RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002697-59.2020.4.03.6309
RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP
RECORRENTE: KARINA APARECIDA FARIA DE JESUS
Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI NEVES GONCALVES DA CRUZ - SP429015
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002697-59.2020.4.03.6309 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: KARINA APARECIDA FARIA DE JESUS Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI NEVES GONCALVES DA CRUZ - SP429015 RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada por KARINA APARECIDA FARIA DE JESUS em face da União Federal, objetivando o restabelecimento do auxílio emergencial previsto na Lei 13.982/20, bem como o pagamento do auxílio emergencial residual, previsto na MP 1000, de 02/09/20. No tocante ao pleito de restabelecimento dos pagamentos do Auxílio Emergencial, a r. sentença homologou o reconhecimento da procedência do pedido, bem como julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão do Auxílio Emergencial Residual formulado na petição inicial. Recorre a parte autora pretendendo a parcial reforma do julgado. Requer, em síntese, a concessão do benefício de auxílio emergencial residual postulado. Aduz que “O AUXILIO EMERGENCIAL RESIDUAL, era pago automaticamente ao inscrito no programa, tendo em vista que o inscrito preenchia os requisitos exigidos para a continuidade do pagamento das parcelas residuais. (...) não houve qualquer alteração dos requisitos exigidos para que a recorrente deixasse de ser atendida pelo programa do AUXILIO EMERGENCIAL, inclusive na modalidade residual. (...) O reconhecimento deste direito enseja por consequência a continuidade do pagamento inclusive das parcelas do AUXILIO EMERGENCIAL RESIDUAL, no valor de R$600,00 (seiscentos reais) referente aos meses de SETEMBRO, OUTUBRO E NOVEMBRO, não sendo devida a parcela de dezembro, visto que a recorrente conseguiu emprego”. É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002697-59.2020.4.03.6309 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: KARINA APARECIDA FARIA DE JESUS Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI NEVES GONCALVES DA CRUZ - SP429015 RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Fundamentou o juízo de origem: “In casu, a parte autora pleiteia o restabelecimento dos pagamentos do Auxílio Emergencial outrora deferido, bem como a concessão do Auxílio Emergencial Residual, previsto pela Medida Provisória n°. 1.000, de 2 de setembro de 2020. (...) Quanto aos requisitos para percepção do Auxílio Emergencial, o artigo 2º da Lei n°. 13.982/2020 elenca as seguintes condições: (i) ser maior de dezoito anos de idade; (ii) não ter emprego formal ativo (carteira assinada pela CLT ou cargo público); (iii) não estar recebendo benefício previdenciário ou assistencial; (iv) não estar recebendo segurodesemprego ou outro programa de transferência de renda (ressalvado o bolsa-família); (v) ter uma renda familiar per capita de no máximo metade do salário mínimo (em torno de R$ 522,50 por pessoa); (vi) ter uma renda familiar total de no máximo três salários-mínimos (em torno de R$ 3.135,00); (vii) não ter recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 em 2018; (viii) ser microempreendedor individual (MEI); (ix) ser contribuinte individual do INSS; (x) ser trabalhador informal, autônomo ou desempregado. Mais recentemente, foi editada a Medida Provisória n°. 1.000, de 2 de setembro de 2020, que instituiu, até 31 de dezembro de 2020, o Auxílio Emergencial residual a ser pago em até quatro parcelas mensais no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) ao trabalhador beneficiário do Auxílio Emergencial. Acerca das hipóteses de concessão do Auxílio Emergencial Residual, o artigo 1º, §3º da aludida Medida Provisória indica que o benefício não será devido ao trabalhador beneficiário do Auxílio Emergencial que: (i) tenha vínculo de emprego formal ativo adquirido após o recebimento do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020; (ii) tenha obtido benefício previdenciário ou assistencial ou benefício do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal após o recebimento do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, ressalvados os benefícios do Programa Bolsa Família; (iii) aufira renda familiar mensal per capita acima de meio salário-mínimo e renda familiar mensal total acima de três salários mínimos; (iv) seja residente no exterior; (v) no ano de 2019, tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); (vi) tinha, em 31 de dezembro de 2019, a posse ou a propriedade de bens ou direitos, incluída a terra nua, de valor total superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais); (vii) no ano de 2019, tenha recebido rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados exclusivamente na fonte, cuja soma tenha sido superior a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais); (viii) tenha sido incluído, no ano de 2019, como dependente de declarante do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física enquadrado nas hipóteses previstas nos incisos V, VI ou VII, na condição de: a) cônjuge; b) companheiro com o qual o contribuinte tenha filho ou com o qual conviva há mais de cinco anos; ou c) filho ou enteado: 1. com menos de vinte e um anos de idade; ou 2. com menos de vinte e quatro anos de idade que esteja matriculado em estabelecimento de ensino superior ou de ensino técnico de nível médio; (ix) esteja preso em regime fechado; (x) tenha menos de dezoito anos de idade, exceto no caso de mães adolescentes; e (xi) possua indicativo de óbito nas bases de dados do Governo federal, na forma do regulamento. No caso dos autos, a respeito do pedido de restabelecimento dos pagamentos do Auxílio Emergencial, o ente federativo informou que “[...] após a análise dos documentos juntados aos autos, reconheceu o direito da parte autora e já deu encaminhamento à liberação das parcelas”. Assim, no tocante a este pedido, entendo configurado o instituto do reconhecimento da procedência do pedido, no qual, segundo nos ensina a doutrina, “[...] verifica-se a submissão processual, caracterizada sempre que o réu expressamente concorda com a pretensão do autor. Essa concordância é ampla, atingindo tanto a causa de pedir quanto o pedido, de forma que no reconhecimento jurídico do pedido o réu concorda com os fundamentos jurídicos alegados pelo autor e também com o pedido por ele formulado” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8ª ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 757/758). De outro modo, quanto ao pedido de concessão do Auxílio Emergencial Residual, em que pese a parte afirmar reunir os requisitos necessários para deferimento desse benefício, o pedido formulado não pode ser acolhido, na medida em que não consta dos autos prova da não ocorrência dos requisitos impeditivos previstos no artigo 1º, §3º da MP 1.000/2020, fato constitutivo do direito da parte autora, cujo ônus lhe incumbia a teor do artigo 373, inciso I, do CPC. A respeito da prova de fato negativo, consigno não se tratar da denominada “prova diabólica”, na medida em que bastaria à parte provar “um fato positivo determinado incompatível logicamente com o fato negativo” , ou seja, deveria a parte provar que seu núcleo familiar manteve todas as condições do deferimento do Auxílio Emergencial (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8ª ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 659). Ainda que sejam graves os efeitos da pandemia causada pelo novo Coronavírus (COVID-19), com inegáveis prejuízos nas esferas de particulares e de entes estatais, sobretudo com danos humanitários expressivos, não pode o Poder Judiciário substituir-se à vontade do Legislador e determinar a concessão do benefício pretendido sem a comprovação dos requisitos estabelecidos em lei, sob pena de, em assim o fazendo, configurar-se verdadeiro arbítrio por parte do órgão julgador que não pode ser tolerado no contexto do Estado Democrático de Direito. Assim, não estando configurados os requisitos cumulativos previstos na disposição normativa acima mencionada, entendo ser inviável a concessão do Auxílio Emergencial Residual tal como pretendido”. Com razão a autora. Nos termos da MP 1.000, de 02/09/2020: “Art. 1º Fica instituído, até 31 de dezembro de 2020, o auxílio emergencial residual a ser pago em até quatro parcelas mensais no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) ao trabalhador beneficiário do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020, a contar da data de publicação desta Medida Provisória. § 1º A parcela do auxílio emergencial residual de que trata o caput será paga, independentemente de requerimento, de forma subsequente à última parcela recebida do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, desde que o beneficiário atenda aos requisitos estabelecidos nesta Medida Provisória. (grifos nossos) § 2º O auxílio emergencial residual será devido até 31 de dezembro de 2020, independentemente do número de parcelas recebidas. § 3º O auxílio emergencial residual não será devido ao trabalhador beneficiário que: I - tenha vínculo de emprego formal ativo adquirido após o recebimento do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020; II - tenha obtido benefício previdenciário ou assistencial ou benefício do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal após o recebimento do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, ressalvados os benefícios do Programa Bolsa Família; III - aufira renda familiar mensal per capita acima de meio salário-mínimo e renda familiar mensal total acima de três salários mínimos; IV - seja residente no exterior; V - no ano de 2019, tenha recebido rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 (vinte e oito mil quinhentos e cinquenta e nove reais e setenta centavos); VI - tinha, em 31 de dezembro de 2019, a posse ou a propriedade de bens ou direitos, incluída a terra nua, de valor total superior a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais); VII - no ano de 2019, tenha recebido rendimentos isentos, não tributáveis ou tributados exclusivamente na fonte, cuja soma tenha sido superior a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais); VIII - tenha sido incluído, no ano de 2019, como dependente de declarante do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física enquadrado nas hipóteses previstas nos incisos V, VI ou VII, na condição de: a) cônjuge; b) companheiro com o qual o contribuinte tenha filho ou com o qual conviva há mais de cinco anos; ou c) filho ou enteado: 1. com menos de vinte e um anos de idade; ou 2. com menos de vinte e quatro anos de idade que esteja matriculado em estabelecimento de ensino superior ou de ensino técnico de nível médio; IX - esteja preso em regime fechado; X - tenha menos de dezoito anos de idade, exceto no caso de mães adolescentes; e XI - possua indicativo de óbito nas bases de dados do Governo federal, na forma do regulamento. § 4º Os critérios de que tratam os incisos I e II do § 3º poderão ser verificados mensalmente, a partir da data de concessão do auxílio emergencial residual. § 5º É obrigatória a inscrição do trabalhador no Cadastro de Pessoas Físicas - CPF para o pagamento do auxílio emergencial residual e sua situação deverá estar regularizada junto à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia para o efetivo crédito do referido auxílio, exceto no caso de trabalhadores integrantes de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família. Art. 2º O recebimento do auxílio emergencial residual está limitado a duas cotas por família. § 1º A mulher provedora de família monoparental receberá duas cotas do auxílio emergencial residual. § 2º Quando se tratar de família monoparental feminina, o auxílio emergencial residual será concedido exclusivamente à chefe de família, após o pagamento da última parcela do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, ainda que haja outra pessoa elegível no grupo familiar. § 3º Não será permitida a cumulação simultânea do auxílio emergencial residual de que trata esta Medida Provisória com qualquer outro auxílio emergencial federal. § 4º É permitido o recebimento de um auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, e um auxílio emergencial residual por membros elegíveis distintos de um mesmo grupo familiar, observado o §2º do caput.” Conforme supratranscrito, o parágrafo 1º do artigo 1º da MP 1.000, de 02/09/2020, previu que “A parcela do auxílio emergencial residual de que trata o caput será paga, independentemente de requerimento, de forma subsequente à última parcela recebida do auxílio emergencial de que trata o art. 2º da Lei nº 13.982, de 2020, desde que o beneficiário atenda aos requisitos estabelecidos nesta Medida Provisória.” Perceba-se que, quisesse, o legislador poderia ter idealizado sistemática diversa, exigindo a formulação de novo requerimento, reclamando, por exemplo, a apresentação de alguns documentos, como fez com relação aos pedidos de auxílio-doença durante a pandemia, em que a própria Lei 13.982/2020 exige, além da mera afirmação do requerente de sua incapacidade para o trabalho, a juntada de atestado médico nos moldes previstos em regulamento (art. 4º, parágrafo único, inciso II). E, no caso em tela, reconhecido pela própria União, por meio da manifestação exarada no evento id 194.191.204 o direito da autora a todas as parcelas do benefício de auxílio emergencial previsto na Lei 13.982/20, e não tendo apresentado nenhuma prova do suposto fato impeditivo do direito da autora ao pagamento das parcelas do auxílio emergencial residual, previsto na MP 1000, de 02/09/20, também postulado pela autora nestes autos, e que, conforme já mencionado, seria pago independente de requerimento, há que se acolher o pedido formulado. Não constitui demasia rememorar, neste ponto, que há muito o direito processual abomina a exigência de provas de “fato negativo” – chamada “prova diabólica” – isto é, a prova de que algo “não ocorreu”. Pelo exposto, dou provimento ao recurso da autora, para condenar a União a pagar-lhe as parcelas residuais do auxílio-emergencial previstas na MP 1.000/20, referente aos meses de setembro, outubro e novembro, no valor de R$600,00 (seiscentos reais), não sendo devida a parcela de dezembro, visto que a recorrente conseguiu emprego, acrescidas de juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal – aprovado pelo CJF. O pagamento deverá ser feito após o trânsito em julgado, por meio de RPV. Sem condenação em custas e honorários advocatícios – art. 55 da lei 9.099/95. É o voto.
E M E N T A
CONCESSÃO DE AUXÍLIO EMERGENCIAL E AUXÍLIO EMERGENCIAL RESIDUAL – DÁ PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA PARA DETERMINAR A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO EMERGENCIAL RESIDUAL