Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
Órgão Especial

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003090-67.2018.4.03.6114

RELATOR: Gab. Vice Presidência

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENIVALDO VITORIO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: FERNANDO GONCALVES DIAS - SP286841-S

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 

 

 PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 3ª Região

Órgão Especial

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003090-67.2018.4.03.6114

RELATOR: Gab. Vice Presidência

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENIVALDO VITORIO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: FERNANDO GONCALVES DIAS - SP286841-S

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

I - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Especial

 

Trata-se de agravo interno interposto com fundamento no art. 1030, I, “b”, do CPC, em face de decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso especial.

A decisão agravada tem os seguintes termos:

 

“Trata-se de recurso especial interposto pelo INSS em face de acórdão proferido por órgão fracionário deste Tribunal Regional Federal.

Decido.

 A presente impugnação não pode ser admitida.

O C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp nº 1.831.371/SP, julgado sob o rito dos recursos repetitivos, publicado em 02/03/2021, assentou que "é admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado."

 Confira-se a ementa do julgado, in verbis:

I. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMÁTICA DE RECURSOS REPETITIVOS. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA DE FOGO. II. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA VIA DA JURISDIÇ]ÃO, COM APOIO PROCESSUAL EM QUALQUER MEIO PROBATÓRIO MORALMENTE LEGÍTIMO, APÓS O ADVENTO DA LEI 9.032/1995, QUE ABOLIU A PRÉ-CLASSIFICAÇÃO PROFISSIONAL PARA O EFEITO DE RECONHECIMENTO DA SITUAÇÃO DE NOCIVIDADE OU RISCO À SAÚDE DO TRABALHADOR, EM FACE DA ATIVIDADE LABORAL. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. III. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO, DADA A INESGOTABILDIADE REAL DA RELAÇÃO DESSES FATORES. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS NA REGRA POSITIVA ENUNCIATIVA. REQUISITOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DA NOCIVIDADE. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE A FATORES DE RISCO (ART. 57, § 3o., DA LEI 8.213/1991). IV. RECURSO ESPECIAL DO INSS PARCIALMENTE CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO À PARTE CONHECIDA.

1. É certo que no período de vigência dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979 a especialidade da atividade se dava por presunção legal, de modo que bastava a informação acerca da profissão do Segurado para lhe assegurar a contagem de tempo diferenciada. Contudo, mesmo em tal período se admitia o reconhecimento de atividade especial em razão de outras profissões não previstas nestes decretos, exigindo-se, nessas hipóteses provas cabais de que a atividade nociva era exercida com a exposição aos agentes nocivos ali descritos.

2. Neste cenário, até a edição da Lei 9.032/1995, nos termos dos Decretos 53.080/1979 e 83.080/1979, admite-se que a atividade de Vigilante, com ou sem arma de fogo, seja considerada especial, por equiparação à de Guarda.

3. A partir da vigência da Lei 9.032/1995, o legislador suprimiu a possibilidade de reconhecimento de condição especial de trabalho por presunção de periculosidade decorrente do enquadramento na categoria profissional de Vigilante. Contudo, deve-se entender que a vedação do reconhecimento por enquadramento legal não impede a comprovação da especialidade por outros meios de prova. Aliás, se fosse proclamada tal vedação, se estaria impedindo os julgadores de proferir julgamentos e, na verdade, implantando na jurisdição a rotina burocrática de apenas reproduzir com fidelidade o que a regra positiva contivesse. Isso liquidaria a jurisdição previdenciária e impediria, definitivamente, as avaliações judiciais sobre a justiça do caso concreto.

4. Desse modo, admite-se o reconhecimento da atividade especial de Vigilante após a edição da Lei 9.032/1995, desde que apresentadas provas da permanente exposição do Trabalhador à atividade nociva, independentemente do uso de arma de fogo ou não.

5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial sofre nova alteração, pois o novo texto não mais enumera ocupações, passando a listar apenas os agentes considerados nocivos ao Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente, aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz o texto qualquer referência a atividades perigosas, o que à primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da vida, por se fundar na crença - nunca confirmada - de que as regras escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos enunciados normativos.

6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso, o direito à aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1º e 202, II da Constituição Federal. A interpretação da Lei Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes constitucionais, sob pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de específico, próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos e a garantia jurídica dos bens da vida digna, como inalienáveis Direitos Fundamentais.

7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes perigosos não significa que eles - os agentes perigosos - tenham sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou que a sua eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada. Também não se pode intuir que não seja mais possível o reconhecimento judicial da especialidade da atividade, já que todo o ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente superior, traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do Trabalhador.

8. Corroborando tal assertiva, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do 1.306.113/SC, fixou a orientação de que a despeito da supressão do agente nocivo eletricidade, pelo Decreto 2.172/1997, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade submetida a tal agente perigoso, desde que comprovada a exposição do Trabalhador de forma permanente, não ocasional, nem intermitente. Esse julgamento deu amplitude e efetividade à função de julgar e a entendeu como apta a dispensar proteções e garantias, máxime nos casos em que a legislação alheou-se às poderosas e invencíveis realidades da vida.

9. Seguindo essa mesma orientação, é possível reconhecer a possibilidade de caracterização da atividade de Vigilante como especial, com ou sem o uso de arma de fogo, mesmo após 5.3.1997, desde que comprovada a exposição do Trabalhador à atividade nociva, de forma permanente, não ocasional, nem intermitente, com a devida e oportuna comprovação do risco à integridade física do Trabalhador.

10. Firma-se a seguinte tese: é admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado.

11. Análise do caso concreto: No caso dos autos, o Tribunal reconhece haver comprovação da especialidade da atividade, a partir do conjunto probatório formado nos autos, especialmente o perfil profissiográfico do Segurado. Nesse cenário, não é possível acolher a pretensão do recursal do INSS que defende a necessidade de comprovação do uso de arma de fogo para caracterização do tempo especial.

12. Recurso Especial do INSS parcialmente conhecido, para, na parte conhecida, se negar provimento.

(REsp 1831371/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2020, DJe 02/03/2021)

 Neste caso concreto, verifica-se que o entendimento emanado do acórdão recorrido não diverge da orientação jurisprudencial da superior instância.

Em face do exposto, nego seguimento ao recurso especial.”

 

Nas razões do presente agravo, a parte alega, em síntese, que o feito deve ficar suspenso até o trânsito em julgado do Tema 1031 do STJ com o posicionamento definitivo do Supremo Tribunal Federal sobre a questão, objetivando uma maior uniformidade, integridade e coerência no julgamento.

A parte recorrida foi intimada, nos termos do art. 1.021, § 2º, do CPC, para o oferecimento de resposta.

É o relatório.  

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

II - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Extraordinário

 

Trata-se de agravo interno interposto com fundamento no art. 1030, I, “b”, do CPC, em face de decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso extraordinário.

A decisão agravada tem os seguintes termos:

 

“Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, contra acórdão proferido por órgão fracionário deste Tribunal Regional Federal.

Decido.

O recorrente impugna o reconhecimento do tempo laboral como especial.

O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do ARE nº 906.569/PE, resolvido conforme a sistemática do artigo 543-B do CPC de 1973, assentou a inexistência de repercussão geral da matéria relativa à cômputo de tempo de serviço em condições especiais para efeito de concessão de aposentadoria, por demandar inevitável análise de normas infraconstitucionais.

A ementa do citado precedente é a que segue:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO. CARACTERIZAÇÃO DA ESPECIALIDADE DO LABOR. ARTIGOS 57 E 58 DA LEI 8.213/91.

1. A avaliação judicial de critérios para a caracterização da especialidade do labor, para fins de reconhecimento de aposentadoria especial ou de conversão de tempo de serviço, conforme previsão dos artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, é controvérsia que não apresenta repercussão geral, o que inviabiliza o processamento do recurso extraordinário, nos termos do art. 543-A, §5º, do Código de Processo Civil.

2. O juízo acerca da especialidade do labor depende necessariamente da análise fático-probatória, em concreto, de diversos fatores, tais como o reconhecimento de atividades e agentes nocivos à saúde ou à integridade física do segurado; a comprovação de efetiva exposição aos referidos agentes e atividades; apreciação jurisdicional de laudos periciais e demais elementos probatórios; e a permanência, não ocasional nem intermitente, do exercício de trabalho em condições especiais. Logo, eventual divergência ao entendimento adotado pelo Tribunal de origem, em relação à caracterização da especialidade do trabalho, demandaria o reexame de fatos e provas e o da legislação infraconstitucional aplicável à espécie.

INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

(STF, Pleno, ARE 906.569/PE, MIN. EDSON FACHIN, j. 18.09.2015, DJe 25.09.2015)

 Esse entendimento, ademais, coloca-se em sintonia com precedente anterior da própria Suprema Corte, no qual já se havia assentado a inexistência de repercussão geral da matéria relativa ao cômputo de tempo de serviço especial para obtenção de aposentadoria. Trata-se do AI nº 841.047/RS, cuja ementa trago à colação:

RECURSO. Agravo de instrumento convertido em Extraordinário. Inadmissibilidade deste. Aposentadoria. Tempo de serviço. Condições Especiais. Cômputo. Tema infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral recurso extraordinário que, tendo por objeto o cômputo, para efeito de aposentadoria, do tempo de serviço exercido em condições especiais, versa sobre tema infraconstitucional.

(STF, Pleno, AI nº 841.047/RS, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 26.05.2011, DJe 31.08.2011)

 Em face do exposto, nos termos do art. 1030, I, “a”, do CPC, nego seguimento ao recurso extraordinário”

 

Nas razões do presente agravo, a parte reproduz, em síntese, os argumentos que já houvera formulado quando da interposição do recurso excepcional ao qual fora negado seguimento nos termos da decisão acima transcrita.

A parte recorrida foi intimada, nos termos do art. 1.021, § 2º, do CPC, para o oferecimento de resposta.

É o relatório.  

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da 3ª Região

Órgão Especial

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003090-67.2018.4.03.6114

RELATOR: Gab. Vice Presidência

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: GENIVALDO VITORIO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: FERNANDO GONCALVES DIAS - SP286841-S

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

VOTO 

 

I - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Especial

 

 A atuação dos tribunais de segundo grau de jurisdição, no tocante ao exame de admissibilidade dos recursos especiais e extraordinários, ganhou novos contornos, ainda ao tempo do CPC/73, com a introdução da sistemática dos recursos representativos de controvérsia ou, na terminologia do CPC/15, da sistemática dos recursos repetitivos ou de repercussão geral, decorrente da transformação das decisões das Cortes Superiores de precedentes meramente persuasivos para julgados de observância obrigatória pelas instâncias ordinárias do Poder Judiciário.

Assim, a partir da edição dos arts. 543-A a 543-C do CPC/73, foi atribuída, aos tribunais locais, a competência de julgar, pelo mérito, os recursos dirigidos às instâncias superiores, desde que a questão de direito constitucional ou legal neles veiculada tenha sido, anteriormente, objeto de acórdão de Corte Superior erigido à condição de precedente qualificado pelo procedimento estabelecido para sua formação.

Esse sistema, aperfeiçoado pelo CPC/15, permite à instância a quo negar seguimento, desde logo, a recurso especial ou extraordinário em contrariedade à tese jurídica já estabelecida pelas Cortes Superiores, bem como a autoriza a proceder ao encaminhamento do caso para retratação pelo órgão julgador, sempre que verificado que o acórdão recorrido não aplicou, ou aplicou equivocadamente, tese jurídica firmada nos leading cases.

Além da valorização dos precedentes, a atual sistemática acarreta sensível diminuição dos casos individuais que chegam aos Tribunais Superiores, ocasionando maior racionalidade em seu funcionamento e aperfeiçoamento de seu papel de Cortes de “teses” ou de interpretação do direito constitucional ou legal.

Cabe destacar que a manutenção do tradicional sistema de recorribilidade externa, qual seja, da possibilidade de revisão das decisões da instância a quo mediante interposição do agravo de inadmissão para julgamento pela instância ad quem, tinha enorme potencial para esvaziar a eficácia da novel sistemática de valorização dos precedentes qualificados, pois mantinha as Cortes Superiores facilmente acessíveis a todos os litigantes em todo e qualquer caso.

As leis de reforma do sistema processual que trouxeram à luz os arts. 543-A a 543-C do CPC/73 silenciaram quanto ao ponto em destaque, o que instigou os Tribunais Superiores a avançarem em direção a uma solução jurisprudencial para o impasse: no AI 760.358/RS-QO (j. 19.11.2009), o Pleno do Supremo Tribunal Federal decidiu por não mais conhecer dos agravos interpostos de decisões proferidas com fundamento no art. 543-B do CPC/73, estabelecendo que a impugnação de tais decisões ocorreria, dali em diante, por meio de agravos regimentais, a serem decididos pelos próprios tribunais de apelação.

Como não poderia deixar de ser, a iniciativa da Suprema Corte foi secundada pelo Superior Tribunal de Justiça, que, por sua Corte Especial, em 12.05.2011, chegou a solução similar ao julgar a QO-AI 1.154.599/SP. Dessa forma, restou adequadamente solucionada pela jurisprudência a questão, ao se estabelecer, como regra, a recorribilidade “interna” na instância a quo em caso de negativa de seguimento do recurso excepcional pelo tribunal, por considerá-lo em confronto à tese jurídica assentada pelo STF ou pelo STJ em precedente qualificado.

Essa solução foi totalmente encampada pelo CPC/15, prevendo-se expressamente, desde então, o cabimento de agravo interno das decisões que negam seguimento a recurso excepcional, sempre que o acórdão recorrido tenha aplicado precedente qualificado e o recurso interposto tenha, em seu mérito, a pretensão única de rediscutir a aplicação da tese jurídica firmada no precedente.

Trata-se de recurso de fundamentação vinculada, pois não é dado à parte rediscutir o acerto ou a justiça do acórdão recorrido, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto.

É lícito ao agravante, portanto, alinhavar razões que evidenciem que o precedente invocado não se aplica ao caso concreto, por nele existir circunstância fática ou jurídica que o diferencia (distinguishing), bem como que demonstrem que a tese assentada no precedente, ainda que aplicável ao caso concreto, encontra-se superada por circunstâncias fáticas ou jurídicas (overruling).

A simples reprodução mecânica, no agravo interno, das razões do recurso excepcional a que negado seguimento, ou ainda, o subterfúgio da inovação recursal, extrapolam o exercício regular do direito de recorrer, fazendo do agravo uma medida manifestamente inadmissível e improcedente, a autorizar a aplicação aos agravos internos interpostos com fundamento no art. 1030, I, do CPC, da penalidade prevista no art. 1021, § 4º, do CPC, por interpretação extensiva.

Assentadas essas premissas, passa-se ao julgamento do agravo interno.

No que diz respeito à arguida necessidade de se aguardar uma posição definitiva sobre a tese objeto de debate pela sistemática da repercussão geral, o Superior Tribunal de Justiça, com fundamento no art. 1.040, caput, do CPC/2015, consolidou sua jurisprudência no sentido de que a existência de decisão de mérito julgada sob a sistemática dos recursos repetitivos autoriza o julgamento imediato de causas que versarem sobre o mesmo tema, independente do trânsito em julgado do paradigma. Nesse sentido, confira-se:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO EFETIVADO NOS TERMOS DO ART. 1.040, II, DO CPC/2015. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. NECESSIDADE DE AGUARDAR O JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS EM FACE DO ARESTO PROLATADO NO RE 579.431/RS, EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL. DESCABIMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

1. Na matéria, o STF consigna que "a existência de decisão de mérito julgada sob a sistemática da repercussão geral autoriza o julgamento imediato de causas que versarem sobre o mesmo tema, independente do trânsito em julgado do paradigma" (ARE 977.190 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 23/11/2016).

2. Assim, tanto os julgados do STJ quanto os do STF já firmaram entendimento no sentido de ser desnecessário aguardar o trânsito em julgado para a aplicação do paradigma firmado em recurso repetitivo ou em repercussão geral. Precedentes: STF, AgRg no ARE 673.256/RS, Rel. Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 22/10/2013; STJ, AgInt no AREsp 838.061/GO, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Federal Convocada do TRF/3ª Região), Segunda Turma, DJe 8/6/2016;AgRg nos EDcl no AREsp 706.557/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13/10/2015.

3. O referido posicionamento vem ao encontro do que dispõe o art. 1.040, II, do CPC/2015, quando consigna que "o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior".

4. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl nos EREsp 1.150.549/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julg. 07/03/2018, DJe 23/03/2018) - destacamos

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. APLICAÇÃO DA TESE FIRMADA EM REPERCUSSÃO GERAL. TRÂNSITO EM JULGADO. DESNECESSIDADE.

1. Inexiste qualquer omissão no julgado, porquanto nele não houve debate acerca da necessidade de aguardar o julgamento de embargos de declaração opostos contra decisão proferida em recurso extraordinário com repercussão geral.

2. A jurisprudência deste Superior Tribunal é no sentido de ser desnecessário aguardar o trânsito em julgado para aplicar a tese firmada em julgamento de recurso especial repetitivo ou de recurso extraordinário sob repercussão geral. Precedentes.

3. Tal entendimento se coaduna com o disposto no art. 1.040 do Código de Processo Civil de 2015.

4. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl no AgRg no REsp 1.460.732/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julg. 20/02/2018, DJe 26/02/2018) - destacamos

 

Além desse aspecto, a parte agravante não trouxe fundamentação idônea, calcada em razões de segurança jurídica, que eventualmente pudesse justificar um tratamento diferenciado no caso vertente. Não há, com efeito, nenhum indicativo concreto de que os embargos declaratórios que pendem de julgamento pelo STJ serão providos com efeitos modificativos; tampouco há sinal evidente de que o STF virá a conhecer e prover eventual recurso extraordinário que tenha sido interposto para impugnar o acórdão proferido no recurso repetitivo do STJ que ensejou a decisão ora agravada, de negativa de seguimento ao recurso especial.

Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

 

 

VOTO 

 

II - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Extraordinário

 

A atuação dos tribunais de segundo grau de jurisdição, no tocante ao exame de admissibilidade dos recursos especiais e extraordinários, ganhou novos contornos, ainda ao tempo do CPC/73, com a introdução da sistemática dos recursos representativos de controvérsia ou, na terminologia do CPC/15, da sistemática dos recursos repetitivos ou de repercussão geral, decorrente da transformação das decisões das Cortes Superiores de precedentes meramente persuasivos para julgados de observância obrigatória pelas instâncias ordinárias do Poder Judiciário.

Assim, a partir da edição dos arts. 543-A a 543-C do CPC/73, foi atribuída, aos tribunais locais, a competência de julgar, pelo mérito, os recursos dirigidos às instâncias superiores, desde que a questão de direito constitucional ou legal neles veiculada tenha sido, anteriormente, objeto de acórdão de Corte Superior erigido à condição de precedente qualificado pelo procedimento estabelecido para sua formação.

Esse sistema, aperfeiçoado pelo CPC/15, permite à instância a quo negar seguimento, desde logo, a recurso especial ou extraordinário em contrariedade à tese jurídica já estabelecida pelas Cortes Superiores, bem como a autoriza a proceder ao encaminhamento do caso para retratação pelo órgão julgador, sempre que verificado que o acórdão recorrido não aplicou, ou aplicou equivocadamente, tese jurídica firmada nos leading cases.

Além da valorização dos precedentes, a atual sistemática acarreta sensível diminuição dos casos individuais que chegam aos Tribunais Superiores, ocasionando maior racionalidade em seu funcionamento e aperfeiçoamento de seu papel de Cortes de “teses” ou de interpretação do direito constitucional ou legal.

Cabe destacar que a manutenção do tradicional sistema de recorribilidade externa, qual seja, da possibilidade de revisão das decisões da instância a quo mediante interposição do agravo de inadmissão para julgamento pela instância ad quem, tinha enorme potencial para esvaziar a eficácia da novel sistemática de valorização dos precedentes qualificados, pois mantinha as Cortes Superiores facilmente acessíveis a todos os litigantes em todo e qualquer caso.

As leis de reforma do sistema processual que trouxeram à luz os arts. 543-A a 543-C do CPC/73 silenciaram quanto ao ponto em destaque, o que instigou os Tribunais Superiores a avançarem em direção a uma solução jurisprudencial para o impasse: no AI 760.358/RS-QO (j. 19.11.2009), o Pleno do Supremo Tribunal Federal decidiu por não mais conhecer dos agravos interpostos de decisões proferidas com fundamento no art. 543-B do CPC/73, estabelecendo que a impugnação de tais decisões ocorreria, dali em diante, por meio de agravos regimentais, a serem decididos pelos próprios tribunais de apelação.

Como não poderia deixar de ser, a iniciativa da Suprema Corte foi secundada pelo Superior Tribunal de Justiça, que, por sua Corte Especial, em 12.05.2011, chegou a solução similar ao julgar a QO-AI 1.154.599/SP. Dessa forma, restou adequadamente solucionada pela jurisprudência a questão, ao se estabelecer, como regra, a recorribilidade “interna” na instância a quo em caso de negativa de seguimento do recurso excepcional pelo tribunal, por considerá-lo em confronto à tese jurídica assentada pelo STF ou pelo STJ em precedente qualificado.

Essa solução foi totalmente encampada pelo CPC/15, prevendo-se expressamente, desde então, o cabimento de agravo interno das decisões que negam seguimento a recurso excepcional, sempre que o acórdão recorrido tenha aplicado precedente qualificado e o recurso interposto tenha, em seu mérito, a pretensão única de rediscutir a aplicação da tese jurídica firmada no precedente.

Trata-se de recurso de fundamentação vinculada, pois não é dado à parte rediscutir o acerto ou a justiça do acórdão recorrido, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto.

É lícito ao agravante, portanto, alinhavar razões que evidenciem que o precedente invocado não se aplica ao caso concreto, por nele existir circunstância fática ou jurídica que o diferencia (distinguishing), bem como que demonstrem que a tese assentada no precedente, ainda que aplicável ao caso concreto, encontra-se superada por circunstâncias fáticas ou jurídicas (overruling).

A simples reprodução mecânica, no agravo interno, das razões do recurso excepcional a que negado seguimento, ou ainda, o subterfúgio da inovação recursal, extrapolam o exercício regular do direito de recorrer, fazendo do agravo uma medida manifestamente inadmissível e improcedente, a autorizar a aplicação aos agravos internos interpostos com fundamento no art. 1030, I, do CPC, da penalidade prevista no art. 1021, § 4º, do CPC, por interpretação extensiva.

Assentadas essas premissas, passa-se ao julgamento do agravo interno.

Diferentemente do quanto sustentado pela parte agravante, o exame meticuloso dos autos revela que não há distinção relevante entre o caso concreto e a ratio decidendi do precedente vinculante invocado para fins de negativa de seguimento ao recurso excepcional interposto.

O próprio STF aplica o mesmo entendimento exarado na decisão agravada em casos nos quais recursos extraordinários ainda logrem adentrar na Suprema Corte. Ex: ARE 1.013.417/CE (decisão monocrática, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 07.12.2016)

Não há fundamento idôneo, portanto, para que seja conferido trânsito ao recurso excepcional interposto, já que o caso bem se amolda ao quanto decidido pela instância superior no recurso excepcional invocado na decisão agravada, e o acórdão proferido pelo órgão fracionário deste Tribunal está em total conformidade com o entendimento que emana do mencionado precedente.

Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

 



 

 EMENTA

 

I - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Especial

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. recurso de fundamentação vinculada. DESNECESSIDADE DE SE AGUARDAR O TRÂNSITO EM JULGADO DE ACÓRDÃO EM RECURSO REPETITIVO. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. ausência de FUNDAMENTO IDÔNEO.

I. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso excepcional.

II. O agravo interno trata-se de recurso com fundamentação vinculada, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto.

III. A existência de decisão de mérito proferida sob a sistemática dos recursos repetitivos autoriza o julgamento imediato das causas que versem sobre o mesmo tema, independentemente do trânsito em julgado do paradigma. Art. 1.040, caput, do CPC/2015. Precedentes do STJ e do STF.

IV. Não trouxe a parte agravante fundamento idôneo, firmado em razões de segurança jurídica, para que seja conferido trânsito ao recurso excepcional.

V. Agravo interno desprovido.

 

 

EMENTA

 

II - Agravo Interno contra negativa de seguimento ao Recurso Extraordinário

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. recurso de fundamentação vinculada. ausência de distinção relevante. acórdão do órgão fracionário em conformidade com o entendimento emanado pelo precedente. AGRAVO DESPROVIDO.

I. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso excepcional.

II. Trata-se o agravo interno de recurso com fundamentação vinculada, sendo cognoscível por essa via recursal, tão somente, a questão relativa à invocação correta, ou não, do precedente no caso concreto.

III. Inexistente distinção relevante entre o caso concreto e a ratio decidendi do precedente vinculante invocado para fins de negativa de seguimento ao recurso excepcional interposto.

IV. O caso amolda-se ao quanto decidido pela instância superior no recurso excepcional invocado na decisão agravada, e o acórdão proferido pelo órgão fracionário deste Tribunal está em total conformidade com o entendimento que emana do mencionado precedente.

V. Agravo interno desprovido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, O Órgão Especial, por unanimidade, decidiu negar provimento aos agravos internos, nos termos do voto da Desembargadora Federal Vice-Presidente CONSUELO YOSHIDA (Relatora). Votaram os Desembargadores Federais MARISA SANTOS, NINO TOLDO, INÊS VIRGÍNIA, VALDECI DOS SANTOS, ANDRÉ NEKATSCHALOW (convocado para compor quórum), DALDICE SANTANA (convocada para compor quórum), CARLOS DELGADO (convocado para compor quórum como suplente do Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO), DIVA MALERBI, BAPTISTA PEREIRA, ANDRÉ NABARRETE, MARLI FERREIRA, PEIXOTO JÚNIOR, THEREZINHA CAZERTA e HÉLIO NOGUEIRA. Ausentes, justificadamente, os Desembargadores Federais NEWTON DE LUCCA, NERY JÚNIOR, SOUZA RIBEIRO, WILSON ZAUHY e PAULO DOMINGUES., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.