Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000257-24.2019.4.03.6310

RELATOR: 27º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: FLAVIO FERREIRA DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: FABIA LUCIANE DE TOLEDO - SP174279-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000257-24.2019.4.03.6310

RELATOR: 27º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: FLAVIO FERREIRA DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: FABIA LUCIANE DE TOLEDO - SP174279-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de demanda ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de tempo laborado em condições especiais.

 

O MM. Juízo Federal a quo proferiu sentença, julgando parcialmente procedentes os pedidos, para condenar o INSS a averbar como tempo especial os períodos de 03/04/1974 a 03/07/1975, 04/07/1976 a 15/02/1978 e de 03/12/1998 a 10/11/2008, bem como a converter o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial.

 

Inconformado, o INSS interpôs recurso, impugnando os períodos especiais reconhecidos na r. sentença.

 

É o relatório.

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000257-24.2019.4.03.6310

RELATOR: 27º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: FLAVIO FERREIRA DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: FABIA LUCIANE DE TOLEDO - SP174279-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

VOTO

 

Por força do efeito devolutivo do recurso, apenas suas razões foram devolvidas ao conhecimento do colegiado para julgamento, restando preclusa a discussão quanto às demais questões.

 

Em relação às condições especiais de trabalho, o artigo 201, § 1º, da Constituição Federal assegura a quem exerce atividades nestas circunstâncias, prejudiciais à saúde ou à integridade física, a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão do benefício correlato.

 

Na essência, é uma modalidade de aposentadoria por tempo de serviço, mas com redução do lapso temporal, em razão das peculiares condições sob as quais o trabalho é prestado, presumindo a lei que o trabalhador em situações adversas à saúde ou à integridade física tem a sua expectativa de vida mais comprometida em comparação com os demais trabalhadores.

 

Para a contagem do tempo de serviço, a norma aplicável é sempre aquela vigente à época da sua prestação, conforme entendimento consolidado na Súmula nº 9 da Turma Regional de Uniformização da 3ª Região. Desta forma, em respeito ao direito adquirido, se o trabalhador exerceu atividades laborativas em condições adversas e a lei vigente naquele momento permitia a contagem de forma mais vantajosa, o tempo de serviço assim deve ser contado.

 

Até a edição da Lei federal nº 9.032/1995 (vigência: 29/04/1995), cada dia trabalhado em atividades enquadradas como especiais pelos Decretos federais nºs 53.831/1964 e 83.080/1979, era contado como tempo de serviço de forma diferenciada.

 

É certo que o Decreto federal nº 611/1992 (vigência: 22/07/1992), no seu artigo 292, estabeleceu a manutenção dos Anexos dos Decretos federais mencionados.

 

Porém, sucessivamente, o Decreto federal nº 2172/1997 (vigência: 09/04/1997), no artigo 261, revogou os Anexos I e II do Decreto federal nº 83.080/1979.

 

Posteriormente, o Decreto federal nº 3048/1999 (vigência: 21/06/1999) revogou integralmente o Decreto anterior, criando uma regra transitória no § único do artigo 70 (voltando a incluir o Anexo I do Decreto federal nº 83.080/1979 e mantendo o Anexo ao Decreto federal nº 53.831/1964), que foi alterada pelo Decreto federal nº 4.827/2003 (vigência: 04/09/2003), que inseriu o § 1º ao mesmo artigo 70 e prescreveu a aplicação da “legislação em vigor na época da prestação do serviço”.

 

Paralelamente, o Decreto federal nº 3048/1999, no artigo 68, caput, passou a prever uma lista de agentes nocivos à saúde ou integridade física no seu Anexo IV.

 

Por isso, o enquadramento para fins de contagem especial de trabalho deve ser considerada com base nos Anexos aos Decretos federais nºs 53.831/1964 e 83.080/1979 e no Anexo IV do Decreto federal nº 3048/1999, de acordo com a época do trabalho exercido.

 

Para que o tempo de serviço convertido fosse incorporado ao patrimônio jurídico do segurado antes da Lei federal nº 9.032/1995, bastava o enquadramento em uma das situações previstas nos Decretos Executivos acima citados, presumindo-se a exposição a agentes nocivos.  Além disso, a exposição não precisava ser permanente, conforme o entendimento veiculado na Súmula nº 49 da TNU: “Para reconhecimento de condição especial de trabalho antes de 29/4/1995, a exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física não precisa ocorrer de forma permanente”.

 

A comprovação da exposição a agentes nocivos, até então, era feita por meio dos formulários SB-40 e DSS-8030.

 

Somente com a edição da Lei federal nº 9.032/1995 (vigência: 29/04/1995), que alterou a redação dos §§ 3º e 4º do artigo 57 da Lei federal nº 8.213/1991, passou a ser exigível a prova de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, que prejudique a saúde ou a integridade física.

 

Outrossim, com a edição da Lei federal nº 9.528/1997 (vigência: 11/12/1997), que incluiu os §§ 1º, 2º e 4º ao artigo 58 da Lei de Benefícios, foram estipulados os meios de prova do trabalho em condições especiais: 1) formulário emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; 2) perfil profissiográfico.

 

A Lei federal nº 9.732/1998 (vigência: 14/12/1998) alterou a redação dos §§ 1º e 2º do aludido artigo 58 da Lei federal nº 8.213/1991, mas não de forma substancial, tanto que manteve a exigência do formulário com base no laudo técnico subscrito pelos mesmos profissionais.

 

Já o perfil profissiográfico previdenciário (PPP) somente foi regulamentado pelo Decreto federal nº 4.032/2001 (vigência: 27/11/2001), que modificou a redação do § 2º e incluiu o § 8º ao artigo 68 do Decreto federal nº 3.048/1999, passando a descrever o conteúdo do documento: “Considera-se perfil profissiográfico previdenciário, para os efeitos do § 6º, o documento histórico-laboral do trabalhador, segundo modelo instituído pelo Instituto Nacional do Seguro Social, que, entre outras informações, deve conter registros ambientais, resultados de monitoração biológica e dados administrativos”.

 

Supervenientemente, nova redação foi conferida ao § 9º do mesmo artigo 68 do Regulamento Previdenciário pelo Decreto federal nº 8.123/2013 (vigência 17/10/2013), que passou a descrever os requisitos do PPP: 1) resultado das avaliações ambientais; 2) resultado de monitoração biológica; 3) nome dos responsáveis pela avaliação ambiental e pela monitoração biológica; e 4) dados administrativos correspondentes.

 

A legislação anterior à 29/04/1995 não limitava os meios de prova. Portanto, não se pode reclamar a aplicação da lei mais rigorosa a situações pretéritas, bastando somente o acostamento de formulários que concluam pelo contato com agentes nocivos ou exercício das atividades descritas nos Decretos federais nºs 53.831/1964 e 83.080/1979 para o reconhecimento do direito correspondente.

 

Entendo que a extemporaneidade do laudo técnico não retira a sua força probatória, até porque com a evolução e inovação tecnológica, as condições do ambiente de trabalho tendem a aperfeiçoar-se, atenuando assim a nocividade dos agentes agressivos. Nesse rumo foi editada a Súmula nº 68 da TNU: “O laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”.

 

Ressalto também que a legislação previdenciária que regulou esse benefício originalmente, assegurou que o tempo de serviço comum fosse convertido em tempo especial ou vice-versa, viabilizando a soma dentro de um mesmo padrão. 

 

Com efeito, o artigo 57, caput e § 5º, da Lei federal nº 8.213/1991, na redação imprimida pela Lei federal nº 9.032/1995, possibilitava a conversão do período especial em comum e posterior soma com o tempo trabalhado em atividade comum.

 

No entanto, a Medida Provisória nº 1663-10, de 28 de maio de 1998, revogou o referido § 5º, passando a não existir a possibilidade de conversão de tempo de serviço.

 

Posteriormente, a Medida Provisória em questão foi convertida na Lei federal nº 9.711/1998, que no artigo 28, restabeleceu a vigência do § 5º do artigo 57 da Lei de Benefícios, até que sejam fixados novos parâmetros por ato do Poder Executivo.  

 

Destarte, foi permitida novamente a conversão do período especial em comum e posterior soma com o tempo de carência para a aposentadoria por tempo, conforme entendimento solidificado na Súmula nº 50 da TNU: “É possível a conversão do tempo de serviço especial em comum do trabalho prestado em qualquer período.” 

 

Consigno, ainda, que os períodos anteriores à Lei federal nº 6.887/1980 também são passíveis de conversão em tempo comum, desde que a aposentadoria tenha sido requerida posteriormente à sua vigência.

 

A análise desse requisito para a concessão de aposentadoria não pode ser submetido ao regime jurídico mais gravoso ao segurado e dissociado dos demais requisitos, que são analisados à luz das normas vigentes na época do requerimento de concessão.

 

Neste sentido já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica da ementa do seguinte julgado:

 

“RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL E COMUM. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE. ART. 9º, § 4º, DA LEI 5.890/1973, INTRODUZIDO PELA LEI 6.887/1980. CRITÉRIO. LEI APLICÁVEL. LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DA APOSENTADORIA.

1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com intuito de desconsiderar, para fins de conversão entre tempo especial e comum, o período trabalhado antes da Lei 6.887/1980, que introduziu o citado instituto da conversão no cômputo do tempo de serviço.

2. Como pressupostos para a solução da matéria de fundo, destaca-se que o STJ sedimentou o entendimento de que, em regra; a) a configuração do tempo especial é de acordo com a lei vigente no momento do labor, e b) a lei em vigor quando preenchidas as exigências da aposentadoria é a que define o fator de conversão entre as espécies de tempo de serviço. Nesse sentido: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC.

3. A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço. Na mesma linha: REsp 1.151.652/MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 9.11.2009; REsp 270.551/SP, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 18.03.2002; Resp 28.876/SP, Rel. Ministro Assis Toledo, Quinta Turma, DJ 11.09.1995; AgRg nos EDcl no Ag 1.354.799/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 5.10.2011.

4. No caso concreto, o benefício foi requerido em 24.1.2002, quando vigente a redação original do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991, que previa a possibilidade de conversão de tempo comum em especial.

5. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ." (grafei)

(STJ – 1ª Seção – RESP nº 1310034 – Relator Ministro Herman Benjamin – j. 24/10/2012 – in DJE de 19/12/2012)

 

Por sua vez, a TNU firmou posição de que deve ser aplicado o fator multiplicador vigente à época em que se completam as condições e é formulado o pedido de aposentadoria, e não na época da prestação do serviço, nos termos da Súmula nº 55: “A conversão do tempo de atividade especial em comum deve ocorrer com aplicação do fator multiplicativo em vigor na data da concessão da aposentadoria”.

 

Destarte, consoante o teor do artigo 70 do Decreto federal nº 3.048/1999 (alterado pelo Decreto federal nº 4.827/2003), a conversão das atividades sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:

 

Tempo a converter

Multiplicadores

Multiplicadores

 

Mulher (para 30)

Homem (para 35)

De 15 anos

2,00

2,33

De 20 anos

1,50

1,75

De 25 anos

1,20

1,40

 

Deveras, pondero que em relação ao agente agressivo ruído houve uma sucessão de regulamentações, que merecem ser equalizadas: acima de 80 decibéis – código 1.1.6 do Anexo ao Decreto federal nº 53.831/1964; acima de 90 decibéis – código 1.1.5 do Anexo I do Decreto federal nº 83.080/1979; e superior a 85 decibéis – Decreto federal nº 4.882/2003 e Anexo IV do Decreto federal nº 3.048/1999.

 

Em prestígio ao princípio de aplicação da lei vigente à época dos fatos (tempus regit actum), que é inerente ao Direito Previdenciário, os limites de tolerância de ruído devem ser considerados na seguinte forma:

 

PERÍODO

LIMITE DE TOLERÂNCIA

25/03/1964 a 05/03/1997

acima de 80 decibéis

06/03/1997 a 18/11/2003

acima de 90 decibéis

19/11/2003 em diante

superior a 85 decibéis

 

Ademais, o Decreto federal nº 4.882/2003 incluiu o § 11 ao artigo 68 do Regulamento da Previdência Social (Decreto federal nº 3.048/1999), estabelecendo que as "avaliações ambientais deverão considerar a classificação dos agentes nocivos e os limites de tolerância estabelecidos pela legislação trabalhista, bem como a metodologia e os procedimentos de avaliação estabelecidos pela Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho – FUNDACENTRO “.

 

Em razão disso, a TNU fixou as seguintes teses jurídicas, especificamente em relação ao ruído:

 

“(a) A partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma"; (b) Em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma".

(TNU – Pedilef 0505614-83.2017.4.02.8300/PE – Relator p/ acórdão Juiz Federal Sérgio de Abreu Brito - j. em 21/11/2018)

 

Vale mencionar também que a mera indicação da utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI’s) não descaracteriza a insalubridade no período em que o trabalhador foi submetido a limite de ruído acima do limite legal. Súmula nº 9 da TNU: “O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado”.

 

Importa mencionar, por fim, que o Colendo Supremo Tribunal Federal, em julgamento com reconhecimento de repercussão Geral (ARE nº 664.335/SC), firmou teses jurídicas sobre a natureza especial do trabalho, in verbis:

 

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 201, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REQUISITOS DE CARACTERIZAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO SOB CONDIÇÕES NOCIVAS. FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO VIRTUAL. EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS À SAÚDE. NEUTRALIZAÇÃO DA RELAÇÃO NOCIVA ENTRE O AGENTE INSALUBRE E O TRABALHADOR. COMPROVAÇÃO NO PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO PPP OU SIMILAR. NÃO CARACTERIZAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS HÁBEIS À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. CASO CONCRETO. AGENTE NOCIVORUÍDO. UTILIZAÇÃO DE EPI. EFICÁCIA. REDUÇÃO DA NOCIVIDADE. CENÁRIO ATUAL. IMPOSSIBILIDADE DE NEUTRALIZAÇÃO. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES PREJUDICIAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

(...) 9. A interpretação do instituto da aposentadoria especial mais consentânea com o texto constitucional é aquela que conduz a uma proteção efetiva do trabalhador, considerando o benefício da aposentadoria especial excepcional, destinado ao segurado que efetivamente exerceu suas atividades laborativas em ‘condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física’. 10. Consectariamente, a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial.

11. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete.

12. In casu, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em limites acima do limite legal, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.

13. Ainda que se pudesse aceitar que o problema causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores.

14. Desse modo, a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

15. Agravo conhecido para negar provimento ao Recurso Extraordinário. (grifei)

(STF – Tribunal Pleno – ARE nº 664335 – Relator Min. Luiz Fux– j. 04/12/2014 – in DJ de 11/02/2015)

 

Pelo mesmo julgado do Colendo restou consignada a prescindibilidade de prévia fonte de custeio para o reconhecimento do tempo especial:

 

“4. A aposentadoria especial possui nítido caráter preventivo e impõe-se para aqueles trabalhadores que laboram expostos a agentes prejudiciais à saúde e a fortiori possuem um desgaste naturalmente maior, por que não se lhes pode exigir o cumprimento do mesmo tempo de contribuição que aqueles empregados que não se encontram expostos a nenhum agente nocivo. 5. A norma inscrita no art. 195, § 5º, CRFB/88, veda a criação, majoração ou extensão de benefício sem a correspondente fonte de custeio, disposição dirigida ao legislador ordinário, sendo inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela Constituição. Deveras, o direito à aposentadoria especial foi outorgado aos seus destinatários por norma constitucional (em sua origem o art. 202, e atualmente o art. 201, § 1º, CRFB/88). Precedentes: RE 151.106 AgR/SP, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 28/09/1993, Primeira Turma, DJ de 26/11/93; RE 220.742, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03/03/98, Segunda Turma, DJ de 04/09/1998. 6. Existência de fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial antes, através dos instrumentos tradicionais de financiamento da previdência social mencionados no art. 195, da CRFB/88, e depois da Medida Provisória nº 1.729/98, posteriormente convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998. Legislação que, ao reformular o seu modelo de financiamento, inseriu os §§ 6º e 7º no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, e estabeleceu que este benefício será financiado com recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.”

 

Destarte, não há como atrelar o reconhecimento do tempo laborado em condições especiais ao efetivo e correto recolhimento das respectivas contribuições, mesmo porque tal ônus recai sobre o empregador, nos termos dos artigos, inciso II, 30, inciso I, e 43, §3º, da Lei federal nº 8.212/1991, sendo que o segurado trabalhador não pode ser penalizado pela deficiência no pagamento do tributo.

 

Verifica-se, por conseguinte, que a Colenda Suprema Corte firmou os seguintes entendimentos:

 

1) o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;

 

2) em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial; e

 

3) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.

 

Assentes tais premissas, no presente caso, remanesce controversa a especialidade do período de 03/04/1974 a 03/07/1975, 04/07/1976 a 15/02/1978 e de 03/12/1998 a 10/11/2008.

 

Em relação aos períodos de 03/04/1974 a 03/07/1975, 04/07/1976 a 15/02/1978, o autor anexou a CTPS (fls. 102 e 103 do evento 1) e PPP’s (fls. 60/61 e 64/65 do evento 1), indicando o exercício da atividade de vigia.

 

A atividade de vigilante/vigia enquadra-se, por equiparação, no código 2.5.7 do anexo ao Decreto federal nº 58.831/1964. Assim firmou entendimento a Turma Regional de Uniformização da 3ª Região:

 

“Também com relação ao labor exercido antes da vigência da Lei 9.032/1995, comprovada a efetiva periculosidade, é possível reconhecer a especialidade da função de ‘vigilante’ por categoria profissional, em equiparação à de guarda, prevista no item 2.5.7 do quadro a que se refere o art. 2º do Decreto n. 53.831/1964, sem a comprovação do uso de arma de fogo, nos moldes previstos no Tema 1.031 do STJ”

(TRU da 3ª Região – Ag no PUREg nº 0001178-68.2018.4.03.9300 – Relator Juiz Federal Herbert de Bruyn – j. em 17/05/2021)

 

De fato, o reconhecimento de tempo especial, pelo mero desempenho de atividade, pode ser aceito até a véspera do advento da Lei federal nº 9.032/1995 (28/04/1995).

 

Por fim, para o período de 03/12/1998 a 10/11/2008, o autor anexou aos autos o respectivo PPP (fls. 55/56 do evento 1), indicando exposição ao agente ruído de 91 dB, acima do limite de tolerância da época.

 

Friso que para o agente ruído faz-se necessária apresentação do respectivo laudo técnico para comprovação de seu nível de intensidade. Contudo, a apresentação de PPP, que consigne a existência de monitoramento por técnico habilitado para o período indicado, supre a necessidade da apresentação do respectivo laudo, como ocorreu no presente caso.

 

Destaco que o PPP não contém campo específico para alusão à habitualidade ou permanência da exposição, razão pela qual não cabendo razão à autarquia previdência no que tange a ausência de tal dado, posto que decorre de sua própria omissão no documento administrativo.

 

Além disso, constou no campo de observações do PPP que a exposição ao fator de risco era de maneira habitual e permanente.

 

Repriso o entendimento que o uso de EPI eficaz, ausência de fonte de custeio e extemporaneidade do laudo técnico ou monitoramento não desnaturam a consideração do tempo especial quando o agente nocivo é ruído.

 

Os parâmetros estabelecidos pela FUNDACENTRO somente tornaram-se exigíveis a partir de 19/11/2003. Ademais, o segurado comprovou que o monitoramento foi realizado por conforme o disposto NR-15 do MTE, conforme estabelecido pela norma. Nesse rumo, já firmou entendimento a Turma Regional de Uniformização da 3ª Região

 

“PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PREVIDENCIÁRIO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP). TÉCNICA DA DOSIMETRIA DO RUÍDO. PREVISÃO NA NR-15/MTE E NA NHO-01/FUNDACENTRO. POSSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA DE LAUDO TÉCNICO (LTCAT OU EQUIVALENTE) PARA SUPRIR INCONSISTÊNCIA, ELUCIDAR DÚVIDA OU SANAR OMISSÃO DO PPP. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL PARCIALMENTE PROVIDO.

a) A técnica da dosimetria para a aferição do ruído tem previsão na NR-15 do MTE e na NHO-01 da FUNDACENTRO, devendo ser observadas as metodologias previstas nessas normas a partir de 19 de novembro de 2003 (Decreto nº 4.882/2003), conforme Tema 174 da TNU;

b) Qualquer que seja a técnica mencionada no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), se houver incompatibilidade de seus dados com outros elementos de prova, fundada dúvida sobre as afirmações desse documento laboral ou, ainda, omissão de informações que nele deveriam constar, conforme prudente e fundamentada avaliação dos fatos pelo órgão julgador, exigir-se-á o laudo técnico (LTCAT ou equivalente) com base no qual foi elaborado o PPP”. (grafei)

(TRU da 3ª Região – Pedido de Uniformização Regional nº 0001089-45.2018.403.9300 – Relator Juiz Federal Leandro Gonsalves Ferreira – j. em 11/09/2019)

 

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do INSS.

 

Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do artigo 55 da Lei federal nº 9.099/1995 (aplicado subsidiariamente), cujo montante deverá ser somente corrigido monetariamente, desde a data do presente julgamento colegiado (artigo 1º, § 1º, da Lei federal nº 6.899/1981), até a data em que o valor se tornar definitivo (concordância das partes ou decisão final), de acordo com os índices da Justiça Federal (“Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal”, aprovado pela Resolução nº 134/2010, com as alterações das Resoluções nºs 267/2013 e 658/2020, todas do Conselho da Justiça Federal – CJF).  

 

Eis o meu voto.

 

São Paulo, 18 de novembro de 2021 (data de julgamento).

 

DANILO ALMASI VIEIRA SANTOS

Juiz Federal – Relator

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



EMENTA

 

JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. TURMA RECURSAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO EXERCIDO SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS. EXPOSIÇÃO A RUÍDO.  ACIMA DO NÍVEL DE TOLERÂNCIA. VIGILANTE. EQUIPARAÇÃO, NO CÓDIGO 2.5.7 DO ANEXO AO DECRETO FEDERAL Nº 58.831/1964. PRECEDENTES DA TRU DA 3ª REGIÃO. RECURSO DO INSS IMPROVIDO. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a 9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.