Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005886-80.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

APELANTE: SILVANO BATISTA

Advogado do(a) APELANTE: DIMAS JOSE DE MACEDO - SP184953-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005886-80.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

APELANTE: SILVANO BATISTA

Advogado do(a) APELANTE: DIMAS JOSE DE MACEDO - SP184953-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação interposta pela defesa de Silvano Batista contra a sentença (id. 182551820) que o condenou pela prática do crime do art. 293, § 1º, incisos I e II, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, em regime aberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor diário de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, com substituição da pena corporal por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e pagamento de prestação pecuniária no valor de 10 (dez) salários mínimos.

Em razões recursais, a defesa pleiteia a absolvição do réu, ao fundamento de que a condenação se pautou somente em provas produzidas durante o inquérito policial, o que é vedado. Aduz, ainda, a incidência do princípio do in dubio pro reo (id. 182551820).

Com contrarrazões do Ministério Público Federal (id. 182551986), os autos vieram a esta Corte Regional.

A Procuradoria Regional da República se manifestou pelo desprovimento do recurso da defesa (id. 186560143).

É o relatório.

À revisão.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0005886-80.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

APELANTE: SILVANO BATISTA

Advogado do(a) APELANTE: DIMAS JOSE DE MACEDO - SP184953-A

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

 

Consta dos autos que, Silvano Batista foi denunciado como incurso nas penas do artigo 293, § 1º, inciso I, do Código Penal, porque, em 20 de julho de 2012, possuía papel de crédito público falso, consistente em 1 (uma) Letra do Tesouro Nacional - LTN, no valor de Cr$ 1.200.000.000,00 (um bilhão e duzentos milhões de cruzeiros).

Narra a denúncia que, na data dos fatos, no Aeroporto de Viracopos, na cidade de Campinas/SP, a Receita Federal do Brasil reteve a encomenda aérea internacional nº 898774928694, registrada em nome do denunciado e, após sua inspeção, localizou uma LTN, série H, número 324402, supostamente emitida em 1972 e, devido aos alertas de fraude, encaminhou o título de crédito para a Casa da Moeda do Brasil que constatou por perícia se tratar de papel falsificado.

Ainda, segundo a acusação, o laudo pericial documentoscópico comparou o documento de exportação “Fedex Express Internacional Air Waybill” à caligrafia do denunciado e atestou que foi cunhado pelo punho de Silvano Batista, além disso, ao ser ouvido pela autoridade policial, o denunciado confirmou o preenchimento do documento, porém informou ter acreditado na autenticidade da LTN devido à presença de uma certificação emitida por uma perita (id. 182551820).  

Após regular instrução, sobreveio a sentença que condenou Silvano Batista pela prática do crime do art. 293, § 1º, incisos I e II, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, em regime aberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor diário de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, com substituição da pena corporal por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e pagamento de prestação pecuniária no valor de 10 (dez) salários mínimos

Passo a análise da matéria devolvida.

Inicialmente, constato a existência de erro material no dispositivo da sentença proferida.

De fato, o erro material constitui equívoco ou inexatidão relacionado a aspectos objetivos como um cálculo errado, ausência de palavras, erros de digitação, troca de nome e, reconhecível também de ofício, não significa integração da fundamentação, modificação do resultado ou, ainda, reconhecimento de vício que comprometa a compreensão e clareza da decisão recorrida.

No caso vertente, observo que o dispositivo da sentença apontou a condenação do réu pela prática do crime do art. 293, § 1º, incisos I e II, do Código Penal. No entanto, da leitura da denúncia e da própria fundamentação da sentença se verifica que a menção ao inciso II foi equivocada. Confira-se:

“Inicialmente, indefiro o pedido ministerial de emendatio libelli,visando o enquadramento jurídico da conduta também no inciso II do § 1º do artigo 293 do CP, uma vez que tal dispositivo tem por objeto jurídico a proteção de selos destinados a controle tributário, o que não é o caso dos autos.

(...)

Diante de tais elementos, comprovada está a materialidade do crime insculpido no artigo 293, §1º, incisos I e II, do Código Penal.

(...)

4. DISPOSITIVO
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a ação penal para:
a) CONDENAR o réu SILVANO BATISTA, já qualificado, como incurso nas sanções do artigo 293, § 1º, incisos I e II, do Código Penal”.

Portanto, corrijo o erro material apontado para que conste a condenação do réu Silvano Batista pela prática do crime do art. 293, § 1º, inciso I, do Código Penal.

No mais, observo que existem provas da materialidade delitiva, quais sejam:

a) Peça de Informação nº 1.34.004.001771/2012 – 92 (id. 182551818);

b) Representação Fiscal para Fins Penais – Aduaneiro nº 10692.000074/2012-09 (id. 182551818); c) Documento Fedex International Air Waybill, com data de 9 de julho de 2012, destinado à Global Trust Depository, na qual Silvano Batista figura na condição de emitente e informação de que se tratava de “Documentos/Contratos” (id. 182551818);

d) Declaração de Remessas Expressas de Exportação DRE – E, com data de 20.07.2012, destino à Memphis e indicação de Luiz Luchesi como representante legal da empresa de Courier (id. 182551818);

e) Relação de Remessas Expressas Retidas (id. 182551818);

f) Carta de Silvano Batista para Fedex Express, com data de 25.07.2012, em que ele admite ser o proprietário dos documentos retidos (dentre os quais, menciona um Laudo Pericial de Documento Histórico, assim como outros itens relacionados à LTN) e relata que seu objetivo ao encaminhar a documentação para a Global Trust Depository para guarda e custódia (id. 182551818);

g) Laudo Pericial nº 039/2012, no qual o perito conclui que as Letras do Tesouro Nacional nº 324402 e 305958, série H, de 1972, com valor nominal de um bilhão e duzentos milhões de cruzeiros são falsas (id. 182551818);

h) Auto de Apreensão da LTN nº 324402 (id. 182551818);

i) Ofício encaminhado pela Secretaria do Tesouro Nacional, esclarecendo que nos últimos anos foram feitas diversas consultas sobre as LTN’s, já que inúmeras pessoas têm tentado obter vantagens com o oferecimento de LTN falsificadas (id. 182551819); e,

j) Laudo de Perícia Criminal – Documentoscopia nº 053/2017, concluindo que os lançamentos questionados no Documento Fedex International Air Waybill apresentam convergências com o punho de Silvano Batista, na escala de “Indicação Positiva – Foram constatadas algumas convergências, porém insuficientes para determinar se os lançamentos foram produzidos pela mesma pessoa” (id. 182551819).    

Da mesma forma, não há dúvida quanto à autoria, já que o réu assumiu a propriedade da LTN na carta encaminhada para a Fedex Express, assim como o preenchimento do Fedex International Air Waybill, o que foi confirmado pela perícia criminal.

Além disso, ao prestar informações em sede policial, o réu novamente confirmou ser o titular da LTN retida pela Receita Federal. Disse que preencheu o Fedex International Air Waybill e pretendia encaminhar o documento aos Estados Unidos da América para uma empresa que o guardaria em um local seguro. Relatou que este título e alguns outros foram por ele adquiridos no ano de 2001, de uma pessoa chamada Francisco Alves, em troca de um apartamento situado em Jurerê/SC. Declarou que a transação foi feita em um escritório de contabilidade já extinto na cidade de São Paulo e que, inclusive, mencionou tal evento em sua declaração de Imposto de Renda. Também mencionou que acreditava totalmente na autenticidade do documento, já que havia a certificação dada por uma perita de nome Edilene, da Polícia Civil de Minas Gerais, que é dona de uma empresa prestadora de serviços de análise e autenticação de documentos chamada “Veritas”, localizada na cidade de Belo Horizonte. Esclareceu que o mencionado laudo pericial acompanhava o referido título, assim como um lacre de segurança no envelope. Por derradeiro, afirmou que não tinha conhecimento da falsidade do título e que não declarou seu valor monetário porque não pensava em negociá-lo e somente guardá-lo em local seguro devido ao seu valor histórico (id. 182551818).   

O réu não compareceu à audiência realizada no dia 14 de novembro de 2019 e, na ocasião, não foi produzida prova testemunhal (id. 182551820).

Pois bem, muito embora os elementos coletados demonstrem a existência de prova da autoria e materialidade delitivas, já que indicam a falsificação do documento e a posse dele pelo réu, verifico que não houve a comprovação quanto ao dolo exigido, no sentido de que ele tinha ciência do falso.

Neste ponto, destaco que as provas irrepetíveis produzidas ao longo da investigação não se mostraram suficientes para tal desiderato e tampouco houve por parte da acusação a produção de algum outro elemento probatório judicial que apontasse, de forma indubitável, a atitude dolosa do réu, tanto que sequer foram ouvidas testemunhas em audiência.  

Assim, não há prova produzida sob o crivo do contraditório apta a demonstrar que o réu Silvano Batista tinha plena ciência da falsidade do documento público, sendo que as únicas informações que se têm são as declarações por ele prestadas no inquérito policial, afirmando que adquiriu a Letra do Tesouro Nacional de terceira pessoa, a qual, inclusive, teria lhe apresentado um certificado de autenticidade produzido por uma perita.

Portanto, não restou demonstrado, sem qualquer ausência de dúvida, que Silvano tenha atuado de forma dolosa para a consumação do crime imputado na exordial, razão pela qual parece mais razoável a sua absolvição, por insuficiência de provas.

Desta feita, considerando que a acusação não se desincumbiu do ônus que lhe impõe o art. 156 do Código de Processo Penal, havendo dúvida razoável acerca dos elementos essenciais do crime, não cabe a condenação do réu, de modo que é garantido ao acusado, no processo penal, o benefício da dúvida, consubstanciado nos primados do princípio do in dubio pro reo.

Ante o exposto, de ofício, corrijo o erro material para constar que a sentença condenou o réu Silvano Batista pela prática do crime do art. 293, § 1º, inciso I, do Código Penal, bem como dou provimento ao recurso da defesa para absolvê-lo da imputação contida na denúncia, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 293, § 1º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. POSSE DE PAPEL PÚBLICO FALSO. LETRA DO TESOURO NACIONAL. ERRO MATERIAL. DOLO. ARTIGO 156 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.ÔNUS PROBATÓRIO. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ABSOLVIÇÃO.

1. O erro material compreende equívoco ou inexatidão relacionado a aspectos objetivos e, reconhecível também de ofício, não significa integração da fundamentação, modificação do resultado ou, ainda, reconhecimento de vício que comprometa a compreensão e clareza da decisão recorrida.

2. Na hipótese de ausência de provas do dolo do réu sob o crivo do contraditório, não se desincumbe a acusação de seu ônus probatório e repousa sobre a conduta do réu o benefício da dúvida, impondo-se a absolvição por insuficiência de provas. 

3. Apelação da defesa provida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, corrigir erro material para constar que a sentença condenou o réu Silvano Batista pela prática do crime do art. 293, § 1º, inciso I, do Código Penal, bem como dar provimento ao recurso da defesa para absolvê-lo da imputação contida na denúncia, nos termos do artigo 386, VII, do Código de Processo Penal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.