RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000490-94.2020.4.03.6339
RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECORRIDO: MARIA DO CARMO DA COSTA
Advogado do(a) RECORRIDO: ANA CAROLINA PARRA LOBO - SP263323-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000490-94.2020.4.03.6339 RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA DO CARMO DA COSTA Advogado do(a) RECORRIDO: ANA CAROLINA PARRA LOBO - SP263323-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré, em face da r. sentença que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar o direito de a autora ter computado como tempo de serviço rural, exceto para fins de carência, o período de 01.01.1980 a 31.10.1991, sem gerar a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição. Nas razões recursais, o INSS sustenta que a certidão de óbito e certidão de casamento, desacompanhadas de documentos comprobatórios do labor rural, não podem ser utilizadas como início de prova material ainda que nelas conste endereço rural ou a qualificação de lavrador. Acrescenta que prontuários médicos, fichas médicas, carteiras do SUS, dentre outros documentos expedidos por instituições de saúde, não são aceitos como início de prova material, na medida em que são elaborados sem qualquer formalidade e podem ser retificados a qualquer instante. Alega que boletins escolares, fichas de matrículas e declarações emitidas pela direção da instituição de ensino, fichas cadastrais de comércio, notas fiscais e/ou recibo de compra de mercadoria são documentos elaborados sem qualquer formalidade, bastando a mera declaração da parte interessada e podem ser alterados a qualquer instante e não possuem controle de temporalidade, o que afasta a certeza e a segurança jurídicas de suas informações. Afirma que não há prova idônea sobre a atividade laboral exercida pelos pais do autor, tendo-se inclusive deixado de fornecer suas CTPS e CPFs, o que permite presumir a ausência de enquadramento na categoria de segurado especial integrante de regime de economia familiar. Por estas razões, pretende a reforma da r. sentença ora recorrida. A parte autora apresentou contrarrazões. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000490-94.2020.4.03.6339 RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA DO CARMO DA COSTA Advogado do(a) RECORRIDO: ANA CAROLINA PARRA LOBO - SP263323-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Da atividade rural: A contagem de tempo de atividade rural para fins previdenciários está prevista no artigo 55, §2º da Lei nº 8213/91, restando claro no dispositivo que o cômputo do período será possível independente do recolhimento de contribuições a ele correspondentes, exceto para efeitos de carência. In verbis: Art. 55 (...) § 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento. §3º. A comprovação do tempo de serviço para fins desta lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso furtuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei 13.846 de 2019). No que se refere à carência, convém tecer alguns esclarecimentos, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, há que se destacar que não se exige idade mínima, mas, no entanto, o artigo 55, §2º, da Lei nº 8.213/91 não deixa dúvidas de que o cômputo do período será possível independente do recolhimento de contribuições a ele correspondentes, exceto para efeitos de carência. Reiterando o dispositivo legal, cito a Súmula 24 da TNU: “O tempo de serviço do trabalhador rural anterior ao advento da Lei nº 8.213/91, sem o recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para a concessão de benefício previdenciário do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), exceto para efeito de carência, conforme a regra do art. 55, § 2º, da Lei nº 8.213/91”. Aliás, no PEDILEF 2007.50.50.009140-9/ES (Tema 63, de relatoria do Juiz Federal Alcides Saldanha Lima, acórdão publicado em 27/07/2012), firmou-se a seguinte tese: “O tempo de serviço rural posterior à Lei n. 8.213/91, para efeitos de carência, demanda o recolhimento de contribuições previdenciárias”. Convém reiterar, por sua vez, que no REsp 1352791 SP firmou-se o entendimento de que “não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência”, neste caso, porque a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias era do empregador rural e não do empregado. Por fim, destaco a Súmula 272 do STJ, cujo enunciado transcrevo: “O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher contribuições facultativas”. Concluindo, como já esclarecido, não se exige o recolhimento de contribuição previdenciária, para fins de reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador rural, prestado anteriormente à vigência da Lei n. 8.213/91, de 24 de julho de 1991. No entanto, posteriormente a esta data, o tempo rural ficará condicionado ao recolhimento de contribuições previdenciárias, para ser computado como carência. No que se refere à produção de provas no caso presente, o sistema previdenciário, a fim de resguardar o equilíbrio atuarial e financeiro, exige em qualquer comprovação de tempo de serviço início de prova material. É o que explicita o artigo 55, §3º, da Lei 8213/91. No caso da comprovação de tempo rural não é diferente, como esclarece a Súmula 149 do STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação de atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário”. Quanto ao que se deve entender por início razoável de prova material, a Jurisprudência tem fornecido os parâmetros para tal avaliação. Tem-se entendido que qualquer documento idôneo, que evidencie a condição de trabalhador rural, atende a tal requisito. Neste sentido, Súmula nº 06 da TNU: “A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.” Outrossim, nos termos da Súmula n. 34 também da TNU, a prova material para comprovação do tempo de labor rural deve ser contemporânea à época dos fatos a provar. Por outro lado, não se confunde início de prova material com suficiência de prova material, razão pela qual não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período probante (Súmula n.º 14 da TNU). Logo, não é necessário que exista um documento para cada ano do interregno que se pretende provar. De todo modo, o STJ na Súmula 577, passou a admitir que: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório”. O serviço rural prestado pelo menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei n.º 8.213/91, pode ser reconhecido, para fins previdenciários, nos termos da Súmula n.º 5 da TNU. Ressalte-se, por fim, que declarações de ex empregadores ou de terceiros acerca da atividade rural não passam de provas orais reduzidas a termo, pelo que não servem como prova material para o início de comprovação do tempo rural. Do mesmo modo, a declaração de Sindicato tem valor probante relativo, caso não tenha sido homologada pelo INSS (Lei 8.213/1991, art. 106, inc. III). Também não servem como indício material as declarações firmadas por testemunhas. E ainda, é importante estar atento à Súmula 46 da TNU prevê que: “O exercício de atividade urbana intercalada não impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no caso concreto”. Na mesma linha, a Súmula 41 da TNU prevê que: “A atividade urbana de membro da família não descaracteriza o regime de economia familiar, desde que a renda advinda da agricultura seja indispensável ao sustento do lar”. A título exemplificativo, o artigo 106 da Lei nº 8213/91 traz um rol de documentos que podem servir como início razoável de prova material. Enfim, do exposto se conclui que a continuidade do trabalho rural, relativa a determinado lapso temporal, é verificada mediante apreciação conjunta da documentação amealhada aos autos, que confira um início razoável de prova material. Do caso concreto: Tendo em vista que r. sentença recorrida decidiu o pedido inicial de modo exauriente, analisando todas as questões suscitadas pelas partes, revela-se desnecessárias meras repetições de sua fundamentação. Vejamos o que dispôs a r. sentença, sobre o tempo de labor rural: “(....) Conforme se tem dos autos, pretende a autora o reconhecimento do lapso de rural, na condição de segurada especial, que diz ter exercido de 28.08.1972 (12 anos de idade) a 31.10.1991, o qual somado a anotação em CTPS - período de 01.01.2013 a 28.02.2013 - e aos recolhimentos como contribuinte individual - interregnos de 01.04.2013 a 30.04.2021 -, seriam suficientes ao cômputo de mais de 30 anos de tempo de serviço/contribuição, necessários à aposentação. No entanto, os recolhimentos na condição de contribuinte individual foram efetuados sob o código 1163, ou seja, sobre 11% - alíquota reduzida -, categoria que somente permite acesso à aposentadoria por idade. Em outras palavras, referidos recolhimentos - de 01.04.2013 a 30.04.2021 - não podem ser computados para espécie do benefício pretendido – a não ser que sejam complementados (conforme determina o § 3º, do art. 21, da Lei 8.212/91, o que não restou demonstrado), eis que realizados abaixo do valor mínimo, ou na alíquota de 11% sobre o salário de contribuição (códigos 1163). Para além disso, o tempo de trabalho rural na condição de segurado especial, prestado anteriormente à data de vigência da Lei 8.213/91, cujo reconhecimento é postulado pela autora, embora possa ser computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondente - desde que averbado para fins de benefício do regime geral de Previdência Social -, não pode ser considerado para fins de carência (art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91). Colocado isso, possui a autora apenas um mês de efetiva contribuição, decorrente de sua anotação em CTPS - 01.01.2013 a 28.02.2013. DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL SUJEITO A DECLARAÇÃO JUDICIAL Na inicial, afirma a autora, nascida em 28.08.1960, ter trabalhado no meio rural, em regime de economia familiar, sem anotação em CTPS, desde os 12 anos de idade, ou seja, 28.08.1972 a 31.10.1991. [...] No caso, para a prova do período postulado - 28.08.1972 a 31.10.1991 -, colacionou a autora, como início de prova material contemporânea ao lapsos postulado, documentos em nome do padrasto, irmãos e genitora, merecendo destaque: a) Certidão de casamento da genitora – Maria de Lourdes dos Santos -, com o padrasto, Manoel Torres dos Santos (de 13.11.1972), qualificando-o profissionalmente como lavrador; b) Documentos escolares, em nome das irmãs, alguns qualificando o padrasto como lavrador e indicando residência na zona rural – Bairro Mil Alqueires (emitidos entre 1977 e 1980); outros indicando residência na zona rural, Bairro Jardim Novo, Sítio Santo Antônio (emitidos entre 1985 e 1986) c) Certidão de óbito do padrasto, qualificando o padrasto como lavrador (de 21.03.1980) d) o certificado de saúde e de capacidade funcional, em nome da genitora (ev. 02, pag. 61), que a qualifica como lavradora, de 1991, Registre-se não servir à finalidade pretendida, as notas fiscais do produtor carreadas (ev. 02, pag. 53/59), pois emitidas em nome do proprietário do sítio onde a autora e família dizem ter trabalhado. Em relação à prova oral, as testemunhas ouvidas somente souberam dizer sobre o trabalho rural desempenhado a partir de 1980, quando a autora, mãe e irmãos (o padrasto já havia falecido), forma morar no sítio dos “Irmãos Vacari”, na cidade de Lucélia/SP, e, após, no sítio dos Irmãos Gasparoto, também na mesma cidade, dedicando-se ao cultivo, predominante, de lavoura de café. A testemunha Maria de Fátima dos Santos, afirmou que a genitora – Maria de Lourdes dos Santos -, “cuidava mais da casa”. Portanto, não se tem prova testemunhal sobre o alegado trabalho anterior a 1980, que teria ocorrido no bairro Mil Alqueires, também em Lucélia/SP. Registre-se que única testemunha que se referiu ao Bairro Mil Alqueires, Maria de Fátima dos Santos, foi contundente ao dizer que conheceu a autora, a partir de 1980 ou 1982, do Bairro Jardim novo, Lucélia/SP, não sabendo dizer sobre o trabalho da autora em momento anterior. Levando-se em conta o regime de economia familiar e considerando ser a autora solteira e sem filhos, possível a utilização dos documentos em nome da mãe e irmãs. Colocado isso, aliando o início de prova material à oral colhida, possível o reconhecimento do trabalho rural da autora de 01.01.1980 a 31.10.1991. (...)” – destaques no original Em complementação, ausente qualquer reparo a ser feito, cabendo apenas breves considerações. A autora, nascida em 28/08/1960, para comprovar o período de labor rural reconhecido em sentença apresentou documentos escolares, certidão de óbito de seu padrasto e certificado de saúde em nome de sua mãe. Quanto ao “certificado de saúde em nome da mãe”, destaco que em sentença consta que a autora é solteira e sem filhos. Este início de prova material foi corroborado por prova testemunhal idônea, constituindo um conjunto harmônico. Assim, presente o liame que conduz à convicção do labor rural da parte autora, de modo que a r. sentença não merece reparo. O artigo 46 combinadamente com o § 5º do artigo 82, ambos da Lei nº 9.099/95, facultam à Turma Recursal dos Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença. Ademais a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. O parágrafo 5º do artigo 82 da Lei nº 9.099/95, dispõe “se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão”. Assim, considerando que a r. sentença recorrida bem decidiu a questão, no que se refere ao labor rural, deve ser mantida integralmente, nos termos do artigo 46 da Lei nº 9.099/95. Diante do exposto, nego provimento ao recurso da parte ré. Condeno o Recorrente vencido, ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (não havendo condenação, do valor da causa), nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95 c/c art. 85, § 3º, do CPC – Lei nº 13.105/15. A parte ré ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida pela DPU (STJ, Súmula 421 e REsp 1.199.715/RJ). É o voto.
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E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL DE 01/01/1980 A 31/10/1991. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA ORAL. CONFIRMAÇÃO PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS (ART 46, LEI Nº 9099/95).
1.Trata-se de recurso da parte ré em face da sentença que julgou parcialmente procedente em parte o pedido, reconhecendo parte do período rural pleiteado pela parte autora, apenas para fins de averbação.
2. A parte ré alega que não há início de prova material da atividade rural, com argumentos genéricos acerca dos documentos apresentados, sem impugnar especificamente o período reconhecido em sentença.
3. Reconhecimento de período de 01/01/1980 a 31/10/1991, em confronto com os documentos e a prova oral.
4. Recurso da parte ré que se nega provimento.