Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002604-96.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: IZALINO PASTRI

Advogado do(a) APELANTE: DEONISIO GUEDIN NETO - MS19140-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002604-96.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: IZALINO PASTRI

Advogado do(a) APELANTE: DEONISIO GUEDIN NETO - MS19140-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):

Trata-se de apelação em ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora requer a concessão de aposentadoria por idade, na modalidade híbrida.

A r. sentença julgou improcedente o pedido inaugural, declarando extinta a ação com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do NCPC). Condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte ré, no valor correspondente a 10% (dez por cento) do valor da causa, e ao pagamento das custas, observando-se a gratuidade de justiça concedida.

Sem as contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.

Os autos foram sobrestados nesta E. Corte, em cumprimento à determinação da Superior Instância (Tema 1.007/STJ).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002604-96.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO

APELANTE: IZALINO PASTRI

Advogado do(a) APELANTE: DEONISIO GUEDIN NETO - MS19140-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):

De início, determino o regular prosseguimento do feito, considerando que as razões que levaram ao sobrestamento do andamento processual não mais subsistem.

Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado se mostra formalmente regular, motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.

Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei 8.213/91.

Cumpre ressaltar que, com o advento da Lei nº 10.666, de 08 de maio de 2003, a perda da qualidade de segurado se tornou irrelevante para a concessão da aposentadoria por idade, desde que o segurado já conte com o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência, na data de requerimento do benefício.

"Art. 3º: A perda da qualidade do segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.

§1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.

§2º A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do §1º, observará, para os fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3º, caput e §2°, da Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991."

Muito embora o art. 3º, §1º, da Lei 10.666/2003 estabeleça que o segurado conte com no mínimo o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício, a Jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça entende que a carência exigida deve levar em conta a data em que o segurado implementou as condições necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.

Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 142 DA LEI Nº 8.213/91. PERÍODO DE CARÊNCIA. PREENCHIMENTO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ATENDIMENTO PRÉVIO DOS REQUISITOS. BENEFÍCIO DEVIDO.

1. Na forma da atual redação do art. 142 da Lei nº 8.213/91, alterado pela Lei nº 9.032/95, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela ali prevista, mas levando-se em consideração o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.

2. Aplica-se ao caso o art. 102, § 1º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que a perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos segundo a legislação então em vigor (arts. 52 e 53 da Lei nº 8.213/91).

3. Recurso especial provido."

(REsp.nº 490.585/PR, Relator o Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU de 23/8/2005).

O artigo 24 da Lei nº 8.213/1991 dispõe que: "Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências."

Por seu turno, o art. 25, inciso II, da referida Lei estabelece que:

"A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:

(...)

II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições mensais."

Porém, para os segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, o art. 142 da Lei nº 8.213/1991, trouxe uma regra de transição, consubstanciada em uma tabela progressiva de carência, de acordo com o ano em que foram implementadas as condições para a aposentadoria por idade.

Deve-se observar que para aferir a carência a ser cumprida deverá ser levada em consideração a data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e não aquele em que a pessoa ingressa com o requerimento de aposentadoria por idade junto ao Instituto Nacional do Seguro Social.

Trata-se de observância do mandamento constitucional de que todos são iguais perante a lei (art. 5º, caput, da Constituição Federal). Se, por exemplo, aquele que tivesse preenchido as condições de idade e de carência, mas que fizesse o requerimento administrativo posteriormente seria prejudicado com a postergação do seu pedido, já que estaria obrigado a cumprir um período maior de carência do que aquele que o fizesse no mesmo momento em que tivesse completado a idade mínima exigida, o que obviamente não se coaduna com o princípio da isonomia, que requer que pessoas em situações iguais sejam tratadas da mesma maneira.

Por outro lado, no caso de cumprimento do requisito etário, mas não da carência, o aferimento desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado quando do atingimento da idade esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse completado a carência necessária.

Nessa situação, o próprio adiamento da possibilidade de obtenção do benefício para o momento em que fosse cumprida a carência exigida no artigo 142 da Lei de Benefícios Previdenciários já estabeleceria diferença entre aquele que cumpriu a carência no momento em que completara a idade mínima, não havendo que se falar em necessidade de qualquer prazo adicional.

Corroborando este entendimento, cito a Súmula nº 02 da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que assim dispôs: Para a concessão da aposentadoria por idade, não é necessário que os requisitos da idade e da carência sejam preenchidos simultaneamente.

Anoto, por oportuno, que a edição da Lei 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito etário mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres e homens.

Trago à colação a redação mencionada, in litteris:

"§2º: Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.

§3º: Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.

§4º: Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social." (g.n.)

A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento administrativo, sendo irrelevante aferir se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.

Verifico, ainda, que, por meio de acórdão publicado no DJe de 04/09/2019 (Resp 1.674.221/PR), a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo".

Observe-se, por fim, que o C. STF concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento do Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.”

Desse modo, ausente repercussão geral da matéria, prevalece o entendimento adotado pelo C. STJ, ao julgar o Tema 1007.

Feitas tais considerações, passo à análise dos requisitos necessários. A idade mínima de 65 anos exigida para a obtenção do benefício foi atingida pela parte autora em 2017, haja vista haver nascido em 02/07/1952, segundo atesta sua documentação. Desse modo, necessária agora comprovação da carência no montante de 180 meses, conforme redação dada ao art. 142 da Lei 8.213/91, após sua modificação pela Lei 9.032/95.

Com o intuito de constituir o início de prova material, com base na CTPS apresentada e documentação colacionada aos autos, verifico que a parte autora não comprovou carência superior à necessária para a obtenção do benefício pleiteado.

Na exordial, a parte autora alega, in litteris:

“(...)

A parte autora, nascido em 02/07/1952, no início da sua vida laborativa exerceu a atividade rural em regime de economia familiar em imóvel rural situado na localidade de Galvão/SC.

A parte autora começou a trabalhar nas atividades rurais quando ainda criança. Essas atividades rurais eram exercidas pelo grupo familiar do autor em terras próprias sem a ajuda permanente de empregados ou mão-de-obra. Em suma, a atividade rural da família consistia na plantação de feijão, milho, trigo, criação de porcos, galinhas, gado de leite.

Os produtos agrícolas cultivados na propriedade rural da família eram comercializados no comércio local após a reserva do necessário para o consumo próprio.

Em 01/04/1993 a parte autora deixou a atividade rural e empregou-se na cidade. Entre os anos de 1989 até 1993 e de 2003 até 2011 laborou como trabalhador rural bóia-fria.

Em suma, a sua vida laboral se deu da seguinte forma conforme faz prova os documentos em anexo:

Em alguns períodos a parte autora verteu contribuições para a Previdência Social na condição de contribuinte individual, conforme registros no Cadastro Nacional de Informações do Segurado – CNIS.

A parte autora constatou que com a soma do tempo de trabalho rural (25 anos) e contribuições urbanas (12 anos 04 meses e 15 dias, já reconhecidos pelo INSS) contava na data do requerimento administrativo no INSS (14/07/2017), com (37 anos 04 meses e 15 dias) de tempo de serviço. Suficiente, portanto, para a obtenção do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do art. 201, § 7º, inciso II da Constituição Federal.

(...)

Como início de prova material relevante para a questão objeto dos autos, foi apresentado no processado:

- Ficha do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Galvão/SC em nome do genitor do autor (Jacinto Pastre), emitida em 01/07/1973, onde consta que ele seria “agricultor” e que teria dez filhos, entre eles o autor;

- Certidão Imobiliária de um imóvel rural com área de 24,20 hectares, localizado no adquirido pelos genitores do autor em 14/08/1972. Na mesma certidão imobiliária, consta que, em 1987, em razão de inventário de bens deixados pela genitora do postulante, foi transmitida a parte ideal que pertencia a ele e a seus irmãos (50%), sendo que, na oportunidade, o autor foi qualificado como solteiro e lavrador. Também consta no mesmo documento que, em 1988, agora em razão de inventário de bens deixados pelo genitor do postulante, os outros 50% do referido imóvel foram transmitidos ao autor e seus irmãos, sendo que, na oportunidade, o autor também foi qualificado como solteiro e lavrador. Por fim, consta que tal imóvel foi alienado a terceiros por todos os irmãos-proprietários em 1991;

- CTPS do autor, emitida em 30/11/1976 em Santa Catarina, onde consta que o autor teria laborado, de 03/01/1977 a 11/05/1977, como servente em um estabelecimento comercial/industrial relacionado a madeiras, voltando a ter registro formal somente em 1993, na mesma área, agora em São Lourenço D’Oeste/SC. Essa foi a única CTPS apresentada pelo, apesar de constar no CNIS diversos outros vínculos laborais formais, aparentemente todos urbanos.

- Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Galvão em nome do genitor do autor, onde consta que ele foi admitido em 11/06/1973 na entidade e que teria adimplido as mensalidades até outubro de 1986.

Verifica-se do processado, ainda, que o INSS, na seara administrativa, já computou como incontroversas, para fins de carência, 136 contribuições vertidas em favor do autor, o que equivale a 12 anos, 4 meses e 15 dias (ID 131293784 – pág. 15) e que, em cumprimento a mandado de constatação expedido em primeiro grau, verificou-se que o autor reside na área urbana do Município de São Miguel D’Oeste, onde não há criações ou plantações (ID 131293784 - págs. 68/69).

Em depoimento pessoal, o autor, que aparentemente apresenta problemas de audição, disse residir na zona urbana de São Miguel D’Oeste desde que chegou ao município, há cerca de 18 anos, sempre no mesmo endereço. Afirmou que faz serviços eventuais de lavoura até hoje, pois não pode parar de trabalhar. Disse que já foi registrado como servente, ou por dia. Afirmou que a vida em Santa Catarina teria sido difícil e complicada, onde trabalhou como bóia-fria, predominantemente. Teria trabalhado, também, na área rural, com carteira assinada, mas por curto interregno. Esclareceu que teria começado a trabalhar com seis ou sete anos, em propriedade de seu genitor, junto com seus 11 irmãos, em área de cerca de 10 hectares. Disse que morou no local até 1989 e que, depois, foi para São Lourenço. Afirmou que quem mais trabalharia fora do sítio seria o depoente, sendo que os demais irmãos ficariam em casa, auxiliando os genitores em trabalhos menores. O depoente casou-se em 1992. Não morou em nenhuma fazenda em São Miguel D’Oeste.

Quanto à prova testemunhal, a testemunha Luiz Carlos Borela disse conhecer o autor desde 1970, de Galvão/SC, pois teria um tio que moraria na região, em local próximo de onde o autor residiria. Pelo que sabe, ele trabalharia na roça, em um sítio que seria de propriedade dos pais do autor, onde a família inteira trabalharia em regime de subsistência, sem empregados. Tal propriedade teria cerca de 8 a 10 alqueires. No local, eles plantariam milho, feijão, entre outras culturas, para consumo e venda de excedente. A testemunha e o autor jogariam futebol juntos. Informou que o autor teria morado no sítio até meados de 1989, sendo certo que a última vez que a testemunha foi até a cidade de Galvão foi em 1988. Afirmou a testemunha que depois deter mudado para São Gabriel/MS, em 1981, só teria voltado para Galvão/SC para passear. Reencontrou o autor há cerca de 10 anos, salientando que ele, nesse período, trabalhou um pouco com carteira registrada e também como boia-fria.

A testemunha Adi Antônio de Cézaro, por sua vez, disse que conheceu o autor desde quando o depoente teria uns 10 anos e, o autor, uns 14 anos. Pelo que se depreende, a testemunha iria para a localidade onde a parte autora morava para jogar “bola”. Segundo a testemunha, o autor teria trabalhado na roça com o núcleo familiar, na plantação de milho, arroz e feijão, em propriedade do genitor do autor, em regime de subsistência. Afirmou que o autor teria trabalhado no local até 1989. Quando reencontrou o autor no MS, há cerca de 14 anos, ele estaria trabalhado como bóia-fria. Depois, esclareceu que o autor também teria trabalhado registrado, mas que, ultimamente, só como boia-fria.

Por fim, a testemunha Domingos Riquetti, que não sabe a data do próprio nascimento, disse que conheceu o autor há cerca de 20 anos, de Galvão/SC, e que ele teria trabalhado na lavoura com os genitores dele, em regime de subsistência, sem empregados, com venda de excedente. A testemunha disse que reside em São Gabriel há cerca de 10 anos, afirmando que o autor trabalhou nas granjas ou na lavoura, mas não soube especificar onde, de fato, ele trabalhou.

Pois bem. 

Analisando detidamente o processado, entendo, conforme já consignado pela r. sentença, que o conjunto probatório não se mostrou apto a comprovar as alegações autorais.

A prova material, ao contrário do alegado, não sugere que o autor teria trabalhado em atividades rurais pelo extenso período vindicado, porquanto o histórico laboral dele sempre foi como trabalhador urbano, tanto em estabelecimentos industriais/comerciais que lidam com madeira, móveis e estofados, como na área da construção civil. Observe-se, nesse contexto, que já em 1977, ele estaria laborando em atividades urbanas em uma empresa industrial/comercial de madeiras, atividade que teria exercido por muito tempo e em várias oportunidades, migrando depois para a construção civil, segundo verificado no CNIS. E o imóvel de titularidade de seu pai foi adquirido em 1972, não sendo possível comprovar trabalho rural de autor desde 1965, como postulou na exordial.

Ademais, a simples propriedade de um imóvel na área rural não pressupõe o trabalho rural de todos os integrantes da família, ainda mais quando não há provas de qualquer atividade campesina exercida no local. O próprio autor afirma, em depoimento pessoal, que era ele quem mais saía do sítio para fazer outros tipos de atividades. O regime de economia familiar exercido por ele, cujo reconhecimento foi vindicado pela exordial, também restou prejudicado, na medida em que o próprio requerente afirma que sua atividade principal rural teria se dado na condição de bóia-fria, situação essa que não foi ventilada por qualquer testemunha. Aliás, nenhuma delas foi capaz de informar sobre as atividades urbanas do autor, apesar de conhecê-lo há muito tempo.

Os períodos em que não obteve registro em CTPS não indicam labor campesino, pois o autor possuía outras habilidades que o possibilitariam trabalhar em diversas outras atividades, conforme observado nos autos, inclusive de maneira informal.

O único documento que o qualificou como lavrador é a Certidão Imobiliária apresentada, onde a profissão é meramente declaratória e é frágil para a comprovação requerida. A prova oral também não se mostrou robusta o suficiente para tanto, pois pelo que se denota dos depoimentos das testemunhas, elas jogavam futebol com o autor, mas sequer ficou claro se tinham residência habitual na localidade, causando estranheza o fato de afirmarem que o autor teria  permanecido no sítio até 1989, com tamanho grau de certeza, até porque decorridos mais de trinta anos da ocasião.

Frise-se, por fim, que a alegação de trabalho rural exercido pelo autor depois de 1989 é ainda menos crível, pois efetivamente não há qualquer documento a indicar, de maneira minimamente razoável, tal situação.

Nesse contexto, entendo que, por não ter exercido adequadamente o ônus probatório que lhe competia, apresentando o conjunto probatório diversas lacunas e inconsistências, a manutenção da r. sentença de improcedência, seria medida imperativa.

Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa." (REsp 1352721/SP).

Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.

Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO.  APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO.

1. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei 8.213/91.

 

2. Anoto, por oportuno, que a edição da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito etário mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres e homens. A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento administrativo, sendo irrelevante aferir se a atividade agrícola foi ou não exercida por último.

3. Verifico, ainda, que, por meio de acórdão publicado no DJe de 04/09/2019 (Resp 1.674.221/PR), a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo".

4. Observe-se, por fim, que o C. STF concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento do Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.”. Desse modo, ausente a repercussão geral da matéria, prevalece o entendimento adotado pelo C. STJ, ao julgar o Tema 1007.

5. Analisando detidamente o processado, entendo, conforme já consignado pela r. sentença, que o conjunto probatório não se mostrou apto a comprovar as alegações autorais.  A prova material, ao contrário do alegado, não sugere que o autor teria trabalhado em atividades rurais pelo extenso período vindicado, porquanto o histórico laboral dele sempre foi como trabalhador urbano, tanto em estabelecimentos industriais/comerciais que lidam com madeira, móveis e estofados, como na área da construção civil. Observe-se, nesse contexto, que já em 1977, ele estaria laborando em atividades urbanas em uma empresa industrial/comercial de madeiras, atividade que teria exercido por muito tempo e em várias oportunidades, migrando depois para a construção civil, segundo verificado no CNIS. E o imóvel de titularidade de seu pai foi adquirido em 1972, não sendo possível comprovar trabalho rural de autor desde 1965, como postulou na exordial. Ademais, a simples propriedade de um imóvel na área rural não pressupõe o trabalho rural de todos os integrantes da família, ainda mais quando não há provas de qualquer atividade campesina exercida no local. O próprio autor afirma, em depoimento pessoal, que era ele quem mais saía do sítio para fazer outros tipos de atividades. O regime de economia familiar exercido por ele, cujo reconhecimento foi vindicado pela exordial, também restou prejudicado, na medida em que o próprio requerente afirma que sua atividade principal rural teria se dado na condição de bóia-fria, situação essa que não foi ventilada por qualquer testemunha. Aliás, nenhuma delas foi capaz de informar sobre as atividades urbanas do autor, apesar de conhecê-lo há muito tempo. Os períodos em que não obteve registro em CTPS não indicam labor campesino, pois o autor possuía outras habilidades que o possibilitariam trabalhar em diversas outras atividades, conforme observado nos autos, inclusive de maneira informal. O único documento que o qualificou como lavrador é a Certidão Imobiliária apresentada, onde a profissão é meramente declaratória e é frágil para a comprovação requerida. A prova oral também não se mostrou robusta o suficiente para tanto, pois pelo que se denota dos depoimentos das testemunhas, elas jogavam futebol com o autor, mas sequer ficou claro se tinham residência habitual na localidade, causando estranheza o fato de afirmarem que o autor teria  permanecido no sítio até 1989, com tamanho grau de certeza, até porque decorridos mais de trinta anos da ocasião. Frise-se, por fim, que a alegação de trabalho rural exercido pelo autor depois de 1989 é ainda menos crível, pois efetivamente não há qualquer documento a indicar, de maneira minimamente razoável, tal situação. Nesse contexto, entendo que, por não ter exercido adequadamente o ônus probatório que lhe competia, apresentando o conjunto probatório diversas lacunas e inconsistências, a manutenção da r. sentença de improcedência, seria medida imperativa.

6. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa." (REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.

7. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.