APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000911-34.2016.4.03.6114
RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
APELADO: RODRIGO DOS SANTOS SILVA
Advogado do(a) APELADO: GISELLE CRISTIANE ROBERTO DOS SANTOS - SP315906-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000911-34.2016.4.03.6114 RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: RODRIGO DOS SANTOS SILVA Advogado do(a) APELADO: GISELLE CRISTIANE ROBERTO DOS SANTOS - SP315906-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de mandado de segurança impetrado em face de ato do SUPERINTENDENTE REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO, com pedido de liminar, objetivando, em síntese, a concessão da ordem a fim de ser determinado que a autoridade impetrada acate sentença arbitral para fins de liberação de parcelas de seguro-desemprego. Em primeiro grau a segurança foi concedida, "para reconhecer o direito do Impetrante à liberação do seguro-desemprego, devendo a Autoridade Impetrada regularizar o pagamento das parcelas devidas, se inexistentes outros óbices afora a questão aqui resolvida.Sem honorários advocatícios". Em apelação requer a União a reforma da r. sentença, alegando, em síntese, que no âmbito do Direito Individual do Trabalho, a aplicação da sentença arbitral não é acolhida, tendo em conta a presença dos princípios da indisponibilidade e irrenunciabilidade, inerentes ao ramo do Direito Laboral. Conclui, outrossim, que a Lei 9.307/96 não conferiu jurisdição ao árbitro para decidir controvérsias relativas a direitos indisponíveis, o que inclui a liberação do seguro-desemprego. Contrarrazões pelo desprovimento da apelação. Em parecer o Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito. A r. sentença "a quo" está sujeita ao reexame necessário. É o relatório. mds
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000911-34.2016.4.03.6114 RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: RODRIGO DOS SANTOS SILVA Advogado do(a) APELADO: GISELLE CRISTIANE ROBERTO DOS SANTOS - SP315906-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A apelação e o reexame não merecem provimento. Dispõem os artigos 2º e 3º da Lei nº 7.998/90: "Art. 2º O programa do seguro-desemprego tem por finalidade: I - prover assistência financeira temporária ao trabalhador desempregado em virtude de dispensa sem justa causa, inclusive a indireta, e ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo; II - auxiliar os trabalhadores na busca ou preservação do emprego, promovendo, para tanto, ações integradas de orientação, recolocação e qualificação profissional. Art. 3º Terá direito à percepção do seguro-desemprego o trabalhador dispensado sem justa causa que comprove: I - ter recebido salários de pessoa jurídica ou de pessoa física a ela equiparada, relativos a: (Redação dada pela Lei nº 13.134, de 2015) a) pelo menos 12 (doze) meses nos últimos 18 (dezoito) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da primeira solicitação; (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015) b) pelo menos 9 (nove) meses nos últimos 12 (doze) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando da segunda solicitação; e (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015) c) cada um dos 6 (seis) meses imediatamente anteriores à data de dispensa, quando das demais solicitações; II - (Revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.134, de 2015) III - não estar em gozo de qualquer benefício previdenciário de prestação continuada, previsto no Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, excetuado o auxílio-acidente e o auxílio suplementar previstos na Lei nº 6.367, de 19 de outubro de 1976, bem como o abono de permanência em serviço previsto na Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973; IV - não estar em gozo do auxílio-desemprego; e V - não possuir renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família. VI - matrícula e frequência, quando aplicável, nos termos do regulamento, em curso de formação inicial e continuada ou de qualificação profissional habilitado pelo Ministério da Educação, nos termos do art. 18 da Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ofertado por meio da Bolsa-Formação Trabalhador concedida no âmbito do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), instituído pela Lei no 12.513, de 26 de outubro de 2011, ou de vagas gratuitas na rede de educação profissional e tecnológica. (Incluído pela Lei nº 13.134, de 2015)". Pois bem, por primeiro, penso fundamental destacar que, uma vez comprovada, sem sombra de dúvidas, a contingência prevista em lei - desemprego, c.c os demais requisitos legais, previstos nos artigos 2º e 3º da Lei nº 7.998/1990 supracitados -, o benefício não pode deixar de ser concedido pela autoridade impetrada, sob o fundamento da nulidade do procedimento de arbitragem quando tutelados direitos indisponíveis, já que a eventual nulidade daquele procedimento não prejudica a legitimidade da concessão do seguro-desemprego, lastreada tão somente na ocorrência de seu fato gerador, o desemprego em razão de dispensa sem justa causa. Com efeito, se a norma em questão foi instituída visando exatamente à proteção do trabalhador que se encontra temporariamente em situação de vulnerabilidade, parece-me claro que o seguro-desemprego, uma vez preenchidos todos os requisitos legais, deve ser imediatamente liberado ao trabalhador, independentemente de qual tenha sido o procedimento que formalizou a sua rescisão. Ademais, sendo a norma protetiva, é evidente que eventuais vícios no processo de rescisão do contrato de trabalho não poderão ser afastados da apreciação do Poder Judiciário, sendo nula qualquer cláusula em sentido contrário, eventualmente constante do termo rescisório. E, no caso da arbitragem, o raciocínio é exatamente o mesmo, isto é, sendo verificados abusos pelo empregador como condição à rescisão contratual, a homologação extrajudicial poderá ser impugnada perante o Poder Judiciário, ainda que a sentença arbitral seja, por lei, equiparada a decisão judicial. Por essas razões, o simples fato de a rescisão trabalhista ser formalizada por meio da arbitragem, por si só, não torna o trabalhador mais vulnerável, já que permanecerá contando com o acesso pleno à tutela jurisdicional do estado, em casos de eventuais abusos ou má-fé da parte adversa ou mesmo de aplicação errônea da lei pelo juízo arbitral, conforme, inclusive, preceituado no art. 5º, inciso, XXXV, da CF/88, segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, imperativo este que é compatível com a Lei nº 9.307/96. Nesse sentido, é o quanto dispõe o artigo 33 da Lei nº 9.307/96, "verbis": "Art. 33. A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei". (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015) Relevante asseverar, ainda, que o fato de a convenção de arbitragem tratar de direitos indisponíveis não mais impede o procedimento previsto na Lei 9.307/96, porquanto seu artigo 25 foi expressamente revogado pela Lei nº 13.129, de 2015, circunstância que vem a corroborar a tese aqui defendida, inclusive, para todos os fatos anteriores à citada revogação. Assim, é destituída de razoabilidade a fundamentação da autoridade impetrada, lastreada na indisponibilidade dos direitos do impetrante, porquanto, como visto, eventual prejuízo na esfera desses direitos permanece sendo resguardado através da tutela jurisdicional estatal, à luz do artigo 5º, XXXV, da CF/1988, de modo que não pode o trabalhador desempregado restar desamparado pelo Estado, com fundamento em normas e princípios que visam à sua própria proteção. Em outras palavras, a irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas não pode servir em prejuízo daquele a quem a própria lei buscou amparar, de maneira que, ocorrida e provada a contingência - desemprego em razão de dispensa sem justa causa, c.c os demais requisitos da Lei nº 7.998/90 -, o benefício em questão deve ser concedido sem oposições pela Administração Pública, e, no caso de eventuais prejuízos de ordem trabalhista e/ou previdenciária, decorrentes da convenção de arbitragem, terá o trabalhador a tutela jurisdicional do estado como amparo ao correto cumprimento da lei e da Constituição Federal, nos termos do artigo 33 da Lei nº 9.307/96. Sobre o tema, cito decisão deste E. Tribunal, da lavra da eminente Desembargadora Federal Tânia Marangoni, nos autos nº 201661000207090: "Todavia, entendo que, no caso em questão, a homologação de rescisão trabalhista por sentença arbitral mostra-se plenamente válida e não viola o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas ao reconhecer a demissão imotivada. Tal se dá porque a indisponibilidade não pode ser invocada com a finalidade de prejudicar os próprios destinatários das normas, ou seja, os trabalhadores e segurados da Previdência. Nessa hipótese, a negativa, e não a utilização da arbitragem, é que prejudicaria o próprio direito indisponível". Nesse mesmo sentido: "ADMINISTRATIVO. FGTS. DESPEDIDA IMOTIVADA. LEVANTAMENTO DOS DEPÓSITOS. ARBITRAGEM. DIREITO TRABALHISTA. 1. A questão relativa à interveniência do sindicato ou do órgão do Ministério do Trabalho na resilição do contrato laboral não foi devidamente prequestionada, pois o acórdão recorrido nada falou a respeito do dispositivo legal mencionado pela recorrente (art. 477, § 1º, da CLT), ou da matéria nele tratada, não tendo a parte manejado os aclaratórios. Incidência da Súmula 356/STF. 2. Configurada a despedida imotivada, não há como negar-se o saque sob o fundamento de que o ajuste arbitral celebrado é nulo por versar sobre direito indisponível. O princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas milita em favor do empregado e não pode ser interpretado de forma a prejudicá-lo como pretende a recorrente.(destaque nosso) 3. Descabe examinar se houve ou não a despedida sem justa causa, fato gerador do direito ao saque nos termos do art. 20, I, da Lei 8.036/90, pois, conforme a Súmula 7/STJ, é vedado o reexame de matéria fática na instância especial. 4. Recurso especial improvido." (STJ, 2ª Turma, REspn.º 635156/BA, rel. Min. Castro Meira, j. em 1º.6.2004, unânime, DJU de 9.8.2004, p. 261)." "PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. JULGAMENTO DE APELAÇÃO PELO ART. 557 DO CPC. POSSIBILIDADE. SEGURO DESEMPREGO. RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO. HOMOLOGAÇÃO POR SENTENÇA ARBITRAL. POSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO. 1. O ordenamento jurídico pátrio prevê expressamente a possibilidade de julgamento da apelação pelo permissivo do Art. 557, caput e § 1º-A do CPC, nas hipóteses previstas pelo legislador. O recurso pode ser manifestamente improcedente ou inadmissível mesmo sem estar em confronto com súmula ou jurisprudência dominante, a teor do disposto no caput, do Art. 557 do CPC, sendo pacífica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a esse respeito. 2. A indisponibilidade dos direitos trabalhistas e previdenciários, como, por exemplo, o seguro-desemprego, é atributo que não se deve invocar com a finalidade de prejudicar os destinatários das normas, no caso, trabalhadores e segurados da Previdência. A natureza do seguro-desemprego é indissociável do interesse público, haja vista que a concessão de referido benefício visa a amparar o cidadão surpreendido pela contingência prevista na lei. Sua negativa, sem motivo outro que não a alegada imprevisão legal da arbitragem de produzir efeitos nessa seara, quando cediço que o árbitro decide a relação posta à sua apreciação com iguais poderes e responsabilidades de um juiz togado, ao contrário do que se pretende induzir, é que prejudica o direito indisponível sub judice, e não a arbitragem, realizada sob os ditames legais. 3. A Décima Turma desta Corte já se pronunciou, reiteradas vezes, no sentido de que a sentença proferida por arbitragem equipara-se, para todos os efeitos, à sentença judicial, nos termos do Art. 31 da Lei 9.307/96. 4. Recurso desprovido." (TRF3. Proc. 00069153020104036100. AMS - APELAÇÃO CÍVEL - 327229. Órgão julgador: Décima Turma. Relator: Desembargador Federal Baptista Pereira. Data da Decisão: 13/08/2013. Data da Publicação: 21/08/2013). Dessa forma, o caso é de ser negado provimento à apelação da União, mantendo-se a r. sentença "a quo" a fim de que a autoridade impetrada acate a sentença arbitral e analise o pedido de concessão do seguro-desemprego, o qual, caso preenchidos todos os requisitos legais, deverá ser imediatamente liberado ao impetrante. Considerando o longo lapso temporal já decorrido entre a data da impetração até o presente julgamento, o benefício, no caso de preenchidos todos os requisitos legais, deve ser concedido com juros e correção monetária. Ante o exposto, nego provimento à apelação da União e ao reexame necessário. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SEGURO DESEMPREGO. SENTENÇA ARBITRAL. SEGURANÇA CONCEDIDA. APELAÇÃO DA UNIÃO E REEXAME NECESSÁRIO IMPROVIDOS
1. Uma vez comprovada, sem sombra de dúvidas, a contingência prevista em lei - desemprego, c.c os demais requisitos legais, previstos nos artigos 2º e 3º da Lei nº 7.998/1990 supracitados -, o benefício não pode deixar de ser concedido pela autoridade impetrada, sob o fundamento da nulidade do procedimento de arbitragem quando tutelados direitos indisponíveis, já que a eventual nulidade daquele procedimento não prejudica a legitimidade da concessão do seguro-desemprego, lastreada tão somente na ocorrência de seu fato gerador, o desemprego em razão de dispensa sem justa causa.
2. Com efeito, se a norma em questão foi instituída visando exatamente à proteção do trabalhador que se encontra temporariamente em situação de vulnerabilidade, parece-me claro que o seguro-desemprego, uma vez preenchidos todos os requisitos legais, deve ser imediatamente liberado ao trabalhador, independentemente de qual tenha sido o procedimento que formalizou a sua rescisão.
3. Ademais, sendo a norma protetiva, é evidente que eventuais vícios no processo de rescisão do contrato de trabalho não poderão ser afastados da apreciação do Poder Judiciário, sendo nula qualquer cláusula em sentido contrário, eventualmente constante do termo rescisório.
4. O simples fato de a rescisão trabalhista ser formalizada por meio da arbitragem, por si só, não torna o trabalhador mais vulnerável, já que permanecerá contando com o acesso pleno à tutela jurisdicional do estado, em casos de eventuais abusos ou má-fé da parte adversa ou mesmo de aplicação errônea da lei pelo juízo arbitral, conforme, inclusive, preceituado no art. 5º, inciso, XXXV, da CF/88, segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, imperativo este que é compatível com a Lei nº 9.307/96.
5. Assim, é destituída de razoabilidade a fundamentação da autoridade impetrada, lastreada na indisponibilidade dos direitos do impetrante, porquanto, como visto, eventual prejuízo na esfera desses direitos permanece sendo resguardado através da tutela jurisdicional estatal, à luz do artigo 5º, XXXV, da CF/1988, de modo que não pode o trabalhador desempregado restar desamparado pelo Estado, com fundamento em normas e princípios que visam à sua própria proteção.
6. Em outras palavras, a irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas não pode servir em prejuízo daquele a quem a própria lei buscou amparar, de maneira que, ocorrida e provada a contingência - desemprego em razão de dispensa sem justa causa, c.c os demais requisitos da Lei nº 7.998/90 -, o benefício em questão deve ser concedido sem oposições pela Administração Pública, e, no caso de eventuais prejuízos de ordem trabalhista e/ou previdenciária, decorrentes da convenção de arbitragem, terá o trabalhador a tutela jurisdicional do estado como amparo ao correto cumprimento da lei e da Constituição Federal, nos termos do artigo 33 da Lei nº 9.307/96.
7. Considerando o longo lapso temporal já decorrido entre a data da impetração até o presente julgamento, o benefício, no caso de preenchidos todos os requisitos legais, deve ser concedido com juros e correção monetária.
8. Dessa forma, o caso é de improvimento da apelação da União, mantendo-se a r. sentença "a quo", a fim de que a autoridade impetrada acate a sentença arbitral e analise o pedido de concessão do seguro-desemprego, o qual, caso preenchidos todos os requisitos legais, deverá ser imediatamente liberado ao impetrante, com juros e correção monetária.
9. Apelação e reexame necessário improvidos.