APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002280-72.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002280-72.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Embargos de declaração (Id. 183164503) de acórdão assim ementado (Id. 164761285): “PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. - A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal. - A prova produzida, inconsistente, é insuficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado. - Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.” Sustenta o embargante, em síntese, que existe omissão e contradição no julgado, uma vez que "deixou de considerar que, após o ano de 2016, o autor retornou às atividades rurais, na condição de TRABALHADOR RURAL POLIVANTE, de 2017 à 2019 (vide CTPS de fls. 26/31). Portanto, tal situação não faz com que o autor perca sua qualidade de segurado especial, uma vez que, logo em seguida, retornou às atividades campesinas, o que não fora considerado pela Nobre Julgadora. Daí consiste a omissão na decisão, ora embargada”. Alega, que “Ainda, acerca da comprovação da condição de trabalhador rural, vale ressaltar a prova testemunhal trazida aos autos (fls. 169 áudio/vídeo), sob o crivo do contraditório, na qual ambas as testemunhas foram uníssonas e coerentes em afirmam que desde que conhecem o autor, o mesmo sempre trabalhou no meio rural". Requer “se digne sanar a omissão e contradição acima apontada, para, atribuindo efeitos infringentes aos presentes embargos, reforme o acórdão de fls., de forma a restabelecer a sentença proferida pela MM. Juíza a quo., mantendo a liminar concedida até que se esgotem os recursos cabíveis, por representar a verdadeira J U S T I Ç A!!!” (Id 183164503). Em 17.09.2021, foi juntada informação, revelando que foi cessado o benefício n.º 41/197.698.384-0, “em face da revogação da tutela” (Id 190257207). Regularmente intimada, a parte embargada não se manifestou. É o relatório. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002280-72.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE VITOR DOS SANTOS Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA SILVA DE SOUZA - MS11007-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Os embargos de declaração têm por objetivo o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, ou, como se extrai da obra de Cândido Rangel Dinamarco, "a função estrita de retificar exclusivamente a expressão do pensamento do juiz, sem alterar o pensamento em si mesmo" (Instituições de Direito Processual Civil, São Paulo, Malheiros, p. 688), não se prestando, portanto, a nova valoração jurídica do conteúdo probatório e fatos envolvidos no processo. Ao contrário, de acordo com o ensinamento de José Carlos Barbosa Moreira, seu provimento se dá sem outra mudança no julgado, além daquela consistente no esclarecimento, na solução da contradição ou no suprimento da omissão (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, p. 556). Cabíveis tão-somente para completar a decisão omissa, aclarar a decisão obscura ou ambígua, suprir a contradição presente na fundamentação ou corrigir, a partir do Código de Processo Civil de 2015, o erro material (art. 1.022, I a III, CPC) – o acórdão é omisso se deixou de decidir algum ponto levantado pelas partes ou se decidiu, mas a sua exposição não é completa; obscuro ou ambíguo quando confuso ou incompreensível; contraditório, se suas proposições são inconciliáveis, no todo ou em parte, entre si; e incorre em erro material quando reverbera inexatidão evidente quanto àquilo que consta nos autos –, não podem rediscutir a causa, reexaminar as provas, modificar a substância do julgado, também não servindo, os embargos de declaração, à correção de eventual injustiça. No caso dos autos, embora ventilada a ocorrência de hipóteses do art. 1.022 do Código de Processo Civil, relacionadas sobretudo à inobservância da adequada valoração das provas quanto à demonstração do exercício da atividade rural da parte autora pelo prazo exigido em lei, os argumentos apresentados não impressionam a ponto de recomendar o reparo da decisão. Isso porque o movimento recursal é todo desenvolvido sob a perspectiva de se obter a alteração do decreto colegiado em sua profundidade, em questionamento que diz respeito à motivação desejada, buscando o ora recorrente, inconformado com o resultado colhido, rediscutir os pontos firmados pelo aresto, quando, sabe-se bem, o órgão julgador não se vincula aos preceitos indicados pelas partes, bastando que delibere aduzindo os fundamentos para tanto considerados, conforme sua livre convicção. Na presente hipótese, o julgado dispôs expressamente, in verbis: “Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução. APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL) O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91. Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único). Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício. Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família. Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício. O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios. Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo. Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz). Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei. Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006. Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06. Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”. É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo. Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal. Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:” "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". DO CASO DOS AUTOS O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 08.05.2019, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses. Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se: - certidão de casamento, celebrado em 23.03.1985, qualificando o autor como lavrador; - certidões de nascimento das filhas do requerente, registradas em 03.05.1986 e 01.07.1993, qualificando-o como lavrador e - CTPS do demandante, com registros de atividades em serviços rurais nos períodos de 01.09.1983 a 30.10.1984, 01.05.1985 a 20.10.1985, 01.08.1986 a 31.03.1987, 01.08.1987 a 31.12.1991, 01.03.1995 a 10.04.1995, 15.08.1996 a 30.08.1996, 01.08.1997 a 11.09.1997, 02.05.1998 a 30.11.1998, 27.04.2000 a 26.08.2000, 01.10.2000 a 30.08.2003, 01.06.2004 a 20.09.2004, 01.06.2006 a 22.07.2006, 01.06.2017 a 01.10.2017, 04.06.2018 a 17.08.2018, 07.01.2019 a 07.03.2019 e 17.06.2019 a 09.08.2019, bem como atividades urbanas de 11.05.1994 a 21.10.1994 no cargo: “servente” e 26.09.2006 a 31.08.2016, no cargo “Armazenista”. O INSS juntou com a contestação as informações do Sistema CNIS da Previdência Social em nome do autor, constando os registros indicados na CTPS, exceto os períodos de 01.09.1983 a 30.10.1984, 01.05.1985 a 20.10.1985 e 01.08.1986 a 31.03.1987, bem como o recebimento auxílio-doença por acidente do trabalho de 24.03.1993 a 10.05.1993. Cabe ressaltar a existência de prova oral. As testemunhas declaram genericamente que conhecem a parte autora há bastante tempo e afirmam o alegado labor rural. O valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir a profissão exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar, é inconteste. No entanto, embora o requerente tenha trazido início de prova material do exercício de atividade rural em seu nome, este passou a exercer atividades predominantemente urbanas, em contraposição ao declarado pelas testemunhas. Cumpre mencionar que conforme consulta detalhada no sistema CNIS acima mencionado, realizada em 14.07.2021, verifica-se que o vínculo empregatício de 26.09.2006 a 31.08.2016, possui a natureza da atividade urbana com as seguintes ocupações: - De 26.09.2006 a 31.03.2009, como almoxarife – 4141-05; - De 01.04.2009 a 30.04.2009, como armazenista – 4141-10; - De 01.05.2009 a 31.08.2009, como almoxarife – 4141-05; - De 01.09.2009 a 31.10.2009, como armazenista – 4141-10; - De 01.11.2009 a 28.02.2010, como almoxarife – 4141-05; - De 01.03.2010 a 31.03.2010, como armazenista – 4141-10; - De 01.04.2010 a 31.07.2010, como almoxarife – 4141-05; - De 01.08.2010 a 31.08.2010, como armazenista – 4141-10; - De 01.09.2010 a 31.08.2011, como almoxarife – 4141-05; - De 01.09.2011 a 30.09.2011, como armazenista – 4141-10 e - De 01.10.2011 a 31.08.2016, como almoxarife – 4141-05; Dessa forma, embora a documentação juntada qualifique o autor como lavrador, não é suficiente esse início de prova material a corroborar o exercício da atividade rural, eis que o conjunto probatório é insuficiente para demonstrá-lo pelo prazo exigido em lei. Esclareça-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário. De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido. Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça. Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado. Revogo a antecipação dos efeitos da tutela concedida”. Em verdade, discordante com o encaminhamento dado pelo colegiado julgador, o que se tem é o embargante pretendendo sua rediscussão pela via dos declaratórios, em que pese o deslinde escorreito da controvérsia aqui renovada, apenas resolvendo-se-a sob perspectiva distinta, contrariamente a seus interesses. Por fim, o entendimento da 3.ª Seção deste Tribunal é firme em que o "escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recurso especial ou extraordinário perde a relevância, em sede de embargos de declaração, se não demonstrada ocorrência de qualquer das hipóteses de cabimento previstas em lei." (n.º 5001261-60.2018.4.03.0000, 3.ª Seção, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, j. 29.4.2020). Dito isso, nego provimento aos embargos de declaração. É o voto. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO EMBARGADO. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO JULGADO.
- Os embargos de declaração têm por objetivo o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional devida, não se prestando a nova valoração jurídica dos fatos e provas envolvidos na relação processual, muito menos a rediscussão da causa ou correção de eventual injustiça.
- Embora ventilada a existência de hipóteses do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os argumentos apresentados não impressionam a ponto de recomendar o reparo da decisão, porquanto o movimento recursal é todo desenvolvido sob a perspectiva de se obter a alteração do decreto colegiado em sua profundidade, em questionamento que diz respeito à motivação desejada, buscando a ora recorrente, inconformada com o resultado colhido, rediscutir os pontos firmados pelo aresto.
- O órgão julgador não se vincula aos preceitos indicados pelas partes, bastando que delibere aduzindo os fundamentos para tanto considerados, conforme sua livre convicção.
- Embargos de declaração aos quais se nega provimento.