RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000836-93.2020.4.03.6323
RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: REGINALDO FERREIRA SANT NA
Advogados do(a) RECORRIDO: CAUE BLASIOLLI - SP345952-N, KAOE VIDOR CASSIANO - SP371360-N
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000836-93.2020.4.03.6323 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: REGINALDO FERREIRA SANT NA Advogados do(a) RECORRIDO: CAUE BLASIOLLI - SP345952-N, KAOE VIDOR CASSIANO - SP371360-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado de reconhecimento de atividade especial, para fins de aposentadoria. O INSS requer a reforma da decisão, de forma a que seja revogado o reconhecimento da especialidade da atividade de borracheiro. A parte autora, por sua vez, apresenta recurso alegando cerceamento de defesa, porquanto teve indeferido o pedido de produção de prova pericial por similaridade. Requer, também, seja julgado procedente o pedido inicial. É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000836-93.2020.4.03.6323 RELATOR: 17º Juiz Federal da 6ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: REGINALDO FERREIRA SANT NA Advogados do(a) RECORRIDO: CAUE BLASIOLLI - SP345952-N, KAOE VIDOR CASSIANO - SP371360-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A sentença atacada decidiu a lide nos seguintes termos: (...) Trata-se de ação previdenciária proposta por REGINALDO FERREIRA SANT’ANA em face do INSS, por meio da qual objetiva a concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição mediante conversão de tempo especial em comum, reformando decisão administrativa que lhe indeferiu idêntica pretensão frente a requerimento administrativo com DER em 10/04/2019, sob fundamento de insuficiência de tempo de serviço. Pede a produção de prova pericial e a utilização de prova emprestada, consistente em laudo pericial produzido no processo nº 1003047- 70.2018.8.26.0539, que tramitou perante a Justiça Estadual. (...) Rejeito o pedido do INSS de intimação da parte autora porque ela já renunciou expressamente ao crédito excedente ao limite de sessenta salários-mínimos previsto no art. 3º da Lei 10.259/01 (evento 12, fl. 03). Indefiro a produção de prova pericial requerida, porquanto cabe à parte autora o ônus da prova de apresentar laudos técnicos e formulários padrões do INSS, tais como SB 40, DSS 8030 e/ou PPP, para comprovar a especialidade da atividade. A realização de perícia é excepcionalidade, já que a manutenção de laudos que avaliem as condições de trabalho de seus empregados é imposta pela legislação previdenciária. Ademais, a produção de prova pericial, que deve ficar reservada às hipóteses de impossibilidade de demonstração do caráter especial das atividades laborais da parte autora por outros meios menos complexos e tão eficazes, não se coaduna com os princípios da informalidade, celeridade, simplicidade e eficiência que norteiam as ações que tramitam no âmbito dos JEFs. Saliento, por oportuno, que a prova técnica em empresa análoga não se prestaria para demonstrar os fatos necessários à procedência do pedido, afinal, seria imperioso demonstrar que a parte autora (ela própria) estava exposta a agentes nocivos, de maneira ininterrupta e intermitente, durante o período laborado. Qualquer perícia técnica em empresa análoga não chegaria à verdade dos fatos, motivo pelo qual se mostra inócua a pretendida prova. Por tais motivos, indefiro a produção de prova pericial. Analogamente, indefiro o pedido da parte autora de utilização de prova emprestada, consistente em laudo pericial produzido no processo nº 1003047-70.2018.8.26.0539, ajuizado por Sidney Ferreira Sant’Ana em face do INSS, perante a Justiça Estadual (evento 02, fls. 53/97). Verifico que a aludida prova técnica tem por objeto a análise de eventual insalubridade/periculosidade das atividades desenvolvidas por pessoa distinta do autor na empresa Usina São Luiz S/A (Fazenda Santa Maria, em Ourinhos/SP). Logo, a sua utilização neste processo não seria apta a comprovar que a parte autora (ela própria) estava exposta a agentes nocivos, de maneira ininterrupta e intermitente, durante o período que compõe o objeto deste feito. Ademais, não desconhece este juízo que só se admitem provas emprestadas quando produzidas sob o manto do contraditório. Assim, não tendo a parte autora e o INSS participado da lide na Justiça Estadual, as provas lá produzidas não bastam, por si só, para a comprovação dos fatos constitutivos do direito previdenciário reclamado nesta ação. Por tais motivos, indefiro o empréstimo de prova pericial produzida em outro feito. (...) 2.1.2. Caso concreto A parte autora pleiteia o reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 02/05/1984 a 10/10/1984, de 01/11/1984 a 31/12/1984, de 04/02/1985 a 02/04/1985, de 06/04/1989 a 05/12/1990, de 01/07/1991 a 23/03/1992, de 27/03/1992 a 02/11/1994, de 22/05/1995 a 01/09/1995, de 01/09/1995 a 15/12/1995, de 02/01/1996 a 10/12/1998, de 15/10/1998 a 31/05/1999, de 01/06/1999 a 19/03/2003, de 03/05/2004 a 15/05/2009, de 01/12/2009 a 21/08/2012 e de 01/03/2013 a 10/04/2019. Entretanto, verifico a partir da documentação que acompanha a exordial (notadamente a CTPS no evento 02, fl. 31, e o Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição no evento 07, fls. 54/56) que, na realidade, o vínculo mantido pela parte não perdurou de 02/01/1996 a 10/12/1998, como erroneamente consta da petição inicial, mas sim de 02/01/1996 a 10/02/1998, sendo reconhecimento deduzido pelo autor. Diante disso, concluo que o objeto desta demanda é composto pelos períodos controversos de 02/05/1984 a 10/10/1984, de 01/11/1984 a 31/12/1984, de 04/02/1985 a 02/04/1985, de 06/04/1989 a 05/12/1990, de 01/07/1991 a 23/03/1992, de 27/03/1992 a 02/11/1994, de 22/05/1995 a 01/09/1995, de 01/09/1995 a 15/12/1995, de 02/01/1996 a 10/02/1998, de 15/10/1998 a 31/05/1999, de 01/06/1999 a 19/03/2003, de 03/05/2004 a 15/05/2009, de 01/12/2009 a 21/08/2012 e de 01/03/2013 a 10/04/2019. A fim de comprovar a especialidade das atividades desenvolvidas, trouxe aos autos cópias de sua CTPS (evento 02, fls. 14/42), de PPPs emitidos pelas ex-empregadoras (evento 02, fls. 130/132) e de laudo técnico (evento 02, fls. 103/129). Quanto aos períodos até 28/04/1995, por serem anteriores à vigência da Lei nº 9.032/95, não se exige que o trabalhador prove sua efetiva exposição a agentes agressivos, bastando o enquadramento de seu cargo em categoria profissional constante nos decretos regulamentadores, conforme fundamentação supra. Com relação aos períodos de 02/05/1984 a 10/10/1984, de 01/11/1984 a 31/12/1984 e de 04/02/1985 a 02/04/1985, exercidos nos cargos de “corte de cana e serviços gerais” e “plantio, carpa de cana e serviços gerais”, é necessário partir do pressuposto de que a atividade de trabalhador rural, ainda quando exercida em condições consideradas penosas, perigosas ou insalubres, nos termos dos quadros anexos aos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, não podia ser computada como especial quando tivesse sido exercida antes do advento da Lei nº 8.213/91, exceto para os empregados rurais da agroindústria/agrocomércio que não prestassem serviços exclusivamente de natureza rural, que já eram tidos como segurados da previdência urbana mesmo antes da entrada em vigor da atual Lei de Benefícios. Somente é possível falar-se em atividade especial exercida pelo trabalhador rural após a efetiva unificação dos sistemas previdenciários, o que se deu somente com os novos planos de custeio e benefícios implantados pelas Leis nº 8.212/91 e nº 8.213/91. No entanto, o código 2.2.1 do anexo do Decreto nº 53.831/64 refere-se especificamente ao trabalho exercido na atividade agropecuária, não abrangendo todas as espécies de trabalhadores rurais, mesmo após o advento da atual Lei de Benefícios (precedentes: APELREE 884900, TRF3, Rel. Desembargador Federal Antonio Cedenho, Sétima Turma, DJF3 04.03.2009, p. 795). No caso em tela , em que os períodos controvertidos são anteriores ao advento da LBPS, inexiste qualquer indício de prestação de serviço que não fosse exclusivamente rural. Ademais, o laudo técnico apresentado no evento 02, fls. 103/129, não traz qualquer informação acerca da exposição do trabalhador rural na lavoura de cana a algum fator de risco. Logo, deixo de reconhecer os períodos de 02/05/1984 a 10/10/1984, de 01/11/1984 a 31/12/1984 e de 04/02/1985 a 02/04/1985 como especiais. No que concerne aos períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994, exercidos no cargo de borracheiro/serviços gerais, a atividade deve ser enquadrada no item 1.2.11 do anexo do Decreto nº 53.831/64 (tóxicos orgânicos), pois é de conhecimento ordinário que o borracheiro (assim como o mecânico) ficava em contato com os agentes químicos discriminados no referido item. Por se tratar de períodos anteriores a 28/04/1995, não se exige que o trabalhador prove sua efetiva exposição a agentes agressivos, bastando o enquadramento de seu cargo em categoria profissional constante nos decretos regulamentadores, o que, pelos fundamentos acima expostos, entendo ter ocorrido no presente caso. Desta forma, reconheço os períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994 como exercidos em atividades especiais. Quanto ao período de 01/07/1991 a 23/03/1992, exercido no cargo de “molejeiro”, verifica-se que o cargo apresenta denominação genérica, inexistindo nos autos informação que permita considerá-lo análogo a qualquer outra atividade constante dos anexos dos Decretos 53.080/64 ou 83.080/79. Ademais, o PPP apresentado no evento 02, fls. 130/131, não se mostra hábil à comprovação do quanto alegado, pois não contém carimbo da pessoa jurídica emitente, nem informações sobre o representante legal da empresa, requisitos indispensáveis para a sua validade, em conformidade com a legislação que rege a matéria (art. 68 do Decreto nº 3.048/99 e art. 272 e Anexo XV da Instrução Normativa INSS-PRES nº 45 de 06/08/2010). Assim sendo, ante a impossibilidade de enquadramento por categoria profissional e a ausência de demonstração de exposição a agentes agressivos, deixo de reconhecer a especialidade do período de 01/07/1991 a 23/03/1992. No que concerne aos períodos a partir de 29/04/1995, o reconhecimento do seu caráter especial exige a comprovação, por meio de formulário, da efetiva exposição a agentes nocivos e da prestação do trabalho de forma permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou integridade física do autor, conforme fundamentação supra. Quanto aos períodos de 22/05/1995 a 01/09/1995, de 01/09/1995 a 15/12/1995 e de 15/10/1998 a 31/05/1999, a parte autora não apresentou qualquer formulário ou laudo técnico, não se desincumbindo do ônus de comprovar o fato constitutivo do seu alegado direito (art. 373, inciso I, CPC). Logo, inexiste motivo para reconhecimento da sua especialidade. No que concerne aos períodos de 02/01/1996 a 10/02/1998, de 01/06/1999 a 19/03/2003, de 03/05/2004 a 15/05/2009, de 01/12/2009 a 21/08/2012 e de 01/03/2013 a 10/04/2019, os PPPs apresentados no evento 12, fls. 04, 08 e 10, e no evento 02, fl. 132, não se mostram hábeis à comprovação do quanto alegado, pois não contêm informações completas sobre o representante legal da empresa, nem dados sobre o atendimento aos requisitos das NR -06 e NR -09 do MTE pelos EPI informados (item 15.9 do PPP), requisitos indispensáveis para a sua validade, em conformidade com a legislação que rege a matéria (art. 68 do Decreto nº 3.048/99 e art. 272 e Anexo XV da Instrução Normativa INSS-PRES nº 45 de 06/08/2010). Ademais, no que concerne especificamente ao PPP do evento 02, fl. 132, nota-se que ele informa a duração do vínculo laboral desde o dia 01/12/2009 até a presente data, em contradição com as anotações contidas na CTPS do autor, que informam a existência de dois vínculos laborais no período, um com início em 01/12/2009 e fim em 21/08/2012 e outro com início em 01/03/2013 até a presente data (evento 02, fl. 33), o que compromete ainda mais sua idoneidade probatória. Assim, tendo em vista que a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o fato constitutivo de seu alegado direito (art. 373, inciso I, CPC), deixo de reconhecer a natureza especial dos períodos de 02/01/1996 a 10/02/1998, de 01/06/1999 a 19/03/2003, de 03/05/2004 a 15/05/2009, de 01/12/2009 a 21/08/2012 e de 01/03/2013 a 10/04/2019. Em suma, reconheço como exercidos em condições especiais somente os períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994. (...) In casu, considerando o tempo ora reconhecido como especial (períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994), verifica-se que a parte autora laborou 04 anos, 03 meses e 06 dias em atividades especiais, tempo claramente insuficiente para a aposentadoria especial, já que a legislação previdenciária para os agentes agressivos presentes na atividade desempenhada pela parte autora exige o tempo de serviço especial mínimo de 25 (vinte e cinco) anos para a concessão do benefício. Quanto ao pedido subsidiário, contabilizado o tempo de serviço já acatado pelo INSS (27 anos, 02 meses e 05 dias – evento 07, fl. 60), somado ao tempo de serviço ora reconhecido como tempo especial convertido em comum (períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994, cujos acréscimos de 40% equivalem a 01 ano, 08 meses e 14 dias, conforme planilha de contagem de tempo em anexo), vê-se que, na data do requerimento administrativo (10/04/2019), o autor detinha 28 anos, 10 meses e 19 dias de tempo de serviço. Assim, verifica-se que a parte autora, quando da DER, não detinha o tempo mínimo exigido para a aposentadoria por tempo de contribuição. Desta feita, improcede o pedido de aposentadoria, em razão do não preenchimento dos requisitos mínimos exigidos para a concessão, quando do requerimento administrativo. Sem mais delongas, passo ao dispositivo. 3. Dispositivo POSTO ISSO, julgo parcialmente procedente o pedido e, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, soluciono o feito com resolução de mérito, para condenar o INSS a reconhecer e averbar os períodos de 06/04/1989 a 05/12/1990 e de 27/03/1992 a 02/11/1994 como efetivamente laborados pela parte autora em atividades especiais, nos termos da fundamentação. Sem custas e sem honorários advocatícios nessa instância (artigo 55 da Lei nº 9.099/95 c.c. o art. 1º da Lei nº 10.259/01). (...) No julgamento do Pedilef 0509377-10.2008.4.05.8300 (04/06/2014), a TNU havia uniformizado o entendimento de que a expressão "trabalhadores na agropecuária", contida no item 2.2.1 do anexo ao Decreto n.º 53.831/64, refere-se a trabalhadores rurais que exerçam atividades agrícolas como empregados em empresas agroindustriais e agrocomerciais, fazendo eles jus ao cômputo de suas atividades como tempo de serviço especial. Dessa forma, as atividades em firmas agropecuárias, bem como na agroindústria (corte de cana, usinas de álcool), quando realizadas em período anterior a 28.04.95, seriam passíveis de reconhecimento por mero enquadramento, com base no código 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64. Entretanto, sobreveio orientação jurisprudencial no sentido de que a expressão “trabalhadores na agropecuária” não contempla trabalhadores que exerçam atividade apenas na lavoura (STJ, 1ª Seção, Pedido de Uniformização de Jurisprudência de Lei - PUIL 452/PE, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 14.06.2019). Assim, é necessário observar o entendimento que veio a prevalecer no Superior Tribunal de Justiça, que não mais reconhece a especialidade dessa atividade profissional por simples enquadramento no item 2.2.1 do Anexo III do Decreto 53.831/1964. Por outro lado, a jurisprudência entende possível o reconhecimento da insalubridade no corte e plantio de cana-de-açúcar, desde que comprovado o exercício de atividade penosa sob exposição ao calor e radiação não-ionizante. Nesse sentido: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. – (...) Como é sabido, em regra, a atividade rural exercida na lavoura não justifica o enquadramento na categoria profissional prevista no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64, o qual prevê a especialidade das atividades desempenhadas pelos trabalhadores na agropecuária , ou seja, pelos prestadores de serviço da agricultura e da pecuária, de forma simultânea - Contudo, nas situações do trabalhador rural, com registro em carteira profissional e apresentação de PPP, comprovando que sua atividade está afeta ao cultivo da cana-de-açúcar, no qual os métodos de trabalhos são voltados à produção agrícola em escala industrial com intensa utilização de defensivos e exigência de alta produtividade dos trabalhadores, há que se dar tratamento isonômico para fins previdenciários, à vista dos demais trabalhadores ocupados na agropecuária, como atividade especial prevista nos decretos previdenciários que regulam a matéria. Soma-se a isso, que o Laudo Pericial foi conclusivo no sentido de que o autor esteve exposto a calor de 27,8 ºC, portanto, acima do limite de tolerância (máximo de 25 º C), bem como à radiação não-ionizante, já que partes do corpo do autor permaneciam expostos aos raios ultravioletas provenientes do sol, ocasionado pelo trabalho a céu aberto. (...) (TRF-3 - Ap: 00252976720174039999 SP, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA, Data de Julgamento: 25/02/2019, SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/03/2019) Em relação ao calor, a simples menção não é suficiente para a caracterização da especialidade, devendo o empregador informar, além da temperatura, o tempo de exposição e a classificação da atividade exercida (leve, moderada ou pesada), possibilitando o confronto de tais dados com o estabelecido no Quadro 1 do Anexo III da NR 15 (Portaria 3.214/78) – Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde do Trabalho. Essa necessidade de detalhamento já foi objeto de apreciação da Turma Nacional de Uniformização, nos seguintes termos: VOTO-EMENTA INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. TRABALHO RURAL EM EMPRESAS AGROINDUSTRIAIS. ENQUADRAMENTO NO ITEM 2.2.1 DO ANEXO DO DECRETO Nº 53.831/64. ACÓRDÃO RECORRIDO NO MESMO SENTIDO DA JURISPRUDÊNCIA DA TNU. INCIDÊNCIA DA QUESTÃO DE ORDEM Nº 13. EXPOSIÇÃO AO CALOR PROVENIENTE DE FONTE NATURAL EM PERÍODO POSTERIOR À ENTRADA EM VIGOR DO DECRETO Nº 2.172/97. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA EXPOSIÇÃO ACIMA DOS PATAMARES ESTABELECIDOS NO ANEXO 3 DA NR-15/TEM, DE FORMA HABITUAL E PERMANENTE. ANÁLISE QUANTITATIVA. NECESSIDADE DE ANÁLISE DO PPP. QUESTÃO DE ORDEM Nº 20 DA TNU. INCIDENTE PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, PARCIALMENTE PROVIDO. (...) . 7. No tocante ao agente agressivo calor, é irrelevante se a fonte à qual se expunha o autor era natural ou artificial, porque os regulamentos atuais não fazem tal distinção. Embora o Decreto nº 53.831/64 explicitasse como fonte de calor as artificiais (1.1.1), os regulamentos da Previdência que o sucederam, não mais fizeram tal referência, sendo certo que o trabalho em exposição contínua ao calor proveniente do sol, em virtude dos raios ultravioleta (radiação não ionizante) sujeitam o trabalhador a condições especiais. Assim, basta a comprovação em patamares superiores aos estabelecidos no Anexo 3 da NR-15/MTE - análise, portanto, quantitativa. Segundo a norma, a exposição ao calor deve ser avaliada através do "Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo" - IBUTG. , de acordo coma seguinte fórmula: Ambientes internos ou externos sem carga solar: IBUTG = 0,7 tbn + 0,3 tg Ambientes externos com carga solar: IBUTG = 0,7 tbn + 0,1 tbs + 0,2 tg onde: tbn = temperatura de bulbo úmido natural tg = temperatura de globo tbs = temperatura de bulbo seco. 2. Os aparelhos que devem ser usados nesta avaliação são: termômetro de bulbo úmido natural, termômetro de globo e termômetro de mercúrio comum. 3. As medições devem ser efetuadas no local onde permanece o trabalhador, à altura da região do corpo mais atingida. Limites de Tolerância para exposição ao calor, em regime de trabalho intermitente com períodos de descanso no próprio local de prestação de serviço. 1. Em função do índice obtido, o regime de trabalho intermitente será definido no Quadro N.º 1. QUADRO N.º 1 TIPO DE ATIVIDADE REGIME DE TRABALHO INTERMITENTE COM DESCANSO NO PRÓPRIO LOCAL DE TRABALHO (por hora) LEVE MODERADA PESADA Trabalho contínuo até 30,0 até 26,7 até 25,0 45 minutos trabalho 15 minutos descanso 30,1 a 30,5 26,8 a 28,0 25,1 a 25,9 30 minutos trabalho 30 minutos descanso 30,7 a 31,4 28,1 a 29,4 26,0 a 27,9 15 minutos trabalho 45 minutos descanso 31,5 a 32,2 29,5 a 31,1 28,0 a 30,0 Não é permitido o trabalho, sem a adoção de medidas adequadas de controle acima de 32,2 acima de 31,1 acima de 30,0 2. Os períodos de descanso serão considerados tempo de serviço para todos os efeitos legais. 3. A determinação do tipo de atividade (Leve, Moderada ou Pesada) é feita consultando-se o Quadro n.º 3. Limites de Tolerância para exposição ao calor, em regime de trabalho intermitente com período de descanso em outro local (local de descanso). 1. Para os fins deste item, considera-se como local de descanso ambiente termicamente mais ameno, com o trabalhador em repouso ou exercendo atividade leve. 2. Os limites de tolerância são dados segundo o Quadro n.º 2. QUADRO N.º 2 M (Kcal/h) MÁXIMO IBUTG 175 200 250 300 350 400 450 500 30,5 30,0 28,5 27,5 26,5 26,0 25,5 25,0 Onde: M é a taxa de metabolismo média ponderada para uma hora, determinada pela seguinte fórmula: M = Mt x Tt + Md x Td 60 Sendo: Mt - taxa de metabolismo no local de trabalho. Tt - soma dos tempos, em minutos, em que se permanece no local de trabalho. Md - taxa de metabolismo no local de descanso. Td - soma dos tempos, em minutos, em que se permanece no local de descanso. IBUTG é o valor IBUTG médio ponderado para uma hora, determinado pela seguinte fórmula: IBUTG = IBUTGt x Tt + IBUTGd xTd 60 Sendo: IBUTGt = valor do IBUTG no local de trabalho. IBUTGd = valor do IBUTG no local de descanso. Tt e Td = como anteriormente definidos. Os tempos Tt e Td devem ser tomados no período mais desfavorável do ciclo de trabalho, sendo Tt + Td = 60 minutos corridos. 3. As taxas de metabolismo Mt e Md serão obtidas consultando-se o Quadro n.º 3. 4. Os períodos de descanso serão considerados tempo de serviço para todos os efeitos legais. QUADRO N.º 3 TAXAS DE METABOLISMO POR TIPO DE ATIVIDADE TIPO DE ATIVIDADE Kcal/h SENTADO EM REPOUSO 100 TRABALHO LEVE Sentado, movimentos moderados com braços e tronco (ex.: datilografia). Sentado, movimentos moderados com braços e pernas (ex.: dirigir). De pé, trabalho leve, em máquina ou bancada, principalmente com os braços. 125 150 150 TRABALHO MODERADO Sentado, movimentos vigorosos com braços e pernas. De pé, trabalho leve em máquina ou bancada, com alguma movimentação. De pé, trabalho moderado em máquina ou bancada, com alguma movimentação. Em movimento, trabalho moderado de levantar ou empurrar. 180 175 220 300 TRABALHO PESADO Trabalho intermitente de levantar, empurrar ou arrastar pesos (ex.: remoção com pá). Trabalho fatigante 440 550 8. No caso em apreço, assim fundamentou o acórdão recorrido: o PPP descreve que o recorrido esteve exposto a calor de 26,5 IBUTG. Apesar de o documento não mencionar, deflui-se da descrição das atividades desempenhadas pelo segurado (trabalho rural) que a fonte de calor ao qual o mesmo estava exposto era natural (raios solares). Frise-se que o trabalho agrícola, tal qual o exercido pelo recorrido, pode ser classificado como fatigante para efeitos de determinação do limite de tolerância, pois, como cediço, os trabalhadores rurícolas desempenham suas funções a céu aberto, com postura inadequada, controle rigoroso da produtividade, stress, esforço físico intenso, jornada de trabalho prolongada, repetitividade e monotonia. 9. Ressalte-se que há necessidade de que a exposição ao calor, por fonte natural, seja habitual e permanente, a partir de 29/04/1995, de acordo com o disposto pelo art. 57, § 3º, da Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 9.032/95. 10. No presente caso, o INSS afirma que as conclusões do PPP constante nos autos indicam que as atividades desenvolvidas pelo segurado se davam de modo habitual e intermitente, o que impediria o reconhecimento da especialidade do trabalho exposto ao calor, por fonte natural. Assim, entendo que se faz necessária a análise de prova no juízo de origem, razão pela qual deixo de aplicar a Questão de Ordem nº 38 deste Colegiado. 11. Incidente parcialmente conhecido, e, nesta parte, parcialmente provido, firmando-se a tese no sentido de que, após a entrada em vigor do Decreto nº 2.172/97, é possível o reconhecimento como especial do labor exercido sob exposição ao calor proveniente de fontes naturais, de forma habitual e permanente, desde que comprovada a superação dos patamares estabelecidos no Anexo 3 da NR-15/TEM, calculado o IBUTG de acordo com a fórmula prevista para ambientes externos com carga solar. Retorno dos autos à Turma Recursal de origem para que proceda a um novo julgamento com base nas conclusões constantes no PPP, nos termos da Questão de Ordem n. 20/TNU. (TNU - PEDILEF: 05030150920154058312, Relator: JUIZ FEDERAL FERNANDO MOREIRA GONÇALVES, Data de Julgamento: 30/08/2017, Data de Publicação: 25/09/2017) Relativamente à perícia por similaridade, antes da Lei n. 9.032, de 28/4/1995, a comprovação do labor em condições especiais de insalubridade fazia-se, em regra, mediante o enquadramento da profissão ou atividade profissional nos termos dispostos nos Anexos dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, posteriormente ratificados pelos Decretos n. 357/91 e 611/92 (STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016). Para tanto, na hipótese de sujeição a agentes físicos, químicos ou biológicos, bastava informação, fornecida pela empresa, da presença do agente nocivo no local onde se desenvolvia a atividade. Depois da Lei n. 9.032/1995 e até a edição do Decreto n. 2.172, de 5/3/1997, além de a atividade ou o agente nocivo precisar estar previsto nos Regulamentos, tornou-se necessário comprovar contato com a essa substância, o que se fazia pela apresentação de formulários emitidos pelo empregador, uma vez que a legislação, a esse tempo, contentava-se com estes documentos: primeiro, o “SB 40”; depois, o “DSS8030”, que o substituiu, Neles eram lançadas as informações pertinentes às atividades exercidas (RIBEIRO, Maria Helena Carreira Alvim. Aposentadoria Especial. 3ª ed. Curitiba: Ed. Juruá, 2010, p. 114) Editado o Decreto n. 2.172, de 5/3/1997, os formulários, subscritos por médicos ou engenheiros do trabalho, precisariam, necessariamente, estar estribados em laudos periciais. Igualmente a Medida Provisória n. 1.523, de 11/10/96, posteriormente convalidada pela MP 1.596-14, de 10/11/1997, convertida na Lei n. 9.528/97, que estipulou nova redação ao artigo 58 da Lei n. 8.213/91, reafirmou a necessidade de laudo técnico, além de estabelecer que os agentes nocivos seriam definidos por ato do Poder Executivo e instituir o perfil profissiográfico (§4º), definindo seus elementos. O regramento do perfil profissiográfico citado no novo art. 58, § 4º, da Lei n. 8.213/91, depois denominado, no Decreto n. 4.032, de 26/11/2001, “Perfil Profissiográfico Previdenciário” (PPP), somente veio com a Instrução Normativa INSS n. 78, de 16/7/2002, que o criou formalmente, estipulando-lhe o modelo. Previsto para entrar em vigor em 1/1/2003, sua efetiva introdução, porém, só ocorreu em 1/1/2004. Nesse contexto, existente e ativa a empresa, é imprescindível a apresentação de prova da presença do agente nocivo na forma da legislação vigente à época, o que, principalmente após a Lei n. 9.032/1995, requer laudo pericial. Somente se a empresa em que a parte trabalhou estiver inativa, não possuir representante legal e, neste último caso, faltarem laudos técnicos ou formulários, é que se poderia aceitar a perícia por similaridade, como única forma de comprovar a insalubridade no local de trabalho. Tratar-se-ia, nesse caso, de laudo técnico comparativo entre as condições alegadas para determinada época e as suportadas em outras empresas, supostamente semelhantes no mesmo período, ao qual pode agregar-se a oitiva de testemunhas. Para verossimilhança das constatações, porém, é preciso que o laudo descreva, com clareza e precisão: São inaceitáveis laudos genéricos que não traduzam, de modo claro e preciso, as reais condições vividas pela parte em determinada época, bem como a especificidade das condições encontradas em cada uma das empresas. Evidentemente, caso o expert valha-se de informações fornecidas exclusivamente pela parte autora, deve ter-se por comprometida a validade das conclusões, em razão da parcialidade. Dito isto, não há cerceamento do direito de defesa no indeferimento ou rejeição de laudo de perícia indireta genérico, que não comprove, cabalmente, a similaridade de circunstâncias (modo de produção, ambiente de trabalho) existentes à época entre a empregadora e a empresa paradigma, e não aponte, precisamente, o agente nocivo ao qual estavam sujeitos os trabalhadores de setor similar àquele no qual trabalhou a pessoa que pretende ser beneficiada, bem como a habitualidade e permanência dessas condições. <#No caso dos autos, verifico que a parte autora apresentou comprovantes do Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) a indicar que a empresa Sobar S.A Alcool e Derivados está inativa (doc. 02, fl. 98/102). Não obstante, teve o pedido de perícia por similaridade rejeitado pelo juízo de origem. Acerca dessa hipótese, a Turma Nacional de Uniformização (TNU) entende que, "é possível a realização de perícia indireta (por similaridade) se as empresas nas quais a parte autora trabalhou estiverem inativas, sem representante legal e não existirem laudos técnicos ou formulários, ou quando a empresa tiver alterado substancialmente as condições do ambiente de trabalho da época do vínculo laboral e não for mais possível a elaboração de laudo técnico, observados os seguintes aspectos: (i) serem similares, na mesma época, as características da empresa paradigma e aquela onde o trabalho foi exercido, (ii) as condições insalubres existentes, (iii) os agentes químicos aos quais a parte foi submetida, e (iv) a habitualidade e permanência dessas condições". No mesmo julgado, a TNU concluiu que "são inaceitáveis laudos genéricos, que não traduzam, com precisão, as reais condições vividas pela parte em determinada época e não reportem a especificidade das condições encontradas em cada uma das empresas" e que "não há cerceamento do direito de defesa no indeferimento ou não recebimento da perícia indireta nessas circunstâncias, sem comprovação cabal da similaridade de circunstâncias à época" (TNU, Pedido 50229632220164047108, Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Presidência), Relator(a) Ministro Raul Araújo – Turma Nacional de Uniformização; Data da Decisão 30/11/2017; Data da Publicação 30/11/2017 – grifos nossos). Ora, considerando a orientação jurídica à qual esta instância está jungida, e a fim de que seja respeitado o contraditório e a ampla defesa, entendo que a sentença deva ser anulada, para que se reabra a instrução probatória para realização de perícia por similaridade, formulando-se laudo técnico comparativo entre as condições e temperaturas suportadas em outras lavouras semelhantes, para mesma época e região, ao qual pode agregar-se a oitiva de testemunhas. Registre-se que a empresa paradigma deve ser indicada pelo autor, posto que somente este conhece as condições em que exerceu a atividade e poderá, com mais segurança, arrolar empresa que traduza condições semelhantes. Não por outra razão, é seu, nos termos da lei, o ônus da prova. Ademais, caso fosse o Juízo a proceder à indicação, além da dificuldade de selecionar paradigma adequado, haveria o risco de se utilizar, sempre, a mesma empresa como tal, de modo a eventualmente propiciar distorções de vulto capaz de macular a prova técnica. Ante o exposto, anulo de ofício a sentença para que os autos retornem à origem para complementação da instrução processual, nos termos da fundamentação acima, e, por conseguinte, seja proferida nova sentença. Tendo em vista a existência de disposição específica na Lei nº. 9.099/95, não se aplicam subsidiariamente as disposições contidas no art. 85 da Lei nº 13.105/2015, razão pela qual não há condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO – APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – AVERBAÇÃO DE TEMPO – ATIVIDADE ESPECIAL -NATUREZA INSALUBRE – CORTADOR DE CANA-DE-AÇÚCAR – AGENTE NOCIVO CALOR – ANEXO 3 DA NR-15/MTE