Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000472-91.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ROBSON CORREA DE BARROS

Advogado do(a) APELANTE: JEFFESON DOS SANTOS RODRIGUES DE AMORIM - MS12576-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: VINICIUS NOGUEIRA CAVALCANTI - MS7594-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000472-91.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ROBSON CORREA DE BARROS

Advogado do(a) APELANTE: JEFFESON DOS SANTOS RODRIGUES DE AMORIM - MS12576-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: VINICIUS NOGUEIRA CAVALCANTI - MS7594-A

 

  

 

RELATÓRIO

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposto por Robson Correa de Barros, em face de sentença que rejeitou os embargos oferecidos em sede de execução de título extrajudicial fundada em contrato de empréstimo consignado firmado junto à Caixa Econômica Federal, reconhecendo o direito ao crédito pretendido pela parte exequente.

Em suas razões, a parte apelante sustenta que a sentença padece de nulidade insanável por falta de motivação e fundamentação, tendo deixando de enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo. Alega, preliminarmente, que a execução está amparada em título inexigível, por não estar demonstrada a liberação do valor contratado. Entende ainda que a pretensão da parte exequente está prescrita em razão do transcurso de prazo superior a três anos entre o vencimento antecipado da dívida e a citação. No mérito, pugna pelo reconhecimento de relação de consumo, a fim de que seja afastadas cláusulas consideradas abusivas, sustentando, por fim, que não foi deduzido do montante total exigido, o valor correspondente às parcelas já pagas pelo devedor.

Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000472-91.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: ROBSON CORREA DE BARROS

Advogado do(a) APELANTE: JEFFESON DOS SANTOS RODRIGUES DE AMORIM - MS12576-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: VINICIUS NOGUEIRA CAVALCANTI - MS7594-A

 

VOTO

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Iniciando pela alegada carência de ação por ausência de título dotado exigibilidade, observo que somente nas restritas hipóteses chanceladas por lei, em que haja elevado grau de comprovação da existência efetiva de um crédito, é que se torna viável a invasão da esfera patrimonial do devedor pelo Estado sem a prévia sujeição da relação negocial entre os envolvidos ao processo de conhecimento.

Nesse sentido, o art. 784, do Código de Processo Civil (CPC), estabelece um rol taxativo dos documentos dotados de força executiva, admitindo ainda, em seu inciso XII, todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei assim os qualifique, o que nos remete à Lei nº. 10.931/2004, que em seu art. 28, confere às Cédulas de Crédito Bancário força de título executivo extrajudicial, representando dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no § 2º do mesmo dispositivo.

É certo que as Cédulas de Crédito Bancário admitem operações de crédito de modalidades distintas, sendo possível inclusive a derivação de várias operações de uma mesma cédula, usualmente vinculadas a um limite de crédito pré-aprovado pela instituição financeira, para utilização total ou parcial ao longo do tempo, conforme a necessidade do contratante, razão pela qual as taxas referentes aos encargos previamente pactuados são informadas no momento de cada solicitação, por meio dos canais de atendimento disponíveis.

No caso dos autos, a execução está lastreada na “Cédula de Crédito Bancário – Crédito Consignado Caixa” nº. 07.0018.110.0019018.80, emitida em 04/06/2013 por Robson Correa de Barros, representativa de um empréstimo sob consignação em folha de pagamento concedido pela Caixa Econômica Federal no valor de R$ 32.893,00, a ser restituído em 96 parcelas sucessivas, com taxa de juros de 1,67% ao mês.

A referida cédula veio acompanhada, entre outros documentos, de demonstrativo de débito e demonstrativo de evolução contratual, com especificação dos encargos, índices e percentuais utilizados na apuração do saldo devedor, de onde se extrai a existência dos atributos necessários ao manejo da via executiva, notadamente, certeza, liquidez e exigibilidade, adequando-se, portanto, aos termos dos arts. 27 e 28, da Lei nº. 10.931/2004.

Entende a parte apelante, no entanto, que o título não é exigível, já que nos documentos que instruem a inicial não há prova da efetiva liberação do crédito em seu favor. Porém, os extratos juntados sob id nº. 182808952 comprovam o creditamento da importância contratada na conta do apelante no mesmo dia da contratação, 04/06/2013. Ademais, o próprio devedor, em seus embargos, pugna pelo reconhecimento do pagamento de 7 parcelas do empréstimo, ao que se conclui que teve acesso aos recursos contratados, mesmo porque, não se concebe que alguém permaneça pagando parcelas de um financiamento por 7 meses sem que o mútuo chegasse a integrar sua esfera patrimonial. Sem razão, portanto, à parte apelante, nesse ponto.

No que concerne à alegada prescrição da pretensão da exequente, destaco, inicialmente que, considerando o contido na Súmula nº 150, do E.STF (“Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”), em se tratando de títulos executivos extrajudiciais (indicados no art. 784 do CPC/2015 e em demais aplicáveis, antes no art. 585 do CPC/1973), o termo inicial da prescrição é o dia da violação do direito do credor (em regra, o primeiro dia de inadimplência, conforme art. 189 do Código Civil).

Em razão de diversas previsões do Código Civil/2002, no caso de título representativo de quantia certa a ser paga em parcelas sucessivas e periódicas (p. ex., contratos de mútuo), pessoalmente entendo que o termo inicial do prazo prescricional é a data do vencimento antecipado da dívida ocasionado pelo descumprimento da obrigação pelo devedor (notadamente quando o contrato tiver sido celebrado com cláusula resolutiva expressa, art. 474), em razão dos primados da autonomia da vontade e da obrigatoriedade, da impossibilidade de alteração de prazos prescricionais previstos em lei (art. 192) e da prescrição como perecimento atrelado à inércia do titular da prerrogativa (art. 189). Porém, em favor da unificação do direito e da pacificação dos litígios, curvo-me ao entendimento firmado pelo E.STJ no sentido de que o vencimento antecipado das parcelas sucessivas, por inadimplemento do devedor, não altera o termo inicial da prescrição, que será aquele ordinariamente indicado no contrato (no caso mútuo, o dia previsto para pagamento da última parcela, observadas eventuais renegociações da dívida), conforme se nota nos seguintes julgados: AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1486155 2014.02.56939-9, MARIA ISABEL GALLOTTI, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:25/10/2019; AINTARESP - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - 667604 2015.00.40446-6, MARCO AURÉLIO BELLIZZE, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:22/10/2019; AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1737161 2018.00.95955-5, LUIS FELIPE SALOMÃO, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:18/02/2019; AINTARESP - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - 1260865 2018.00.53704-2, RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:04/10/2018.

Especificamente em relação à pretensão relativa a obrigações decorrentes de cédulas de crédito bancário, saliento que a Lei nº. 10.931/2004, que instituiu essa modalidade de título de crédito, embora não tenha tratado expressamente da prescrição, sujeitou a matéria à regência da legislação cambial, ao dispor, em seu art. 44, que se aplica às Cédulas de Crédito Bancário, no que não contrariar o disposto na lei que as regulamenta, a legislação cambial.

Essa referência nos remete à Lei Uniforme de Genebra, internalizada pelo Decreto n. 57.663/1966, que em seu art, 70, prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos, a contar do vencimento da dívida. Assim, restam inaplicáveis à Cédula de Crédito Bancário, os prazos reservados pelo Código Civil para as execuções de título de crédito, haja vista a expressa reserva de subsidiariedade deste último, conforme estabelece seu art. 903.

A questão se encontra pacificada, como se observa dos seguintes julgados a seguir colacionados:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. EXECUÇÃO. PRAZO TRIENAL DE PRESCRIÇÃO. NÃO APLICAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL. 1. Hipótese em que a parte recorrente alega que a Lei Uniforme de Genebra não poderia incidir no caso dos autos, uma vez que seria aplicável apenas a letras de câmbio e notas promissórias e que, in casu, a discussão gira em torno de Cédula de Crédito Bancário. 2. Consoante jurisprudência do STJ, considerando o disposto no art. 44 da Lei n. 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, de modo que, à falta de prazo específico na mencionada norma, mostra-se de rigor a incidência do art. 70 da LUG, que se apresenta, no cenário jurídico, como uma espécie de norma geral do direito cambiário. 3. É inaplicável o prazo do atual Código Civil ao caso em exame, que trata de execução de título de crédito, haja vista que o referido Diploma fez expressa reserva de subsidiariedade nos arts. 206, § 3º, inciso VIII e 903. Precedentes. 4. Agravo Interno não provido. (AgInt no AREsp 1525428/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 12/11/2019)

DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. 1. Conforme estabelece o art. 44 da Lei n. 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, de modo que se mostra de rigor a incidência do art. 70 da Lei Uniforme de Genebra, que prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento da dívida. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp 1675530/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 26/02/2019, DJe 06/03/2019)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PRESCRIÇÃO. CITAÇÃO. DEMORA. DESÍDIA DA PARTE RECONHECIDA. VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA. PRAZO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. LUG. ART. 206, § 5º, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INAPLICABILIDADE. RESERVA DE SUBSIDIARIEDADE. ARTS. 206, § 3º, INCISO VIII, e 903. 1. Afigura-se dispensável que o órgão julgador venha a examinar uma a uma as alegações e fundamentos expendidos pelas partes. Basta-lhe que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo exigível que se reporte de modo específico a determinados preceitos legais. Ofensa aos arts. 165, 535 e 458, II, do CPC inexistente. 2. "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo" (Súmula n. 211). Ausência de prequestionamento dos arts. 396, 397 e 736 do CPC. 3. Tendo as instâncias de origem reconhecido a desídia do autor em promover a citação, não pagando as custas da carta precatória depois de reiterados ofícios, forçoso reconhecer a não interrupção da prescrição, nos termos do art. 219, § 4º, do CPC. Não incidência da Súmula n. 106/STJ. Precedentes. 4. Nos termos do que dispõe o art. 44 da Lei n. 10.931/2004, aplica-se às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, de modo que se mostra de rigor a incidência do art. 70 da LUG, que prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento da dívida. 5. São inaplicáveis os prazos do atual Código Civil ao caso em exame, que trata de execução de título de crédito, haja vista que o Diploma de 2002 fez expressa reserva de subsidiariedade nos arts. 206, § 3º, inciso VIII e 903. Precedentes. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 353.702/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 22/05/2014)

Com relação ao termo final da prescrição, será o último dia do período fixado em lei para propositura da medida judicial cabível perante o juízo competente (nos prazos previstos no art. 205 e no art. 206, também do Código Civil/2002), respeitada a existência de causas suspensivas ou interruptivas. No dia do protocolo da medida judicial tempestiva, há interrupção da prescrição (art. 240, §1º, e art. 802, parágrafo único, ambos do CPC/2015, art. 202, I, do Código Civil, art. 219, §1º do CPC/1973, e Súmula 106 do E.STJ), razão pela qual o prazo prescricional é reiniciado em sua totalidade.

Durante a regular tramitação da ação (ainda que prolongada), fica suspensa a contagem do prazo prescricional, salvo se o processamento for injustificadamente paralisado pelo titular do direito subjetivo, embora a prescrição intercorrente possa se consumar mesmo que o autor/exequente não tenha sido omisso.

No caso dos autos, a Cédula de Crédito Bancário prevê a restituição do mútuo em 96 parcelas mensais e sucessivas, exigíveis a partir da liberação do empréstimo, ocorrida em junho de 2013. Portanto, a fluência do prazo prescricional, nesse caso, teria início somente em junho de 2021. Tratando-se de execução ajuizada em 13/01/2015, não há que se cogitar a prescrição da pretensão executória.

Dito isso, lembro que o contrato é um negócio jurídico bilateral, na medida em que retrata o acordo de vontades com o fim de criar, modificar ou extinguir direitos, gerando com isso obrigações aos envolvidos; vale dizer, o contrato estabelece relação jurídica entre credor e devedor, podendo aquele exigir o cumprimento da prestação por este assumida.

Há dois vetores que norteiam as relações contratuais: o primeiro é autonomia de vontade, que confere às partes liberdade para estabelecer ou não avenças, fixando seu conteúdo desde que em harmonia com as leis e a ordem pública; o segundo é obrigatoriedade contratual, dado que, uma vez firmado o acordo de vontades, as partes devem cumprir o contratado (primado “pacta sunt servanda”), garantidor da seriedade das avenças e da segurança jurídica. Qualquer alteração do contrato deverá ocorrer igualmente de forma voluntária e bilateral, salvo em casos como mudanças decorrentes de atos normativos supervenientes (cuja eficácia se viabilize sem prejuízo ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido) ou situações imprevistas e extraordinárias que alterem o equilíbrio do que foi pactuado.

Sobre a regência normativa, encontra-se sedimentado na jurisprudência o entendimento segundo o qual contratos bancários e de financiamento em geral se submetem à disciplina do Código de Defesa do Consumidor. Não bastasse a previsão contida no artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/1990, segundo a qual “Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”, a questão restou pacificada com a edição da Súmula 297 do E.STJ, nos seguintes termos: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”.

Análise detida dos termos do contrato celebrado entre as partes permite concluir pela inexistência de ofensa aos dispositivos previstos na legislação consumerista, notadamente às garantias da transparência, da boa-fé e do equilíbrio contratuais. Isso porque a redação das cláusulas pactuadas, além de respeitar as disposições legais que regem a matéria, propiciou ao devedor (quando da obtenção dos empréstimos junto à instituição financeira) o entendimento exato do alcance das obrigações assumidas, não se vislumbrando regras abusivas ou lesivas que levassem a um desequilíbrio das relações jurídicas estabelecidas entre as partes.

Sobre o tema, note-se o que restou decidido pelo E. STF:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, EXCLUÍDAS DE SUA ABRANGÊNCIA A DEFINIÇÃO DO CUSTO DAS OPERAÇÕES ATIVAS E A REMUNERAÇÃO DAS OPERAÇÕES PASSIVAS PRATICADAS NA EXPLORAÇÃO DA INTERMEDIAÇÃO DE DINHEIRO NA ECONOMIA [ART. 3º, § 2º, DO CDC]. MOEDA E TAXA DE JUROS. DEVER-PODER DO BANCO CENTRAL DO BRASIL. SUJEIÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. 1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. 4. Ao Conselho Monetário Nacional incumbe a fixação, desde a perspectiva macroeconômica, da taxa base de juros praticável no mercado financeiro. 5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxas de juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. 7. O preceito veiculado pelo art. 192 da Constituição do Brasil consubstancia norma-objetivo que estabelece os fins a serem perseguidos pelo sistema financeiro nacional, a promoção do desenvolvimento equilibrado do País e a realização dos interesses da coletividade. 8. A exigência de lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura do sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. ART. 4º, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMATIVA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ILEGALIDADE DE RESOLUÇÕES QUE EXCEDEM ESSA MATÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidade normativa --- a chamada capacidade normativa de conjuntura --- no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade. (ADI 2591, Relator(a):  Min. CARLOS VELLOSO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 07/06/2006, DJ 29-09-2006 PP-00031 EMENT VOL-02249-02 PP-00142 RTJ VOL-00199-02 PP-00481)

No mesmo sentido, trago à colação os seguintes julgados deste E. TRF da 3ª Região:

DIREITO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. I - Suficiente para o processo e julgamento da ação de cobrança que se demonstre a relação jurídica entre as partes e a existência do crédito. Precedente. II - Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor que não tem o alcance de autorizar a decretação de nulidade de cláusulas contratuais com base em meros questionamentos do devedor com alegações vagas e genéricas de abusividade. III - Recurso desprovido. (ApCiv 0006483-79.2008.4.03.6100, Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, TRF3 - 2ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/03/2020.)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. APLICAÇÃO DO CDC - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. INCIDÊNCIA DA TABELA PRICE. FÓRMULA DE CÁLCULO DAS PRESTAÇÕES. JUROS OU ENCARGOS EXCESSIVOS OU ABUSIVOS. INOCORRÊNCIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA INEXISTENTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. Aplicável o Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários, nos termos da Súmula 297 do STJ. Essa proteção, porém, não é absoluta e deve ser invocada de forma concreta, comprovando o mutuário efetivamente a existência de abusividade das cláusulas contratuais ou de excessiva onerosidade da obrigação pactuada. 2. Ainda que se entenda que o cálculo dos juros pela utilização da Tabela Price implica em capitalização, tratando-se de contratos bancários firmados posteriormente à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17, de 30/03/2000 (em vigor a partir da publicação no DOU de 31/03/2000), por diversas vezes reeditada, a última sob nº 2.170-36, de 23/08/2001, ainda em vigor por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11/09/2001, é lícita da capitalização dos juros, nos termos do artigo 5º. Precedente. 3. O sistema de amortização do saldo devedor pela utilização da Tabela Price não é vedado por lei. Além disso, é apenas uma fórmula de cálculo das prestações, em que não há capitalização de juros e, portanto, não há motivo para declarar a nulidade da cláusula questionada. Precedentes. 4. As instituições financeiras não estão sujeitas à limitação da taxa de juros, conforme entendimento de há muito firmado pelo Supremo Tribunal Federal na Súmula 596. 5. No sentido de que a mera estipulação de juros contratuais acima de 12% não configura abusividade, que somente pode ser admitida em situações excepcionais, firmou-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça. 6. Destarte, observa-se não haver qualquer irregularidade ou ilegalidade no contrato firmado entre as partes, uma vez que quando a parte embargante contratou, sabia das taxas aplicadas e das consequências do inadimplemento. Uma vez inadimplente, não pode agora ser beneficiada com taxas diferentes das contratadas, devendo ser respeitado o princípio do pacta sunt servanda. 7. As Súmulas n. 30, 294 e 296 do Superior Tribunal de Justiça já reconheciam a legitimidade da aplicação da comissão de permanência, uma vez caracterizada a inadimplência do devedor, contanto que não haja cumulação com índice de atualização monetária ou taxa de juros. 8. A comissão de permanência, prevista na Resolução nº 1.129/1986 do BACEN, já traz embutida em seu cálculo a correção monetária, os juros remuneratórios e os encargos oriundos da mora. Desse modo, nenhum encargo decorrente da mora (como, v.g. juros moratórios) pode ser cumulado com a comissão de permanência, por configurar verdadeiro bis in idem. Precedente. 9. In casu, o exame dos discriminativos de débito revela a inexistência de cobrança de comissão de permanência, como se vê também no laudo elaborado pela Contadoria Judicial. Daí, inexiste cobrança cumulativa de comissão de permanência com outros encargos. 10. Apelação improvida.”. (ApCiv 5000054-63.2018.4.03.6131, Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, TRF3 - 1ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 07/04/2020.)

Ademais, nos termos do art. 51, IV, do CDC, ou do art. 423 e art. 424, ambos do Código Civil, as cláusulas abusivas estabelecem obrigações consideradas iníquas ou excessivas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, vale dizer, notoriamente desfavoráveis à parte mais fraca na relação contratual de consumo. Assim, valendo-se da vulnerabilidade do contratante consumidor, tais cláusulas gerariam desequilíbrio contratual, com vantagem exclusiva ao agente econômico mais forte (fornecedor).

Não basta que um contrato seja de adesão para que suas cláusulas sejam consideradas abusivas, sendo necessário que tragam em si a desvantagem ao consumidor, como um desequilíbrio contratual injustificado. Esse o entendimento adotado por este E.TRF da 3ª Região, conforme se observa no julgado transcrito a seguir:

PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. EXEQUIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA CONTÁBIL. PRELIMINAR AFASTADA. CDC. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. BENEFÍCIO INDEFERIDO. RECURSO DESPROVIDO. I - No caso dos autos, há de se constatar que os valores, índices e taxas que incidiram sobre o valor do débito estão bem especificados, e que a questão relativa ao abuso na cobrança dos encargos contratuais é matéria exclusivamente de direito, bastando, porquanto, a mera interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes para se apurar eventuais ilegalidades. Logo, totalmente desnecessária a realização de prova pericial. II - Não obstante tratar-se de contratos de adesão, inexiste qualquer dificuldade na interpretação das cláusulas contratuais, de modo que descabe alegar desconhecimento do conteúdo dos contratos à época em que foram celebrados. III - Afiguram-se presentes os pressupostos de certeza, exigibilidade e liquidez, não havendo se falar em vício que macula o título executivo utilizado para a propositura da ação IV - Não logrou êxito a parte pessoa jurídica em comprovar hipossuficiência relativa as custas deste processo V - Recurso desprovido. (ApCiv 5008236-53.2017.4.03.6105, Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, TRF3 - 2ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/04/2020.)

Pelas características relatadas no contrato combatido, bem como à luz da legislação de regência, não há que se falar em cláusulas contratuais celebradas com conteúdo doloso ou excessiva onerosidade, mesmo porque o contratante tinha capacidade suficiente de entender o contrato que celebrava com a instituição financeira.

Sobre a possibilidade de inversão do ônus da prova, dispõe o art. 373, §1º, do CPC, que nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo na forma dos incisos I e II, do mesmo artigo, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

No mesmo sentido, dispõe o art. 6º, VIII, da Lei nº. 8.078/1990 que é direito básico do consumidor a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.

Assim, para a alteração das regras de distribuição ordinária do ônus probatório fixadas nos incisos I e II, do art. 373, do CPC, exige-se, na dicção do estatuto processual, que a produção da prova se mostre impossível ou excessivamente dificultosa por quem deva fazê-lo, enquanto a legislação consumerista estabelece a verossimilhança da alegação ou a hipossuficiência do consumidor.

No caso dos autos, não vejo presentes os requisitos autorizadores da inversão pretendida, qualquer que seja o estatuto invocado.

A verificação de eventual abuso em relação aos encargos mencionados se dará a partir do cotejo das regras presentes no contrato firmado entre as partes e a legislação de regência. Assim, a ausência de indicação objetiva acerca da prova considerada indispensável à sua defesa, bem como da dificuldade em obtê-la, não autoriza a inversão do ônus probatório pretendida. Sem razão a parte apelante, portanto, nesse ponto.

De acordo com a natureza do contrato firmado entre as partes (crédito consignado), as parcelas seriam descontadas pela convenente, Prefeitura Municipal de Ladário, diretamente na folha de pagamento, e repassadas à instituição financeira credora. Consta, no entanto, que a partir de março de 2014, houve a interrupção dos pagamentos.

Embora nessa modalidade de empréstimo o valor da parcela seja deduzido da remuneração percebida pelo contratante, e repassado à credora pela convenente, dispõe a cláusula terceira, parágrafo quarto, do contrato que regula a operação de crédito, que no caso de não haver o desconto, em folha de pagamento, o devedor se compromete a pagar os valores necessários ao completo adimplemento da parcela, na data de seu vencimento. Surge daí o dever da parte contratante de acompanhar periodicamente a movimentação da conta vinculada à operação e de seus contracheques, a fim de proceder ao pagamento das parcelas eventualmente não descontadas de seus vencimentos. Sublinho que esse dispositivo contratual, longe de caracterizar uma prática abusiva, como que fazer crer a parte apelante, está alinhado à boa-fé contratual, preconizada no art. 422, do Código Civil, e que impõe às partes contratantes o dever de agirem com lealdade no cumprimento das obrigações assumidas.

No caso concreto, o fato é que a parte executada não comprovou ter havido o pagamento das parcelas consideradas inadimplidas, assim como não demonstrou ter ocorrido o desconto das parcelas de seus vencimentos, sem o repasse à instituição financeira, hipótese que deslocaria a responsabilidade para a fonte pagadora. Vale destacar que, nos termos do art. 373, II, do CPC, é da executada o ônus da prova, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Quanto à ausência de notificação para que o executado providenciasse o pagamento da parcela não debitada em folha, saliento que no caso de obrigação deriva de responsabilidade contratual, notadamente quando envolve direitos disponíveis, as partes poderão convencionar sobre o momento em que haverá a constituição em mora do devedor. Ausente previsão expressa nesse sentido, a mera menção ao prazo para cumprimento da obrigação dispensa outras providências para que o credor constitua em mora o devedor. Nesse sentido o art. 397, do Código Civil:

Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.

Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.

Sobre o tema, note-se o que restou decidido nos julgados colacionados a seguir:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - JUROS MORATÓRIOS - AÇÃO MONITÓRIA - NOTA PROMISSÓRIA - RESPONSABILIDADE CONTRATUAL - VENCIMENTO DA DÍVIDA. 1.- Embora juros contratuais em regra corram a partir da data da citação, no caso, contudo, de obrigação contratada como positiva e líquida, com vencimento certo, os juros moratórios correm a partir da data do vencimento da dívida. 2.- Emissão de nota promissória em garantia do débito contratado não altera a disposição contratual de fluência dos juros a partir da data certa do vencimento da dívida. 3.- O fato de a dívida líquida e com vencimento certo haver sido cobrada por meio de ação monitória não interfere na data de início da fluência dos juros de mora, a qual recai no dia do vencimento, conforme estabelecido pela relação de direito material. 4.- Embargos de Divergência providos para início dos juros moratórios na data do vencimento da dívida. (EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1.250.382-RS, Relator Ministro SIDNEI BENETI, STJ – CORTE ESPECIAL, Data de Julgamento: 02/04/2014)

DIREITO CIVIL. EMBARGOS À MONITÓRIA. CONTRATO BANCÁRIO. CONSTRUCARD. CERCEAMENTO DE DEFESA. PERÍCIA CONTÁBIL. DESNECESSIDADE. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS. LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS. TABELA PRICE. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. MULTA MORATÓRIA. TERMO INICIAL DA INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS. INCLUSÃO DO NOME DO RÉU NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. 1. Não incidem as disposições do Código de Defesa do Consumidor à relação discutida nos autos, principalmente no que diz respeito à inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII do CDC. 2. Analisando-se o contrato de prestação de serviços firmado entre as partes, não é possível afirmar que a Apelante tenha utilizado o serviço prestado como destinatária final, mas sim para concretização de sai atividade negocial. Precedentes dos Tribunais Regionais Federais e Do C. STJ. 3. Ainda que se considerasse a hipossuficiência da Apelante, tal critério não seria suficiente para autorizar o magistrado a inverter o ônus probatório, uma vez que deve estar presente juntamente com a verossimilhança das alegações. 4. Relativamente aos contratos, uma vez convencionados os direitos e obrigações, ficam as partes ligadas pelo vínculo da vontade que as uniu. Este é o princípio da Força Obrigatória dos Contratos. Portanto, inexistindo nulidades, ilegalidades ou vicio de vontade, as cláusulas impugnadas remanescem válidas. 5. A impossibilidade de limitação da taxa de juros remuneratórios livremente pactuados pelas partes já está pacificada no STJ, mas existe uma exceção bem definida pela jurisprudência: a possibilidade de limitação dos juros nos casos em que cabalmente demonstrada a abusividade dos índices cobrados. 6. A propósito do tema atinente ao anatocismo, no julgamento do REsp 1.061.530/RS (STJ- Rel. Ministra Nancy Andrighi - Segunda Seção - public. 10.03.2009), selecionado como Recurso Repetitivo representativo de controvérsia (tema 24), restou definido que "As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33)". 7. Seguindo esta mesma linha de entendimento o STJ, no julgamento do também recurso repetitivo (tema 246) acabou por definir que "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos (bancários em geral) celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." (REsp 973.827/RS- Rel. Min. Luis Felipe Salomão - Segunda Seção - public. 24.09.2012). Portanto, somente é nula a cláusula que permite a capitalização mensal dos juros nos contratos firmados antes de 31/03/2000. 8. Especificamente quanto ao CONSTRUCARD, por disposição expressa do inciso I do artigo 9º do Decreto-Lei no 2.407/88 (atual Decreto 6.306/2007), tais operações de crédito são isentas do IOF em razão da finalidade habitacional que lhe é inerente. 9. De qualquer forma, o próprio contrato firmado entre as partes prevê tal isenção, razão pela qual não pode agora ser incluído na cobrança. 10. O entendimento deste Tribunal é no sentido de que a atualização de dívida objeto de ação monitória deve se dar nos termos do contrato celebrado entre as partes, desde o inadimplemento e até a data do efetivo pagamento. Destarte, a atualização da dívida deverá se dar nos moldes do contrato celebrado entre as partes. 11. Os juros moratórios são devidos e devem incidir desde o início da inadimplência, à taxa indicada no contrato firmado entre as partes, à luz do art. 406 do Código Civil. 12. O Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a simples discussão do débito não é suficiente para impedir a inclusão do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito. 13.  Apelação a que se nega provimento. (ApCiv 0003626-61.2012.4.03.6119, Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, TRF3 - 1ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/12/2019.)

APELAÇÃO - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO MONITÓRIA - CARTÃO DE CRÉDITO - JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA - TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA - PREVISÃO CONTRATUAL - IMPROVIMENTO. 1. Na origem, cuida a hipótese de apelação cível interposta de sentença que em ação monitória ajuizada pela CEF, visando à cobrança de dívida decorrente de cartão de crédito empresa, julgou parcialmente procedentes os embargos monitórios opostos, para determinar tão-somente a que os juros moratórios são devidos à taxa de 1% (um por cento) ao mês sobre o valor atualizado do débito. 2. Ao recorrer, postula a empresa ré/embargante a observância do artigo 1º, § 2º da Lei nº 6.899/81, bem como do artigo 219, §1º, do CPC, de modo que o termo a quo de incidência da correção monetária seja a data do ajuizamento da ação, e o termo a quo dos juros moratórios, a data da citação. 3. Depreende-se da leitura do contrato firmado entre as partes, constar da "cláusula décima oitava - mora/inadimplemento", a previsão de que os juros moratórios e a correção monetária incidiriam a partir da data de vencimento indicada na fatura mensal, o que deve prevalecer. Observância do princípio da pacta sunt servanda. 4. Apelação conhecida e não provida. (AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho 0103284-73.2014.4.02.5001, GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, TRF2 - VICE-PRESIDÊNCIA)

Assim, não havia necessidade de notificação do devedor para pagamento de parcelas que, eventualmente, não fossem debitadas em folha.

Insurge-se a parte autora, ainda, contra o disposto no parágrafo segundo, da cláusula sétima, do contrato, que prevê, na hipótese de vencimento antecipado da dívida por infringência às cláusulas contratuais, ou por rescisão do contrato de trabalho, que as condições do empréstimo poderão ser mantidas, desde que oferecida garantia fidejussória ou real. Entende a recorrente que tal disposição afrontaria o art. 10, da Lei nº. 1.046/1950, segundo o qual, nos empréstimos em dinheiro não será admitida outra garantia além da consignação em folha.

É preciso ter em conta que a grande vantagem do financiamento na modalidade “crédito consignado” é a oferta de juros bem mais atraentes do que aqueles usualmente encontrados em modalidades de crédito distintas, disponíveis no mercado. Essas condições favoráveis são possíveis justamente em razão do baixo risco de inadimplemento que essas operações envolvem, já que o valor das parcelas é deduzido dos vencimentos do contratante antes mesmo de entrar em sua esfera patrimonial, sendo repassado, de imediato, à parte credora. Com isso, dispensam-se outras formas de garantia normalmente exigidas em operações de mútuo.

Portanto, o encerramento do vínculo de devedor com sua fonte pagadora, desnatura a operação de crédito originalmente pactuada, fazendo ressurgir um risco inicialmente inexistente. Com isso, é natural que para a manutenção das condições anteriormente estabelecidas, seja permitido ao credor a exigência de garantias que façam frente à elevação do risco do negócio. O que o art. 10, da Lei nº. 1.046/1950 veda é a exigência simultânea de outras garantias na vigência do crédito consignado, o que, obviamente, não é a hipótese prevista na cláusula questionada. Ademais, sequer há interesse na discussão a esse respeito, já que não há registro de que a parte executada tenha sido impedida de retomar o financiamento, a pretexto da ausência de novas garantias.

Por fim, não procede a alegação de que o valor executado não considerou o pagamento de sete parcelas pelo executado. Nesse ponto, o demonstrativo id nº. 182808944, pág. 22, é cristalino ao indicar que a dívida exigida resulta da incidência dos encargos devidos sobre o saldo devedor existente na data do início do inadimplemento, ou seja, 10/03/2014, evidenciando a amortização da dívida no período de cumprimento regular do contrato.

O que se tem, portanto, é uma relação jurídica contratual estabelecida entre credor e devedor, pautada na autonomia da vontade e na obrigatoriedade contratual, autorizando o primeiro a exigir o cumprimento da prestação assumida pelo segundo.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

Considerando o insucesso do recurso interposto, com a manutenção da decisão recorrida, aplica-se a regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, § 11, do CPC, pelo que majoro em 20% os honorários advocatícios fixados na sentença, observando-se o disposto no art. 98, § 3º, do CPC, ante à concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.

É como voto.



EMENTA

 

APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. HIGIDEZ DO TÍTULO EXECUTIVO. PRESCRIÇÃO NÃO CARACTERIZADA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. RESPONSABILIDADE DO DEVEDOR POR EVENTUAL CESSAÇÃO DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. PREVISÃO CONTRATUAL. NOTIFICAÇÃO DESNECESSÁRIA.

- Dispõe o art. 44 da Lei n. 10.931/2004, que se aplicam às Cédulas de Crédito Bancário, no que couber, a legislação cambial, incidindo, portanto, em matéria de prescrição, a regra do art.  70 da Lei Uniforme de Genebra, internalizada pelo Decreto n. 57.663/1966, que prevê o prazo prescricional de 3 (três) anos a contar do vencimento da dívida.

- Tratando-se de título representativo de quantia certa a ser paga em parcelas sucessivas e periódicas (ex. contratos de mútuo), curvo-me ao entendimento firmado pelo E.STJ no sentido de que o vencimento antecipado das parcelas sucessivas, por inadimplemento do devedor, não altera o termo inicial da prescrição, que será aquele ordinariamente indicado no contrato (no caso mútuo, o dia previsto para pagamento da última parcela, observadas eventuais renegociações da dívida).

- Contratos bancários e de financiamento em geral se submetem à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula 297 do E.STJ e posicionamento do E.STF na ADI 2591/DF. Não basta que um contrato seja de adesão para que suas cláusulas sejam consideradas abusivas, sendo necessário que tragam em si desvantagem ao consumidor, como um desequilíbrio contratual injustificado.

- Nos contratos de empréstimo consignado, o valor da parcela é deduzido do valor do salário ou benefício do devedor, e repassado ao credor pelo convenente, incumbindo ao devedor acompanhar a movimentação dos recursos, em especial para que haja o pagamento das parcelas em caso de eventual cessação imotivada dos descontos.

- No caso de obrigação deriva de responsabilidade contratual, notadamente quando envolver direitos disponíveis, as partes poderão convencionar sobre o momento em que haverá a constituição em mora do devedor. Ausente previsão expressa nesse sentido, a mera menção ao prazo para cumprimento da obrigação dispensa outras providências para que o credor constitua em mora o devedor. Inteligência do art. 397, do Código Civil.

- A execução embargada está amparada em Cédula de Crédito Bancário representativa de operação do crédito consignado. Não há que se falar em prescrição da pretensão executória, por se tratar de ação ajuizada em janeiro/2015, ao passo que o vencimento da última parcela estava previsto somente para junho/2021, data em que teria início a fluência do prazo trienal previsto para a espécie. Na modalidade de crédito sob análise, recai sobre o mutuário o dever de acompanhar eventual interrupção nos descontos das parcelas em seu contracheque, a fim de proceder ao pagamento na data do vencimento, independentemente de notificação prévia.

-Recurso desprovido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.