Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5007835-94.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: CURVEX PARTICIPACOES LTDA

Advogado do(a) AGRAVANTE: RICARDO PIEDADE NOVAES - SP196356

AGRAVADO: NOVA DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LIMITADA

Advogado do(a) AGRAVADO: FABIO TEIXEIRA OZI - SP172594-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5007835-94.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: CURVEX PARTICIPACOES LTDA

Advogado do(a) AGRAVANTE: RICARDO PIEDADE NOVAES - SP196356

AGRAVADO: NOVA DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LIMITADA

Advogado do(a) AGRAVADO: FABIO TEIXEIRA OZI - SP172594-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por CURVEX PARTICIPACOES LTDA contra decisão proferida nos autos do mandado de segurança impetrado por NOVA DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LIMITADA contra a JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO.

Sustenta a agravante, em síntese, que: a) a ampla defesa e o contraditório não foram exercidos no caso sob exame, e a alegação de que teriam  sido  objeto  de  discussão entre os sócios da impetrante e da impetrada e seus representantes nos meses que antecederam a convocação  representa  ofensa  aos mandamentos constitucionais insculpidos no inciso LX do artigo 5º da Constituição; independentemente  da  conclusão  acerca  da tempestividade  da convocação, a  defesa foi  inviabilizada  diante da  absoluta  ausência  de  elementos  que detalhassem as faltas graves atribuídas à  parte agravante; argumenta que as irregularidades atribuídas a sócio devem ser expressas e não genéricas, e a convocação não  trouxe  o  fato  determinado  imputado  à  agravante nem indicou quando  este teria ocorrido, não havendo como fazer  prova  de  fato que sequer foi alegado; b) que antes da realização da reunião, a agravante requereu expressamente à agravada a disponibilização  de  documentos  e  informações e a  redesignação   do ato para momento  após  a  disponibilização  dos mesmos,  em  prazo  suficiente  para permitir o comparecimento e o exercício do direito de defesa,  mas a providência não foi adotada, o que infringe o art. 1.085 do CPC; c) a reunião de  sócios  ocorreu em  local  diverso  da  sede social, contrariando  o  item  6.3,  capítulo  IV  do  contrato social, tratando-se de elemento formal indispensável à regular convocação para a reunião de sócios, o que também consiste em motivo para que se restabeleça a decisão do Sr. Presidente da Jucesp, que desautorizou o arquivamento das alterações societárias em questão; d) houve descumprimento da cláusula 9.2 do contrato social, segundo a qual “a  exclusão  por  justa  causa  será deliberada  em  reunião  de  sócios  convocada  especialmente  para  esse  fim,  cientificando-se  o  sócio averiguado, com 08 (oito) dias de antecedência para que este compareça na reunião e exerça seu direito de defesa. Os haveres do sócio excluído serão apurados e pagos na forma e prazo previstos no item 10.2 do contrato social.” Afinal, a convocação para a reunião, designada para o dia 19/06/2019, foi recebida pela representante da agravante em 12/06/2019, às 15h45min, ou seja, o período entre o recebimento e a data de realização da reunião não permite o prazo mínimo para defesa; ademais, como já mencionado, a agravante requereu expressamente que lhe fossem disponibilizados documentos relativos às supostas irregularidades, para que pudesse exercer plenamente seu direito de defesa, pedido que foi ignoradoe) foi  desconsiderado pela agravada o  teor  da  parte  final  da mencionada cláusula 9.2 do contrato social, que dispõe que os haveres do sócio excluído serão apurados e pagos na forma e prazo previstos no item 10.2, estabelecendo-se irregulamente condições para o pagamento das cotas do sócios excluído. A agravada ressalta, a seguir, a natureza infringente dos embargos declaratórios acolhidos pela decisão agravada, que, caracterizando-se como extra petita, não se limitou a abordar a omissão alegada (no tocante ao prazo de defesa, avaliado, no entendimento da parte ora agravada, de maneira imprecisa), e passou a avançar em várias direções.  Requer o provimento do recurso para que seja restaurada  a  decisão  proferida  pelo  Presidente  da  Junta  Comercial  do Estado  de  São  Paulo ,  nos autos do  processo  administrativo  Revex  nº997.031/19-0, que determinou o cancelamento do arquivamento nº 362.648/19-0 (exclusão da sócia e ora agravante, Curvex  Participações  Ltda.),  oriundos  da  reunião  de  sócios  da  Nova  Distribuidora  de  Veículos, realizada em 19/06/2019. Pugna pela atribuição de efeito suspensivo ao recurso.

Foi proferida decisão que deferiu o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso, restaurando a decisão proferida pelo Presidente da JUCESP no bojo da decisão proferida no processo administrativo Revex nº 997.031/19-0, que determinou o cancelamento do arquivamento nº 362.648/19-0 (exclusão da sócia Curvex Participações Ltda.), oriundo da reunião de sócios da Nova Distribuidora de Veículos realizada em 19/06/2019.

Contra tal decisão, a agravada NOVA DISTRIBUIDORA DE VEÍCULOS LTDA. interpôs agravo interno (Id. 164722456, com retificação de erro material no Id. 165314427), sustentando, em síntese, que todo o procedimento formal para a exclusão da Curvex foi devidamente observado: convocação da reunião com observância de todas as formalidades cabíveis, deliberação tomada por participação suficiente, ato de inegável gravidade, previsão no contrato social autorizando a exclusão por justa causa, tendo a agravante optado por renunciar ao seu direito de defesa, que lhe foi plenamente assegurado pela sócia majoritária MBS e pela agravada “Nova”.  Assevera que a decisão agravada determinou a publicidade de fato que já está consagrado há mais de 2 anos: a Agravante não faz mais parte dos quadros societários da agravada. Destaca que inicialmente o arquivamento ocorreu sem qualquer exigência por parte da Junta Comercial, posicionamento que só foi alterado após requerimento de revisão apresentado pela agravante. A agravada alega que não há probabilidade do direito ou risco de difícil reparação à agravante Curvex a a justificar a concessão do efeito suspensivo deferido, eis que ao promover a exclusão por justa causa da Curvex, a Nova obedeceu ao requisito formal e, consequentemente, ao requisito temporal previsto no contrato social. Acrescenta que o arquivamento das alterações no contrato social da agravante faria apenas tornar públicas informações que já estão consolidadas e não serão alteradas, especialmente aquelas relacionadas à exclusão da Curvex. Questiona especificamente o fundamento para a concessão do efeito suspensivo: o entendimento do Relator de que prevalece “a data do comprovado recebimento do telegrama contendo a notificação acerca da reunião”. Sustenta que tal entendimento não deve prosperar, por seis motivos: 1) há previsão de possibilidade de comunicação sobre as reuniões por meio eletrônico, conforme consta na cláusula 6.3 do contrato social, existente para otimizar o rito de convocação, especialmente considerando que, àquela época, a Nova era composta apenas por duas sócias – a MBS e a Curvex;  argumenta que não faria sentido que a mesma cláusula que permite maior celeridade nos atos internos da sociedade representasse entrave para sua conclusão; sustenta que, “ao pé da letra”, a cláusula 6.3 apenas determina que seja possível a confirmação do recebimento, sem que esta seja obrigatória para que a convocação seja considerada perfeita; sustenta ser plenamente possível confirmar o recebimento de um e-mail, sendo uma das formas para tanto ocorre quando o destinatário acusa o recebimento, como fez o Sr. Roberto, na condição de sócio-administrador da Curvex, ao confirmar que recebeu o e-mail enviado no dia 10 de junho; a possibilidade de “erro” na menção ao dia 10/06/19, aliás, nunca foi alegada pela Curvex; os sócios da agravante e agravada sempre se comunicaram através do email mencionado na decisão agravada, não havendo qualquer sentido ou respaldo  na sugestão de que o e-mail ali mencionado não seria do sócio administrador da Curvex; 2)  a Curvex não refutou, em momento nenhum do Mandado de Segurança de origem ou mesmo no agravo de instrumento, a sua resposta ao e-mail enviado em tempo hábil pela Nova para a convocação da Curvex para a reunião de sócios, nem alegou que teria havido erro na indicação de que, de fato, recebeu o e-mail no dia 10 de junho de 2019;  caso o faça convenientemente em resposta ao presente recurso, deverá ser punida por má-fé processual e por faltar com a verdade; em síntese, a base para a conclusão pela concessão de efeito suspensivo nunca foi alegada pela Curvex; 3)  a cláusula 6.4 do contrato social prevê que “[a]s formalidades de convocação serão dispensadas quando todos os sócios comparecerem à reunião ou se declararem, por escrito, cientes do local, data e ordem do dia” , o que reflete o teor do artigo 1.072, §2º, do Código Civil; no caso dos autos, a Curvex enviou, em 12/06/19 (antes, portanto, da resposta à mensagem de convocação para a reunião), no endereço em que seria realizada a reunião de sócios, notificação referente à reunião geral extraordinária, indicando ter conhecimento sobre a data e ordem do dia e local da reunião; 4) a reunião sequer precisava acontecer, diante do disposto no parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil, que prevê que “[r]essalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa”  (a Nova, na época, tinha apenas duas sócias em seu quadro societário); 5) O pedido de alteração na data da reunião não poderia ser acolhido, diante do crime praticado, que gerou milhões em prejuízos e não deixou margem para tanto, ainda mais diante do cumprimento de todas as formalidades necessárias à convocação para reunião; 6) a Curvex sequer teria interesse recursal, uma vez que busca discutir o mérito da exclusão em sede inadequada e é apenas assistente litisconsorcial do polo passivo; a JUCESP (autoridade coatora) não apresentou agravo de instrumento contra a decisão proferida em primeira instância, acatando seus termos. Por fim, ressalta a possibilidade de dano reverso ocasionado pela manutenção da decisão que concedeu efeito suspensivo ao recurso: o não arquivamento do ato não possui como efeito prático invalidar a exclusão da Curvex, o que somente poderia ser determinado pela Justiça Estadual e em sede própria; impede tão somente que terceiros tenham conhecimento das informações reais da “Nova”. Acrescenta que o não arquivamento acarretará novas recusas ao registro de outras alterações de contrato social, pois a JUCESP apresentará “exigências”, informando haver incompatibilidade quanto ao quadro societário. Requer, enfim, a reforma da decisão, indeferindo-se o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao agravo de instrumento.

A agravada “Nova” apresentou, ainda, contrarrazões ao agravo de instrumento (Id. 165087818).

A agravante Curvex apresentou contrarrazões ao agravo interno (Id. 178620754), destacando-se, dos argumentos elencados na peça, que a “comprovação da data da convocação não pode se pretender por dedução, conforme almeja a Recorrente, na defesa de sua tese neste recurso”.  Assevera que “a prova do cumprimento de formalidades, em um caso como o presente, não pode ser feita por deduções e conjecturas, ainda mais mediante o uso limitado e distorcido de palavras da parte ofendida, tiradas de comunicação na qual esta, inclusive, expressamente, se insurgia contra o cerceamento de seus direitos de defesa”.  Argumenta que a validade do comprovante teria que se materializar de forma direta e autônoma, o que, no caso dos autos, só ocorre com o telegrama, enviado de forma intempestiva.  Atribui à Nova a intenção de cercear seu direito de defesa. Ressalta que jamais se recusou a comparecer à reunião e intentou obter detalhamento mais preciso dos elementos pelos quais lhe estavam sendo dirigidas gravíssimas acusações, buscando adiar a reunião, com a garantia de um prazo razoável para a sua defesa. Rechaça os argumentos de que O argumento de que a questão era “urgente”, envolvia fatos “criminosos” e prejuízos de “milhões”, pois os eventos alegados ocorreram há muitos anos e sempre foram de conhecimento da recorrente.  Sustenta que o ônus da indefinição e irregularidade  societária foi provocado pela própria Nova, que não pode pretender se aproveitar de suas próprias falhas para tentar convencer que, como o fim da sociedade parece inevitável, deve-se desconsiderar os direitos de defesa da sócia excluída e a circunstância de que vem sendo privada da conta de seus haveres.

É o relatório.

 

 

 

 

 


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V O T O

 

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO:  A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:

“Vistos em embargos de declaração.

Petição ID 44850718: Trata-se de declaração tempestivamente opostos por Nova Distribuidora de Veículos Ltda., com fulcro no artigo 1.022, inciso II, do Código de Processo Civil, sob o argumento de omissão na decisão ID 44165382.

A embargante assevera que a decisão embargada, ao conceder em parte a medida liminar tão somente para alterar o endereço da filial estabelecida em Ribeirão Preto-SP no registro mercantil, entendeu que não era possível conceder a integralidade da tutela, porquanto a impetrante, ora embargante, não teria cumprido o prazo mínimo de 8 dias para convocação da reunião de sócios que culminou com a exclusão da Curvex, por justa causa.

Entretanto, conforme sustenta a embargante, há comprovação nos autos de que a convocação foi recebida pelo administrador da Curvex, por e-mail, em 10.06.2019, portanto 9 dias antes da realização da reunião em 19.09.2019, cumprindo assim a cláusula 9.2 do contrato social.

Destaca que a Curvex jamais alegou não ter sido convocada em tempo hábil para a reunião.

Curvex Participações Ltda. manifestou-se pelo desprovimento dos embargos de declaração (ID 46022651), sob o argumento de que inexistiria a omissão apontada.

Argumenta, ainda, que o vício apontado nos embargos não teriam o condão de modificar a decisão, porquanto a exclusão do sócio teria ofendido o garantia da ampla defesa substancial.

Aponta que a comunicação enviada não elenca as acusações contra a Curvex para que delas pudesse se defender, limitando-se a mencionar que a deliberação se daria “em razão da prática, por tal sócia, de atos de inegável gravidade que colocaram (e colocam) em risco a continuidade da EMPRESA, acarretando desinteligência grave e quarando-se por completo a affectio societatis”.

Aduz que reiteradamente solicitou o envio de informações e documentos acerca das acusações, assim como a concessão de prazo para articular a defesa, porém a sócia majoritária se recusou a adequar a convocação aos parâmetros legais e de razoabilidade.

Jucesp manifestou-se sucintamente pelo desprovimento dos embargos (ID 46978833).

É a síntese do necessário. Fundamentando, decido.

Os embargos de declaração postos à disposição das partes litigantes se prestam para esclarecer, interpretar ou completar pronunciamento judicial, exclusivamente em benefício de sua compreensão ou inteireza, sem cuidado com possível proveito que possa ser trazido ao embargante.

Não visam proporcionar novo julgamento da causa cujo desfecho pode até ser favorável ao embargante como sucederia se fosse recurso no qual necessária a sucumbência como pressuposto.

O objetivo consiste em integrar ou aclarar juízo decisório implícito no julgamento, porém omisso do texto da sentença e devem ser enfrentados pelo mesmo juiz prolator, conforme observa Theotonio Negrão em nota ao artigo 536 do Código de Processo Civil (37ª edição. Nota 5).

A obscuridade tanto pode se apresentar na fundamentação da decisão como no seu “decisum” e na observação de Barbosa Moreira: “a falta de clareza é defeito capital em qualquer decisão”. A omissão ocorre quando o Juiz deixa de apreciar questões relevantes suscitadas pelas partes ou que deveriam ser conhecidas de ofício, com o que, na falta de interposição dos declaratórios, poder-se-ia levar à preclusão da matéria não apreciada e decidida, vedando-se ao tribunal conhecê-la caso não fosse daquelas a serem conhecidas de ofício, pois, em relação a estas, não ocorreria a preclusão (art. 485, § 3º, CPC). A contradição se verifica quando presentes na sentença, pronunciamentos e decisões inconciliáveis entre si.

O antigo Código de Processo Civil de 1973, antes da edição de lei nº 8.950/94, prendia-se à existência de obscuridade, dúvida, contradição ou omissão. Com a edição da Lei nº 8.950/94, houve supressão da expressão “dúvida” reputada consequência de obscuridade ou contradição observada no julgamento, portanto, inócua, o que foi mantido na redação do atual Código de Processo Civil.

Embora haja uma certa relutância em aceitar-se a modificação ou inovação do julgado através dos embargos de declaração, ela inexiste em relação ao “erro material” à partir do entendimento tradicional, inclusive do E. Supremo Tribunal Federal, no sentido de que “a contradição que vicia a inteireza lógica do julgado, constitui verdadeiro erro material, suscetível de modificação pela via de embargos declaratórios” (RE nº 69.765, Rel. Min. Barros Monteiro, RTJ 63/424).

Prestigia-se, assim, o entendimento no sentido de considerar o erro material como uma forma grave de contradição do julgador que, abstraída, resultará em julgamento diverso.

Atualmente, é pacífica a admissão de embargos declaratórios com efeitos modificativos, mesmo que não seja caso de erro material, podendo ocorrer, inclusive, na apreciação das provas do processo, se ocorrer erro manifesto, a ponto de alterar o resultado do julgamento, posição abraçada pelo STJ como observa Humberto Theodoro Júnior, “quando manifesto o equívoco”. Neste sentido, Barbosa Moreira ensina: “Na prática judiciária é sensível a tendência de ampliar essa possibilidade, para ensejar a correção de equívocos manifestos por meio de embargos de declaração”.

Carlos de Araújo Cintra, em estudo na RT 595/17, esclarece que, na potencialidade própria dos embargos de declaração, está contida a força de alterar decisão embargada, na medida em que isto seja necessário para atender a sua finalidade legal de esclarecer obscuridade, resolver contradição ou suprir omissão verificada naquela decisão. Qualquer restrição que se oponha a esta força modificativa dos embargos de declaração nos estritos limites necessários à consecução de sua finalidade específica constituirá artificialismo injustificável, que produzirá a mutilação do instituto.

Assente que os princípios do “due process of law” e da prestação jurisdicional enfeixam um notável conjunto de garantias aos jurisdicionados e a própria doutrina do processo busca desapegar-se das fórmulas que o transformavam em simples técnica de produção de atos e de julgamentos para, reconhecendo-lhe a exata dimensão, torná-lo um veículo eficiente de reconhecimento do direito material que nele se busca, constata-se ser impossível que, em nome da forma se possa amesquinhar o direito, impedindo a prestação jurisdicional em sua plenitude.

Em apertada síntese, prestando-se para esclarecer, interpretar ou completar pronunciamento judicial emitido exclusivamente em benefício de sua compreensão ou inteireza sem cuidado com o possível proveito ao embargante, qualquer decisão judicial termina por comportá-los por não se poder admitir que decisões, quando não definitivas, fiquem desprovidas de um remédio mesmo eivadas de omissão ou obscuridade, comprometendo, inclusive, o seu cumprimento.

Este juízo, diante deste entendimento, tem provido a maior parte dos embargos opostos às decisões por reconhecer que qualquer expressão de linguagem, a escrita em particular, embora indispensável, sofra - sempre e necessariamente - do defeito da insuficiência em relação à ideia que se procura exprimir, o que termina por impor ao interlocutor a exigência de integrar e completar aquela e, assim, se dúvida remanesceu, merece-a o embargante, ainda que em homenagem ao recurso.

No caso dos autos, sustenta a impetrante, ora embargante, que a decisão embargada deve ser modificada porque teve por base premissa equivocada, de que não teria sido respeitado o prazo de antecedência mínimo de convocação para a reunião que culminou com a exclusão da sócia Curvex Participações.

No caso, de fato, da análise do documento ID 43543635, possível depreender que a convocação da reunião geral extraordinária foi encaminhada ao e-mail ras64@[omissis] no dia 10.06.2019, portanto 9 (nove) dias antes da data da reunião em 19.06.2019.

Possível depreender, também, a partir das missivas eletrônicas trocadas entre as partes e seus representantes (ID 44107558, pp. 58-60, 129-130, 188-189, 211-212, 231-232, 273-281; ID 44107569, pp. 16-19, 23-65; etc.) que o endereço de e-mail ras64@[omissis] pertence e é utilizado pelo sócio-administrador da Curvex Participações, Sr. Roberto de Andrade Souza.

Desse modo, afigura-se cumprida a cláusula 9.2 do contrato social quanto à antecedência mínima de 8 (oito) dias para convocação de reunião em que se delibere a exclusão de sócio.

O suposto descumprimento do princípio da ampla defesa e contraditório por não terem sido apontadas as condutas tidas por faltas graves da sócia minoritária não merecem acolhida para invalidar o ato registral, seja porque as missivas eletrônicas carreadas aos autos dão conta de que os atos imputados à Cuvex já eram objeto de discussão entre os sócios e seus representantes nos meses que antecederam à convocação, seja porque, conforme já apontado – e reconhecido pelo próprio legislador positivo ao promover a alteração no parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil que não se aplica ao caso – nas sociedades com apenas dois sócios, o próprio sócio majoritário funciona concomitantemente como acusador e julgador, de modo que a ampla defesa e o contraditório sempre estarão, a princípio, comprometidos, e serão resguardados tão somente de forma postergada, em eventual ação proposta pelo sócio irresignado com sua exclusão.

No caso, há ação que tramita perante a Justiça Estadual (ação nº 1117436-90.2019.8.26.0100), em que a ocorrência ou não da justa causa há de ser analisada.

Nesse contexto, não se afigura supedâneo para a anulação dos atos registrais, dado que cumprida a cláusula restritiva concernente à antecedência mínima de convocação para a exclusão do sócio (art. 34, VI, Lei nº 8.934/1994).

Tampouco há irregularidade na existência de mais de um assunto na reunião, dado que o assunto principal (especial) era a exclusão do sócio minoritário. Ademais, a exclusão do sócio necessariamente acarreta a modificação do contrato social, não havendo que se falar em nulidade do ponto de vista registral por conta disso.

O local de realização da reunião (Avenida Santo Amaro, nº 960, Itaim Bibi, São Paulo-SP), diverso da sede conforme estabelecido no contrato social (Avenida Celso Garcia, nº 5.000, Tatuapé, São Paulo-SP) não tem o condão de infirmar o ato, tendo em vista que localizado na mesma cidade da sede da pessoa jurídica e em local central e de fácil acesso.

Ademais, em mera consulta ao Google Maps (acesso em 23.03.2021, confira-se documento anexo) é possível depreender, segundo captura de imagem datada de junho de 2019, mesmo mês da reunião dos sócios, que o número 5.000 da Avenida Celso Garcia estava desocupado, com vistas à implantação de empreendimento residencial.

Assim, salvo se a Jucesp exigisse que a reunião de sócios fosse realizada em terreno alheio e ao ar livre, não há supedâneo para que deixe de aceitar que fosse realizada em outro endereço. pertencente a filial da própria pessoa jurídica e localizado na mesma cidade.

Por seu turno, a alteração da forma de apuração de haveres é alheia ao espeque da análise registral e, caso seus efeitos consubstanciem inadimplemento de prestação devida à sócia excluída, seja em decorrência de direito garantido por lei, seja adquirido pela redação anterior do contrato, cabe-lhe a via da apuração de haveres e cobrança em ação apropriada na Justiça Estadual.

Desse modo, afigura-se presente a relevância da fundamentação para suspender a decisão da Jucesp que cancelou o arquivamento das modificações do contrato social decorrentes da reunião de sócios ocorrida em 19.06.2019.

Ante o exposto, acolho os embargos de declaração para, diante dos apontamentos supra, que passam a integrar a fundamentação da decisão ID 44165382, alterar a parte dispositiva e DEFERIR A LIMINAR, determinando o imediato arquivamento dos documentos societários NUM.DOC 362.648/19-0 e 362.649/19-4.

Oficie-se a autoridade para ciência e cumprimento.

Intimem-se, com urgência

A decisão embargada, por sua vez, fora proferida nos seguintes termos:

“Trata-se de mandado de segurança impetrado por NOVA DISTRIBUIDORA DE VEÍCULOS LTDA. em face de ato do PRESIDENTE DA JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO, com pedido de medida liminar objetivando determinação “i) para imediatamente suspender os efeitos do Ato Coator e permitir o arquivamento imediato dos documentos societários NUM.DOC 362.648/19-0 e 362.649/19-4 referentes à exclusão da Curvex, permitindo a regularização societária perante terceiros da desvinculação da Curvex à Impetrante; ii) Sucessivamente, na remota hipótese de este MM. Juízo entender não ser possível determinar o imediato arquivamento dos documentos que evidenciam a exclusão da Curvex, requer seja ao menos determinado o imediato arquivamento da alteração de contrato social que alterou o endereço da sede da filial de Ribeirão Preto, até o julgamento definitivo do presente writ, no qual deverá ser reconhecida a ilegalidade do Ato Coator”

Informa que se dedica à comercialização de veículos automotores novos e semi-novos produzidos pela General Motors do Brasil Ltda. (“Chevrolet”) e que, até recentemente, tinha nos seus quadros sociais a MBS Participações Ltda. (“MBS”), detentora de 90% do capital social, e a Curvex Participações Ltda. (“Curvex”), titular dos 10% restantes.

Aduz que, após a descoberta de fraudes pelo administrador de uma das unidades da Impetrante e sócio da Curvex, Sr. Roberto de Andrade Souza (“Roberto”), esta foi excluída da sociedade por deliberação tomada pela sócia majoritária MBS, com anterior investigação interna e após instauração de inquérito policial, e não sem que antes houvesse a convocação da Curvex para reunião de sócios da impetrante para deliberação sobre a sua exclusão da sociedade, por justa causa, nos termos do artigo 1.085 do Código Civil, na qual a sócia não compareceu.

Alega a existência de prejuízos para o impetrante decorrente de tais fatos no montante que supera a casa de R$3.000.000,00 (três milhões de reais).

Sustenta que, a alteração do contrato social do impetrante excluindo a Curvex de seus quadros sociais foi levada a arquivamento perante a Jucesp, que a recebeu sem questionamentos.

Isso não obstante, relata que, em 07.08.2019, a Curvex apresentou requerimento de revisão ex officio dos arquivamentos realizados, alegando supostas irregularidades que podem se resumir em (i) realização da reunião que culminou na exclusão da Curvex em local distinto do endereço da sede social, (ii) ausência de justa causa para a exclusão e (iii) alteração na forma da apuração de haveres dos sócios.

Afirma que, em 24.09.2019, a autoridade impetrada recebeu o requerimento da Curvex e determinou a suspensão dos registros que já haviam sido realizados, em 13.12.2019, a impetrante apresentou defesa administrativa e, em 16.10.2020, a autoridade impetrada decidiu pelo cancelamento do arquivamento dos documentos societários da impetrante, nos quais constava a exclusão da Curvex.

Alega que a Jucesp não efetuou o arquivamento sob a justificativa de que “o quadro societário diverge da JUCESP”.

Explica que, como a Jucesp não arquivou a alteração de contrato social da impetrante, prevendo o novo quadro societário após a exclusão da Curvex, e ainda se recusou a arquivar a alteração de contrato social prevendo a alteração de endereço da filial por entender existir uma divergência no quadro social (dado que, para a Jucesp, a Curvex ainda seria formalmente sócia da impetrante, diante da anulação do arquivamento dos atos societários referentes à exclusão).

Desta forma, alega que se encontra com suas atividades paralisadas sem poder promover a alteração em seu contrato social.

Além do mais, a impetrante necessita realizar o arquivamento de alteração do endereço da filial de Ribeirão Preto, pois o imóvel em que se localizava a filial teve o seu contrato de locação encerrado e, inclusive, já foi transferido a terceiros.

Acerca do direito violado alega que o ato coator consiste na decisão do Presidente da Jucesp que determinou o cancelamento do arquivamento previamente autorizado, pautado em três justificativas equivocadas, a uma, a suposta inobservância do disposto no item 9.2 do Capítulo IV do contrato social da Impetrante, que exige, para exclusão de sócio do seu quadro, reunião convocada especialmente para esse fim, sendo que, na hipótese, a reunião tinha mais de 01 (um) assunto a ser objeto de deliberação, a duas, a suposta inobservância do prazo mínimo de 08 (oito) dias de antecedência para ciência da Curvex, visando ao seu comparecimento e exercício do direito de defesa e, a três, a realização da reunião não no endereço da sede da impetrante, mas sim no de uma filial, o que supostamente seria contrário ao disposto no item 6.3 do Capítulo IV do Contrato Social.

Rebate as justificativas da seguinte forma:

Em relação ao primeiro ponto, assevera que é desnecessária a realização de reunião para exclusão.

Assim, a Jucesp estar-se-ia recusando a arquivar um ato que sequer necessário é, tendo em vista que a Lei nº 13.874/2019 (“Lei da Liberdade Econômica”), já vigente à época da exclusão da Curvex, alterou a redação do parágrafo único do artigo 1.085, tornando desnecessária a reunião para exclusão de sócio em sociedades formadas por apenas dois sócios.

Não bastasse isso, defende que a reunião de exclusão de sócio por justa causa deve ser especialmente convocada para este fim e não exclusivamente para este fim, de forma que não seria incompatível com a existência de mais de um assunto na ordem do dia.

Em relação ao segundo ponto, defende que houve observância do prazo mínimo de 8 (oito) dias para convocação da sócia Curvex, que teria sido devidamente notificada por mensagem eletrônica, na pessoa de seu administrador, para comparecer à reunião, de modo que sua ausência se deu por sua própria livre espontânea vontade e não por não ter sido cientificado da reunião.

Em relação ao terceiro ponto, aduz que a reunião jamais poderia ser realizada no endereço que constava como a sede da sociedade, pois o imóvel havia sido devolvido, sendo que a Curvex teria sido devidamente notificada e estava ciente de que a reunião se realizaria excepcionalmente na unidade administrativa da impetrante, o que estaria claro em seu texto.

Ressalta que tanto seria de conhecimento inequívoco da Curvex o endereço da reunião que, inclusive, enviou notificações sobre o tema da reunião para o endereço indicado para a realização da reunião.

Argumenta, ainda, que a Curvex já está excluída da sociedade e não retornará ao ‘status quo’ pela decisão da Jucesp, que se refere tão somente ao ato necessário para dar publicidade a terceiros.

Por fim, alega que, nos termos do artigo 605, inciso V, do Código de Processo Civil, a Curvex já não compõe os quadros societários da impetrante há mais de um ano, tendo a Jucesp criado uma situação sem saída na qual não arquiva a alteração de contrato social da impetrante que prevê a exclusão da Curvex e não arquiva nenhum outro ato pela ausência de assinatura da Curvex, por lhe reconhecer como sócia – o que jamais poderia ser feito por uma autarquia que possui mera função executiva.

Atribui à causa o valor de R$ 1.000,00. Procuração e documentos acompanham a inicial.

Custas no ID 43598659.

Distribuídos os autos, foi proferida a decisão ID 43637733, postergando a análise do pedido de medida liminar para após a oitiva da autoridade impetrada.

Presidente da Jucesp prestou informações no ofício ID 43762417, defendendo a inexistência de ato ilegal.

Preliminarmente, a autoridade argui que a Curvex Participações Ltda. teria interesse jurídico no deslinde do feito, motivo pelo qual também teria que ser notificada.

No mérito, reproduz os pareceres CJ/Jucesp nºs 690/2019, 926/2019 e 468/2020, que trazem o contorno jurídico das teses em que se sustentou a decisão da Jucesp., e reitera a legalidade do ato de cancelamento dos arquivamentos nºs 362.648/19-0 e 362.649/19-4.

Curvex Participações Ltda. Roberto de Andrade Souza se manifestaram espontaneamente nos autos, apresentando a petição ID 44106694, sustentando, em suma, a inexistência de justa causa para a sua exclusão extrajudicial do quadro de sócios da impetrante, e pugnando pela denegação da segurança.

É o relatório. Fundamentando, decido.

O Mandado de Segurança visa a proteger bens de vida em jogo, lesados ou ameaçados, por atos que se revelem contrários ao direito, seja por faltar à autoridade a competência legal para tanto, seja por desviar-se ela da competência que pela lei lhe é outorgada.

No âmbito do exame da concessão das liminares requeridas verifica-se apenas se estão presentes os requisitos da relevância de fundamentos da impetração e se do ato impugnado pode resultar eventual ineficácia se concedida a ordem apenas ao final, após a necessária cognição exauriente.

Neste exame superficial e pouco aprofundado, próprio das situações de aparência ou de probabilidades exigidas para o caso, presentes os requisitos para a concessão parcial da liminar requerida.

A Lei nº 8.934/1994 estabelece que o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins visa a dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos das empresas mercantis, submetidos a registro, bem como cadastrar as empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no País e manter atualizadas as informações pertinentes (artigo 1º).

Competem às Juntas Comerciais, na qualidade de órgãos locais, as funções executora e administradora dos serviços de registro (artigo 3º, II).

Conforme disposto no artigo 32 do referido Diploma Legal, o registro compreende, dentre outros, o arquivamento de documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas.

Tais documentos devem ser apresentados para arquivamento na Junta dentro de trinta dias contados de sua assinatura, a cuja data retroagirão os efeitos do arquivamento; fora desse prazo, o arquivamento só terá eficácia a partir do despacho que o conceder.

O artigo 35 estabelece as proibições de arquivamento:

“Art. 35. Não podem ser arquivados:

I - os documentos que não obedecerem às prescrições legais ou regulamentares ou que contiverem matéria contrária aos bons costumes ou à ordem pública, bem como os que colidirem com o respectivo estatuto ou contrato não modificado anteriormente;

II - os documentos de constituição ou alteração de empresas mercantis de qualquer espécie ou modalidade em que figure como titular ou administrador pessoa que esteja condenada pela prática de crime cuja pena vede o acesso à atividade mercantil;

III - os atos constitutivos de empresas mercantis que, além das cláusulas exigidas em lei, não designarem o respectivo capital, bem como a declaração precisa de seu objeto, cuja indicação no nome empresarial é facultativa;

IV - a prorrogação do contrato social, depois de findo o prazo nele fixado;

V - os atos de empresas mercantis com nome idêntico ou semelhante a outro já existente;

VI - a alteração contratual, por deliberação majoritária do capital social, quando houver cláusula restritiva;

VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis à sociedade, por instrumento particular, quando do instrumento não constar:

a) a descrição e identificação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, bem como o número da matrícula no registro imobiliário;

b) a outorga uxória ou marital, quando necessária;”

Já o artigo 40 dispõe acerca da necessidade de prévio exame dos requisitos formais para o arquivamento de atos pela Junta Comercial:

“Art. 40. Todo ato, documento ou instrumento apresentado a arquivamento será objeto de exame do cumprimento das formalidades legais pela junta comercial.

§ 1º Verificada a existência de vício insanável, o requerimento será indeferido; quando for sanável, o processo será colocado em exigência.

§ 2º As exigências formuladas pela junta comercial deverão ser cumpridas em até 30 (trinta) dias, contados da data da ciência pelo interessado ou da publicação do despacho.

§ 3º O processo em exigência será entregue completo ao interessado; não devolvido no prazo previsto no parágrafo anterior, será considerado como novo pedido de arquivamento, sujeito ao pagamento dos preços dos serviços correspondentes.”

Depreende-se, portanto, que o exame a ser realizado pelas Juntas Comerciais quanto aos documentos submetidos a arquivamento deve se restringir a questões precipuamente formais (presença de assinaturas, respeito ao quórum exigido, etc.), podendo adentrar às questões materiais (conteúdo das cláusulas) apenas nas hipóteses previstas no artigo 35.

Por seu turno, o Código Civil admite a exclusão de sócio extrajudicialmente, por deliberação da maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, em caso de cometimento de ato grave que coloque em risco a continuidade da sociedade, desde que a exclusão por justa causa esteja prevista no contrato social:

“Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.

Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembléia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.”

Recentemente, a redação do parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil foi alterada para dispensar a reunião dos sócios para exclusão por justa causa do sócio minoritário nas sociedades formadas por apenas dois sócios:

“Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.” (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019)

Tal modificação, por certo não infensa a críticas, visou suprimir requisito que, na prática das sociedades com apenas dois sócios, não cumpria a função de resguardar a ampla defesa e do contraditório por parte do sócio minoritário, na medida em que, de forma inquisitiva, o próprio sócio majoritário funciona nesses casos concomitantemente como acusador e julgador.

Nada obstante pudesse restringir a exclusão do sócio faltoso nesses casos unicamente à via judicial, o legislador optou por preservar a via extrajudicial – agora sem melindres – na prática postergando o contraditório e a ampla defesa para eventual ação proposta pelo sócio irresignado com sua exclusão.

No caso dos autos, discute-se a decisão proferida no processo administrativo Revex nº 997.031/19-0, que determinou o cancelamento de dois arquivamentos na Junta Comercial, oriundos da mesma reunião de sócios realizada em 19.06.2019: os arquivamentos nºs 362.648/19-0 (exclusão da sócia Curvex Participações Ltda.) e 362.649/19-4 (consolidação do contrato social).

Como primeiro ponto a observar está que o contrato social, na forma já vigente à época dos fatos, permitia a exclusão do sócio por justa causa, conforme Capítulo IX da 56ª Alteração e Consolidação (ID 43543602), arquivado no registro mercantil em 03.04.2019 sob o nº 176.700/19-5 (ID 43543609):

CAPÍTULO IX

DA EXCLUSÃO DE SÓCIOS POR JUSTA CAUSA

9.1 Será lícita a exclusão por justa causa, do sócio que, por praticar atos de inegável gravidade, estiver pondo em risco a continuidade da sociedade, desde que a exclusão seja consentida pelos sócios que representam a maioria do capital social.

9.1.1 Os sócios minoritários também poderão ser excluídos da Sociedade por justa causa. Caso os sócios que representam a maioria do capital social verifiquem que qualquer um dos sócios se encontra com restrição ou pendência perante a Secretaria da Receita Federal ou qualquer outro órgão de avaliação de crédito; bem como verificada qualquer outra forma de restrição ou pendência em nome do minoritário que prejudique ou possa prejudicar a Sociedade, sem prejuízo de outras hipóteses passíveis de exclusão do sócio minoritário por justa causa.

9.2 A exclusão por justa causa será deliberada em reunião de sócios convocada especialmente para esse fim, cientificando-se o sócio averiguado, com 08 (oito) dias de antecedência para que este compareça na reunião e exerça seu direito de defesa. Os haveres do sócio excluído serão apurados na forma e prazo previstos no item 10.2 do contrato social.” (ID 43543602, p. 9).

Nos termos do item 9.2 do contrato social, exclusão do sócio averiguado por justa causa deveria ser deliberada em reunião especialmente convocada para esse fim com antecedência mínima de 8 dias.

Por sua vez, a alteração da redação do parágrafo único do artigo 1.085 do Código Civil pela Lei nº 13.792/2019 só poderia ser aplicada diretamente na sociedade caso, apesar de autorizar a exclusão de sócio por justa causa, o contrato social nada dispusesse sobre o procedimento.

No caso, o contrato social dispunha, em seu item 9.2, sobre o procedimento de exclusão de sócio por justa causa de forma específica e sem contrariar nenhuma norma cogente, mas, ao contrário, resguardando os princípios do contraditório e da ampla defesa ao prever prazo mínimo de antecedência de 8 dias.

Deve prevalecer, portanto, a norma livremente pactuada entre as partes constante do contrato social.

Dos elementos informativos dos autos, nota-se que há telegrama de notificação da sócia minoritária convocando-a para a reunião a ser realizada em 19.06.2019, às 14h, na Avenida Santo Amaro, nº 960, Itaim Bibi, São Paulo-SP (ID 43543631). O telegrama, datado de 10.06.2019 e remetido em 11.06.2019, foi entregue ao destinatário em 12.06.2019, após a primeira tentativa, às 17h58 do próprio dia 11.06.2019, ter sido frustrada pela ausência do destinatário.

Conclui-se, portanto, que a sócia averiguada foi notificada da reunião com apenas 7 (sete) dias de antecedência da reunião, excluindo-se o dia de começo e incluindo-se o do final, nos termos do artigo 132 do Código Civil, em ofensa ao disposto no item 9.2 do contrato social, que exige 8 (oito) dias.

O descumprimento desse requisito, por si só, dá supedâneo ao ato de cancelamento de arquivamento, dado que dentro da atribuição do registro mercantil a averiguação do atendimento às normas restritivas previstas no contrato para a sua alteração por deliberação majoritária (art. 35, VI, Lei 8.934/1994).

Necessário destacar que não cabe à Junta Comercial, e tampouco a esta sede mandamental, incursionar sobre o mérito da existência ou não de justa causa para a exclusão da sócia, mas tão somente o cumprimento dos requisitos para o registro mercantil.

Isso não obstante, em relação ao pleito subsidiário, é certo que a mera alteração do endereço da filial atua em favor de toda sociedade, já que visa possibilitar o regular funcionamento de suas atividades, não trazendo prejuízos mesmo à sócia minoritária que não participou da deliberação, já que a viabilidade do pagamento de seus haveres depende inclusive da saúde financeira da empresa.

Portanto, ainda que não se vislumbre ato coator no cancelamento dos arquivamentos atinentes à exclusão da sócia e, por conseguinte, na exigência de que as alterações contratuais posteriores continuem a identificá-la no quadro societário, até que sejam sanadas as irregularidades acerca das alterações contratuais anteriores, visualiza-se a necessidade de alteração do endereço da filial, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo a não embaraçar a continuidade de suas atividades, diante da devolução do imóvel anteriormente locado (ID 43543626).

Ante o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE A MEDIDA LIMINAR requerida, para o fim de determinar à autoridade impetrada que proceda ao registro tão somente da alteração do endereço da filial estabelecida em Ribeirão Preto-SP (Nire 35.903.702.931 em sessão de 16/10/2009, CNPJ 72.855.505/0022-73) para a “Rua Doutor Hugo Fortes, 1.119, Parque Industrial Lagoinha, Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, CEP 14095-260”, nos termos da deliberação do dia 25.11.2020, de modo a permitir a regular continuidade de suas atividades.

Defiro o ingresso de Curvex Participações Ltda. na qualidade de assistente litisconsorcial, nos termos do artigo 124 do Código de Processo Civil.

Indefiro a intervenção de Roberto de Andrade Souza, diante da inexistência de interesse jurídico direto do administrador da Curvex Participações Ltda. nos termos do artigo 124 do Código de Processo Civil e por não vislumbrar a necessidade de admissão de amicus curiae no presente processo.

Oficie-se à autoridade impetrada para ciência e cumprimento da presente decisão.

Dê-se vista dos autos ao Ministério Público Federal para parecer e, em seguida, voltem conclusos para sentença.

Intimem-se. Oficie-se, com urgência.

No presente caso, nenhuma das partes trouxe qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já por mim manifestado na decisão que apreciou o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Passo a transcrever os fundamentos da decisão da minha lavra:

“A Justiça Federal é competente para processar e julgar mandados de segurança que envolvam ato do Presidente da Junta Comercial, uma vez que está presente interesse público federal no que tange ao interesse administrativo. Com efeito, a Constituição Federal, em seu art. 22, XXV, atribuiu à União a competência para legislar sobre registros públicos, e, concorrentemente com os Estados e o Distrito Federal, dispor sobre as Juntas Comerciais (art. 24, III), cabendo-lhe a fixação de normas gerais (art. 24 § 1º), ao passo em que o tema relativo ao registro mercantil, dada a sua relevância, gera efeitos por todo território nacional, repercutindo até mesmo no exterior, o que afirma o interesse e responsabilidade da União Federal na sua execução e operacionalização. Assim sendo, considerando que os atos de registro público de comércio, levados a efeito pelas Juntas Comerciais, decorrem de delegação da União, a competência para julgamento dos mandados de segurança é atraída para a Justiça Federal, consoante determina o art. 109, VIII, da Constituição Federal.

Há tempos a jurisprudência do E.STJ tem se inclinado pela competência da Justiça Federal para julgar as ações mandamentais impetradas em face de atos do Presidente da Junta Comercial (p. ex., no E.STJ, CC 31357, DJ Data 26/02/2003, p. 174, Segunda Seção, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).

Dito isso, consigno que o objeto deste recurso (assim como o da ação mandamental subjacente) diz respeito tão somente ao registro de atos societários pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (JUCESP), de modo que não alcança conflitos negociais decorrentes do conteúdo desses atos societários (por óbvio, matéria que não se insere nas atribuições de juntas comerciais, ainda que suas funções não sejam estritamente formais). Ademais, há notícia de judicialização, perante a Justiça Estadual paulista, de aspectos envolvendo os atos negociais entre as empresas e sócios atinentes ao caso destes autos.

Indo adiante, as Juntas Comerciais são órgãos responsáveis pela execução e administração dos atos de registro, e estão submetidas, no plano técnico, às normas e diretrizes disciplinadas pelo Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI, nos termos do art. 6º da Lei 8.934/1994 (que regulamenta o sistema registral brasileiro).

Nos termos da Lei nº 8.934/1994 e demais aplicáveis, o registro público de empresas mercantis consiste na matrícula (e respectivo cancelamento) dos leiloeiros, tradutores públicos e intérpretes comerciais, trapicheiros e administradores de armazéns-gerais, bem como no arquivamento de: a) documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas, b) atos relativos a consórcio e grupo de sociedade de que trata a Lei nº 6.404/1976, c) atos concernentes a empresas mercantis estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil, d) declarações de microempresa e e) atos ou documentos que, por determinação legal, sejam atribuídos ao Registro Público de Empresas Mercantis e atividades afins ou daqueles que possam interessar ao empresário e às empresas mercantis, e ainda a autenticação dos instrumentos de escrituração das empresas mercantis registradas e dos agentes auxiliares do comércio. A proteção do nome empresarial decorrerá automaticamente do arquivamento dos atos constitutivos, e suas alterações, da firma individual e da sociedade mercantil, observando-se os princípios da veracidade e da novidade.

No que concerne ao procedimento de arquivamento dos atos societários da pessoa jurídica, o art. 37, I a V, da Lei nº 8.934/1994 (com as alterações da Lei nº 10.194/2001), dispõe que a documentação pertinente deve ser apresentada perante a Junta Comercial, devidamente instruída com o instrumento original de constituição, modificação ou extinção de empresas mercantis, assinado pelo titular, pelos administradores, sócios ou seus procuradores. Devem ainda acompanhar o pedido de arquivamento a declaração do titular ou administrador de não estar impedido de exercer o comércio ou a administração de sociedade mercantil, em virtude de condenação criminal, a ficha cadastral segundo modelo aprovado pelo DNRC, os comprovantes de pagamento dos preços dos serviços correspondentes e a prova de identidade dos titulares e dos administradores da empresa mercantil.

O art. 37, parágrafo único, da Lei nº 8.934/1994, reza que além dos documentos acima mencionados, exigidos para o arquivamento de atos societários, a Junta Comercial não poderá exigir nenhum outro documento das firmas individuais e sociedades de natureza mercantil, cooperativas, das sociedades de que trata a Lei nº 6.404/1976 e das microempresas.

Cumpre anotar que a JUCESP, na análise de atos de registro a ela submetidos, deve observar a legalidade, cumprindo as formalidades previstas, consoante dispõe o art. 40 da Lei 8.934/1994:

Art. 40. Todo ato, documento ou instrumento apresentado a arquivamento será objeto de exame do cumprimento das formalidades legais pela junta comercial.

§ 1º Verificada a existência de vício insanável, o requerimento será indeferido; quando for sanável, o processo será colocado em exigência.

§ 2º As exigências formuladas pela junta comercial deverão ser cumpridas em até 30 (trinta) dias, contados da data da ciência pelo interessado ou da publicação do despacho.

§ 3º O processo em exigência será entregue completo ao interessado; não devolvido no prazo previsto no parágrafo anterior, será considerado como novo pedido de arquivamento, sujeito ao pagamento dos preços dos serviços correspondentes.

Em vista as premissas de liberdade de comércio asseguradas pela ordem constitucional, a JUCESP está autorizada a analisar o conteúdo dos atos societários que lhes são submetidos apenas para dar cumprimento a legítimas restrições, tais como as dispostas no art. 35 da Lei nº 8.934/1994:

 

 Art. 35. Não podem ser arquivados:

I - os documentos que não obedecerem às prescrições legais ou regulamentares ou que contiverem matéria contrária aos bons costumes ou à ordem pública, bem como os que colidirem com o respectivo estatuto ou contrato não modificado anteriormente;

II - os documentos de constituição ou alteração de empresas mercantis de qualquer espécie ou modalidade em que figure como titular ou administrador pessoa que esteja condenada pela prática de crime cuja pena vede o acesso à atividade mercantil;

III - os atos constitutivos de empresas mercantis que, além das cláusulas exigidas em lei, não designarem o respectivo capital e a declaração de seu objeto, cuja indicação no nome empresarial é facultativa;        (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.040, de 2021)

IV - a prorrogação do contrato social, depois de findo o prazo nele fixado;

V - os atos de empresas mercantis com nome idêntico a outro já existente;        (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.040, de 2021)

VI -        (Revogado dada pela Medida Provisória nº 1.040, de 2021)

VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis à sociedade, por instrumento particular, quando do instrumento não constar:

a) a descrição e identificação do imóvel, sua área, dados relativos à sua titulação, bem como o número da matrícula no registro imobiliário;

b) a outorga uxória ou marital, quando necessária;

VIII - (revogado).    (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 1º  O registro dos atos constitutivos e de suas alterações e extinções ocorrerá independentemente de autorização governamental prévia e os órgãos públicos deverão ser informados pela Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios - Redesim a respeito dos registros sobre os quais manifestarem interesse.        (Incluído pela Medida Provisória nº 1.040, de 2021)

§ 2º  Eventuais casos de colidência entre nomes empresariais por semelhança poderão ser questionados pelos interessados, a qualquer tempo, por meio de recurso ao Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.        (Incluído pela Medida Provisória nº 1.040, de 2021)

Como regra, a análise dos atos de registro pela JUCESP se limita à verificação de vícios procedimentais e do cumprimento de demais formalidades legais. Havendo vício insanável, procede-se ao indeferimento; de outro lado, se o vício é sanável, a parte interessada possui prazo de 30 dias para suprir referido vício. Sobre o assunto, confira-se, nesta c.Segunda Turma:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO. ALTERAÇÃO DO CONTRATO SOCIAL. VÍCIO NA DESCRIÇÃO DOS IMÓVEIS QUE INTEGRALIZAM O CAPITAL. REDUÇÃO DO CAPITAL SOCIAL. NECESSIDADE DE PUBLICAÇÃO DE ATA EM JORNAL. EXIGÊNCIA LEGAL. TUTELA PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. RECURSO DESPROVIDO.

1. Cuida-se, assim, de verificar ilegalidade ou não da exigência da JUCESP quanto ao cumprimento do disposto nos artigos 1.082, II 1.084, §§1º, 2º e 3º, e 1.152, §1º todos do Código Civil de 2002, para o fim de registro da alteração do contrato social da agravante.

2. Cumpre anotar que a JUCESP, na análise de atos de registro a ela submetidos, devem observar o princípio da legalidade, cumprindo-se as formalidades legais previstas, consoante dispõe o art. 40 da Lei 8.934/94.

3. A exigência de publicação da ata em jornal se justifica pelo disposto nos §§2º e 3º do art. 1.084 do CC/02 na medida em que a redução do capital social não depende exclusivamente da vontade dos sócios, visto que qualquer credor que se sinta prejudicado poderá apresentar impugnação.

4. O erro material apontado pela JUCESP, relativo a descrição dos imóveis integralizados no capital social da agravante, enseja a aplicação do inciso II do art. 1.082 do CC/02, de modo a corrigir o valor do capital social para menor.

5. Não se verifica qualquer exigência ilegal por parte da agravada a corroborar a probabilidade do direito alegado, visto que o ato administrativo se encontra em conformidade com o regramento legal.

4. Recurso não provido.

 

(TRF3. AI   5032674-23.2020.4.03.0000. Segunda Turma. Relator: Des. Federal Cotrim Guimarães. Julgamento: 18/05/2021. Disponibilizado no DJe em 24/05/2021)

 

No caso dos autos, friso que a discussão limita-se à averiguar a regularidade da recusa da JUCESP a proceder ao arquivamento da alteração societária requerida pela  agravada Nova Distribuidora de Veículos (ou seja, os motivos para a negativa), com base na inobservância da legislação pertinente e das disposições do contrato social a respeito da matéria. Afinal, o mérito da exclusão da sócia minoritária, ora agravante, é matéria de competência da Justiça Estadual, e já se encontra em discussão nos autos da ação n. 1117436-90.2019.8.26.0100 (vale dizer, matéria que refoge à competência da JUCESP).

Trata-se de pedido de arquivamento de alteração de contrato social que, em princípio, foi providenciado pela JUCESP, sendo, posteriormente, suspenso após pedido de revisão levado a efeito pela agravante Curvex. Após apresentação de defesa administrativa pela agravada Nova Distribuidora de Veículos, o arquivamento foi cancelado pela JUCESP.

 

A decisão de cancelamento do arquivamento da alteração societária encontra-se no ID. 43543620 dos autos de origem (páginas 85 e seguintes da versão em PDF dos autos de origem). Em breve síntese, decorreu dos seguintes motivos: desconformidade com o item 9.2 do capítulo IV do contrato social, que exigia, para exclusão do sócio do seu quadro, reunião convocada especialmente para este fim; inobservância do prazo mínimo para ciência do sócio averiguado quanto à reunião a ser realizada em 19/06/2019, às 14h00min; ocorrência da reunião em endereço distinto daquele da sede da empresa.

Dispõe o item 9.2 do contrato social em questão:

CAPÍTULO IX

DA EXCLUSÃO DE SÓCIOS POR JUSTA CAUSA

9.1 Será lícita a exclusão por justa causa, do sócio que, por praticar atos de inegável gravidade, estiver pondo em risco a continuidade da sociedade, desde que a exclusão seja consentida pelos sócios que representam a maioria do capital social.

9.1.1 Os sócios minoritários também poderão ser excluídos da Sociedade por justa causa. Caso os sócios que representam a maioria do capital social verifiquem que qualquer um dos sócios se encontra com restrição ou pendência perante a Secretaria da Receita Federal ou qualquer outro órgão de avaliação de crédito; bem como verificada qualquer outra forma de restrição ou pendência em nome do minoritário que prejudique ou possa prejudicar a Sociedade, sem prejuízo de outras hipóteses passíveis de exclusão do sócio minoritário por justa causa.

9.2 A exclusão por justa causa será deliberada em reunião de sócios convocada especialmente para esse fim, cientificando-se o sócio averiguado, com 08 (oito) dias de antecedência para que este compareça na reunião e exerça seu direito de defesa. Os haveres do sócio excluído serão apurados na forma e prazo previstos no item 10.2 do contrato social.

Da leitura do contrato social da Nova Distribuidora de Veículos Ltda (Id. 43543602 dos autos de origem), a expressão “especialmente para esse fim”, utilizado na cláusula 9.2, não impossibilita que outros assuntos sejam tratados na mesma reunião societária, notadamente a modificação documental em razão da alteração do quadro societário da empresa (ademais, uma é decorrência lógica da outra, daí porque sequer consiste propriamente em um segundo item em pauta, como consignado na decisão agravada).

Além disso, conquanto o item 6.3 do contrato social apresente a previsão sobre reuniões na sede da empresa, tenho que a realização em endereço distinto não implica, necessariamente, em invalidade do ato societário, e muito menos na impossibilidade de arquivamento dos correspondentes instrumentos. Há múltiplas razões legítimas pelas quais reuniões de sócios possam ser feitas em outros locais (e não na sede da empresa), bastando que exista prévia informações e, à evidência, que o novo local não seja impeditivo para um ou alguns sócios. No caso dos autos, a parte agravante foi devidamente cientificada acerca do endereço de realização do ato, e a reunião se deu em local no mesmo município.

Contudo, o prazo mínimo de antecedência para convocação para reunião foi desrespeitado, caracterizando-se vício formal impeditivo do registro do ato societário, por restar caracterizado cerceamento do direito de defesa da parte agravante. Nos termos  do item 6.3 do contrato social, os anúncios de convocação serão encaminhados aos sócios, pelo correio ou por qualquer meio eletrônico disponível, desde que seja possível a comprovação do recebimento.

Assim, o contrato social é claro ao exigir, no caso de notificação por meio eletrônico, que este possibilite a comprovação de recebimento. A tanto não se presta a menção à expressão “Em resposta a mesma recebida em 10 de junho de 2019”, originada do e-mail ras64@uol.com.br (atribuído ao Sr. Roberto Andrade), com data 14/06/2019 (vide  Id. 43543635 - Pág. 2, fls. 119 da versão em PDF dos autos de origem). Houvesse comprovação de anterior entrega, caberia à parte interessa a devida juntada aos autos (por óbvio, seu ônus), daí porque a referência ao dia 10 de junho deve ser tida como erro.

Prevalece, portanto,  a data do comprovado recebimento do telegrama contendo a notificação acerca da reunião, ou seja, o dia 12/06/2019, tendo decorrido apenas sete dias entre a notificação e a data designada, 19/06/2019.

 

Seria possível cogitar qual o prejuízo efetivamente causado pela redução do prazo em tela, que em princípio não seria significativa em vista da invalidação do arquivamento de ato societário. Contudo, além de a via mandamental eleita não permitir a comprovação desse aspecto, tenho que o prazo mínimo de antecedência para a convocação de reunião societária que possa levar à exclusão de sócio atende, substancialmente, às garantias do direito de defesa do sócio que pode ser excluído.

Desnecessário invocar a horizontalização de direitos e de garantais fundamentais (art. 5º. LV da Constituição) para assegurar respeito ao prazo mínimo de defesa porque se trata de cláusula expressa livremente pactuada e refletida no contrato social, de modo que não se trata de mera formalidade mas de medida necessária a resguardar o direito  da parte a preparar-se para o ato.  Sua redução, por parte do Judiciário, implicaria em adotar conduta equivalente à diminuição unilateral e injustificada de prazos garantidos às partes, pela legislação, para a interposição de recursos processuais e apresentação de defesa.

Observo, por fim, que os interesses da parte agravada encontram-se preservados, eis que foi concedida parcialmente medida liminar que garantiu-lhe o registro de alteração de endereço de filial em seus assentamentos junto à JUCESP, medida pleiteada nos autos de origem." (sem destaques no original)

Ausente qualquer motivo para alteração, entendo que a decisão deve ser mantida.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, com o fim de restaurar a decisão proferida pelo Presidente da JUCESP no bojo da decisão proferida no processo administrativo Revex nº 997.031/19-0, que determinou o cancelamento do arquivamento nº 362.648/19-0 (exclusão da sócia Curvex Participações Ltda.), oriundo da reunião de sócios da Nova Distribuidora de Veículos realizada em 19/06/2019.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO. ALTERAÇÃO DO CONTRATO SOCIAL. ARQUIVAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. DESCUMPRIMENTO DO PRAZO MÍNIMO PARA REALIZAÇÃO DO ATO.  RECURSO  PROVIDO.

- O objeto deste recurso (assim como o da ação mandamental subjacente) diz respeito, tão somente, ao registro de atos societários pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (JUCESP), de modo que não alcança conflitos negociais decorrentes do conteúdo desses atos societários (por óbvio, matéria que não se insere nas atribuições de juntas comerciais, ainda que suas funções não sejam estritamente formais). Ademais, há notícia de judicialização, perante a Justiça Estadual paulista, de aspectos envolvendo os atos negociais entre as empresas e sócios atinentes ao caso destes autos.

- Em vista as premissas de liberdade de comércio asseguradas pela ordem constitucional, a JUCESP está autorizada a analisar o conteúdo dos atos societários que lhes são submetidos apenas para dar cumprimento a legítimas restrições, tais como as dispostas no art. 35 da Lei nº 8.934/1994. A análise dos atos de registro pela JUCESP se limita à verificação de vícios procedimentais e do cumprimento de demais formalidades legais: havendo vício insanável, procede-se ao indeferimento; de outro lado, se o vício é sanável, a parte interessada possui prazo de 30 dias para suprir referido vício. 

- No caso dos autos, a discussão diz respeito à regularidade da recusa da JUCESP quanto ao arquivamento da alteração societária requerida pela  agravada Nova Distribuidora de Veículos (ou seja, os motivos para a negativa), com base na inobservância da legislação pertinente e das disposições do contrato social a respeito da matéria. Afinal, o mérito da exclusão da sócia minoritária, ora agravante, é matéria de competência da Justiça Estadual, e já se encontra em discussão nos autos da ação n. 1117436-90.2019.8.26.0100 (vale dizer, matéria que refoge à competência da JUCESP).

- Trata-se de pedido de arquivamento de alteração de contrato social que, em princípio, foi providenciado pela JUCESP, sendo, posteriormente, suspenso após pedido de revisão levado a efeito pela agravante Curvex. Após apresentação de defesa administrativa pela agravada Nova Distribuidora de Veículos, o arquivamento foi cancelado pela JUCESP. A decisão de cancelamento do arquivamento da alteração societária, em breve síntese, decorreu dos seguintes motivos: desconformidade com o item 9.2 do capítulo IV do contrato social, que exigia, para exclusão do sócio do seu quadro, reunião convocada especialmente para este fim; inobservância do prazo mínimo para ciência do sócio averiguado quanto à reunião a ser realizada em 19/06/2019, às 14h00min; ocorrência da reunião em endereço distinto daquele da sede da empresa.

- Da leitura do contrato social da Nova Distribuidora de Veículos Ltda, a expressão “especialmente para esse fim”, utilizado na cláusula 9.2, não impossibilita que outros assuntos sejam tratados na mesma reunião societária, notadamente a modificação documental em razão da alteração do quadro societário da empresa (ademais, uma é decorrência lógica da outra, daí porque sequer consiste propriamente em um segundo item em pauta, como consignado na decisão agravada).

- Conquanto o item 6.3 do contrato social apresente a previsão sobre reuniões na sede da empresa, a realização em endereço distinto não implica, necessariamente, em invalidade do ato societário, e muito menos na impossibilidade de arquivamento dos correspondentes instrumentos. Há múltiplas razões legítimas pelas quais reuniões de sócios possam ser feitas em outros locais (e não na sede da empresa), bastando que exista prévia informações e, à evidência, que o novo local não seja impeditivo para um ou alguns sócios. No caso dos autos, a parte agravante foi devidamente cientificada acerca do endereço de realização do ato, e a reunião se deu em local no mesmo município.

- Contudo, o prazo mínimo de antecedência para convocação para reunião foi desrespeitado, caracterizando-se vício formal impeditivo do registro do ato societário, por restar caracterizado cerceamento do direito de defesa da parte agravante. Nos termos  do item 6.3 do contrato social, os anúncios de convocação serão encaminhados aos sócios, pelo correio ou por qualquer meio eletrônico disponível, desde que seja possível a comprovação do recebimento.

- Assim, o contrato social é claro ao exigir, no caso de notificação por meio eletrônico, que este possibilite a comprovação de recebimento. A tanto não se presta a menção à expressão “Em resposta a mesma recebida em 10 de junho de 2019”, originada do e-mail ras64@uol.com.br, com data 14/06/2019 . Houvesse comprovação de anterior entrega, caberia à parte interessa a devida juntada aos autos (por óbvio, seu ônus), daí porque a referência ao dia 10 de junho deve ser tida como erro. 

- Prevalece, portanto,  a data do comprovado recebimento do telegrama contendo a notificação acerca da reunião, ou seja, o dia 12/06/2019, tendo decorrido apenas sete dias entre a notificação e a data designada (19/06/2019).

- Seria possível cogitar qual o prejuízo efetivamente causado pela redução do prazo em tela, que em princípio não seria significativa em vista da invalidação do arquivamento de ato societário. Contudo, além de a via mandamental eleita não permitir a comprovação desse aspecto, o prazo mínimo de antecedência para a convocação de reunião societária que possa levar à exclusão de sócio atende, substancialmente, às garantias do direito de defesa do sócio que pode ser excluído.

- Desnecessário invocar a horizontalização de direitos e de garantais fundamentais (art. 5º. LV da Constituição) para assegurar respeito ao prazo mínimo de defesa porque se trata de cláusula expressa livremente pactuada e refletida no contrato social, de modo que não se trata de mera formalidade mas de medida necessária a resguardar o direito  da parte a preparar-se para o ato.  Sua redução, por parte do Judiciário, implicaria em adotar conduta equivalente à diminuição unilateral e injustificada de prazos garantidos às partes, pela legislação, para a interposição de recursos processuais e apresentação de defesa.

- Os interesses da parte agravada encontram-se preservados, eis que foi concedida parcialmente medida liminar que garantiu-lhe o registro de alteração de endereço de filial em seus assentamentos junto à JUCESP, medida pleiteada nos autos de origem.

- Agravo de instrumento provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.