. Por outro lado, verifico que inúmeras medidas foram adotadas pelo Governo Federal visando uniformizar o socorro prestado para empresas e cidadãos necessitados, devendo os interessados recorrem a elas em igualdades de condições, mediante o preenchimento das respectivas exigências, não cabendo ao Poder Judiciário criar, em casos específicos, situações não contempladas em lei, sob pena de afrontar a tripartição dos poderes e os princípios da legalidade e isonomia tributária. Importante salientar, ainda, que ao apreciar situação análoga, nos autos da Suspensão de Segurança n. 5363 – DF, o Exmo. Senhor Ministro Presidente do c. STF deferiu pedido formulado pelo Estado de São Paulo para suspender os efeitos da r.decisão proferida pelo e.TJ do Estado de Sao Paulo, que concedeu liminar nos autos do Agravo de Instrumento nº 2062467-83.2020.8.26.0000, a saber: (....) Narra o requerente que referida decisão, proferida sob o alegado fundamento de “resguardar o particular de consequências nefastas ao direito de exercer livremente atividade econômica, garantido pelo art. 170, parágrafo único da Constituição Federal de 1988, que poderá ser gravemente afetado acaso advenham medidas punitivas pela eventual descumprimento das obrigações tributárias decorrentes do não pagamento de tributos ao Estado de São Paulo”, em verdade permite, em detrimento da receita pública, que o interessado deixe de responder pelo ônus da mora em que porventura incida, podendo obter certidões sem o efeito de positiva, não podendo eventuais débitos nem mesmo serem inscritos na dívida ativa, constituindo um verdadeiro estímulo à inadimplência. Restou afastada a incidência de regras legais aplicáveis em hipóteses de atraso no pagamento de tributos, sob a alegação de que o requerente teria dado causa à paralisação das atividades do contribuinte, em vista da edição do Decreto nº 64.881, de 22/3/20. Contudo, o certo é que as restrições constantes desse Decreto não se aplicam ao contribuinte, cuja área de atuação não foi atingida, sendo certo, ainda que referido normativo foi editado com vistas ao combate da pandemia de COVID-19 e em estrita consonância com as normas federais pertinentes, bem como às recomendações da OMS e do Ministério da Saúde. Ademais, mostra-se inaplicável ao caso a teoria da imprevisão, pois essa se direciona ao equilíbrio de obrigações comutativas, recíprocas e onerosas, o que não se dá com a obrigação tributária, que decorre de Lei, insuscetível, assim, de ser assimilada à obrigação contratual, mormente no caso do ICMS, em que o tributo é havido pelo contribuinte com o preço da operação. Defendeu o cabimento do presente pedido de suspensão, bem como a competência desta Suprema Corte para sua apreciação, aduzindo que a celeuma envolve matéria constitucional. Destacou o efeito multiplicador inegável dessa decisão, ressaltando que diversas ações semelhantes já foram ajuizadas, por diferentes contribuintes desse e de outros tributos, e que o deferimento de medidas semelhantes acarretará nefastas consequências para as já combalidas finanças do estado. Discorreu, a seguir, sobre as medidas já tomadas, em âmbito estadual, em decorrência dessa pandemia, ressaltando a grave lesão à ordem, saúde e economia públicas representada pela concessão de ordem judicial que declara a inexigibilidade de uma obrigação tributária, com especial destaque para o impacto orçamentário que isso pode acarretar. Refutou a comparação da situação do contribuinte com a do próprio requerente, em vista da liminar em seu benefício concedida por esta Suprema Corte, nos autos da ACO nº 3.363, pois essa teve como objetivo permitir que mais recursos pudessem ser canalizados no combate aos efeitos da pandemia. Destacou, por fim, a existência de precedentes jurisprudenciais desta Suprema Corte, no abono da tese ora esposada pelo requerente, para postular a pronta suspensão dos efeitos dessa decisão regional, até final julgamento do mandado de segurança impetrado na origem. Manifestou-se, na sequência, a empresa autora da impetração, opondo-se à concessão da pretendida suspensão. É o relatório. Decido: Inicialmente, cadastre-a empresa Intercement Brasil S/A, como interessada neste processo, bem como os ilustres patronos que a representam. Afaste-se, desde logo, o segredo de justiça sobre o trâmite desta contracautela, porque inexiste interesse público ou social a exigi-lo, e tampouco vieram a estes autos documentos ou dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade. Consigne-se, em prosseguimento, a competência do Supremo Tribunal Federal para julgamento da presente suspensão, visto que a controvérsia instaurada na ação originária é de índole constitucional, conforme se conclui pela menção a diversas normas da Constituição Federal então elencadas (arts. 2º e 170, caput e parágrafo único). O pedido de suspensão de liminar não objetiva a reforma ou anulação da decisão impugnada, não sendo, portanto, instrumento idôneo para reapreciação judicial. O requerente deve pretender tão somente suspender a eficácia da decisão contrária ao Poder Público, comprovando, de plano, que o cumprimento imediato da decisão importará grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas. Sob essas considerações, reputo presentes os requisitos de admissibilidade do presente incidente de suspensão de liminar, passando, então, ao exame da pretensão deduzida pelo requerente. A cautelar ora atacada, reformando anterior decisão proferida pelo Juízo de Primeiro Grau, concedeu a liminar postulada pelo autor do mandado de segurança, para impedir o estado de aplicar-lhe sanções tributárias de cunho pecuniário e administrativo, assegurando-lhe, ainda, a possibilidade de incluir débitos em programas de parcelamento de débito fiscal, sem inclusão de juros e multa e suspendeu a exigibilidade de eventuais valores passíveis de exigência, em decorrência de sanções fiscais pecuniárias. Constata-se, assim, sem maiores dificuldades que, de uma penada, foi completamente subvertida a ordem administrativa, no tocante ao regime fiscal vigente no estado de São Paulo, em relação à empresa impetrante, medida essa que pode ser potencialmente estendida a milhares de outras empresas existentes naquele estado. Pese embora as razões elencadas pelo ilustre prolator dessa decisão, ao fundamentá-la, tem-se que sua execução poderá acarretar grave lesão à ordem público-administrativa e econômica no âmbito do estado de São Paulo. Não se ignora que a situação de pandemia, ora vivenciada, impôs drásticas alterações na rotina de todos, atingindo a normalidade do funcionamento de muitas empresas e do próprio estado, em suas diversas áreas de atuação. Mas, exatamente em função da gravidade da situação, exige-se a tomada de medidas coordenadas e voltadas ao bem comum, não se podendo privilegiar determinado segmento da atividade econômica em detrimento de outro, ou mesmo do próprio Estado, a quem incumbe, precipuamente, combater os nefastos efeitos decorrentes dessa pandemia. Assim, não cabe ao Poder Judiciário decidir quem deve ou não pagar impostos, ou mesmo quais políticas públicas devem ser adotadas, substituindo-se aos gestores responsáveis pela condução dos destinos do Estado, neste momento. Apenas eventuais ilegalidades ou violações à ordem constitucional vigente devem merecer sanção judicial, para a necessária correção de rumos, mas jamais – repita-se – promover-se a mudança das políticas adotadas, por ordem de quem não foi eleito para tanto e não integra o Poder Executivo, responsável pelo planejamento e execução dessas medidas. Não se mostra admissível que uma decisão judicial, por melhor que seja a intenção de seu prolator ao editá-la, venha a substituir o critério de conveniência e oportunidade que rege a edição dos atos da Administração Pública, notadamente em tempos de calamidade como o presente, porque ao Poder Judiciário não é dado dispor sobre os fundamentos técnicos que levam à tomada de uma decisão administrativa. Ademais, a subversão, como aqui se deu, da ordem administrativa vigente no estado de São Paulo, em matéria tributária, não pode ser feita de forma isolada, sem análise de suas consequências para o orçamento estatal, que está sendo chamado a fazer frente a despesas imprevistas e que certamente têm demandado esforço criativo, para a manutenção das despesas correntes básicas do estado. E nem mesmo a liminar obtida pelo requerente, em ação ajuizada originariamente perante esta Suprema Corte, pode servir de fundamento a justificar a medida cautelar ora em análise, na medida em que foi proferida com o escopo de permitir um melhor direcionamento dos recursos públicos ao combate aos efeitos da pandemia, sendo certo que as consequências advindas da decisão cuja suspensão aqui se postula, apontam exatamente em sentido contrário. Além disso, a concessão dessa série de benesses de ordem fiscal a uma empresa denota quadro passível de repetir-se em inúmeros processos, pois todos os demais contribuintes daquele tributo poderão vir a querer desfrutar de benesses semelhantes. Aliás, o quadro constante do e-doc. nº 3, demonstra que várias são as ações já ajuizadas, no estado de São Paulo, com esse fito, tendo sido rejeitada a quase totalidade das pretensões assim deduzidas. Destaque-se, ainda, que algumas daquelas liminares ali elencadas foram suspensas por decisão proferida pelo eminente Presidente do Tribunal de Justiça paulista, no dia 8/4/20, nos autos da Suspensão de Liminar nº 2066138-17.8.26.0000, conforme notícia veiculada no site daquela Corte regional. Inegável, destarte, concluir-se que a decisão objeto do presente pedido apresenta grave risco de efeito multiplicador, o qual, por si só, constitui fundamento suficiente a revelar a grave repercussão sobre a ordem e a economia públicas e justificar o deferimento da suspensão pleiteada. Nesse sentido e apreciando hipóteses semelhantes, citem-se os seguintes precedentes: TRIBUTO. Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS. Redução da alíquota incidente sobre serviços de telecomunicação e energia elétrica. Grave lesão à economia pública demonstrada. Ocorrência do chamado “efeito multiplicador”. Pedidos idênticos já deferidos. Suspensão de segurança concedida. Agravos regimentais improvidos. Defere-se pedido de suspensão quando demonstrados o potencial efeito multiplicador e a grave lesão aos interesses públicos tutelados pelo regime de contracautela (SS nº 4.178-AgR/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJe de 17/11/11). AGRAVO REGIMENTAL NA EXTENSÃO NA SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. IMPOSTO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA E SERVIÇOS. ICMS. REDUÇÃO DA ALÍQUOTA INCIDENTE SOBRE SERVIÇOS DE TELECOMINICAÇÃO E ENERGIA ELÉTRICA. DEMONSTRAÇÃO DE GRAVE LESÃO À ECONOMIA PÚBLICA. OCORRÊNCIA DE EFEITO MULTIPLICADOR. AUSÊNCIA DE ARGUMENTOS OU FATOS NOVOS CAPAZES DE INFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO (SS nº 3.977/RJ-Extn-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 18/4/2018). Ante o exposto, defiro o pedido para suspender os efeitos da decisão que concedeu liminar nos autos do Agravo de Instrumento nº 2062467-83.2020.8.26.0000, até o trânsito em julgado do mandado de segurança a que se refere. Comunique-se com urgência. Publique-se. Brasília, 15 de abril de 2020. Ministro Dias Toffoli Presidente. No mesmo sentido, já se manifestou esta E.Corte, cujos arestos estão assim ementados: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. COVID-19. PANDEMIA. PRORROGAÇÃO DE PAGAMENTO DE TRIBUTOS. MORATÓRIA. AFASTADAS AS ALEGAÇÕES QUANTO À VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. 1. A concessão de moratória ou parcelamento depende de lei, nos termos do art. 153, do CTN. Não cabe ao Poder Judiciário, sob pena violar o princípio da separação de poderes e atuar como legislador positivo, outorgar o benefício, atendendo às condições específicas de cada contribuinte. 2. A Portaria MF n. 12/2012 e a Instrução Normativa 1.243/2012 não tiveram por objetivo tratar do grave cenário fiscal e econômico trazido pela pandemia do COVID-19, sobretudo porque editadas em 2012, sem previsão de prazo para a sua concessão, conforme determina o artigo 153, inciso I, do CTN. Ademais, a Portaria 12/20 não é autoaplicável e depende de atos complementares, conforme expressamente dispõe o seu art. 3º. 3. A jurisprudência do C. STF é firme no sentido de que "é vedado ao Poder Judiciário, com fundamento em ofensa ao princípio da isonomia, desconsiderar os limites objetivos e subjetivos estabelecidos na concessão de benesse fiscal ou previsão de situação mais vantajosa, de sorte a alcançar contribuinte não contemplado na legislação aplicável, ou criar situação mais favorável ao contribuinte, a partir da combinação legalmente não permitida de normas infraconstitucionais, sob pena de agir na condição anômala de legislador positivo" (STF - 744.520 AGR/PR). 4. O Governo Federal vem implementando medidas para minimizar, em relação às empresas, os efeitos econômicos deletérios relacionados à pandemia do coronavírus, tal como o caso do Simples Nacional e a publicação da Portaria ME nº 139/2020 e da Instrução Normativa RFB nº 1.932/2020. 5. O Decreto nº 7.247/2010 (que regulamenta a Medida Provisória nº 494 de 2 de julho de 2010, para dispor sobre o Sistema Nacional de Defesa Civil - SINDEC, sobre o reconhecimento de situação de emergência e estado de calamidade pública, sobre as transferências de recursos para ações de socorro, assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução nas áreas atingidas por desastre, e dá outras providências) conceitua “estado de calamidade pública” como: situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido. Os desastres mencionados no decreto têm direta relação com fenômenos naturais, ao passo que a situação retratada no presente momento não tem qualquer origem em desastre natural, mas sim trata-se, na verdade, de emergência sanitária. 6. Afastada a alegação quanto à violação dos princípios constitucionais da moralidade pública, da razoabilidade, da proporcionalidade e da capacidade contributiva pelo fato de o Poder Executivo ter direcionado a prorrogação para o pagamento de tributos apenas para as empresas optantes pelo Simples Nacional. A iniciativa nada mais é do que a concretização do disposto no art. 146, III, d, da Constituição Federal. 7. A pretensão veiculada pela apelante poderá afetar sensivelmente a administração da crise provocada pela pandemia de COVID-19, pois importará em redução direta e imediata da arrecadação, tão necessária para fazer frente ao gasto público extraordinário decorrente de tal crise sanitária. 8. Apelação a que se nega provimento. (TRF-3 - ApCiv: 50014501620204036128 SP, Relator: Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, Data de Julgamento: 29/03/2021, 4ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 05/04/2021) DIREITO TRIBUTÁRIO. PRORROGAÇÃO DE VENCIMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO EM DECORRÊNCIA DE ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA. COVID-19. PORTARIA MF 12/2012. NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO. NEGADO PROVIMENTO AO APELO. Por fim, não há que se cogitar da aplicação da teoria do fato do príncipe já que ela se aplica a ato de autoridade praticado pelo poder público, o que não se não se enquadra às medidas de suspensão de atividades empresariais praticadas pelo Estado do São Paulo frente à COVID-19. Tais medidas se revelam imprescindíveis para garantia da saúde coletiva, e sobretudo, para a continuidade da prestação dos serviços públicos essenciais no atual cenário. Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação. É como voto.
“Art. 152. A moratória somente pode ser concedida:
I - em caráter geral:
a) pela pessoa jurídica de direito público competente para instituir o tributo a que se refira;
b) pela União, quanto a tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, quando simultaneamente concedida quanto aos tributos de competência federal e às obrigações de direito privado;
II - em caráter individual, por despacho da autoridade administrativa, desde que autorizada por lei nas condições do inciso anterior.
Parágrafo único. A lei concessiva de moratória pode circunscrever expressamente a sua aplicabilidade à determinada região do território da pessoa jurídica de direito público que a expedir, ou a determinada classe ou categoria de sujeitos passivos.”
“Art. 153. A lei que conceda moratória em caráter geral ou autorize sua concessão em caráter individual especificará, sem prejuízo de outros requisitos:
I - o prazo de duração do favor;
II - as condições da concessão do favor em caráter individual;
III - sendo caso:
a) os tributos a que se aplica;
b) o número de prestações e seus vencimentos, dentro do prazo a que se refere o inciso I, podendo atribuir a fixação de uns e de outros à autoridade administrativa, para cada caso de concessão em caráter individual;
c) as garantias que devem ser fornecidas pelo beneficiado no caso de concessão em caráter individual”.
1 - A questão cinge-se sobre a possibilidade de postergação do pagamento de tributos federais durante a crise provocada pelo COVID-19. Independentemente da gravidade da situação instalada ou da opinião deste magistrado sobre a necessidade de medidas regulatórias para amenizar os danos provocados pela pandemia, no âmbito deste processo limita-se a discussão sobre a legalidade ou não da cobrança do crédito tributário na data do vencimento.
2 - Corroborando a adequada divisão dos Poderes, algumas medidas já foram editadas para regulamentar tributos específicos, como o diferimento do pagamento de FGTS (Medida Provisória nº 927/2020), do SIMPLES Nacional (Resolução CGSN nº 152/2020), da contribuição previdenciária patronal, da COFINS e da contribuição ao PIS/PASEP (Portaria do Ministério da Economia nº 139/2020).
3 - Saliente-se que, na forma da jurisprudência dominante do STJ,"a suspensão da exigibilidade do crédito tributário reclama, na forma do disposto no artigo 141, CTN, a observância das hipóteses previstas no artigo 151 do mesmo diploma legal", sendo certo que,"a teor do art. 97, VI, a suspensão do crédito tributário sujeita-se ao princípio da legalidade estrita"(STJ, REsp 219.651/SP, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJU de 06/11/2000), bem como"interpreta-se literalmente a legislação que dispõe sobre a suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 111, I, do CTN)"(STJ, AgRg na MC 15.496/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 21/08/2009).
4 - Os instrumentos adequados às situações de calamidade pública são: a moratória, prevista no artigo 152 e seguintes do CTN, para a suspensão da exigibilidade do crédito tributário; e, nos termos do artigo 66 da Lei n 7450/85, postergação de vencimento por norma infralegal.
5 - Não cabe ao Poder Judiciário, sob pena de se malferir o ditame constitucional da separação dos poderes, criar políticas públicas e resolver a situação das empresas caso a caso conforme a necessidade, crise ou força maior, por mais grave que seja a situação do contribuinte; sendo legal e constitucional a cobrança, não se deve obstá-la.
6 - Esse é o entendimento do e. STF, sendo-lhe pacífica a Jurisprudência" no sentido de ser impossível ao Poder Judiciário, por não possuir função legislativa típica, conceder benefício fiscal sem amparo legal, ao fundamento de concretização do princípio da isonomia "(RE 949278 AgR, Relator (a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 26/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-203 DIVULG 22-09-2016 PUBLIC 23-09-2016).
7 - A portaria nº 12/2012 do Ministério da Fazenda não possui aplicação imedita, conforme preceitua seu artigo 3º:"A RFB e a PGFN expedirão, nos limites de suas competências, os atos necessários para a implementação do disposto nesta Portaria, inclusive a definição dos municípios a que se refere o art. 1º".
8 - A interpretação sistemática da supracitada norma infralegal também consigna sua eficácia limitada, posto que imprudente considerar desnecessárias a Medida Provisória nº 927/2020, a Resolução CGSN nº 152/2020 e a Portaria do Ministério da Economia nº 139/2020; muito mais razoável concluir que estas disciplinaram aquela.
9 - Negado provimento à apelação.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5005223-56.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 27/10/2020, Intimação via sistema DATA: 01/11/2020)
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. COVID-19. PANDEMIA. PRORROGAÇÃO DE PAGAMENTO DE TRIBUTOS. MORATÓRIA. CONCESSÃO. NECESSIDADE DE LEGISLAÇÃO. PODER JUDICIÁRIO. ATUAÇÃO COMO LEGISLADOR. VEDAÇÃO. FATO DO PRINCIPE. INOCORRÊNCIA.
1. Forçoso verificar que a situação que se pretende alcançar descreve nitidamente a clara aplicação do instituto da moratória, tendo como respaldo norma infra legal, hierarquicamente inapta para tal fim.
2. Especificamente no campo do Direito Tributário, impor a aplicação do instituto em questão requer o atendimento dos inúmeros requisitos elencados pela lei, especialmente pelos artigos 152 a 155-A do CTN, que dispõe, entre outras coisas, que a moratória pode ser concedida em caráter geral, pela pessoa jurídica de direito público competente para instituir o tributo a que se refira, resultando diretamente da lei, fato que não ocorreu.
3. A teor do disposto no art. 153 do CTN, a concessão de moratória depende de autorização legislativa, sendo defeso ao Poder Judiciário, sob pena violar o princípio da separação de poderes e atuar como legislador positivo, criar políticas públicas e resolver a situação das empresas casuisticamente conforme a necessidade, crise ou força maior, por mais grave que seja a situação do contribuinte. Precedentes do C.STF e desta E.Corte.
4. Não há que se cogitar da aplicação da teoria do fato do príncipe já que ela se aplica a ato de autoridade praticado pelo poder público, o que não se não se enquadra às medidas de suspensão de atividades empresariais praticadas pelo Estado do São Paulo frente à COVID-19. Tais medidas se revelam imprescindíveis para garantia da saúde coletiva, e sobretudo, para a continuidade da prestação dos serviços públicos essenciais no atual cenário.
5. Apelação da impetrante improvida.