APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003483-69.2021.4.03.6119
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: LASZLO KERESZTES
Advogado do(a) APELANTE: BARBARA GILEK CASTELLARI COIMBRA - SP424302-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003483-69.2021.4.03.6119 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: LASZLO KERESZTES Advogado do(a) APELANTE: BARBARA GILEK CASTELLARI COIMBRA - SP424302-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Apelação interposta por Laszlo Keresztes contra sentença que, em sede de mandado de segurança, denegou a ordem e julgou improcedente o pedido de liberação das mercadorias objeto do Termo de Retenção de Bens n.º 081760021006112TRB01, aprendidas pela Alfândega do Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP (Id 163301304). Aduz (Id 163301309) que: a) é cidadão americano e, não obstante tenha morado no Brasil, não é considerado como residente no país, pois é domiciliado nos Estados Unidos da América há mais de 12 meses (artigo 3º da IN SRF n.º 208/2002); b) na condição de não residente tem direito à isenção legal de US$ 3.000,00 (três mil dólares americanos), nos termos do artigo 5º, § 2º, da IN RFB n.º 1.059/2010; c) ao contrário do alegado, no momento do termo de retenção dos bens, o requerimento de extinção do termo de concessão de admissão temporária de bens – TECAT já estava em andamento perante a administração no procedimento n.º 13032.406270.2021-38; d) o artigo 5º da IN RFB n.º 1.059/2010 não impede a fruição da cota de isenção em razão de viagem anterior realizada em menos de 30 dias, como afirma o termo de retenção, mas que o direito somente pode ser exercido uma vez a cada intervalo de um mês; e) ainda que considerado residente fiscal no Brasil, a inaplicabilidade do direito à isenção com base no parágrafo 5º do artigo 33 da IN RFB nº 1.059/10 deveria ser comprovada pela Receita Federal do Brasil; f) tinha o direito de trazer consigo os aparelhos celulares e não havia a necessidade de declará-los e pagar impostos, uma vez que os bens não eram superiores à monta legal exigível de declaração, bem como estavam alocados em bagagem de não residente e eram bens para uso pessoal e em consonância com a finalidade da viagem. Em contrarrazões (Id 163301315), a União requer a manutenção da sentença. O parecer ministerial é no sentido de que seja desprovido o recurso (Id 164239293). Recebido o recurso somente no efeito devolutivo (Id 164241741), o apelante opôs embargos de declaração (Id 165245710). Intimada, a União apresentou resposta (Id 167933687). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003483-69.2021.4.03.6119 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: LASZLO KERESZTES Advogado do(a) APELANTE: BARBARA GILEK CASTELLARI COIMBRA - SP424302-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – Dos fatos Ação proposta por Laszlo Keresztes contra ato praticado pelo Inspetor-Chefe da Alfândega da Receita Federal do Brasil no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP, com vista à liberação das mercadorias objeto do Termo de Retenção n.º 081760021006112TRB01, dado que incluídos no conceito de bagagem. II – Dos embargos de declaração Inicialmente, observo que os embargos de declaração opostos contra a decisão que recebeu o recurso apenas em seu efeito devolutivo estão prejudicados, à vista julgamento do apelo. III – Da condição de não residente no Brasil Inicialmente, cumpre esclarecer que, na condição de não residente, o apelante requereu, em 23.01.2021, e lhe foi concedido o regime de admissão temporária, que lhe possibilitou o ingresso de bens procedentes do exterior com suspensão do pagamento de tributos por tempo determinado (Id 163301299, p. 28). Contudo, segundo informado pela autoridade aduaneira, o recorrente retornou ao exterior em 25.01.2021, com ingressos posteriores ao Brasil em 07 e 28.02.21, sem realizar a baixa do termo com declaração da saída dos bens, situação que não permite nova fruição do regime aduaneiro, conforme disposto no artigo 10 da IN RFB n.º 1.602/2015, que dispõe sobre o tema: Art. 10. Não será exigida a prestação de garantia nas hipóteses de que trata esta Instrução Normativa. § 1º Nos casos em que houver pendência relacionada à extinção do regime, novo pedido de admissão temporária de bens de viajante somente será concedido mediante regularização da extinção do regime anteriormente concedido ou prestação de garantia por parte do beneficiário. § 2º Para fins de concessão de nova admissão temporária, somente serão consideradas as pendências constatadas nos últimos 12 (doze) meses, contados a partir da data de solicitação do novo regime. [destaquei]. Relativamente ao termo de extinção do TECAT (procedimento n.º 13032.406270.2021-38), não há nos autos prova sobre o seu andamento na data da retenção. IV - Da bagagem acompanhada Admitido que o recorrente fosse residente em território nacional, melhor sorte não o socorreria. De acordo com as informações prestadas pela União (Id 163301298), o impetrante, ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Guarulhos/SP em voo proveniente dos Estados Unidos da América, em 18.03.2021, optou pelo canal nada a declarar. Contudo, selecionado para a realização do procedimento de fiscalização da bagagem, foi constatado o transporte de 02 (dois) aparelhos celulares marca Apple, modelo Iphone 12 Pro, com capacidade de armazenamento de 128Gb e 256Gb (gigabytes), sem sinais de uso e acondicionados em suas respectivas caixas. Afirma o impetrante que os bens são de uso pessoal, entretanto tal argumento não procede, pois conforme as informações da Receita Federal, o apelante tinha consigo, além do telefone celular em uso da marca Motorola, outros dois aparelhos celulares novos no interior de sua bagagem e que não foram declarados (Id 163301282), situação que não autoriza a concessão do benefício fiscal da isenção, conforme disposto nos artigos 155 e 157 do Decreto n.º 6.759/2009 e 33 da INSRF n.º 1.059/2010, verbis: Decreto n.º 6.759/2009 Art. 155. Para fins de aplicação da isenção para bagagem de viajante procedente do exterior, entende-se por: I - bagagem: os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar para seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação com fins comerciais ou industriais; Art. 157. A bagagem acompanhada está isenta do pagamento do imposto, relativamente a: I - bens de uso ou consumo pessoal; II - livros, folhetos e periódicos; e III - outros bens, observados os limites, quantitativos ou de valor global, os termos e as condições estabelecidos em ato do Ministério da Fazenda (Decreto-Lei nº 2.120, de 1984, art. 1º, caput). Art. 102. Aplica-se o regime de tributação especial aos bens: I - compreendidos no conceito de bagagem, no montante que exceder o limite de valor global a que se refere o inciso III do art. 157; IN SRF n.º 1.059/2010 Art. 2º Para os efeitos desta Instrução Normativa, entende-se por: (...) II - bagagem: os bens novos ou usados que um viajante, em compatibilidade com as circunstâncias de sua viagem, puder destinar para seu uso ou consumo pessoal, bem como para presentear, sempre que, pela sua quantidade, natureza ou variedade, não permitirem presumir importação ou exportação com fins comerciais ou industriais; (...) VII - bens de caráter manifestamente pessoal: aqueles que o viajante possa necessitar para uso próprio, considerando as circunstâncias da viagem e a sua condição física, bem como os bens portáteis destinados a atividades profissionais a serem executadas durante a viagem, excluídos máquinas, aparelhos e outros objetos que requeiram alguma instalação para seu uso e máquinas filmadoras e computadores pessoais; e § 1º Os bens de caráter manifestamente pessoal a que se refere o inciso VII do caput abrangem, entre outros, uma máquina fotográfica, um relógio de pulso e um telefone celular usados que o viajante porte consigo, desde que em compatibilidade com as circunstâncias da viagem. Art. 6º Ao ingressar no País, o viajante procedente do exterior deverá dirigir-se ao canal "bens a declarar" quando trouxer: (...) IX - bens que excederem limite quantitativo para fruição da isenção, de acordo com o disposto no art. 33; (...) § 1º O viajante poderá ainda dirigir-se ao canal "bens a declarar", caso deseje obter documentação comprobatória da regular entrada dos bens no País. Art. 33. O viajante procedente do exterior poderá trazer em sua bagagem acompanhada, com a isenção dos tributos a que se refere o caput do art. 32: I - livros, folhetos, periódicos; II - bens de uso ou consumo pessoal; e III - outros bens, observado o disposto nos §§ 1º a 5º deste artigo, e os limites de valor global de: a) US$ 500.00 (quinhentos dólares dos Estados Unidos da América) ou o equivalente em outra moeda, quando o viajante ingressar no País por via aérea ou marítima; e (...) Destaque-se que não se trata da restrição ao uso do benefício da isenção em prazo inferior a 30 dias, passível de utilização uma vez a cada intervalo de um mês, como estabelecido pelo artigo 33, §5º, da IN RFB n.º 1.059/2010, mas de importação de bens não declarados que não se enquadram no conceito de bagagem de uso pessoal. Observa-se, portanto, que os aparelhos celulares trazidos do exterior pelo apelante não estão albergados pelo benefício fiscal concedido à bagagem acompanhada, porquanto não considerados de uso pessoal, de modo que a importação deveria ter sido realizada pelo regime de tributação especial, na forma dos artigos 101 e 102 do Decreto n.º 6.759/09. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. TERMO DE RETENÇÃO DE BENS. CANAL “NADA A DECLARAR”. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. IMPOSSIBILIDADE. LIBERAÇÃO DE MERCADORIAS. NÃO CABIMENTO. PENA DE PERDIMENTO. ATOS ADMINISTRATIVOS. ILEGALIDADE NÃO DEMONSTRADA. MULTA DESCRITA NO TERMO DE RETENÇÃO. APELAÇÃO DESPROVIDA. I - Os itens encontrados na bagagem do apelante, sem declaração à fiscalização, embora não configurem exatamente destinação comercial, ao contrário do alegado, também não se enquadram no conceito de bens de caráter manifestamente pessoal, pela qual deveriam ter sido declarados, na forma do art. 6º e parágrafos da IN 1.059/2010. II - Conforme as informações dos autos, o valor total dos bens retidos, obtido mediante pesquisa de preços importa em US$ 37.752,80 (trinta e sete mil, setecentos e cinquenta e dois dólares norte-americanos e oitenta centavos), valor excedente ao previsto no art. 33, da IN 1.059/2010. No caso, foram apreendidos em poder do impetrante um relógio “Rolex Sky Dweller 42 mm Yellow Gold” e uma joia “Black & White Diamond Penguin Small Art. Pendant – Theo Fennell”, avaliados em US$ 37.752,80. III - Outrossim, conforme consignado na r. sentença, muito embora o impetrante afirme que a mercadoria apreendida se destinava uso pessoal, os bens encontrados em sua bagagem estavam acondicionados em caixas e plásticos. Ademais o impetrante viajou com relógio de pulso além daquele encontrado embalado em sua bagagem, pelo que se verifica que a mercadoria apreendida, evidentemente, não configura artigo de vestuário em natureza e quantidade compatível com as circunstâncias da viagem. IV - Dessa forma, os bens não estão sujeitos à isenção de tributos estabelecida aos bens pessoais, nos termos do artigo 33, II da IN 1.059/2010, se amolda aos preceitos do inciso III do referido artigo, estando a isenção da bagagem acompanhada limitada a US$ 500 dólares, Portanto, os bens se enquadram no conceito de bagagem acompanhada, mas devem ser submetidos à fiscalização e tributação, sendo necessária a declaração e recolhimento dos tributos devidos, além da multa. V- Apelação não provida. (AC 5003948-49.2019.4.03.6119, Terceira Turma, Rel. Des. Fed. Antônio Cedenho, j. 25.09.2020, destaquei). TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. MANDADO DE SEGURANÇA. PERDIMENTO. IN RFB Nº 1.059/2010. BENS DE USO MANIFESTAMENTE PESSOAL. BAGAGEM ACOMPANHADA. BENS INDIVIDUALIZÁVEIS. INCIDÊNCIA DA PENA SOMENTE SOBRE O QUE EXCEDE A COTA DE ISENÇÃO. 1. Bens estrangeiros excluídos do conceito de "bens de uso manifestamente pessoal" cujo valor supera a cota de isenção prevista na legislação aduaneira (IN RFB 1.059/2010), introduzidos em território nacional sem a Declaração de Bagagem Acompanhada e sem o pagamento dos tributos incidentes sobre a operação de importação, estão sujeitos a apreensão, por se tratar de importação irregular. 2. In casu, à exceção dos itens de vestuário (camisetas e meias), o restante dos objetos não se enquadra no conceito de bens de uso ou consumo pessoal, tratando-se, portanto, de bagagem acompanhada. Deve-se observar, portanto, o disposto pelos art. 33 da IN RFB nº 1.059/2010 e art. 7º da Portaria MF 440/2010, que autorizam a internalização, como bagagem acompanhada, sem necessidade de declaração e de recolhimento de tributos, além dos bens elencados nos incisos I e II do art. 33, as mercadorias que não ultrapassem o valor de US$ 300,00. 3. Recurso de apelação desprovido. (TRF 4ª Região, AC 5013550-41.2018.4.04.7002, Primeira Turma, Rel. Roger Raupp Rios, j. 01.06.2020, destaquei). Ademais, não há que se falar na violação ao disposto à Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal, uma vez que aquela corte no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.090.591/SC (Tema 1.042), representativo da controvérsia, firmou entendimento de que a retenção das mercadorias não se configura como meio coercitivo com vista ao recolhimento do tributo, mas, apenas, o cumprimento da norma, dado que o recolhimento das diferenças fiscais é requisito a ser atendido, sem o qual não se aperfeiçoa a importação. Por fim, as questões relativas ao demais artigos suscitados pelo apelante, quais sejam, os artigos 5º da IN RFB n.º 1.059/2010, 5º da IN RFB n.º 1.602/2015, 3º da IN SRF n.º 208/2002, não têm o condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados. V – Do dispositivo Ante o exposto, declaro prejudicados os embargos de declaração e nego provimento à apelação. É como voto.
E M E N T A
ADUANEIRO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. BAGAGEM ACOMPANHADA. TELEFONES CELULARES. BEM DE CARÁTER PESSOAL. NÃO VERIFICAÇÃO. IMPORTAÇÃO IRREGULAR. REGIME DE IMPORTAÇÃO ESPECIAL. RETENÇÃO. POSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PREJUDICADOS. RECURSO DESPROVIDO.
- Os embargos de declaração opostos contra a decisão que recebeu o recurso apenas em seu efeito devolutivo estão prejudicados, à vista julgamento do apelo.
- Ao viajante não residente no país é concedido o regime de admissão temporária, que permite o ingresso de bens procedentes do exterior com suspensão do pagamento de tributos por tempo determinado. Contudo, a saída do país sem realização da baixa do termo com declaração da saída dos bens não permite nova fruição do regime aduaneiro, conforme disposto no artigo 10 da IN RFB n.º 1.602/2015.
- De acordo com os artigos 157 do Decreto n.º 6.759/09 e 2º, inciso II, e 33 da Instrução Normativa n.º 1.059/2010, o viajante procedente do exterior poderá trazer em sua bagagem acompanhada, com isenção de tributos os bens de uso e consumo pessoal.
- O §1º do artigo 2º da IN SRF n.º 1.059/2010 determina que os bens de caráter manifestamente pessoal abrangem, entre outros, uma máquina fotográfica, um relógio de pulso e um telefone celular usados que o viajante porte consigo, desde que em compatibilidade com as circunstâncias da viagem.
- Aos bens compreendidos no conceito de bagagem que excedam o valor da isenção deve ser aplicado o regime de tributação especial, nos termos do artigo 102 do Decreto n.º 6.759/09.
- O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.090.591/SC, representativo da controvérsia (tema 1042), firmou entendimento de que a exigência do pagamento para o desembaraço da mercadoria importada não se configura como meio coercitivo com vista ao recolhimento do tributo, mas norma segundo a qual o recolhimento das diferenças fiscais é requisito a ser cumprido, sem o qual não se aperfeiçoa a importação.
- Embargos de declaração prejudicados. Apelação desprovida.