
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001881-42.2019.4.03.6332
RELATOR: 31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: EDUARDO SANTIAGO GUIMARAES CLAUDIO
Advogado do(a) RECORRENTE: DANILO SCHETTINI RIBEIRO LACERDA - SP339850-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001881-42.2019.4.03.6332 RELATOR: 31º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: EDUARDO SANTIAGO GUIMARAES CLAUDIO Advogado do(a) RECORRENTE: DANILO SCHETTINI RIBEIRO LACERDA - SP339850-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: RELATÓRIO Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95. São Paulo, 16 de novembro de 2021.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001881-42.2019.4.03.6332 RELATOR: 31º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: EDUARDO SANTIAGO GUIMARAES CLAUDIO Advogado do(a) RECORRENTE: DANILO SCHETTINI RIBEIRO LACERDA - SP339850-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: VOTO Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95. São Paulo, 17 de novembro de 2021.
VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.
1. Ação ajuizada com o objetivo de se obter a condenação do INSS a restabelecer benefício previdenciário por incapacidade laborativa (auxílio-doença/aposentadoria por invalidez) cessado em 21/08/2017.
2. A sentença julgou improcedente o pedido, ao fundamento de que não foi constatada incapacidade laborativa.
3. Recurso da parte autora (em síntese): alega que a documentação médica juntada aos autos comprova que não possui capacidade laborativa, ao contrário do que concluíram as perícias judiciais. Aduz que, dessa forma, deveria ao menos ser encaminhada a processo de reabilitação profissional, pois não possui condição de exercer sua atividade habitual. Argumenta que o segundo laudo pericial não se encontra bem fundamentado, não tendo explicado porque a recorrente, portadora de HIV e visão monocular, é plenamente capaz para suas atividades. Pede o provimento do recurso para que lhe seja deferido o benefício pleiteado ou o encaminhamento para reabilitação ou, subsidiariamente, seja convertido o julgamento em diligência para que seja realizada nova perícia ou complementação daquela já realizada.
4. A parte autora foi submetida a duas perícias médicas, cujas conclusões transcrevo a seguir:
i) especialidade em oftalmologia (documento 191803219)
“5.B. DO EXAME DIRETO:
Neste exame de natureza médico legal foi constatado que conta com 40 anos de idade completos que em olho direito apresenta cicatriz macular (CID 10: H 31.0) e atrofia de nervo óptico (CID 10: H 47.2).
Informou acuidade visual sem correção óptica em seu olho direito igual percepção luminosa (eficiência visual igual a menor que 5%). e em olho esquerdo igual a 0,5 (83,6% de eficiência visual). O que caracteriza cegueira no olho direito com comprometimento visual categoria IV e no olho esquerdo comprometimento visual leve ou categoria zero conforme definida na CID 10 e classificada sob o código H 54.4
A situação clínica em olho direito do examinado não tem perspectiva de melhora com os atuais conhecimentos científicos e recursos terapêuticos disponíveis.
Tal situação clínica não pode ser classificada como dentre as situações clínicas consideradas como deficiência visual previstas no artigo 4º do Decreto 3298/1999 alterado pelo artigo 5º do Decreto 5296/2004; não podendo ser considerada como visão monocular, considerando que se trata de baixa visão equiparável a cegueira em olho direito conforme definido na CID 10.
Não foi constatada situação clínica que pudesse ser considerada como Deficiência conforme a “Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência” (Estatuto da Pessoa com Deficiência), (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, que considera pessoa com deficiência aquela que apresenta situação clínica objetiva que motiva impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas).
O uso de correção óptica é considerado como normal para o ser humano o seu uso pela Organização Mundial de Saúde e a classificação da função visual também depende de seu uso e inclusive legalmente no Brasil.
Esta situação é considerada como Visão normal conforme a atual legislação brasileira e não é nem prevista no anexo I, nem no quadro de número um do anexo III do atual regulamento da previdência social.
A perda da visão central em um dos olhos determina a perda da plena capacidade de reconhecimento da profundidade. Com o passar do tempo, os adultos que passam por esta situação passam a recuperar está capacidade por mecanismos visuais adaptativos, voltando a perceber a profundidade pelo reflexo de paralaxe. A discriminação da distância de um objeto ao olho pode ser inferida pela apreciação de vários outros indícios de percepção monocular, através de experiência, tais como o seu tamanho e sua perspectiva, o interposicionamento (quando partes de um objeto são escondidas de outra), obliquidade de iluminação, distinguibilidade cromática e outras.
O julgamento da distância também é especialmente fornecido pelo deslocamento dos objetos visíveis.. O período de adaptação é estimado em 90 dias e tomamos este período de tempo, amparado no conteúdo do Anexo II da Resolução CONTRAN 267/2008.
Considerando o conceito de “Eficiência Visual” em termos de funcionalidade, adaptado de “DUKE ELDER - Prática de Refração em Oftalmologia”, “BCSC” da “American Academy of Ophthalmologyes” e Previdência Social (2014) “DIRSAT - Manual Técnico de Procedimentos de Avaliação Médica Pericial das Funções da Visão”, pessoas que informam no melhor olho com a melhor correção óptica possível, a acuidade visual maior ou igual que 0,3 ou 20/60 e 1,0 ou 20/20 (de 69,9% a 100% de eficiência visual) apresentam comprometimento visual categoria zero: visual leve ou ausente conforme a CID 10; segundo a OMS apresentam “visão normal”: tem orientação espacial e mobilidade geralmente adequada, velocidade de leitura normal e talvez necessitem de lentes oftálmicas corretoras para longe e perto
Esta função visual não permite que os seus portadores executem funções que necessitam formalmente da plenitude da visão binocular e percepção da profundidade, tais como operar empilhadeiras, esteiras de rolagem, trabalhar em altura, conduzir veículos automotores de quaisquer categorias, ser Militar, Policial, pilotar aeronaves e embarcações. Devem evitar operar fresas, guilhotinas, prensas, serras elétricas cujos aparatos de proteção não estejam de acordo com as normas regulamentadoras de sua operação em nosso país; como também ao operá-las devem evitar as chamadas atitudes e comportamentos de risco. (Anexo VII da NR – 12 da Portaria 3214/1978).
Estima-se a redução da capacidade funcional nestes casos em cerca de 30%, limitada ao campo visual, porque cada olho enxerga 70% do campo visual do outro para formar a visão binocular.
Também foi visto que o examinado goza da plenitude das faculdades mentais e não foi vista redução efetiva ou impedimento da capacidade de integração social; nem também foi vista a necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que possa receber ou transmitir informações; também não foi vista situação que o impeçam de ver, ler, assinar, transmitir ou receber informações, de adotar postura de trabalho, efetuar gestos necessários, caminhar, desviar de objetos, superar barreiras arquitetônicas, se locomover até o ambiente de trabalho e lá permanecer; melhor dizendo, não foram constatadas situações clínicas que impedissem seu desempenho de função ou atividade a ser exercida ou de executar tarefas de atividades habituais que lhe garantam a subsistência.
6. CONCLUSÃO
Então, do visto e exposto, considerando a função visual do examinado, não foi constatada situação clínica atual na qual necessite de repouso ou de segregação social para cuidados, nem que impedisse sua permanência em ambiente de trabalho, nem que impedisse o planejamento e execução de tarefas que exigissem a função visual para sua consecução, sendo, porém constatada restrição.
Não foi constatada incapacidade para o trabalho, nem para as atividades da vida diária, nem para os atos da vida civil.
Não foi constatada situação clínica objetiva que motivasse o impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pudessem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
ii) especialidade em medicina legal e perícia médica (documento 191803354) e relatório de esclarecimentos (documento 191803361)
“Discussão
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Fundamentado única e exclusivamente nos documentos a mim apresentados e nas informações obtidas durante a entrevista e exame físico do periciando, passo aos seguintes comentários.
Os documentos médicos apresentados descrevem H300, Inflamação coriorretiniana focal; B24, Doença pelo vírus da imunodeficiência humana [HIV] não especificada; B580, Oculopatia por Toxoplasma; J158, Outras pneumonias bacterianas; INSS; F200, Esquizofrenia paranóide; F320, Episódio depressivo leve; M540, Paniculite atingindo regiões do pescoço e do dorso; A521, Neurossífilis sintomática; A523, Neurossífilis não especificada.
Ante o exposto, noto que o periciando apresenta relatos dos diagnósticos acima elencados, sendo que refere que em 2006 foi doar sangue a acabou descobrindo que era portador do vírus da imunodeficiência humana adquirida (HIV). Iniciou o tratamento e melhorou.
Porém, já tinha sido acometido de coriorretinite em 1998 devido à toxoplasmose. Porém, de 2013 em diante a coriorretinite começou a avançar/piorar. Atualmente, não enxerga nada do olho direito e enxerga apenas o campo visual lateral do olho esquerdo – sic. Ao ser questionado sobre o que o incapacita para o trabalho, informa que é por causa da baixa visão – sic (Informa que, desde e perícia oftalmológica, não mudou nada na sua visão – sic). Nesse sentido, apresenta documentos que corroboram em parte os eventos narrados, incluindo a infecção viral e o acometimento visual. Assim, cabe salientar que o periciando já foi devidamente periciado na área oftalmológica e que a presente avaliação tem foco em neurologia/clínica médica, conforme Acórdão acostado aos autos. Também, é importante observar que não apresentou queixas neurológicas ou da área de clínica geral e que, apesar de não apresentar exames objetivos recentes relacionados (linfócitos T CD4+, carga viral etc.), refere que o HIV está bem controlado – sic. Por fim, não apresenta evidências de acometimento atual por doenças oportunistas e, ao exame físico pericial, verifico a presença de cognição preservada, boa capacidade de comunicação e de deambulação, musculatura eutrófica, força proporcional, amplitude satisfatória dos movimentos, coordenação motora adequada e ausência de repercussões funcionais significativas que o incapacitem para o ofício de operador de teleatendimento.
Desse modo, concluo que não foi comprovada incapacidade atual para as suas atividades laborais habituais, nem para as atividades da vida independente.
Conclusão
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1-Não foi comprovada incapacidade atual para as suas atividades laborais habituais;
2-Não há incapacidade para as atividades da vida independente”.
(...)
“Ante a determinação judicial, venho esclarecer que não foi comprovada incapacidade para as suas atividades laborais habituais (operador de teleatendimento, auxiliar de manutenção, mecânico predial), conforme Acórdão acostado ao arquivo 44 dos autos.
Desse modo, resta-me ratificar o laudo e as conclusões firmadas”.
5. Veja-se, portanto, que a perícia em oftalmologia apontou algumas limitações do autor para determinadas atividades laborativas, especificamente aquelas que necessitem da plenitude da visão binocular e percepção de profundidade, tais como operar empilhadeiras, trabalhar em alturas e conduzir veículos automotores, dentre outras.
6. A parte autora juntou aos autos cópia da CTPS, que indica a última função como representante de atendimento em empresa de telemarketing (fl. 9 do documento 191803202). Por ocasião da segunda perícia, alegou ter exercido serviços como bombeiro civil e em empresa de manutenção de elevadores, funções para as quais, segundo o perito em oftalmologia, haveria limitações. Apesar de não constarem estes últimos registros na CTPS apresentada, verifica-se da análise do CNIS (fl. 10 e seguintes) que o autor manteve diversos contratos de trabalho com empresas de manutenção de elevadores, além de contratos de trabalho em empresas de recursos humanos e telecomunicações. Por outro lado, considerando a última função exercida, em empresa de telemarketing, conforme já citado, e as demais informações constantes do CNIS, vejo que é possível ao autor, apesar de suas limitações atuais, exercer atividade como representante de atendimento em telemarketing, de modo que improcede o pedido de concessão de benefício de auxílio-doença e encaminhamento para procedimento de reabilitação profissional. Destaque-se que a perda da visão de um dos olhos ocorreu em 2017, de acordo com o laudo oftalmológico.
7. Por fim, considerando que o autor reside em cidade grande, Guarulhos/SP, exerceu diversas atividades laborativas desde o diagnóstico do HIV e não apresenta prova alguma que afaste esses indicativos de ausência de estigma social da doença no caso, não há tampouco o que se falar em incapacidade decorrente da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. No mais, ao contrário do que alega a recorrente, os laudos periciais, elaborados por profissionais de confiança do juízo e equidistantes das partes, se encontram bem fundamentados, sem qualquer erro ou contradição que pudesse infirmar as conclusões apresentadas. Afasto, portanto, a impugnação apresentada pela parte.
8. Ante o exposto, não obstante as razões arguidas pela recorrente, tenho que a r. sentença deve ser mantida tal como lançada.
9. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
10. Condenação da parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da causa (artigo 55, da Lei nº 9.099/95), devidamente atualizado em conformidade com os critérios definidos pela Resolução CJF nº 658/2020, cuja execução fica suspensa nas hipóteses de concessão de gratuidade de justiça.
11. É como voto.
PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR