Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
7ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002300-70.2020.4.03.6318

RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: VERA BARBOSA RODRIGUES RANDI

Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA DANUZIA DA SILVA CARVALHO - SP301345-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002300-70.2020.4.03.6318

RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: VERA BARBOSA RODRIGUES RANDI

Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA DANUZIA DA SILVA CARVALHO - SP301345-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de ação objetivando o reconhecimento de tempo de atividade rural, para fins de concessão de aposentadoria por idade.

A r. sentença julgou procedente em parte o pedido, sendo oportuno colacionar alguns excertos dela, do que interessam:

 

 “Trata-se de demanda ajuizada por VERA BARBOSA RODRIGUES RANDI em

face do INSS, sob o rito sumariíssimo, com pedido de tutela provisória de urgência de natureza antecipada, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural E/NB 41/187.889.820-2, desde a data DER em 29/06/2018, mediante o reconhecimento do tempo de atividade rural.

(...)

No caso concreto, a autora, nascida aos 19/09/1954, completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade aos 19/09/2009. Pelo que se depreende da tabela do artigo 142 da Lei n.º  8.213/91, a carência necessária para a concessão do benefício que pleiteia seria de 168 contribuições. Este é o tempo de atividade rural que a autora deve comprovar ter exercido, para a procedência de seu pleito.

Para comprovar o fato alegado na inicial, apresentou como início de prova material os seguintes documentos:

i) CTPS nº 073732 – série 436ª emitida em 27/05/1975 pela DRT de Franca de titularidade da autora;

ii) identidade de beneficiário INPS, figurando como beneficiária Vera Barbosa Rodrigues Randi e segurado Gonçalo Raimundo Siqueira Randi; iii)  título de eleitor de Vera Barbosa Rodrigues, emitido em 03/05/1975, qualificação profissional doméstica, residente na Fazenda Santa Eudóxia; iv) CTPS nº 45928 – série 221 de titularidade de Eurico Rodrigues, emitida em 04/08/1969, com registro de vínculo empregatício rural de  01/08/1996 a 14/02/1998 (Fazenda Sapucaí);

v) CTPS nº 82394 – série 002 de titularidade de Eurico Rodrigues, emitida em 08/1969, com registro de vínculo empregatício rural de 12/06/1973 a 14/02/1976 (Fazenda Santa Eudóxia), de 01/10/1984 a 31/08/1986 (Fazenda Santa Adélia), de 25/09/1986 a 03/11/1986 (Fazenda Rosário), de 21/03/1988 a 05/02/1993 (Fazenda Santana), de 09/11/1993 a 05/08/1994 (Fazenda Rosário), de 02/01/1995 a 31/03/1995 (Fazenda Santa Alcina);

vi) certidão de casamento de Gonçalo Raimundo Siqueira Randi, filho de Luiz Randi, lavrador, e Etelvina Siqueira Ranid do Lar, e Vera Barbosa Rodrigues, filha de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa Rodrigues, do lar, celebrado aos 27/12/1975;

vii) certidão de casamento de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa, do lar, celebrado aos 13/12/1952;

viii) certidão de nascimento de Hélio Barbosa Rodrigues, nascido aos 22/05/1953, nascido na Fazenda Cachoeira dos Eudorados, filho de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa Rodrigues, do lar;

ix) certidão de nascimento de Ademir Barbosa Rodrigues, nascido aos 15/05/1962, na Fazenda Santa Eudóxia, filho de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa Rodrigues, do lar;

x) certidão de nascimento de Valdeir Barbosa Rodrigues, nascido aos 15/10/1955, na Fazenda Sapucaí, filho de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa Rodrigues, do lar;

xi) certidão de nascimento de Ailton Barbosa Rodrigues, nascido aos 15/12/1956, na Fazenda Santa Eudóxia, filho de Eurico Rodrigues, lavrador, e Ana Barbosa

Rodrigues, do lar; xii) carteira de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São José da Bela Vista em nome de Eurico Rodrigues, viúvo, rurícola, com admissão em 18/05/1994;

xiii) fotografias sem registro de datas; xiv) certidão de óbito de Eurico Rodrigues, aposentado, falecido aos 14/02/1998.

Colhe-se do extrato previdenciário CNIS que o cônjuge da autora, Sr. Gonçalo Raimundo Siqueira Randi, filou-se ao RGPS em 01/10/1976, na qualidade de segurado obrigatório empregado urbano, e manteve vínculos empregatícios com Arlindo Scarellini S/C Ltda., Companhia Paulista de Força e Luz e Toshiba Sistemas de Transmissão e Distribuição do Brasil Ltda., entre 01/10/1976 e 15/08/1997 e 15/01/2001 a 01/08/2001.

Refiliou-se ao RGPS na condição de segurado obrigatório contribuinte individual e verteu contribuições nas competências de 07/2004 a 12/2004, 02/2005 a 08/2005, 11/2005 a 12/2005, 02/2006 a 03/2006, 05/2006 a 12/2012, 02/2013 e 05/2013 a 06/2013 (evento 15).

Em depoimento pessoal, a parte autora relatou o seguinte:

“que nasceu em 19/09/1954, no Sítio Pitangueiras, em São José da Bela Vista/SP; que em 1955 a família mudou-se para a Fazenda Santa Eudóxia, de propriedade de José Baltazar, localizada no município de São José da Bela Vista/SP ; que seu avô materno arrendou 7 alqueires da citada fazenda para plantar arroz, feijão e hortaliças; que tinham três residências no lote arrendado, nas quais residiam as famílias do avô materno, da autora e do Tio João; que lá permaneceu até 21 anos de idade e se casou em 1975; que o seu esposo trabalhava de servente na barragem localizada no interior da Fazenda Santa Eudóxia; que, logo após contrair o matrimônio, a autora mudou-se para residência perto da barragem e continuou a auxiliar os pais na lavoura; que vendiam melancia, milho verde e mandioca na cidade e no comércio local; que teve duas filhas gêmeas, nascidas em 01/09/1976; que, entre a gestação e o parto, ficou parada durante um ano e meio; que sua mãe cuidava das filhas e continuou a trabalhar na lavoura, sem auxílio de empregados; que chegou a trabalhar como diarista em colheitas de amendoim, milho, batata e arroz; que em 1983 seu pai mudou-se da propriedade; que seu marido mudou de emprego, razão por que o casal passou a residir perto da cidade de Patrocínio Paulista; que o seu marido passou a trabalhar como servente e depois ele começou a exercer a função de ajudante da CPFL; que a autora cuidava da casa e também se dedicava à atividade campesina em porção de terra cedida pela CPFL aos empregados; que permaneceu ali durante oito anos, cuidando da casa e das crianças, bem como plantava tomate, mandioca e hortaliças; que a autora e seu esposo retornaram para o município de São José da Bela Vista em 1990 ; que, nessa época, ficou mais difícil o trabalho em colheitas de lavoura, pois tinham que viajar; que, às vezes, trabalhava nas safras de café e algodão; que até hoje, quando aparece alguma coisa, ainda trabalha.”

As testemunhas arroladas pela parte autora minudenciaram o seguinte:

Adalberto Alves

“que conhece a autora desde a idade de 11, 12 ou 13 anos; que o pai da testemunha arrendava umas terras, nos anos de 1961 a 1982, na fazenda Santa Eudóxia, município de São José da Bela Vista/SP ; que já presenciou a autora trabalhando, pois a testemunha controlava a contabilidade do genitor, fazia as anotações e os pagamentos aos arrendatários e aos empreiteiros; que lá tinha plantação de batata, arroz, feijão, milho, soja e algodão; que a autora morava na propriedade com os pais e irmãos, o avô e o tio; que a fazenda arrendava um pedaço de terra para o avô da autora, conhecido por ‘Barbosa’; que o avô dela era funcionário antigo da fazenda, sem registro; que o pai da testemunha, na verdade, cedeu de 5 a 6 alqueires para o avô da autora; que a autora se casou e passou a morar na barragem da CPFL que ficava dentro da fazenda, mas ela continuou a trabalhar com os pais e os irmãos na propriedade rural; que o marido da autora era empregado da CPFL.”

José Antonio

que conhece a autora da Fazenda Santa Eudóxia, localizada na região de São José da Bela Vista/SP; que a testemunha trabalhava na citada fazenda com os tios; que a autora morava com os pais e os irmãos na Fazenda Santa Eudóxia; que lá tinha plantação de milho, arroz, algodão e feijão; que a família da autora ficou bastante tempo na fazenda, cerca de vinte anos; que a fazenda era muito grande e cada família arrendava uma parte de terra; que a autora chegou a ajudar na colheita de algodão; que a testemunha trabalhou na citada fazenda até 1977; que depois que saiu da fazenda frequentava muito pouco; que a autora, depois que se casou, morou certo tempo na cidade e, emseguida, voltou para a Fazenda Santa Eudóxia, retomando o labor rural.”

Mister se faz cotejar as provas documentais com os depoimentos produzidos em audiência.

Constam anotações de vínculos rurais na CTPS de titularidade do pai da autora, Sr. Rodrigues, nos períodos de 12/06/1973 a 14/02/1976, 01/10/1984 a 31/08/1986, 25/09/1986 a 03/11/1986, 21/03/1988 a 05/02/1993, de 09/11/1993 a 05/08/1994, 02/01/1995 a 31/03/195 e 01/08/1996 a 14/02/1996. Somente no período de 12/06/1973 a 14/02/1976 o labor foi exercido na Fazenda Santa Eudóxia.

Malgrado a possibilidade de extensão de qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro ou do pai em relação ao filho constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), quando não se tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de economia  familiar – como no caso dos autos em que a parte autora busca a extensão da qualidade de rurícola  de vínculos anotados em CTPS de titularidade do seu pai -, inadmissível se mostra a extensão da qualidade de trabalhador rural.

Com efeito, os trabalhos desempenhados nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, mediante vínculo hierárquico, não eventual, com salário pelo serviço prestado, tornam os registros personalíssimos, não podendo ser estendidos à autora para comprovar a carência.

Adiro ao entendimento no sentido de que, em se tratando de empregados rurais, impossível se mostra a extensão da condição de lavrador do marido à mulher ou do pai em relação aos filhos, em vista do caráter individual e específico em tais atividades laborais ocorrem. O trabalho, neste caso, não se verifica com o grupo familiar, uma vez que restrito ao próprio âmbito profissional de cada trabalhador. Ao contrário da hipótese do segurado especial, não há de se falar em empréstimo, para fins previdenciários, da condição de lavrador do cônjuge ou do genitor (vide súmula nº 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região). A propósito, a presunção de que a esposa acompanha o marido, assim como os filhos menores acompanham os pais, somente é  aplicável ao segurado especial em regime de economia familiar, não sendo aceitável presumir que o empregador, ao contratar um trabalhador rural eventual ou empregado, contrata sua esposa ou filhos por presunção, face ao caráter personalíssimo do contrato de trabalho, principalmente no que toca ao empregado.

Nota-se, outrossim, a qualificação de doméstica no título de eleitor de titularidade da autora.

Inobstante a parte autora tenha afirmado que, antes de contrair matrimônio, residia com os pais e irmãos em pequena porção de terra localizada na Fazenda Santa Eudóxia, cujo avô materno arrendou cerca de sete alqueires, para desenvolverem plantação de arroz, feijão e hortaliças, coleta-se das certidões de nascimento de seus irmãos, Hélio Barbosa Rodrigues e Valdeir Barbosa Rodrigues, que o local do nascimento deu-se em propriedades rurais diferentes.

Ademais, os registros dos vínculos empregatícios anotados em CTPS de titularidade do pai da autora indica a mantença de relações de emprego com as Fazendas Santa Adélia, Santana, Santa Alcina e Rosário.

Por outro lado, antes do registro formal do primeiro vínculo empregatício do pai da autora, em 12/06/1973, a certidão de casamento e as certidões de nascimento juntadas aos autos, que remontam a períodos anteriores, já registravam a qualificação profissional de trabalhador rural do Sr. Eurico Rodrigues.

Consoante acima exposto, a Constituição Federal de 1967, vigente ao tempo dos fatos, proibiu o trabalho de menores de 12 anos, nos termos do inciso X do artigo 165, de forma que se deve tomar como parâmetro para a admissão do trabalho rural tal limitação norma acima não pode ser flexibilizada a ponto de ser reconhecida atividade laboral à criança. Ora, se a parte autora, quando ainda contava com 10 (dez) anos de idade, acompanhava seus pais na execução de algumas tarefas, isto não o identifica como trabalhador rural ou empregado, tampouco caracteriza trabalho rural em regime de economia familiar, sob pena de banalizar o comando constitucional. De mais a mais, não é crível que um menor de 12 (doze anos), ainda na infância, disponha de vigor físico suficiente para o exercício pleno da atividade rural, sendo sua participação nas lides rurais de caráter limitado, secundário, cujo eventual auxílio não pode ser considerado como período de efetivo labor rural.

Assim, entre 19/09/1966 e 27/12/1975 (data do matrimônio), infere-se o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, o que é roborado pelos depoimentos das testemunhas.

Assevera a autora que, após contrair o matrimônio, passou a residir com o cônjuge em outra moradia, localizada no interior da propriedade rural Fazenda Santa Eudóxia, próxima à barragem. Delineou que auxiliava os genitores no labor rurícola. Disse que também trabalhou como diarista em lavouras de milho, amendoim, batata e arroz. Destacou que, mesmo após a mudança de cidade, em razão do trabalho do esposo, continuou a exercer a atividade rurícola, em regime de economia familiar.

Como visto, o extrato previdenciário indica o intenso labor urbano do cônjuge da autora, desde outubro de 1976. Alguns meses após a celebração do casamento civil (27/12/1975), o Sr. Gonçalo Raimundo Siqueira Randi havia se filiado ao RGPS na condição de segurado obrigatório empregado urbano.

Não há nos autos início razoável de prova material de que a autora, após contrair o matrimônio, tenha continuado a exercer atividade rural em regime de economia familiar,  mormente em razão dos sucessivos vínculos empregatícios urbanos mantidos pelo cônjuge.

Expõe, ainda, a autora que, após a mudança de cidade e o nascimento dos filhos, cuidava do lar e plantava tomate, mandioca e hortaliças. Acrescentou que, a partir de 1990, quando retornou para o município de São José da Bela Vista, o trabalho no campo ficou mais difícil, pois teria que viajar. Mencionou que, às vezes, trabalhava como diarista em safras de café e algodão. Pontuou que, atualmente, ainda exerce a atividade campesina “quando aparece alguma coisa”.

O C. STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, por ocasião do julgamento do REsp. 1.354.908, firmou o seguinte entendimento:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO

ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício.

Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil. (RESP 201202472193, RESP - RECURSO ESPECIAL - 1354908, Relator MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 10/02/2016)

Salutar a prova do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício de aposentadoria por idade, ainda que de forma descontínua, ou ao menos por ocasião do implemento do requisito etário. Confira-se:

EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE DE RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO CUMPRIMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO. - Atividade rural, mesmo que descontínua, não comprovada no período imediatamente anterior ao implemento da idade ou requerimento do benefício, enseja a negação da aposentadoria de rurícola vindicada.

- Inaplicabilidade à hipótese do artigo 3º, §1º, da Lei 10.666/03, segundo a jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça (...) - Permanecem arraigadas as exigências do artigo 143 da Lei 8.213/91 à concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, na medida em que os benefícios de valor mínimo pagos aos rurícolas em geral possuem disciplina própria, em que a carência independe de contribuições mensais, daí que obrigatória, mesmo de forma descontínua, a prova do efetivo exercício da atividade no campo. - Embora comportando temperamentos, via de regra, o abandono do posto de lavrador anteriormente ao implemento do requisito etário ou formulação do requerimento administrativo ou judicial, mormente quando contemporâneo ao emprego em atividade urbana do cônjuge que empresta à esposa requerente a qualidade de segurado, acaba inviabilizando por completo o deferimento da benesse postulada".(EI 00139351020134039999, Relatora DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA, TRF3, TERCEIRA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 10/06/2015)

Esse inclusive é o entendimento consolidado pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Tema 642: “O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade”.

Assim, tanto na data em que implementou o requisito etário quanto na data do requerimento administrativo não restou provado o desempenho de atividade rural.

Desse modo, o pedido deve ser parcialmente acolhido para somente reconhecer o tempo de atividade rural de 19/09/1966 e 27/12/1975.

III – DISPOSITIVO

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela autora, resolvendo-lhe o mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para tão-somente reconhecer o tempo de atividade rural laborado, em regime de economia familiar, de 19/09/1966 e 27/12/1975. Sem custas processuais nem honorários advocatícios (arts. 54 e 55 da L. 9099/95, c/c art. 1º da L. 10259/01). Havendo interposição tempestiva de recurso, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo legal e, após, com ou sem apresentação destas, remetam-se os autos à Turma Recursal, com as formalidades de praxe. Caso contrário, certifique-se o trânsito em julgado e intime-se o INSS para que, no prazo de 30 (trinta) dias, cumpra a obrigação de fazer. Derradeiramente, arquivem-se os autos Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se.”

 

 

Recorre a autora, sustentando, em síntese, que o início de prova material foi corroborado por prova testemunhal, pugnando pela reforma da r. sentença, com a procedência do pedido inicial.

Recorre o INSS, alegando que os documentos trazidos pela parte autora são insuficientes para comprovar o labor rural da autora nos períodos reconhecidos na sentença. Pugna pela improcedência do pedido inicial. Subsidiariamente, pleiteia, que seja o tempo de atividade rural limitado ao período de 12/06/1973 (primeira prova documental) até 27/12/1975 (casamento da autora).

É o relatório.

 

 

 

 


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JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002300-70.2020.4.03.6318

RELATOR: 20º Juiz Federal da 7ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: VERA BARBOSA RODRIGUES RANDI

Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA DANUZIA DA SILVA CARVALHO - SP301345-A

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V O T O

O art. 39 da Lei nº 8.213/91, assim dispõe:

Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido; ou (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)

II - dos benefícios especificados nesta Lei, observados os critérios e a forma de cálculo estabelecidos, desde que contribuam facultativamente para a Previdência Social, na forma estipulada no Plano de Custeio da Seguridade Social.

 Parágrafo único. Para a segurada especial fica garantida a concessão do salário-maternidade no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício.  (Incluído pela Lei nº 8.861, de 1994)

Consoante o art. 11, inciso VII, § 1º, da Lei nº 8.213/91, caracteriza-se por regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.

Em situações em que se pretende comprovar exercício de atividade rural em regime de economia familiar, os documentos em nome do marido podem ser considerados como início de prova material para a esposa. Foi esta última a razão da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editar a Súmula nº 6:

Súmula 6/TNU: A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.

Em relação à prova do tempo de atividade rural, há dois entendimentos sedimentados nos Juizados Especiais Federais, veiculados pelas Súmulas 14 e 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais:

Súmula 14: Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício.

Súmula 34: Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar.

Do cotejo dos enunciados acima reproduzidos, conclui-se que, os documentos (início de prova material) para prova do tempo rural devem ser contemporâneos aos fatos que se quer comprovar, mas não se exige que a prova material corresponda a todo o período que se quer

Conforme asseverado na r. sentença:

 

Quanto aos vínculos do marido da autora:

(…)

Colhe-se do extrato previdenciário CNIS que o cônjuge da autora, Sr. Gonçalo Raimundo Siqueira Randi, filou-se ao RGPS em 01/10/1976, na qualidade de segurado obrigatório empregado urbano, e manteve vínculos empregatícios com Arlindo Scarellini S/C Ltda., Companhia Paulista de Força e Luz e Toshiba Sistemas de Transmissão e Distribuição do Brasil Ltda., entre 01/10/1976 e 15/08/1997 e 15/01/2001 a 01/08/2001.

Refiliou-se ao RGPS na condição de segurado obrigatório contribuinte individual e verteu contribuições nas competências de 07/2004 a 12/2004, 02/2005 a 08/2005, 11/2005 a 12/2005, 02/2006 a 03/2006, 05/2006 a 12/2012, 02/2013 e 05/2013 a 06/2013 (evento 15).

(…)”

 

Os períodos com vínculos do marido da autora como empregado rural, não podem ser a ela estendidos, pois se trata de relação trabalhista personalíssima, regida por legislação específica. Conforme depoimento da autora, à época do casamento, o marido era servente na barragem, que se situa dentro da fazenda, Santa Eudoxia.

 

No tocante aos vínculos do genitor da autora, assim consta da r. sentença:

 

“(…)

Constam anotações de vínculos rurais na CTPS de titularidade do pai da autora, Sr. Rodrigues, nos períodos de 12/06/1973 a 14/02/1976, 01/10/1984 a 31/08/1986, 25/09/1986 a 03/11/1986, 21/03/1988 a 05/02/1993, de 09/11/1993 a 05/08/1994, 02/01/1995 a 31/03/195 e 01/08/1996 a 14/02/1996. Somente no período de 12/06/1973 a 14/02/1976 o labor foi exercido na Fazenda Santa Eudóxia.

Malgrado a possibilidade de extensão de qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro ou do pai em relação ao filho constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), quando não se tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido em regime de economia  familiar – como no caso dos autos em que a parte autora busca a extensão da qualidade de rurícola  de vínculos anotados em CTPS de titularidade do seu pai -, inadmissível se mostra a extensão da qualidade de trabalhador rural.

Com efeito, os trabalhos desempenhados nos moldes da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, mediante vínculo hierárquico, não eventual, com salário pelo serviço prestado, tornam os registros personalíssimos, não podendo ser estendidos à autora para comprovar a carência.

(…)

Por outro lado, antes do registro formal do primeiro vínculo empregatício do pai da autora, em 12/06/1973, a certidão de casamento e as certidões de nascimento juntadas aos autos, que remontam a períodos anteriores, já registravam a qualificação profissional de trabalhador rural do Sr. Eurico Rodrigues.

 

A extensão à autora dos documentos que qualificam o seu genitor como rurícola é reconhecida pela nossa jurisprudência, conforme ementas que seguem:

 

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. PERÍODO LABORADO COMO RURÍCOLA. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. DOCUMENTOS EM NOME DOS PAIS DO AUTOR. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. VALORAÇÃO DAS PROVAS. POSSIBILIDADE.

- Em se tratando de trabalhador rural, em razão das dificuldades de produzir provas no meio rural, verificar os elementos probatórios carreados aos autos não agride a Súmula 7 do STJ.

- O rol de documentos previsto no art. 106 da Lei n.º 8.213/91 não é numerus clausus, sendo possível utilizar-se de documentos em nome dos genitores do autor, com o propósito de suprir o requisito de início de prova material, desde que acrescido por prova testemunhal convincente.

- Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp 1073582/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 03/02/2009, DJe 02/03/2009)

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PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.

RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO NA ATIVIDADE RURAL. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. DOCUMENTOS EM NOME DO GENITOR DA AUTORA.

POSSIBILIDADE.

1. É sabido que, diante da dificuldade dos trabalhadores rurais em fazer prova do tempo de serviço prestado na atividade rurícola, não se exige uma vasta prova documental. O legislador exige é que haja início de prova material, corroborado pela prova testemunhal, do período em que se pretende o reconhecimento do labor rural, respeitado o prazo de carência legalmente previsto no art. 143 da Lei n. 8.213/91.

2. Verifica-se, no presente caso, que houve o início de prova material para a comprovação da atividade rural no período pleiteado pela autora na inicial e reconhecido pelas instâncias ordinárias, de 1957 a 31.12.1964, atestado por robusta prova testemunhal.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1112785/SC, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2013, DJe 25/09/2013)

 

 

Assim, considerando o início de prova documental produzida, anterior à data do primeiro vínculo do genitor, onde consta a atividade como lavrador, aliada à prova testemunhal, reconheço o exercício de trabalho rural durante o período de 19/09/1966 (12 anos de idade) a 11/06/1973 (dia anterior ao primeiro vínculo do genitor da autora), como trabalhador rural segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da lei 8.213/91.

 

Posto isso, nego provimento ao recurso da autora e dou parcial provimento ao recurso do INSS para reformar em parte a r. sentença para reconhecer o período de 19/09/1966 (12 anos de idade) a 11/06/1973 (dia anterior ao primeiro vínculo do genitor da autora), o tempo de atividade rural da autora. No mais, considerando que a r. sentença recorrida bem decidiu a questão, deve ser mantida nos termos do artigo 46 da Lei nº 9.099/95.

Condeno ao recorrente vencido, ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa, que somente poderão ser exigidos em caso de cessação do estado de necessitado, nos termos do artigo 98, §§ 2º e 3º, do CPC/2015.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. AVERBAR TEMPO RURAL RECONHECIDO. NÃO RESTOU COMPROVADO O EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO OU À DATA DA IMPLEMENTAÇÃO DA IDADE MÍNIMA. RECURSO DA PARTE AUTORA. RECURSO DO INSS. INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL PRODUZIDA, SOMENTE ANTERIOR A DATA DO PRIMEIRO VÍNCULO DO GENITOR, ONDE CONSTA A ATIVIDADE COMO LAVRADOR, ALIADA À PROVA TESTEMUNHAL. RECURSO DO INSS PROVIDO EM PARTE. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS e negar provimento ao recurso da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.