APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024920-27.2015.4.03.6100
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: JOSE ROBERTO BERNARDES DE LUCA
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO BISCARO DE SOUZA - SP163851-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: ADL ASSESSORIA E CONSULTORIA S/C LTDA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FERNANDO BISCARO DE SOUZA - SP163851-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024920-27.2015.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: JOSE ROBERTO BERNARDES DE LUCA Advogado do(a) APELANTE: JOSE LUIZ DA SILVA LEME TALIBERTI - SP35919 APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Apelação interposta por José Roberto Bernardes de Luca contra sentença que julgou improcedentes os embargos à execução de título extrajudicial, consubstanciado no Acórdão nº 2.948/2010-TCU-1ª Câmara, proferido pelo Tribunal de Contas da União (Id. – fls. 129/135). Sustenta, em síntese, que (Id. 58525189 – fls. 100/138): 1) ocorreu o perecimento do direito buscado na execução embargada, uma vez que foi extrapolado o prazo para início do processo de tomada de contas e o procedimento ultrapassou o prazo quinquenal fixado em lei para a constituição do crédito. 2) a sentença, ao afastar as teses de decadência e prescrição, violou o disposto no artigo 54 da Lei n. 9784/99, artigo 1°, §1°, da Lei 9.873/99, artigo 146 do Regimento Interno do TCU (aprovado pela Resolução Administrativa n. 15, de 15/06/1993), o Acórdão TCU 1441/2016 e os artigos 2° e 3°, II, do Decreto-lei n° 2.298/86. 3) o artigo 54 da Lei nº 9.784/99 estabelece o prazo quinquenal para a cobrança, anulação ou convalidação de débitos decorrentes de atos administrativos e deve ser aplicado também para a sua constituição. 4) o procedimento que acarretou a constituição do crédito executado perdurou por mais de 13 anos, o que o torna inexequível por força do artigo 54 da Lei n. 9784/99 e artigo 1°, § 1° da Lei 9.873/99, ainda que não tenha transcorrido o quinquênio entre o trânsito em julgado do acórdão do TCU e o ajuizamento da execução. 5) à época dos fatos estava em vigor o Regimento Interno do TCU, aprovado pela Resolução Administrativa n. 15, de 15/06/1993, segundo o qual os processos de tomada ou prestação de contas deveriam ser apresentados ao tribunal no prazo máximo de 120 dias, contados do correspondente exercício financeiro. 6) caso seja reconhecido imprescritível o ressarcimento, seria criada a possibilidade eterna de se demandar, ou seja, uma pena perpétua, em antinomia com a própria Constituição. 7) “tanto é certa a prevalência do direito fundamental de vedação de penas perpétuas sobre a norma do art. 37, § 5º, CF, que o art. 23, I, da Lei n. 8.429/92, prevê a prescrição quinquenal para a aplicação de suas sanções, entre as quais se situa, obviamente, o perdimento de bens ou imposição de indenizar o erário”. 8) a imputação de débito é imprescritível somente nos casos de desfalque ou desvio de recursos, ou seja, quando fundamentada na hipótese do artigo16, inciso III, alínea “d”, da Lei 8.443/1992. 9) antes do advento da Lei nº 9.873/1999, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.105.422/RJ, entendeu ser de 05 anos o prazo para o exercício do poder de polícia pela administração, com aplicação analógica do artigo 1° do Decreto n. 20.910/1932. 10) a analogia deve ser utilizada, como recurso de integração legislativa, como previsto no artigo 4º da LINDB, para o fim de fixar o prazo de agir da administração. 11) o artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932 estabeleceu, como regra geral, o prazo prescricional de cinco anos quando o sujeito passivo da relação jurídica for a fazenda pública e na hipótese inversa, ou seja, quando ela for o sujeito ativo. 12) o ordenamento somente previu regras específicas para determinadas ações administrativas que se assemelham ao direito em questão, não regulado, como é o caso dos artigos 173 e 174 do CTN, artigo 142 da Lei n. 8.112/1990, artigo 54 da Lei n. 9.784/99, artigo 23 da Lei n. 8.429/1992, artigo 13, § 1°, da Lei n. 9.847/1999, artigo 1° da Lei n. 6.838/1980 e, em especial, artigo 1° da Lei n. 9.873/1999. 13) o princípio da duração razoável dos processos, inclusive administrativos, foi elevado à condição de direito fundamental do cidadão por meio da Emenda Constitucional nº. 45/2004 e não há qualquer dúvida acerca de sua aplicabilidade em qualquer instância e tribunal. 14) o recorrente teve cerceado o direito de defesa, no curso do processo administrativo e perante o Judiciário, e violado o disposto nos artigos 369 e 370 do CPC e artigo 2°, parágrafo único, inciso VI, da Lei nº 9.784/99, uma vez que foi indeferida a produção de provas indispensáveis à comprovação da correção dos procedimentos por ele adotados e inexistência de prejuízo ou dano ao erário, decorrentes dos projetos aprovados, em clara violação ao artigo 50 da Lei 9.784/99 e artigo 93, incisos IX e X, da Constituição Federal. 15) os pleitos estão amparados em elementos dos autos que demonstram não ter sido apurada qualquer irregularidade pela AGU, Polícia Federal, Ministério Público, Secretaria da Receita Federal do Brasil e CVM, fatos sólidos ignorados pelo TCU no processo administrativo promovido pela SECEX/SP, com violação ao disposto no artigo 2°, parágrafo único, inciso VI, da Lei nº 9.784/99 e artigos 369 e 370 do CPC. 16) foram comprovadas a existência de duas contas relativas ao projetos executados, não obstante a declaração prestada pelo Banco do Brasil quanto à sua inexistência, que foram objeto de questionamento no processo administrativo, mas não foram consideradas, o que demonstra que o indeferimento de provas consolidou o cerceamento de defesa e demonstrou a atuação desidiosa da SECEX/SP. 17) nas diligências encetadas na tomada de contas especial, a SECEX se manifestou pela invalidade das provas produzidas, partir da infundada presunção de irregularidades praticadas pelo apelante, sem buscar o devido esclarecimento para fatos capitais, como a existência de comprovantes de abertura e movimentação de contas e a desídia ao se contentar com a negativa da SRF em apresentar informações sobre os valores utilizados como incentivo fiscal pelo investidores. 18) “a ressalva do artigo 37, § 5°, in fine, por se tratar de exceção ao princípio da prescritibilidade, interpreta-se restritivamente. Dessa forma, a aludida presunção de dano, é inadmissível como causa de pedir da ação de ressarcimento, vale dizer, à Fazenda Pública, cumpre-lhe provar a materialidade do suposto prejuízo, a imputação de débito está protegida pelo manto da imprescritibilidade somente nos casos de desfalque ou desvio de recursos, ou seja, quando fundamentada na hipótese da alínea d, inciso III, artigo 16, da Lei 8.443/1992”. 19) a sentença, ao convalidar o procedimento adotado pelo TCU e afirmar inexistir qualquer ilegalidade, incorreu em negativa de vigência ao artigo 10 da Lei 8.429/92 e desconsiderou o artigo 333, parágrafo único, inciso II, do Código de Processo Civil de 1973, o qual prevê que o ônus da prova cabe ao exequente, que tem todos os meios para produzi-la. 20) não poderia ter prevalecido o entendimento ilegal defendido pela assessoria do SECEX/SP, no sentido de que a nova norma poderia alcançar atos praticados sob a égide de outro comando legal plenamente válido (artigo 2º, inciso XIII, da Lei 9784/98) por não encontrar amparo legal e não respeitar o ato jurídico perfeito e acabado e o direito adquirido. 21) ao contrário do decidido, trata-se de situação em que se discute a legalidade dos atos praticados no âmbito do procedimento administrativo e a inobservância de preceitos fundamentais, o que autoriza a revisão em sede de embargos, pois as principais teses sustentadas são a inexigibilidade do título, em função do cerceamento de defesa e desrespeito ao devido processo administrativo, e as ilações de ter havido prejuízo ao erário, circunstâncias pelas quais o ato deve ser considerado nulo e insuscetível de convalidação. 22) os fundamentos da sentença não se coadunam com a tese de que o procedimento de tomada de contas partiu de um equivocado enquadramento legal do projeto aprovado pela SECEX, pois foi iniciado e aprovado pela CVM sob a égide da Instrução CVM nº 208/1994, que estabelecia duas formas de captação de recursos. 23) não obstante o projeto tenha sido aprovado por meio da emissão de certificados pelo registro simplificado, toda a análise foi realizada como se a captação tivesse sido aprovada de acordo com o artigo 4º da Instrução CVM nº 208/1994, e tal distorção levou à equivocada constatação de que o recorrente estava sujeito à prestação e contas nos termos e prazos previstas para as emissões com distribuição pública e sujeito ao mesmo prazo de conclusão e limitação de movimentação dos valores arrecadados para tal forma de captação. Desse modo, o Tribunal de Contas incorreu em ilegalidade ao aplicar a pena de devolução dos valores e pagamento da multa, pois a emissão de certificados para captação privada é modalidade peculiar, que não permite a aplicação das regras previstas para os projetos fundados na emissão publica. 24) ao contrário do que foi considerado na tomada de contas, não há previsão legal de prazo para a conclusão da captação de recursos, mas sim que cabe a empresa emissora estabelecer o período de validade dos certificados de investimentos, do que se conclui que não há prazo para a conclusão do projeto. 25) os fatos que levaram à impossibilidade de conclusão do projeto foram gerados pela Instrução Normativa CVM nº. 260/1997 e do arbitrário bloqueio e desaparecimento de suas contas, fato que não foi esclarecido pelo Banco do Brasil e TCU. 26) a Instrução CVM n° 260/1997 induziu o mercado em geral à interpretação de que, a partir da sua edição, todos os certificados emitidos pelo recorrente, sob a égide da Instrução CVM n°208/1994, tinham perdido a validade, o que representa motivo justificável para a não conclusão do projeto. Tal norma acabou por atribuir ao ato normativo posterior efeito retroativo inconstitucional e desprovido de previsão legal e desrespeitou o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, o que foi apontado nos embargos de declaração, mas não foi reconhecido pela sentença. 27) a SECEX/SP não poderia ter concluído que ocorreu prejuízo ao erário, sem que fossem demonstrados quais investidores utilizaram-se de suas cotas de investimento para a obtenção de isenção de impostos, o que revela o impulso punitivo que moveu a assessoria durante todo o procedimento de tomada de contas e o macula de nulidade. 28) o TCU não poderia atribuir ao apelante a sanção aplicada por não se tratar de recursos públicos. Ademais, o modo utilizado para arbitrar o valor a ser devolvido, com base na previsão de valores a serem arrecadados e não nos valores efetivamente captados, e utilizados como beneficio fiscal, contraria as regras mais comezinhas do ordenamento jurídico e as instruções normativas do próprio tribunal, acarreta enriquecimento sem causa do fundo e impõe penalidade ao apelante que não encontra amparo na legislação aplicável ao caso. 29) a sentença incorreu em negativa da prestação jurisdicional e deixou de analisar e valorar a prova apresentada, sem a adequada e necessária fundamentação. Ademais, são nulos os embargos que não apreciam todas as questões postas e que dizem respeito às contradições e omissões existentes. 30) Os Ministros do TCU determinaram à SECEX/SP a realização de diligências junto à SRF para apurar o efetivo dano ao erário. Em resposta, o órgão se manifestou pela inviabilidade de atendimento do pleito por não ter em seu banco de dados as informações solicitadas e não ser viável a obtenção por meio de ação fiscal, dada a ocorrência de decadência do direito de constituição de eventuais créditos tributários. Também não foi apurada existência de qualquer beneficiado de incentivos fiscais, como observado pela AGU. 31) a determinação de ressarcimento acarretaria enriquecimento sem causa, uma vez que não foram demonstrados os valores utilizados pelos investidores para fins de abatimento fiscal e as sanções previstas no artigo 21, inciso I, da Lei nº 8.429/92, prescindem da efetiva demonstração de ocorrência de dano ao patrimônio público. 32) em razão da ausência de prova de prejuízo ao erário, descabe a pretensão de imputar obrigação aos executados. Não obstante, o titulo extrajudicial que embasa a execução não se reveste das qualidades exigidas por lei, especialmente quanto à sua liquidez, de acordo com o artigo 803 do CPC, o que impede o prosseguimento da execução. Requer a reforma da sentença, para que seja reconhecida a inexistência de prova de prejuízo ao erário, a ausência de desfalques ou desvio de valores e bens públicos, bem como que o procedimento administrativo está eivado de nulidades insanáveis, que prejudicam a certeza, liquidez e exigibilidade do acórdão do TCU, que embasa a execução. Em contrarrazões, a UNIÃO requer seja negado provimento ao recurso e majorada a verba honorária fixada, nos termos do artigo 85, § 1º, do CPC (Id 58525189 – fls. 185/217). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0024920-27.2015.4.03.6100 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: JOSE ROBERTO BERNARDES DE LUCA Advogado do(a) APELANTE: JOSE LUIZ DA SILVA LEME TALIBERTI - SP35919 APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – DOS FATOS E PROCESSAMENTO Trata-se de embargos à execução do Acórdão/TCU nº 2948/2010, com pedido de efeito suspensivo, opostos por ADL ASSESSORIA E CONSULTORIA S/C LTDA. e JOSÉ ROBERTO BERNARDES DE LUCA, com o objetivo de que sejam reconhecidas: “preliminarmente, as matérias prejudiciais invocadas no inciso terceiro retro relativos à prescrição e decadência, bem como a inexigibilidade do título executivo que se operam no presente caso ou reconhecer, no mérito, em razão da absoluta ausência de prova de prejuízo ao erário, que não há se falar em ressarcimento ao erário. Do mesmo modo, requer sejam reconhecidos (em razão da ilegal retroação dos efeitos da Instrução CVM n° 260/1997, aplicada pela Comissão de Valores Mobiliários a partir abril de 1997, tornando sem validade os certificados emitidos pela empresa (ADL) e da total impossibilidade de conclusão do projeto aprovado por motivo de fato superveniente) corretos os atos e condutas adotados em face da legislação vigente à época, bem como do lapso temporal decorrido e afastando, por consequência, as imputações dirigidas a embargante de (i) omissão no dever de prestar contas e (ii) desfalque ou desvio de dinheiros, bens ou valores públicos, considerando o processo administrativo totalmente nulo” e afastada: “a obrigação a eles imputados de ressarcimento aos cofres do Tesouro Nacional condenando-se a embargada a arcar com os ônus da sucumbência” (Id. 58525188 - fls. 04/23). A ação foi recebida sem efeito suspensivo (Id. 58525189 - fl. 03). Processado o feito, sobreveio a sentença que julgou improcedentes os embargos e condenou os embargantes ao pagamento de custas e honorários, fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa, que serão devidos apenas se a embargada comprovar a perda da condição de necessitados dos autores no prazo estabelecido pelo artigo 98, § 3º, do CPC, contra a qual foi interposto recurso, ora examinado. (Id. 58525189 - fls. 53/57) Os embargos de declaração opostos pelos autores (Id. 58525189 - fls. 60/72 e 82/89) foram rejeitados (58525189 - fls. 78/79 e 95/96). O apelante apresentou memoriais (Id. 71526228). O recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo, com fundamento no artigo 1.012, §1º, inciso III, do CPC (Id. 90192394). Novos memoriais foram apresentados pelo autor (Id. 107378818). Em decorrência da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 636.886/AL, foi determinada a suspensão do curso do processo até pronunciamento definitivo da corte, nos termos do artigo 1.035, §5º, do Código de Processo Civil (Id. 125417028). Contra referida decisão, foram opostos embargos de declaração pelo recorrente (Id. 126650467). O embargante apresentou manifestação para reiterar a ocorrência da prescrição intercorrente na tramitação do processo administrativo de tomada de contas especial pelo TCU e a nulidade do procedimento e requereu a prioridade na tramitação do feito por se tratar de pessoa com idade de 68 anos (Id. 131641771). JOSÉ ROBERTO BERNARDES DE LUCA apresentou manifestação para requerer a declaração imediata da prescrição, matéria de ordem pública, à vista da existência jurisprudência pacificada no STF quanto à aplicabilidade imediata do julgamento de temas de repercussão geral e da decisão proferida pelo juiz da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo na Execução de Titulo Extrajudicial nº 0022328-15.2012.4.03.6100, processo idêntico ao presente feito e com as mesmas partes (Id. 148391124). À vista do julgamento do RE 636.886/AL pelo Supremo Tribunal Federal, foram declarados prejudicados os embargos de declaração opostos pelo apelante e determinado à União que trouxesse aos autos cópia integral do processo administrativo de Tomada de Contas Especial TC nº 009.857/1999-0, para análise das questões relativas à regularidade formal do procedimento, erro no enquadramento legal dos projetos, existência de comprovação de prejuízo ao erário e eventual ocorrência da decadência e prescrição intercorrente (Id. 153064069). Contra essa decisão, foram opostos embargos de declaração pelo apelante (Id. 14831351). A UNIÃO apresentou contrarrazões aos embargos de declaração opostos e colacionou aos autos a cópia integral do procedimento administrativo de Tomada de Contas Especial TC nº 009.857/1999-0 (Id. 155724634). O apelante José Roberto manifestou-se novamente para informar o julgamento dos embargos de declaração no RE 636886, dizer que a decisão aplica-se de imediato à tese tratada nos autos, especialmente no que se refere aos ditames do inciso V do artigo 174 do Crédito Tributário Nacional e artigo 40 da Lei de Execução Fiscal, considerado que o processo tramita há mais de 05 anos e que o fato gerador ocorreu na década de 90, como demonstra o processo administrativo, e afirmar que está presente a prescrição de 03 anos, prevista no paragrafo 1º do artigo 1º da Lei nº 9.873/99 (Id. 201490719). II – DO PROCEDIMENTO DE TOMADA CONTAS ESPECIAL O Projeto “EM CARTAZ É A REPRESENTAÇÃO” apresentado pela embargante ADL Assessoria e Consultoria S/C Ltda. foi aprovado pelo Ministério da Cultura, em 07/03/14995, e credenciada a obter investimentos, previstos na Lei nº 8.685/93, no valor de R$ 766.211,39 (Id. 155726154 – fl. 03). A Comissão de Valores Mobiliários aprovou, em 02/10/1995, a emissão e colocação mediante subscrição particular de 39 certificados de investimentos, representativos de direitos de comercialização da obra audiovisual cinematográfica, com valor unitário de R$ 19.66,41 e valor total da emissão registrada de R$ 766.210,00, e fixou o prazo de 120 dias para a distribuição pública (Id. 155726154 – fls. 04/05). A produtora captou, efetivamente, o valor total de R$ 117.876,00 e restou um saldo a captar de R$ 648.318,00 (Id. 155726154 - fl. 15). O responsável pela empresa ADL Assessoria e Consultoria foi notificado pelo Ministério da Cultura, em 23/03/1998, a encaminhar a prestação de contas relativa ao projeto (Id. 155726154 – fl. 14). À vista do não atendimento da solicitação, o projeto foi encaminhado à Secretaria de Controle Interno, unidade do Ministério da Cultura (Id. 155726154 – fls. 16/17), que reiterou, em 11/12/1998 e 25/01/1999, a solicitação de encaminhamento da prestação de contas e deu oportunizado o recolhimento dos recursos aos cofres do tesouro nacional (Id. 155726154 – fls. 20/25). Como as solicitações não foram atendidas, o processo foi encaminhado à Secretaria de Controle Interno do Ministério da Cultura para instauração da tomada de contas especial (Id. 155726154 – fl. 26 e Id. 155726153 – fl. 01). A tomada de contas especial foi instaurada em 14/04/1999 (Id. 155726153 – fls. 15/16). O chefe de divisão da Secretaria de Controle Interno do Ministério da Cultura manifestou-se pela irregularidade das contas de José Roberto Bernardes e Luca e considerou-o devedor da importância de R$ 172.886,04, correspondente ao valor original corrigido, de acordo com relatório de auditoria de tomada de contas especial nº 05/99, de 11/06/1999 (Id. 155726153 – fls. 17/19), o que foi ratificado pelo chefe da Divisão de Auditoria de Gestão e pelo coordenador-geral de Auditoria/CISET/MINC (Id. 155726153 – fls. 20/21). O processo foi encaminhado, em 18/06/1999, ao Tribunal de Contas da União para apreciação e julgamento (Id. 155726153 – fl. 23). Após diversas diligências efetuadas para fins de quantificação precisa do débito, apuração dos fatos e responsabilidade concernentes à liberação indevida dos recursos, confirmação da inexistência da conta corrente informada, levantamento de todas as contas correntes vinculadas ao projeto e da movimentação bancária, solicitação à Receita Federal dos montantes das deduções de imposto de renda, nos anos de 1994 a 1999, decorrentes da utilização de quotas representativas de direitos de comercialização de projetos cinematográficos da produtora ADL, entre outras (Id. 155726153 – fls. 25/56, Id. 155726148 – fls. 01/50, Id. 155726142 – fls. 01/37), foi determinada a citação dos responsáveis solidários, nos termos do artigo 10, § 1º e artigo 12, inciso II, da Lei nº 8.443/92, c.c. o artigo 153, inciso III, do Regimento Interno, para apresentação de defesa ou recolhimento da quantia devida aos cofres do Tesouro Nacional (Id. 155726142 – fls. 38/43). A empresa ADL Assessoria e Consultoria S/C LTDA. e seus sócios José Roberto Bernardes de Luca e Ângela Maria do Prado Teixeira compareceram espontaneamente, em 28/08/2001, para informar que haviam tomado conhecimento da existência do processo administrativo por meio de matéria jornalística e requerer a prorrogação do prazo para prestação das contas (Id. 155726142 – fls. 44/47). A defesa e a prestação de contas foram apresentadas em 01/10/2001 (Id. 155726139 – fls. 14/53 e Id. 155726138 – fls. 01/19). A defesa apresentada foi considerada improcedente, conforme parecer técnico. O mesmo documento determinou a citação solidária dos responsáveis pelo débito, para apresentação de defesa ou recolhimento da quantia devida, em razão do desvio dos recursos captados que se destinavam a financiar a execução do projeto, o que foi chancelado pelo Secretário de Controle Externo e pelo Ministro-Relator do TCU, conforme despacho de 20/03/2002 (Id. 155726138 – fls. 31/37). Os apelantes não apresentaram defesa e nem efetuaram o recolhimento do débito, motivo pelo qual foram considerados revéis. O auditor da Secretaria de Controle Interno do Ministério da Cultura propôs que as contas fossem julgadas irregulares e os responsáveis condenados ao pagamento do valor de R$ 278.583,29, atualizado até 30/08/2002, com acréscimo de atualização monetária e juros de mora. Foi aplicada ao apelante José Roberto Bernardes de Luca a multa prevista no artigo 57 da Lei nº 8.443/92, atualizada monetariamente e acrescida de juros de mora, autorizada a cobrança judicial das dívidas e a remessa de cópia da decisão para o Ministério Publico Federal para ajuizamento das ações civis e penais cabíveis, o que foi acolhido pela Secretaria de Controle Externo e o processo remetido ao Ministro-Relator do TCU (Id. 155726135 – fls. 38/51). Na Sessão ordinária da Primeira Câmara do TCU, ocorrida em 25/03/2003, foi adiada a discussão e votação do processo TC nº 009.857/1999-0 por pedido de vista formulado pelo Ministro-Substituto (Id. 155726135 – fl. 58). Na sessão realizada em 02/09/2003, os Ministros aprovaram o voto revisor apresentado pelo substituto, antecedente ao julgamento de mérito das contas, no qual defendeu a adoção de medidas preliminares de diligências ao Banco do Brasil e à Secretaria da Receita Federal, para o fim de obter informações adicionais para subsidiar o julgamento e uniformizar as decisões sobre a matéria e o encaminhamento de cópias dos autos ao Ministério Público da União, à vista da existência de indícios de ilícitos na gestão dos recursos captados, para adoção das providências cíveis e penais cabíveis (Id. 155726134 – fls. 02/18). Os executados foram novamente citados solidariamente para apresentar defesa ou pagar o valor do débito, em virtude da omissão no dever de prestar contas e dos fortes indícios de desvio dos recursos captados, das informações inverídicas sobre a abertura de conta de aplicação financeira vinculada ao projeto junto ao Banco do Brasil e a sua não conclusão (Id. 155725980 – fls. 31/34). O embargante José Roberto Bernardes de Luca apresentou defesa (Id. 155725979 – fls. 52/53 e Id. 155725976 – fls. 01/02). Na sessão realizada no dia 25/05/2010, a 1ª Câmara do TCU julgou irregulares as contas de José Bernardes de Luca e condenou-o, solidariamente com a empresa ADL Assessoria e Consultoria, ao pagamento da quantia de R$ 766.211,39, atualizada monetariamente e com juros de mora calculados a partir de 07/03/1995, acrescida de multa de 50% sobre o valor original corrigido, nos termos do artigo 6º, § 1º, da Lei nº 8.685/93. A corte aplicou ao apelante e à empresa produtora, individualmente, multa de R$ 210.000,00, com base no artigo 57 da Lei nº 8.443/92 (Id. 155725974 – fls. 51/66). Os Ministros, na sessão ocorrida em 26/07/2001, negaram provimento ao recurso de reconsideração apresentado por José Roberto (Id. 155725969 – fls. 61/76) e no dia 20/09/2001 rejeitaram os embargos de declaração por ele opostos (Id. 155725969 – fls. 85/87). O acórdão nº 2948/2010, de 25/05/2010, transitou em julgado em 25/10/2010 (Id. 155725969 – fl. 101). III – DA PRESCRIÇÃO 3.1) Da Prescrição da Pretensão Executiva O Supremo Tribunal no julgamento do RE nº 636886/AL, com repercussão geral reconhecida, pacificou o entendimento de que a pretensão de ressarcimento ao erário proveniente de acórdão do Tribunal de Contas não é imprescritível e está sujeita ao prazo previsto na Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal), como estabelece o artigo 39, § 2º, da Lei 4.320/1964. Foi fixada a seguinte tese jurídica: “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”. Confira-se: EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL. EXECUÇÃO FUNDADA EM ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESCRITIBILIDADE. 1. A regra de prescritibilidade no Direito brasileiro é exigência dos princípios da segurança jurídica e do devido processo legal, o qual, em seu sentido material, deve garantir efetiva e real proteção contra o exercício do arbítrio, com a imposição de restrições substanciais ao poder do Estado em relação à liberdade e à propriedade individuais, entre as quais a impossibilidade de permanência infinita do poder persecutório do Estado. 2. Analisando detalhadamente o tema da “prescritibilidade de ações de ressarcimento”, este SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL concluiu que, somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa – Lei 8.429/1992 (TEMA 897). Em relação a todos os demais atos ilícitos, inclusive àqueles atentatórios à probidade da administração não dolosos e aos anteriores à edição da Lei 8.429/1992, aplica-se o TEMA 666, sendo prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública. 3. A excepcionalidade reconhecida pela maioria do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no TEMA 897, portanto, não se encontra presente no caso em análise, uma vez que, no processo de tomada de contas, o TCU não julga pessoas, não perquirindo a existência de dolo decorrente de ato de improbidade administrativa, mas, especificamente, realiza o julgamento técnico das contas à partir da reunião dos elementos objeto da fiscalização e apurada a ocorrência de irregularidade de que resulte dano ao erário, proferindo o acórdão em que se imputa o débito ao responsável, para fins de se obter o respectivo ressarcimento. 4. A pretensão de ressarcimento ao erário em face de agentes públicos reconhecida em acórdão de Tribunal de Contas prescreve na forma da Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal). 5. Recurso Extraordinário DESPROVIDO, mantendo-se a extinção do processo pelo reconhecimento da prescrição. Fixação da seguinte tese para o TEMA 899: “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”. (RE 636886, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 20/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-157 DIVULG 23-06-2020 PUBLIC 24-06-2020) No julgamento dos embargos de declaração opostos pela União foi esclarecido que a discussão ficou limitada à fase de execução e não tratou da fase anterior à formação do título extrajudicial e reafirmado que: “a pretensão executória de título executivo proveniente de decisão do TCU da qual resulte imputação de débito ou multa é prescritível; e, portanto, a ela se aplica o prazo prescricional da Lei de Execução Fiscal”: Ementa: TEMA 899 DE REPERCUSSÃO GERAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO FUNDADA EM DECISÃO DE TRIBUNAL DE CONTAS (CF, ART. 71, § 3º). PRAZO DE 5 (CINCO) ANOS. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. O acórdão embargado não apresenta omissões, contradições, ou obscuridades. O ofício judicante realizou-se de forma completa e satisfatória, não se mostrando necessários quaisquer reparos. 2. A questão controvertida decidida no Tema 899 da repercussão geral definiu a prescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas, nos termos do art. 71, § 3º, da CF, que estabelece: “as decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo”. 3. Após a conclusão da tomada de contas, com a apuração do débito imputado ao jurisdicionado, conforme definido pelo STF, a decisão do TCU formalizada em acórdão terá eficácia de título executivo e será executada conforme o rito previsto na Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/1980). 4. Inexistência de hipótese de imprescritibilidade, aplicando-se, integralmente, o disposto no art. 174 do Código Tributário Nacional, c/c art. 40 da Lei 6.830/1980, que rege a Execução Fiscal e fixa em 5 (cinco) anos, respectivamente, o prazo para a cobrança do crédito fiscal e para a declaração da prescrição intercorrente, conforme consta no acórdão embargado. 5. Ausência dos pressupostos necessários à modulação dos efeitos do julgado. 6. Embargos de Declaração rejeitados. (RE 636886 ED, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 23/08/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-177 DIVULG 03-09-2021 PUBLIC 08-09-2021) Assim, a execução de acórdão do Tribunal de Contas que considerar irregulares as contas e imputar débito e/ou multa ao(s) responsável (eis) enquadra-se no conceito de dívida ativa não tributária da União e está sujeita ao artigo 174 do Código Tributário Nacional, c.c. o artigo 40 da Lei 6.830/1980, que rege o executivo fiscal, fixa o prazo 05 cinco anos para a cobrança do crédito e para a declaração da prescrição intercorrente, bem como estabelece como termo inicial a data da sua constituição definitiva: Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005) II - pelo protesto judicial; III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor. No caso concreto, o acórdão do Tribunal de Contas que julgou irregulares as contas do apelante transitou em julgado em 25/10/2010 (Id. 155725969 – fl. 101). A execução extrajudicial, por sua vez, foi distribuída em 13/03/2015, portanto, dentro do prazo prescricional previsto no artigo 174, caput, do CTN. 3.2) Da Prescrição das Pretensões Ressarcitória e Punitiva José Roberto Bernardo de Luca teve as contas reprovadas pelo Tribunal de Contas da União e foi condenado ao pagamento dos débitos apurados e das multas previstas no artigo 6°, § 1°, da Lei n° 8.685/93 e artigo 57, da Lei nº 8.443/92. O artigo 37, § 5º, da Constituição Federal prevê que os ilícitos praticados por agentes que causem prejuízos ao erário terão os prazos de prescrição fixados por lei, com exceção das ações de ressarcimento. Art. 37 (…) § 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. A interpretação literal do dispositivo levou a comunidade jurídica, num primeiro momento e por um longo período, a compreender que todas as ações de ressarcimento ao erário eram imprescritíveis. No entanto, o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que, em nome da segurança jurídica, as ações de reparação de danos ao erário decorrentes de ilícitos civis são, em regra, prescritíveis, inclusive as decorrentes de atos de improbidade administrativa praticados sem dolo. Confira-se: Ementa: CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. 2. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 669069 RG, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-082 DIVULG 27-04-2016 PUBLIC 28-04-2016) Para a Corte Suprema, a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário decorrente de ilícitos civis é cabível apenas para os casos de prática de atos dolosos tipificados na lei de improbidade por expressa disposição constitucional (artigo 37, § 5º): DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5 º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. A prescrição é instituto que milita em favor da estabilização das relações sociais. 2. Há, no entanto, uma série de exceções explícitas no texto constitucional, como a prática dos crimes de racismo (art. 5º, XLII, CRFB) e da ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV, CRFB). 3. O texto constitucional é expresso (art. 37, § 5º, CRFB) ao prever que a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos na esfera cível ou penal, aqui entendidas em sentido amplo, que gerem prejuízo ao erário e sejam praticados por qualquer agente. 4. A Constituição, no mesmo dispositivo (art. 37, § 5º, CRFB) decota de tal comando para o Legislador as ações cíveis de ressarcimento ao erário, tornando-as, assim, imprescritíveis. 5. São, portanto, imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. 6. Parcial provimento do recurso extraordinário para (i) afastar a prescrição da sanção de ressarcimento e (ii) determinar que o tribunal recorrido, superada a preliminar de mérito pela imprescritibilidade das ações de ressarcimento por improbidade administrativa, aprecie o mérito apenas quanto à pretensão de ressarcimento. (RE 852475 RG, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 08/08/2018, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-058 DIVULG 22-03-2019 PUBLIC 25-03-2019) No julgamento do RE nº 686886/AL, acima transcrito, embora a discussão estivesse limitada à análise da prescrição da pretensão executória de acórdão do TCU, o STF definiu que a tese da prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário aplica-se, inclusive, para as decisões do Tribunal de Contas que imputam ao responsável débito ou multa. Para a corte, essa decisão não pode ser considerada imprescritível por ausência de previsão constitucional expressa e uma vez que não analisa a existência ou ato doloso de improbidade, não decorre de atividade jurisdicional, mas de ato de natureza administrativa, e não há no procedimento a garantia do devido processo legal, consubstanciada no exercício do contraditório e da ampla defesa, para fins de comprovação da ausência do elemento subjetivo. Confira-se trecho extraído do voto do relator Ministro Alexandre de Moraes: “(...) Em conclusão, nos termos das fundamentações e decisões Plenárias do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa Lei 8.429/1992 (TEMA 897). Em relação a todos os demais atos ilícitos, inclusive àqueles atentatórios à probidade da administração não dolosos e aos anteriores à edição da Lei 8.429/1992, aplica-se o TEMA 666, sendo prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública. Entendo que, as razões que levaram a maioria da CORTE a estabelecer excepcional hipótese de imprescritibilidade, no tema 897, não estão presentes em relação as decisões do Tribunal de Contas que resultem imputação de débito ou multa, e, que, nos termos do §3º, do artigo 71 da CF, tem eficácia de título executivo; sendo, portanto, prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada nessas decisões; uma vez que, (a) a Corte de Contas, em momento algum, analisa a existência ou não de ato doloso de improbidade administrativa; (b) não há decisão judicial caracterizando a existência de ato ilícito doloso, inexistindo contraditório e ampla defesa plenos, pois não é possível ao imputado defender-se no sentido da ausência de elemento subjetivo (...)”.. A excepcionalidade reconhecida pela maioria do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no TEMA 897, portanto, não se encontra presente no caso em análise, uma vez que no processo de tomada de contas, o TCU não perquire nem culpa, nem dolo decorrentes de ato de improbidade administrativa, mas, simplesmente realiza o julgamento das contas à partir da reunião dos elementos objeto da fiscalização e apurada a ocorrência de irregularidade de que resulte dano ao erário, proferindo o acórdão em que se imputa o débito ao responsável, para fins de se obter o respectivo ressarcimento. Ainda que franqueada a oportunidade de manifestação da outra parte, trata-se de atividade eminentemente administrativa, sem as garantias do devido processo legal. No procedimento instaurado pelo TCU, não se imputa a existência de ato de improbidade, nem tampouco se abre a possibilidade do fiscalizado defender-se, com todas as garantias do devido processo judicial, no sentido de eximir-se de dolo ou mesmo culpa (...) Cabe registrar que para o STF, o: “reconhecimento da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas significa grave ferimento ao Estado de Direito, que exige, tanto no campo penal, como também na responsabilidade civil, a existência de um prazo legal para o Poder Público exercer sua pretensão punitiva, não podendo, em regra, manter indefinidamente essa possibilidade, sob pena de desrespeito ao devido processo legal”. Por fim, foi ressalvada pelo Ministro Relator no voto proferido a possibilidade de ajuizamento de ação de improbidade administrativa, paralelamente à execução de título extrajudicial, observados a ampla defesa e o contraditório, para os casos de irregularidades identificadas pelo TCU, consideradas atos ilícitos, para o fim de obter-se a condenação ao ressarcimento ao erário que, nos termos da tese fixada no Tema 897, será considerada imprescritível. Nesse sentido, cita-se, ainda: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. OCORRÊNCIA. RE 852.475/SP - TEMA 897/STF. INAPLICABILIDADE. DISTINGUISHING. RECONHECIMENTO. 1. Conforme previsto no art. 1.040, II, do CPC/2015, publicado o paradigma nos casos de recurso repetitivo ou repercussão geral, o julgador reexaminará o acórdão recorrido que contrariar a orientação do tribunal superior. 2. No caso, muito embora a Suprema Corte tenha determinado a restituição dos autos para eventual adequação do acórdão antes proferido ao RE 852.475/SP, no qual foi firmada tese quanto à imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Tema 897/STF), a hipótese não se enquadra na aplicação do precedente. 3. O acórdão antes proferido por esta Turma, ao reconhecer a prescrição quinquenal da pretensão ressarcitória, levou em consideração que, no presente caso, não houve o ajuizamento da ação de improbidade administrativa, mas tão somente da ação de ressarcimento, de modo a incidir o prazo prescricional do Decreto-Lei n. 20.910/1932, sendo certo que o aspecto alusivo ao elemento subjetivo (dolo) em momento algum foi referido no âmbito do Tribunal a quo. 4. O precedente obrigatório em comento é oriundo de ação de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público/SP em desfavor de agentes públicos que, no âmbito do TJ/SP, tiveram reconhecida a prescrição das sanções previstas na Lei n. 8.429/1992, bem assim do ressarcimento dos danos ao erário. 5. Evidenciado o distinguishing ora apresentado em relação à situação fática analisada pela Suprema Corte, não se verifica nenhuma incompatibilidade do julgado antes proferido no presente feito com o entendimento firmado pelo STF no RE 852.475/SP. 6. Manutenção do acórdão. (AgInt no REsp 1532741/ES, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/08/2020, DJe 13/08/2020) Os artigos 1º, 7º e 8º do Decreto nº 20.910/32 estabelecem que as dívidas da União, bem como todo direito ou ação contra a fazenda federal, independentemente da natureza, prescreve em cinco anos, contados da data ou do fato do qual se originarem e que a citação tem o condão de interromper a prescrição, circunstância que somente poderá ocorrer uma vez: Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem. Art. 6º O direito à reclamação administrativa, que não tiver prazo fixado em disposição de lei para ser formulada, prescreve em um ano a contar da data do ato ou fato do qual a mesma se originar. Art. 7º A citação inicial não interrompe a prescrição quando, por qualquer motivo, o processo tenha sido anulado. A jurisprudência tem considerado que referida regra aplica-se às ações de ressarcimento decorrentes de atos ilícitos, que não configurem ato de improbidade dolosa, com fundamento nos princípios da igualdade e simetria: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PROCESSO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. VIOLAÇÃO A INSTRUÇÃO NORMATIVA. EXAME INCABÍVEL EM SEDE DE APELO ESPECIAL. ARTS. 31 E 57 DA LEI 8.443/92, 471 DO CPC, 884 DO CC, 26, VI, E 27, § 1º, DA LEI 9.784/99. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. TESE DE PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA OU FALHA NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. IMPUTAÇÃO DO DÉBITO E APLICAÇÃO DE SANÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE HIPÓTESE DE IMPRESCRITIBILIDADE. LACUNA LEGISLATIVA. NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO POR ANALOGIA. APLICAÇÃO DO PRAZO QUINQUENAL. DECURSO. OCORRÊNCIA. (...) 6. Na tomada de contas especial, diversamente, o ônus da prova incumbe ao responsável pela aplicação dos recursos repassados, que se torna o responsável pelo débito e multa por mera presunção de prejuízo ao erário se ausente ou falha a prestação de contas. Nessas circunstâncias, a atuação administrativa deve encontrar limites temporais, sob pena de sujeitar os responsáveis pela aplicação de repasses de verbas federais a provarem, eles, a qualquer tempo, mesmo que decorridas décadas, a adequada aplicação dos recursos que um dia geriram, em flagrante ofensa a princípios basilares do Estado de Direito, como a segurança jurídica e ampla defesa. 7. Em virtude da lacuna legislativa, pois não há previsão legal de prazo para a atuação do Tribunal de Contas da União, deve ser-lhe aplicado o prazo quinquenal, por analogia aos arts. 1º do Decreto 20.910/32 e 1º da Lei 9.873/99. Em hipótese similar à presente, porquanto ausente prazo decadencial específico no que concerne ao exercício do poder de polícia pela Administração, antes do advento da Lei 9.873/99, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 1.105.442/RJ (Rel Min. Hamilton Carvalhido, Primeira Seção, DJe 22/2/2011), sob o rito do art. 543-C do CPC, assentou ser ele de 5 anos, valendo-se da aplicação analógica do art. 1º do Decreto 20.910/32. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido para julgar procedente o pedido inicial, desconstituindo a decisão do Tribunal de Contas da União no processo de tomada de contas especial do Convênio 5013/96, ressalvando-se a via judicial para o pleito de eventual ressarcimento. (STJ, REsp 1480350/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/04/2016, DJe 12/04/2016) PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. NÃO CARACTERIZAÇÃO. FRAUDE CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. APURAÇÃO EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. PRAZO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO RESSARCITÓRIA. REPERCUSSÃO GERAL. RE 669.069/MG. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. DECRETO 20.910/1932. 1. Incidência do Enunciado Administrativo 3/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". 2. O acórdão recorrido abordou, de forma fundamentada, todos os pontos essenciais para o deslinde da controvérsia, razão pela qual não há falar na suscitada ocorrência de violação do art. 1022 do CPC/2015. 3. "É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil." (RE 669.069/MG, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, DJe 28.4.2016). 4. Aplica-se o prazo prescricional de 5 anos, nos termos do art. 1º do Decreto 20.910/1932, à ação de ressarcimento de benefício previdenciário pago indevidamente, quando comprovada a má-fé do benefíciário, em atenção aos princípios da isonomia e simetria. 5. Agravo conhecido. Recurso especial conhecido e não provido. (STJ, AREsp 1441458/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 17/11/2020) A prescrição da pretensão punitiva do TCU, consoante entendimento jurisprudencial, é regulada pela Lei nº 9.873/1999, cujo artigo 1º fixa em cinco anos o prazo para ajuizamento da ação sancionatória pela administração pública federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, para fins de apuração de infração, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração continuada, do dia em que tiver cessado e prevê como uma das causas de interrupção a notificação ou citação do indiciado ou acusado (artigo 2º, inciso I): Ementa: Direito administrativo. Mandado de segurança. Multas aplicadas pelo TCU. Prescrição da pretensão punitiva. Exame de legalidade. 1. A prescrição da pretensão punitiva do TCU é regulada integralmente pela Lei nº 9.873/1999, seja em razão da interpretação correta e da aplicação direta desta lei, seja por analogia. 2. Inocorrência da extinção da pretensão punitiva no caso concreto, considerando-se os marcos interruptivos da prescrição previstos em lei. 3. Os argumentos apresentados pelo impetrante não demonstraram qualquer ilegalidade nos fundamentos utilizados pelo TCU para a imposição da multa. 4. Segurança denegada. (MS 32201, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 21/03/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-173 DIVULG 04-08-2017 PUBLIC 07-08-2017) Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. PRETENSÃO PUNITIVA DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. PRESCRIÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI 9.873/1999. SUBSISTÊNCIA DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I - As razões do agravo regimental são inaptas para desconstituir os fundamentos da decisão agravada, que, por isso, se mantêm hígidos. II - No âmbito do TCU, o agravante teve a possibilidade de demonstrar a ocorrência das nulidades suscitadas, mas não cumpriu o ônus de comprovar suas alegações. Do mesmo modo, no presente mandado de segurança, não foram apresentados novos argumentos ou documentos aptos a desconstituir o que asseverado no acórdão apontado como ato coator. III – Ao perquirir sobre qual prazo prescricional deve ser aplicado à espécie, a Primeira Turma desta Corte entendeu que “a prescrição da pretensão punitiva do TCU é regulada integralmente pela Lei nº 9.873/1999, seja em razão da interpretação correta e da aplicação direta desta lei, seja por analogia” (MS 32.201/DF, Rel. Min. Roberto Barroso). No caso, aplicando-se a referida Lei, observa-se que a pretensão sancionatória do TCU, em relação aos atos praticados pelo agravante, não foi fulminada pelo decurso do tempo. IV- Agravo regimental a que se nega provimento. (MS 37373 AgR, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 31/05/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-106 DIVULG 02-06-2021 PUBLIC 04-06-2021) In casu, verifica-se a ocorrência da prescrição das pretensões ressarcitória e sancionatória, porquanto o procedimento de tomada de contas especial foi instaurado em 14/04/1999 (Id. 155726153 – fl. 16), interrompido pelo comparecimento espontâneo do apelante em 28/08/2001 (Id. 155726142 – fls. 44/47) e as contas foram examinadas e consideradas irregulares na sessão ocorrida no dia 25/05/2010 (Id. 155725974 – fls. 66). Portanto, entre a citação e o julgamento decorreu o prazo de quase 10 anos, superior ao estabelecido no Decreto nº 20.910/32 e na Lei nº 9.873/1999. Nas contrarrazões apresentadas, a União requer seja explicitada a distinção entre a presente demanda e o Mandado de Segurança nº 26.210-9, julgado pelo STF, em que a alegação da impetrante de ocorrência da prescrição da cobrança dos valores, exigidos por meio de acórdão do TCU, com fundamento no artigo 1º do Decreto 20.910/32, foi afastada e reconhecida a imprescritibilidade do prejuízo apurado, com base no artigo 37, § 5º, da CF. Como mencionado, à época do julgamento do Mandado de Segurança nº 21.210-9/DF (04/09/2008), prevalecia o entendimento jurisprudencial de que todas as ações de ressarcimento eram consideradas imprescritíveis. Todavia, o STF alterou seu entendimento e passou dar uma nova interpretação ao § 5º do artigo 37 da CF, para considerar que as ações de reparação de danos ao erário decorrentes de ilícitos civis são, regra geral, prescritíveis e que a imprescritibilidade das ações limita-se aos casos de prática de atos dolosos tipificados na lei de improbidade. Nesse sentido, a Corte Suprema, ao julgar o RE 669.069/MG, em 03/02/2016, reconheceu que “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”. Por sua vez, no julgamento do RE 852475/SP, em 08/08/2018, reconheceu que são: “imprescritíveis ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativo”. No voto proferido, o Relator Ministro Ricardo Lewandowski fez a seguinte observação relativamente à imprescritibilidade das ações: “Por fim, ressaltou que, mais do que contrapor os princípios da supremacia do interesse público ao da segurança jurídica, a imprescritibilidade suprime o direito ao devido processo legal e, especialmente, ao da ampla defesa, uma vez que a eventual prevalência do entendimento pela imprescritibilidade acarretaria o dever de cada cidadão de guardar eternamente comprovantes os mais diversos de seus negócios jurídicos com a Administração, o que evidentemente seria inviável e comprometeria o direito à defesa dos cidadãos. Assim, não é só uma questão de segurança jurídica ou de garantia de direitos ou interesses particulares. É também o da Justiça, abrigando dilemas inerentes ao interesse público primário”. Por fim, no julgamento do RE 636886/AL, o vogal Ministro Gilmar Mendes fez um breve histórico dos julgados que culminaram com a alteração do entendimento pela Corte, que passou a considerar que as ações de ressarcimento ao erário são prescritíveis, salvo as fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei 8.429/1992. Confira-se: “Para contextualizar a questão, esta Corte tem, historicamente, assentado a imprescritibilidade de ressarcimento ao erário decorrente de condenação dos Tribunais de Contas, firmando tal posicionamento no MS 26.210, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 10.10.2008, cuja ementa enuncia: (...)Todavia, mais recentemente, relembro que o STF, ainda que lateralmente, por ocasião do julgamento do RE 669.069/MG, paradigma do tema 666, da repercussão geral, de relatoria do Ministro Teori Zavascki, assentou a prescritibilidade da ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Naquela ocasião, o eminente relator propôs a fixação da seguinte tese: “A imprescritibilidade a que se refere o art. 37, §5º, da CF diz respeito apenas a ações de ressarcimento de danos ao erário decorrentes de atos praticados por qualquer agente, servidor ou não, tipificados como ilícitos de improbidade administrativa ou como ilícitos penais”. A partir daí, demonstramos numerosas preocupações quanto ao reconhecimento da imprescritibilidade da ação de ressarcimento por danos decorrentes de ato de improbidade administrativa. Os Ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio, por exemplo, destacaram que a imprescritibilidade poderia redundar na responsabilização de herdeiros. Ao final, restringimo-nos aos ilícitos civis para assentar a prescritibilidade da ação de ressarcimento em tais casos, restando assim aprovada a tese do tema 666 e a ementa, respectivamente: “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”. “CONSTITUCIONAL E CIVIL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. SENTIDO E ALCANCE DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. 1. É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. 2. Recurso extraordinário a que se nega provimento”. (RE 669.069, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, DJe 28.4.2016) No julgamento mais recente (RE 852.475), objeto do tema 897 da sistemática da repercussão geral, esta Corte reassentou, em regra, a incidência de prazo prescricional. Transcreva-se a ementa: (...) A tese restou assim definida: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. Da conjugação de tais precedentes firmados em repercussão geral, sobressai a conclusão de que, em regra, as ações de ressarcimento ao erário são prescritíveis, salvo as ações fundadas especificamente na prática de ato doloso tipificado na Lei 8.429/1992. Isso inclui, por óbvio, todas as demandas que envolvam pretensão do Estado de ser ressarcido pela prática de qualquer ato ilícito, seja ele de natureza civil, administrativa ou penal, ressalvadas as exceções constitucionais (art. 5º, XLII, e XLIV, CF) e a prática de ato doloso de improbidade administrativa (excluindo-se os atos ímprobos culposos, que se submetem à regra prescricional). O que se percebe, portanto, é a necessidade de revisão da jurisprudência consolidada no âmbito desta Corte, no MS 26.210, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 10.10.2008, mais especificamente em relação ao ressarcimento ao erário decorrente de acórdão da Corte de Contas. (...)Ainda, com base nessas premissas e tendo em vista disposto no art. 27 da Lei 9.868/1999, proponho a modulação de efeitos, de modo a assentar a superação da jurisprudência firmada com base no MS 26.210, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 10.10.2008, aplicando os marcos decadenciais e prescricionais, ambos quinquenais (salvo em se tratando de fato que também constitua crime) e observadas as causas de suspensão ou interrupção, apenas aos processos ajuizados posteriormente à presente decisão. É como voto. IV – DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À vista da reforma integral da sentença, faz-se necessária a inversão dos ônus sucumbenciais. Assim, considerados o valor da causa (R$ 10.506.056,87), o grau de zelo do profissional, a natureza da demanda cuja solução não envolveu questões de elevada complexidade, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido, condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios incidentes sobre o proveito econômico obtido e fixados no patamar mínimo previsto nas faixas percentuais iniciais constantes do artigo 85, §§ 3º e 5º, inciso III, do Código de Processo Civil. Por fim, as questões relativas aos demais precedentes e dispositivos suscitados, quais sejam, entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no ARE nº 772852 AgR, AI nº 819135 AgR, RE nº 646741 AgR, AI nº 712435 AgR, RE nº 55821/PR, MS nº 7280 e Ação Cível Originária n° 2.068/RS, pelo Superior Tribunal de Justiça no AgRg nos EmbExeMS nº 4.565/DF, RMS nº 12.349/RO, REsp nº 200.347/RO, RMS nº 12.487/GO e REsp nº 1293330/PE, pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região no julgamento da AC 2006.35.00.007611-9/GO, AC 2000.33.00.016673-8/BA e AC 2007.37.02.000118-8/MA e pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região no julgamento da AC 2001.05.00.034365, artigo 5°, incisos XLII e XLIV, e artigos 70, 71, 73 e 96 da Constituição Federal, artigo 1°, inciso I, artigo 5°, incisos I e II e artigos 8°, 19, 24 e 35 da Lei 8.443/92, Lei n° 9.873/99, Acórdão n° 1.441/2016-Plenário TCU e estudo realizado pela Escola Superior do Ministério Público da União, coordenador André de Carvalho Ramos, em 2011, não interferem ou alteram esse entendimento pelos motivos já indicados. V – DO DISPOSITIVO Ante o exposto, dou provimento à apelação, para reconhecer a prescrição das pretensões ressarcitória e punitiva e condenar a União ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos da fundamentação. Declaro prejudicados os embargos de declaração opostos pelo autor. É como voto.
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTIVA. RE 636886/AL. ARTIGO 174 CTN E ARTIGO 40 DA LEI Nº 6.830/80. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO RESSARCITÓRIA. ARTIGO 37, § 5º, CF. ARTIGOS 1º, 7º E 8º DO DECRETO Nº 20.910/32. RESSARCIMENTO DECORRENTE DE ILICITOS QUE NÃO CONFIGURAM ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE. PRETENSÃO PUNITIVA TCU. LEI Nº 9.873/1999. SUCUMBÊNCIA. REVERSÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 85, §§ 3º E 5º, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO PROVIDA.
- O Supremo Tribunal no julgamento do RE nº 636886/AL, com repercussão geral reconhecida, pacificou o entendimento de que a pretensão de ressarcimento ao erário proveniente de acórdão do Tribunal de Contas não é imprescritível e está sujeita ao prazo previsto na Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal), como estabelece o artigo 39, § 2º, da Lei 4.320/1964. Foi fixada a seguinte tese jurídica: “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”. No julgamento dos embargos de declaração opostos pela União foi esclarecido que a discussão ficou limitada à fase de execução e não tratou da fase anterior à formação do título extrajudicial e reafirmado que: “a pretensão executória de título executivo proveniente de decisão do TCU da qual resulte imputação de débito ou multa é prescritível; e, portanto, a ela se aplica o prazo prescricional da Lei de Execução Fiscal”.
- A execução de acórdão do Tribunal de Contas que considerar irregulares as contas e imputar débito e/ou multa ao(s) responsável (eis) enquadra-se no conceito de dívida ativa não tributária da União e está sujeita ao artigo 174 do Código Tributário Nacional, c.c. o artigo 40 da Lei 6.830/1980, que rege o executivo fiscal, fixa o prazo 05 cinco anos para a cobrança do crédito e para a declaração da prescrição intercorrente, bem como estabelece como termo inicial a data da sua constituição definitiva.
- O artigo 37, § 5º, da Constituição Federal prevê que os ilícitos praticados por agentes que causem prejuízos ao erário terão os prazos de prescrição fixados por lei, com exceção das ações de ressarcimento. A interpretação literal do dispositivo levou a comunidade jurídica, num primeiro momento e por um longo período, a compreender que todas as ações de ressarcimento ao erário eram imprescritíveis. No entanto, o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que, em nome da segurança jurídica, as ações de reparação de danos ao erário decorrentes de ilícitos civis são, em regra, prescritíveis, inclusive as decorrentes de atos de improbidade administrativa praticados sem dolo. Precedentes.
- Para a Corte Suprema, a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário decorrente de ilícitos civis é cabível apenas para os casos de prática de atos dolosos tipificados na lei de improbidade por expressa disposição constitucional (artigo 37, § 5º). Precedentes.
- No julgamento do RE nº 686886/AL, embora a discussão estivesse limitada à análise da prescrição da pretensão executória de acórdão do TCU, o STF definiu que a tese da prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário aplica-se, inclusive, para as decisões do Tribunal de Contas que imputam ao responsável débito ou multa. Para a corte, essa decisão não pode ser considerada imprescritível por ausência de previsão constitucional expressa e uma vez que não analisa a existência ou ato doloso de improbidade, não decorre de atividade jurisdicional, mas de ato de natureza administrativa, e não há no procedimento a garantia do devido processo legal, consubstanciada no exercício do contraditório e da ampla defesa, para fins de comprovação da ausência do elemento subjetivo.
- Cabe registrar que para o STF, o: “reconhecimento da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas significa grave ferimento ao Estado de Direito, que exige, tanto no campo penal, como também na responsabilidade civil, a existência de um prazo legal para o Poder Público exercer sua pretensão punitiva, não podendo, em regra, manter indefinidamente essa possibilidade, sob pena de desrespeito ao devido processo legal”. Foi ressalvada a possibilidade de ajuizamento de ação de improbidade administrativa, paralelamente à execução de título extrajudicial, observados a ampla defesa e o contraditório, para os casos de irregularidades identificadas pelo TCU, consideradas atos ilícitos, para o fim de obter-se a condenação ao ressarcimento ao erário que, nos termos da tese fixada no Tema 897, será considerada imprescritível. Precedente.
- Os artigos 1º, 7º e 8º do Decreto nº 20.910/32 estabelecem que as dívidas da União, bem como todo direito ou ação contra a fazenda federal, independentemente da natureza, prescreve em cinco anos, contados da data ou do fato do qual se originarem e que a citação tem o condão de interromper a prescrição, circunstância que somente poderá ocorrer uma vez. A jurisprudência tem considerado que referida regra aplica-se às ações de ressarcimento decorrentes de atos ilícitos, que não configurem ato de improbidade dolosa, com fundamento nos princípios da igualdade e simetria. Precedentes.
- A prescrição da pretensão punitiva do TCU, consoante entendimento jurisprudencial, é regulada pela Lei nº 9.873/1999, cujo artigo 1º fixa em cinco anos o prazo para ajuizamento da ação sancionatória pela administração pública federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, para fins de apuração de infração, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração continuada, do dia em que tiver cessado e prevê como uma das causas de interrupção a notificação ou citação do indiciado ou acusado (artigo 2º, inciso I). Precedentes.
- À vista da reforma integral da sentença, faz-se necessária a inversão dos ônus sucumbenciais. Assim, considerados o valor da causa, o grau de zelo do profissional, a natureza da demanda cuja solução não envolveu questões de elevada complexidade, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido, condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios incidentes sobre o proveito econômico obtido e fixados no patamar mínimo previsto nas faixas percentuais iniciais constantes do artigo 85, §§ 3º e 5º, inciso III, do Código de Processo Civil.
- Apelação provida. Prejudicados os embargos de declaração opostos pelo autor.