Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006256-66.2010.4.03.6182

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. PEIXOTO JUNIOR

APELANTE: AREA NOVA INCORPORADORA LTDA.

Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIA SIMONE FERRAZ - SP272619-A, GABRIEL HERNAN FACAL VILLARREAL - SP221984-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006256-66.2010.4.03.6182

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. PEIXOTO JUNIOR

APELANTE: AREA NOVA INCORPORADORA LTDA.

Advogados do(a) APELANTE: CLAUDIA SIMONE FERRAZ - SP272619-A, GABRIEL HERNAN FACAL VILLARREAL - SP221984-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

Área Nova Incorporadora Ltda propôs embargos à execução fiscal em face da União objetivando desconstituir a cobrança do débito fiscal relativo à diferença de laudêmio objeto da execução fiscal nº 2009.61.82.034110-5. 

Sustenta, em síntese, que quanto ao débito objeto da CDA nº 80.609.014.121-01, referente a comercialização do apartamento nº 34, Bloco A, Edifício Ilha de Guam, situado na Alameda Itapecuru, nº 119, Barueri/SP, já foi providenciado o pagamento, devendo, portanto, ser extinta a execução em relação a ele. Já em relação ao débito constante da CDA nº 80.608.039.611-94, referente a cobrança de laudêmio e multa moratória decorrente da comercialização do apartamento nº 61, Bloco B, Edifício Ilha de Baker, localizado na Alameda Itapecuru, nº 119, Barueri/SP, afirma a embargante que transferiu o domínio útil do imóvel em 11/02/1994 a Maria Silvana Silva que, por sua vez, cedeu seus direitos a Gilberto Ambrogini em 17/05/1996, tendo promovido a comunicação a SPU, não podendo ser responsabilizada por suposto descumprimento pelo adquirente da norma estabelecida no art. 116 do DL nº 9.760/46, sendo ainda obrigação da União a inscrição dos ocupantes do imóvel, inclusive de ofício, alegando ainda, o “caráter propter” rem da obrigação. 

Afirma, por outro lado, que a União sustenta a propriedade dos imóveis por estarem localizados em extinto aldeamento indígena, com base no DL 9.760/46, que, todavia, não foi recepcionado pela CF/46, também não incluindo as Constituições posteriores os extintos aldeamentos indígenas como propriedade da União, destarte afigurando-se inconstitucional a propriedade amparada no referido decreto-lei, inexistindo, ainda, qualquer contrato escrito amparando eventual relação foreira havida entre a União e a embargante, sendo, portanto, inexigível a cobrança em destaque. 

Proferida sentença de improcedência do pedido (Id 104966598, pp. 217/219), reconhecendo o pagamento do débito constante da CDA nº 80609014212-01, referente ao apartamento nº 34, Bloco A, Edifício Ilha de Guam, todavia ocorrido após o ajuizamento da execução fiscal, a legitimidade passiva da embargante e a ausência de comprovação da alegação de não pertencer o imóvel a União, dela recorre a embargante (pp. 233/250) sustentando, em síntese, que em relação ao apartamento nº 61, Bloco B, Edifício Ilha de Baker, “qualquer eventual diferença devida à título de Laudêmio deveria ocorrer por parte dos envolvidos nesta transação. Quais seja, Sra. Maria Silvana Silva e Sr. Gilberto Ambrogini, haja vista tratar de receita patrimonial decorrente desta comercialização” e que os extintos aldeamentos indígenas não foram incluídos como bens da União, a Constituição Federal de 1946 não prevendo tal inserção e, assim, não recepcionando o art. 1º e alíneas do Decreto-Lei nº 9.760/46, inexistindo regime enfitêutico a amparar a cobrança da União. 

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. 

É relatório

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006256-66.2010.4.03.6182

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. PEIXOTO JUNIOR

APELANTE: AREA NOVA INCORPORADORA LTDA.

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V O T O

 

 

 

 

Debate-se no presente recurso sobre a legitimidade passiva em relação a cobrança de laudêmio de imóvel em que efetuado negócio jurídico de transferência de domínio e também sobre a exigibilidade ou não da referida taxa no caso concreto. 

A matéria referente ao recolhimento do laudêmio, no que guarda pertinência à hipótese, encontra-se regulada no art. 3º do Decreto-Lei nº 2.398/87, que assim estabelecia, na redação da época: 

Art. 3° Dependerá do prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias, a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil de terreno da União ou de direitos sobre benfeitorias neles construídas, bem assim a cessão de direito a eles relativos. 

§1° As transferências parciais de aforamento ficarão sujeitas a novo foro para a parte desmembrada. 

§ 2o Os Cartórios de Notas e Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade dos seus respectivos titulares, não lavrarão nem registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União, ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio:  

I - sem certidão da Secretaria do Patrimônio da União - SPU que declare:  

a) ter o interessado recolhido o laudêmio devido, nas transferências onerosas entre vivos;  

b) estar o transmitente em dia com as demais obrigações junto ao Patrimônio da União; e 

c) estar autorizada a transferência do imóvel, em virtude de não se encontrar em área de interesse do serviço público;  

II - sem a observância das normas estabelecidas em regulamento.  

§ 3o A SPU procederá ao cálculo do valor do laudêmio, mediante solicitação do interessado. 

§ 4o Concluída a transmissão, o adquirente deverá requerer ao órgão local da SPU, no prazo máximo de sessenta dias, que providencie a transferência dos registros cadastrais para o seu nome, observando-se, no caso de imóvel aforado, o disposto no art. 116 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946. 

§ 5o A não-observância do prazo estipulado no § 4o sujeitará o adquirente à multa de 0,05% (cinco centésimos por cento), por mês ou fração, sobre o valor do terreno e benfeitorias nele existentes. 

§ 6o É vedado o loteamento ou o desmembramento de áreas objeto de ocupação sem preferência ao aforamento, nos termos dos arts. 105 e 215 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, exceto quando: 

a) realizado pela própria União, em razão do interesse público; 

b) solicitado pelo próprio ocupante, comprovada a existência de benfeitoria suficiente para caracterizar, nos termos da legislação vigente, o aproveitamento efetivo e independente da parcela a ser desmembrada. 

 

O art. 116 do Decreto-Lei nº 9.760/46, referido no § 4º do dispositivo legal acima citado, por sua vez, estabelece que: 

Art. 116. Efetuada a transação e transcrito o título no Registro de Imóveis, o adquirente, exibindo os documentos comprobatórios, deverá requerer, no prazo de 60 (sessenta) dias, que para o seu nome se transfiram as obrigações enfitêuticas. 

§ 1º A transferência das obrigações será feita mediante averbação, no órgão local do S.P.U., do título de aquisição devidamente transcrito no Registro de Imóveis, ou, em caso de transmissão parcial do terreno, mediante têrmo. 

 

Isto estabelecido, colhe-se dos elementos constantes da inicial que em relação ao imóvel ainda objeto de cobrança no executivo fiscal (apartamento 61, Bloco B, Edifício Ilha de Baker), referente a laudêmio e multa com vencimento em 04/07/08 e atinente ao exercício 2007, foi celebrado em 17/05/1996 instrumento particular de cessão de direitos figurando como cedente Maria Silvana Silva e como cessionário Gilberto Ambrogini, com anuência da embargante, ora apelante, pelo qual foram cedidos os direitos e obrigações assumidos pela cedente em face da anuente, referente ao instrumento particular de venda e compra da unidade autônoma apartamento nº 61, Bloco B, Edifício Ilha de Baker, ficando no referido instrumento de cessão estabelecido que  a escritura definitiva do imóvel será outorgada diretamente pela anuente ao promitente cessionário, sendo que “Todas as despesas decorrentes de referida escritura, impostos, taxas, laudêmios, emolumentos, cartorários e de registro, ou outras que incidam ou venham a incidir sobre essa escritura, será de responsabilidade do PROMITENTE CESSIONÁRIO: Todas as despesas decorrentes dos instrumentos anteriores, inclusive laudêmios e foros correrão por conta da PROMITENTE CEDENTE” (cláusula 4.2, Id 104966598, p. 79), a escritura definitiva do domínio útil por aforamento sendo lavrada em 26/04/2007, perante o Tabelionato da Comarca de Barueri (livro 465, p. 111), dela constando expressamente que o comprador apresentou, em atendimento ao disposto na Lei nº 9.636/98, “a guia do: pagamento do LAUDÊMIO referente à compra e venda e as cessões anteriores, nos valores de R$ 377,62 e R$ 63,31, pagos pelo COMPRADOR, recolhido aos 23/11/2006”, integrando a escritura os respectivos darf’s devidamente. autenticados, assumindo o comprador, ciente das previsões da Lei nº 9.636/98, “total responsabilidade por eventuais exigências que venham a ser formuladas pela Secretaria do Patrimônio da União, tanto à nível de documentação quanto ao pagamento de possíveis diferenças do laudêmio recolhido por ele COMPRADOR, incidente sobre esta transação, que a União venha a cobrar futuramente da VENDEDORA” e apresentando também cópia da “CERTIDÃO AUTORIZATIVA DE TRANSFERÊNCIA - CAT nº 000251886-40, referente ao RIP. n° 6213 0100192-91, expedida pela Secretaria do Patrimônio da União (GRPU/SP), em 18/04/2007, válida por 90 (noventa) dias, e referente a vaga de garagem, a CERTIDÃO AUTORIZATIVA DE TRANSFERÊNCIA - CAT nº 000251893-79, referente ao RIP. no 6213 0100347-62, expedida pela Secretaria do Patrimônio da União (GRPU/SP), em 18/04/2007, válida por 90 (noventa) dias, as quais ficam arquivadas neste cartório, em pasta própria ns. 736 e 737, provando dessa forma que a VENDEDORA possui o imóvel objeto desta escritura em regime de aforamento” (pp. 81/87). 

Releva anotar que, conforme documento juntado no Id 104966598, p. 75, já constava nos registros da SPU o cadastro do referido imóvel em nome do responsável Gilberto Ambrogini, portanto, em tese, restando cumpridas as exigências legais de transferência de domínio e ciente e anuente a União em relação ao negócio jurídico, não se justificando a cobrança do laudêmio em destaque da embargante, ora apelante, quando já figurava o adquirente, pessoa diversa, como responsável pelo domínio do bem no exercício perseguido. 

Essa é a orientação adotada no Eg. STJ, conforme se observa dos julgados a seguir transcritos: 

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. OFENSA. INEXISTÊNCIA. TERRENO DE MARINHA. AFORAMENTO. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. REGISTRO NO CARTÓRIO COMPETENTE. AUSÊNCIA. DOMÍNIO ÚTIL DAS FRAÇÕES IDEAIS DO IMÓVEL. TRANSFERÊNCIA. AVERBAÇÃO. SECRETARIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO. POSSIBILIDADE. 

1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2). 

2. Preliminar de desrespeito ao princípio da colegialidade afastada, porquanto o art. 932, III, do CPC/2015, c/c o art. 253, I e II, do RISTJ autoriza o relator a julgar monocraticamente o agravo em recurso especial, nas situações ali descritas. 

3. Hipótese em que o Tribunal de origem reconheceu o direito dos impetrantes, ora agravados, à averbação da transferência do aforamento e do direito de ocupação das frações ideais de bens imóveis (apartamentos) construídos em dois lotes de terreno de marinha, apesar da ausência de registro do condomínio edilício no Cartório de Registro de Imóveis. 

4. É certo que o condomínio edilício em questão não se encontra regularmente instituído, subsistindo apenas condomínio voluntário, e apenas sobre um terreno indiviso, circunstância que inviabilizaria o reconhecimento de aquisição da propriedade de unidade autônoma no âmbito das relações de natureza privada, mas não impede a averbação da transferência do aforamento e do direito de ocupação das frações ideais nos registros da Secretaria de Patrimônio da União - SPU. 

5. Para a transferência do domínio útil de terreno da União, os Cartórios de Notas e Registro de imóveis devem exigir a certidão da SPU declarando que o interessado recolheu o laudêmio, isso nas transferências onerosas entre vivos, bem como que o transmitente se encontra em dia com as demais obrigações na Secretária de Patrimônio da União, até porque a cobrança é direcionada para quem está cadastrado no referido órgão, independentemente de acordo entre as partes. 

6. Os dispositivos apontados como violados (arts. 108 e 1332 Código Civil/2002, 167, I, e 17 da Lei n. 6.015/1.973) não possuem comando normativo suficiente para modificar a conclusão do julgado, circunstância que autoriza a aplicação da Súmula 284 do STF. 

7. In casu, a controvérsia perdeu importância com o advento das Leis ns. Lei n. 13.139/2015 e 13.465/2017, pois trouxeram modificações profundas nos procedimentos de alienação de imóveis da União, notadamente nos Decretos-leis ns. 2.398/87 e 9.760/46 e na Lei n. 9.636/98, inclusive na Lei de Registros Públicos, instituindo mecanismos para desburocratizar a tramitação cartorária e aprimorar a regularização fundiária rural e urbana. 

8. Agravo interno desprovido. 

(AgInt no REsp 1418180/CE, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/03/2020, DJe 25/03/2020); 

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. IMÓVEIS DA UNIÃO. TERRENO DE MARINHA. TAXA ANUAL DE OCUPAÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. TRANSFERÊNCIA DA OCUPAÇÃO DO IMÓVEL A TERCEIRO. CESSÃO DE POSSE. NÃO OPONÍVEL EM FACE DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO. PAGAMENTO. RESPONSABILIDADE DE QUEM FIGURA COMO OCUPANTE NO CADASTRO DA SECRETARIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU. 

1. A controvérsia posta no recurso especial decorre da cobrança de crédito pelo não recolhimento da Taxa de Ocupação dos exercícios 1999, 2000 e 2001, referentes à imóvel da União (terrenos de marinha), efetuada originariamente pela Fazenda Nacional por meio de execução fiscal. O recorrente além de apontar divergência jurisprudencial acerca da interpretação dada pelo acórdão recorrido ao artigo 7º da Lei n. 9.636/98, a qual difere do entendimento esposado pela Tribunal Regional Federal da 4ª Região, alega violação do artigo 535 do CPC, ao argumento de que o Tribunal de origem incorreu em omissão quanto ao exame do artigo 7º da Lei n. 9.636/98, que eximiria o recorrente de responsabilidade pelo pagamento da dívida referente à taxa de ocupação. Para tanto aduz o seguinte: a) que não é proprietário da área da qual é cobrada a taxa de ocupação, mas sim a União, ocupando o referido imóvel até 1997, e que o atual ocupante é quem deveria arcar com o débito, em face da alienação do imóvel; b) a taxa de ocupação cobrada não é espécie tributária, tendo natureza jurídica de preço público; c) que não há como transcrever o título de alienação junto ao Registro Geral de Imóveis uma vez que se trata de cessão de posse e não de domínio; e d) a transferência de responsabilidade pelo recolhimento da taxa de ocupação, independe de pagamento de laudêmio. 

2. O Tribunal de origem sobre o tema em discussão assim se pronunciou: a) a Taxa de Ocupação tem como fato gerador o domínio útil dos terrenos de marinha e é exigida de quem detém os poderes inerentes à propriedade, sendo certo que a promessa de compra e venda não tem o condão de transferir a propriedade, o que, segundo disciplinam o art. 1.245 e seus parágrafos do Código Civil, se dá mediante o registro do título translativo perante o Registro de imóveis; b) o objeto do contrato de promessa de compra e venda é o imóvel sobre o qual incide a taxa exigida nos autos, não havendo notícia da transcrição no Registro de Imóveis do título translativo da propriedade, não há como deixar de reconhecer a responsabilidade do devedor, que a toda evidência, figura como real proprietário do imóvel; e c) a cláusula de transferência de responsabilidade dos créditos exeqüendos é inoponível em face da Fazenda Pública, porquanto as normas reguladoras da responsabilidade tributária são de ordem pública, portanto insuscetíveis de modificação pelas partes (art. 123, do CTN). 

3. Não há violação do artigo 535 do CPC quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese do recorrente. 

4. Os terrenos de marinha são bens públicos que se destinam historicamente à defesa territorial e atualmente à proteção do meio ambiente costeiro, permitindo-se a ocupação por particulares, mediante o pagamento de taxa de ocupação e de laudêmio quando da transferência, em relação eminentemente pública, regida pelas regras do direito administrativo. 

5. A responsabilidade de pagamento da referida a taxa nasce com a inscrição do terreno de marinha na Secretaria do Patrimônio da União (SPU), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, responsável por seu registro, consoante preconiza o artigo 7º da Lei n. 9.636/98. A inscrição do terreno pela Administração Pública é o ato em que se define quem efetivamente aproveita o imóvel, e que se tornará obrigado ao pagamento da taxa de ocupação. A partir desse momento, não são oponíveis contra a Administração Pública o não aproveitamento do imóvel, negócios jurídicos, desocupação, senão pelo estreito caminho que leva à Administração a ciência da situação real do bem cujo poder-dever de administrar lhe compete. 

6. O processo de inscrição de ocupação do imóvel junto à SPU guarda semelhança como o próprio registro de imóveis. Isso porque a Lei exige que antes de levada a transferência a registro, é imprescindível, além do pagamento do laudêmio, a ciência da Administração para que ela autorize a transferência. Feitas essas diligências, poderá o Cartório averbar a transferência e permitir que o adquirente altere a inscrição do registro na SPU. Só a partir daí o adquirente terá justo título para ostentar a situação de "ocupante de direito" do imóvel pertencente à União. Enquanto isso não ocorrer, permanecerá na inscrição do imóvel o antigo ocupante, podendo responder pelo adimplemento da taxa, caso dos autos. 

7. A comunicação do negócio jurídico formalizado entre o ocupante e terceiro à SPU não se reveste de ato de mera formalidade, mas se constitui em medida de essencial importância e que produz efeitos jurídicos relevantes, uma vez que a União é a proprietária do terreno de marinha (artigo 1º, "a", do Decreto-lei n. 9.760/46) e, nessa qualidade, deverá estar sempre a par e consentir com a utilização de bem que lhe pertence. 

8. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o título de propriedade do particular não é oponível à União nesses casos, pois os terrenos de marinha são da titularidade originária deste ente federado, na esteira do que dispõem a Constituição da República e o Decreto-lei n. 9.760/46. 

9. Recurso especial não provido. 

(REsp 1201256/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/12/2010, DJe 22/02/2011) 

 

Nessa linha de orientação é o precedente da Turma a seguir transcrito: 

 

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. COBRANÇA DE TAXA DE OCUPAÇÃO E LAUDÊMIO. TERRENO DE MARINHA. DOMINIO PÚBLICO DA UNIÃO. REGISTRO DE PROPRIEDADE PARTICULAR. INOPONIBILIDADE À UNIÃO. SÚMULA 496 DO STJ. TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO ÚTIL DO IMÓVEL. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO À SPU. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. ALIENANTE. DECADÊNCIA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1. Cinge-se a questão debatida nos autos em definir se os lotes adquiridos pela autora são caracterizados como terrenos de marinha e se afiguram devidas as respectivas taxas de ocupação e laudêmio. 

2. De início cumpre ressaltar que o registro do título translativo no Registro de Imóveis não gera presunção absoluta do direito real de propriedade, apenas relativa, consoante dispõe o art. 1.231 do CC/2002. 

3. Dos documentos acostados aos autos, conclui-se que o Lote 07, Quadra 10, do Loteamento Bela Vista não figura como terreno de marinha, ao passo que o Lote 15, Quadra 10, figura como terreno de marinha, pertencendo à União, nos termos do art. 20, VII da CRFB/88, gozando de presunção de veracidade o cadastro efetuado pela SPU. A autora não comprova as cobranças em relação ao lote 07, quadra 10. Já as cobranças em relação ao lote 15, quadra 10, são legítimas. 

4. O STJ, no julgamento do RESP n. 1183546/ES, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC/73), firmou o entendimento de que “os registros de propriedade particular de imóveis situados em terrenos de marinha não são oponíveis à União”, o que levou inclusive à edição do verbete sumular nº 496 pela Corte Superior. 

5. Como o domínio útil, em debate, foi alienado pela parte autora a terceiro, não há prova nos autos de que tal transferência do domínio útil respeitou as disposições do art. 3º, §§ 1º a 5º, do DL nº 2.398/1987. 

6. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a não observância do dever de comunicar a SPU acerca da cessão de direitos relativos à ocupação de imóveis da União, o alienante continua responsável pelo pagamento da taxa de ocupação. 

7. Compulsando os autos, não encontrei nenhum documento atestando que eventual transferência de domínio útil do imóvel em debate teve anuência da Secretaria do Patrimônio da União nos termos do art. 102 do DL nº 9.760/46, nem que as obrigações enfitêuticas foram transferidas aos respectivos adquirentes mediante apresentação na SPU do título de aquisição, de forma a alterar a sujeição passiva da obrigação. 

8. Com relação à decadência e prescrição, os créditos anteriores à Lei 9.821/99 não se sujeitavam à decadência, mas, tão-somente, ao prazo prescricional de cinco anos, previsto no art. 1º, do Decreto 20.910/32; com a edição da Lei 9.636/98, foi instituída a prescrição quinquenal em seu art. 47, sendo que o referido artigo foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadência de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência; por fim, com a edição da Lei 10.852/2004, publicada em 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, sendo estendido o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, novamente, o prazo prescricional quinquenal, a contar do lançamento. 

9. Não há que se falar em decadência nos termos do disposto no artigo 47, I, da Lei 9.636/98, na redação conferida pela lei 10.852/2004, e tampouco há que se cogitar ser o caso de prescrição que, segundo o inciso II, somente deve ocorrer cinco anos contados do lançamento. 

10. Apelação desprovida, com majoração honorária. 

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001109-34.2017.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 29/07/2021, Intimação via sistema DATA: 02/08/2021) 

 

Consigno que, afastada a legitimidade passiva da recorrente, resta prejudicada a análise do pedido outro referente a exigibilidade ou não do laudêmio em face do designado imóvel. 

Configura-se nos autos situação de sucumbência recíproca, a teor do art. 21 do CPC/73, nenhuma das partes decaindo de parcela mínima do pedido, descabendo condenação nas verbas correspondentes.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso para julgar parcialmente procedentes os embargos à execução, nos termos supra. 

É o voto. 

 

 

 

 

 

 

 



 

 

 

 

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  E M E N T A

 

DIREITO PRIVADO. ENFITEUSE. LAUDEMIO. LEGITIMIDADE PASSIVA.  

I – Hipótese dos autos em que tanto no instrumento particular de cessão de direitos quanto na escritura definitiva consta expressamente a responsabilidade do cessionário/adquirente pelo pagamento do laudêmio eventualmente devido, sendo apresentada na ocasião da lavratura da escritura definitiva as guias de recolhimento do laudêmio devido em razão da transferência e as respectivas certidões autorizativas de transferência (CAT) expedidas pela SPU, constando, inclusive, nos registros da SPU o nome do adquirente como responsável pelo domínio útil, sendo, portanto, ele o legitimado para figurar no polo passivo da execução. Precedentes. 

II – Recurso provido.  


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para julgar parcialmente procedentes os embargos à execução, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.