Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5008866-57.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: COMPANHIA AUXILIAR DE ARMAZENS GERAIS

Advogados do(a) IMPETRANTE: CAMILA NICOLETTI DEL ARCO - SP378423, GUILHERME SERAPICOS RODRIGUES ALVES - SP358730, CONRADO GIDRAO DE ALMEIDA PRADO - SP303058, DANIELLA MEGGIOLARO PAES DE AZEVEDO - SP172750, ARTHUR SODRE PRADO - SP270849

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTOS/SP - 6ª VARA FEDERAL

 


 

  

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5008866-57.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

IMPETRANTE: COMPANHIA AUXILIAR DE ARMAZENS GERAIS

Advogados do(a) IMPETRANTE: CAMILA NICOLETTI DEL ARCO - SP378423, GUILHERME SERAPICOS RODRIGUES ALVES - SP358730, CONRADO GIDRAO DE ALMEIDA PRADO - SP303058, DANIELLA MEGGIOLARO PAES DE AZEVEDO - SP172750, ARTHUR SODRE PRADO - SP270849

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SANTOS/SP - 6ª VARA FEDERAL

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de embargos de declaração interpostos pela Companhia Auxiliar de Armazéns Gerais contra o acórdão pelo qual esta Turma, por maioria, denegou a segurança (Id n. 4598440).

A embargante alega, em síntese, o seguinte:

a) o writ foi impetrado arguindo-se quatro linhas argumentativas, quais sejam, inépcia da denúncia, ausência de uma das condições da ação, falta de justa causa para a ação penal e falta de fundamentação do ato coator;

b) o Eminente Desembargador Federal Relator, Dr. Mauricio Kato, votou pelo trancamento da ação penal, adotando fundamentos diversos daqueles expostos na impetração, pois entendeu necessária a dupla imputação;

c) o voto condutor divergiu quanto à necessidade de dupla imputação, mas não houve pronunciamento sobre as teses da impetração;

d) “ou se entende que o voto do Relator acertou ao reconhecer vigência à necessidade de dupla imputação e, em razão disso, os outros pontos aventados pela Defesa não precisam ser analisados, ou se discorda dessa inteligência e, aí, todas essas questões precisariam ser enfrentadas” (Id n. 5147302, p. 3);

e) há omissão acerca da alegação defensiva de que o ato coator teria infringido o art. 3º da Lei n. 9.605/98, dispositivo legal que trata dos requisitos para a atribuição de responsabilidade criminal a pessoas jurídicas;

f) há omissão quanto às teses de inépcia, falta de condições da ação e carência de justa causa, contrariando as regras do art. 489, § 1º, I e II, do Código de Processo Civil;

g) “se houve até pedido de vista para ‘uma análise mais detida dos autos’, a decisão embargada não pode silenciar quanto às teses da impetrante por meio de negativa genérica” (Id n. 5147302, p. 5);

h) “a impetrante tem o direito de compreender como o Poder Judiciário chegou à categórica conclusão de que a defesa pode ser exercida de forma ampla em um caso que considera teratológico” (Id n. 5147302, p. 7);

i) “para que dê vigência às garantias do contraditório e da ampla defesa, as decisões jurídicas não podem ser compreendidas mediante um ato de fé, mas por meio de motivação que explicitamente acolha ou rejeite as teses defensivas” (Id n. 5147302, p. 8);

j) “é fundamental haver pronunciamento da Turma, pois até agora o processo está andando sem que tenham sido apreciados os argumentos suscitados desde a resposta à acusação” (Id n. 5147302, p. 9);

k) “requer e merece ver conhecidos e acolhidos os presentes embargos de declaração, a fim de que sejam sanadas as diversas omissões apontadas acima, constantes do v. acórdão cadastrado no PJe em Num. 4598440, pág. 1 a 16, dando-se, no caso de provimento, efeitos infringentes” (Id n. 5147302, p. 9) (Id n. 5147302).

Ciente, o Ministério Público Federal manifestou não ter interesse de recorrer (Id n. 6468110).

É o relatório.

 

 


VOTO
 

Processo Penal. Embargos de declaração. Rediscussão. Inadmissibilidade. Os embargos de declaração não se prestam a rediscutir a matéria julgada, para que desse modo se logre obter efeitos infringentes:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.(...). AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA OMISSÕES, OBSCURIDADE E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE.

(...)

3. Para se configurar a contradição, é necessário que a fundamentação do julgado esteja em desarmonia com a conclusão atingida, o que em nenhum momento foi demonstrado pelo Embargante.

4. O real objetivo do Embargante é conferir efeitos modificativos aos presentes embargos, visando revisão do julgamento que não lhe foi favorável, pretensão que não se coaduna com a via eleita, que têm a finalidade de sanar eventual omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada, inexistentes na espécie.

5. Embargos de declaração rejeitados.

(STJ, EDHC n. 56.154, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 27.03.08)

 

PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA.(...). INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 619 DO CPP. REDISCUSSÃO DE QUESTÕES DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE.

(...)

5. Revelam-se improcedentes os embargos declaratórios em que as questões levantadas traduzem inconformismo com o teor da decisão embargada, pretendendo rediscutir matérias já decididas, sem demonstrar ambigüidade, obscuridade, contradição ou omissão (art. 619 do CPP).

6. Embargos de declaração rejeitados.

(STJ, EDAPn n. 300-ES, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 17.10.07)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM HABEAS CORPUS - OMISSÃO - INOCORRÊNCIA - REDISCUSSÃO DE MATÉRIA DECIDIDA NO ACÓRDÃO EMBARGADO - IMPOSSIBILIDADE - REJEIÇÃO.

- Devem ser rejeitados os embargos opostos contra acórdão que não contenha qualquer omissão.

- É vedada a rediscussão de matéria decidida no acórdão embargado por meio de embargos de declaração, aptos a dirimir apenas eventual omissão, contradição, obscuridade ou ambigüidade.

- Embargos rejeitados.

(STJ, EDHC n. 62.751, Rel. Min. Jane Silva, Des. Conv. TJMG, j. 23.08.07)

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 1º, INCISO II, DA LEI Nº 8.137/90.(...). REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE.

I - São cabíveis embargos declaratórios quando houver na decisão embargada qualquer contradição, omissão ou obscuridade a ser sanada. Podem também ser admitidos para a correção de eventual erro material, consoante entendimento preconizado pela doutrina e jurisprudência, sendo possível, excepcionalmente, a alteração ou modificação do decisum embargado.

II - Inviável, entretanto, a concessão do excepcional efeito modificativo quando, sob o pretexto de ocorrência de contradição, omissão e obscuridade na decisão embargada, é nítida a pretensão de rediscutir matéria já incisivamente apreciada.

Embargos rejeitados.

(STJ, EDRHC n. 19.086, Rel. Min. Felix Fischer, j. 14.11.06)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. CARÁTER MODIFICATIVO. EMBARGOS REJEITADOS.

1. A pretensão do embargante é nitidamente modificativa, buscando a rediscussão da matéria e não seu aclaramento. Para tanto, os embargos de declaração não se prestam, por não consubstanciaram via própria a corrigir erro de julgamento, sob a leitura da parte.

2. Afastadas as hipóteses de ambigüidade, obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do artigo 619 do CPP, devem ser rejeitados os embargos declaratórios de caráter meramente infringentes. (Precedentes das Quinta e Sexta Turmas deste STJ)

3. Embargos de declaração rejeitados.

(STJ, EDRHC n. 17.035, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 16.05.06)

 

Do caso dos autos. Os embargos de declaração não merecem provimento.

Registrou-se na decisão embargada que não foi verificado no caso o direito líquido e certo da impetrante ao trancamento da ação penal, nos seguintes termos:

Crimes ambientais. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Dupla imputação. Inexigibilidade. O princípio societas delinquere non potest tem sido relativizado pelo direito penal moderno e diversos ordenamentos jurídicos estrangeiros preveem a responsabilidade criminal dos entes coletivos.

Nesse passo, a Constituição da República de 1988 estabeleceu no § 3º do art. 225 a responsabilidade penal da pessoa jurídica pela prática de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente:

Art. 225 (...)

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

O art. 3º da Lei n. 9.605/98 regulamentou o dispositivo constitucional e estabeleceu como requisitos para responsabilização criminal da pessoa jurídica que a infração seja cometida em seu benefício ou interesse e por decisão do seu representante ou de órgão colegiado, sem excluir a responsabilidade das pessoas físicas pelo mesmo fato, in verbis:

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, coautoras ou partícipes do mesmo fato.

Há controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, uma vez que exigiria a superação da teoria penal clássica fundada na culpabilidade do agente, dada a falta de consciência e vontade do ente moral, dentre outras questões, como inviabilidade de aplicação do princípio da personalidade das penas, de imposição da pena privativa de liberdade e a impossibilidade de arrependimento ou de compreensão do caráter aflitivo ou corretivo da sanção penal pela pessoa jurídica.

A despeito das divergências sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça decidiram recentemente que, para a responsabilização penal da pessoa jurídica, não é necessária a simultânea persecução penal da pessoa física que atua no âmbito da empresa. Assim, revejo meu entendimento, a fim de acompanhar a jurisprudência dos Tribunais Superiores:

EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À IDENTIFICAÇÃO E À PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO ENCONTRA AMPARO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. 2. As organizações corporativas complexas da atualidade se caracterizam pela descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades, sendo inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato ilícito a uma pessoa concreta. 3. Condicionar a aplicação do art. 225, §3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico ambiental. 4. A identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da produção do fato ilícito tem relevância e deve ser buscada no caso concreto como forma de esclarecer se esses indivíduos ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se deu no interesse ou em benefício da entidade coletiva. Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual. 5. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte conhecida, provido.

(STF, RE n. 548.181, Rel. Min. Rosa Weber, j. 06.08.13)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TEORIA DA DUPLA IMPUTAÇÃO. PESSOA JURÍDICA QUE FIGURA ISOLADAMENTE COMO RÉ NA DENÚNCIA POR CRIME AMBIENTAL. POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

1. É assente nesta Corte Superior de Justiça que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. 2. Este Superior Tribunal, na linha do entendimento externado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a entender que, nos crimes societários, não é indispensável a aplicação da teoria da dupla imputação ou imputação simultânea, podendo subsistir a ação penal proposta contra a pessoa jurídica, mesmo se afastando a pessoa física do polo passivo da ação.

Precedentes.

3. O trancamento de ação penal, somente deve ser acolhido se restar, de forma indubitável, comprovada a ocorrência de circunstância extintiva da punibilidade, de ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito e ainda da atipicidade da conduta.

3. Agravo regimental improvido.

(STJ, AgRg no RMS n. 48.851, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 20.02.18)

PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. CRIME AMBIENTAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE VERIFICADA. 2. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INICIAL QUE NARRA APENAS A QUALIDADE DE SÓCIO. MERA ATRIBUIÇÃO DE UMA QUALIDADE. DENÚNCIA GENÉRICA. AUSÊNCIA DE LIAME. 3. MANUTENÇÃO DA AÇÃO PENAL CONTRA A SOCIEDADE EMPRESÁRIA. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. 4. RECURSO EM HABEAS CORPUS PROVIDO EM PARTE.

1. O trancamento da ação penal na via estreita do habeas corpus somente é possível, em caráter excepcional, quando se comprovar, de plano, a inépcia da denúncia, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito.

2. Não se pode confundir a denúncia genérica com a denúncia geral, pois o direito pátrio não admite denúncia genérica, sendo possível, entretanto, nos casos de crimes societários e de autoria coletiva, a denúncia geral, ou seja, aquela que, apesar de não detalhar minudentemente as ações imputadas aos denunciados, demonstra, ainda que de maneira sutil, a ligação entre sua conduta e o fato delitivo.

Da leitura da inicial, verifica-se que os recorrentes Cristiano e Maria da Graça foram denunciados apenas em virtude de serem sócios administradores da primeira recorrente, Caiçaras Empreendimentos Imobiliários Ltda. A acusação limitou-se a vinculá-los ao crime porque eram sócios administradores da primeira recorrente, o que torna a denúncia genérica e inadmissível.

3. Mantêm-se, entretanto, a persecução penal contra CAIÇARAS EMPREEDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., haja vista a desnecessidade de dupla imputação, conforme assentado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, porquanto "o art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa". Além do mais, o habeas corpus não se destina às pessoas jurídicas. Sua incidência constitucional diz respeito ao direito de locomoção, ainda que de modo reflexo ou indireto (AgRg no HC 393.284/PI, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 09/05/2017, DJe 15/05/2017).

4. Recurso em habeas corpus provido em parte, para reconhecer a inépcia da denúncia apenas com relação aos recorrentes CRISTIANO e MARIA DA GRAÇA, sem prejuízo de oferecimento de nova inicial acusatória, desde que observados os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.

(STJ, RHC n. 88.264, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 08.02.18)

PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO. DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DA CONDUTA DOS GESTORES DA EMPRESA. PRESCINDIBILIDADE. ART. 54 DA LEI N. 9.605/1998. CRIME FORMAL. POTENCIALIDADE EVIDENCIADA. LAUDO QUE ATESTA VÍCIOS NA ESTRUTURA UTILIZADA PELA EMPRESA. RESPONSABILIDADE QUE NÃO SE AFASTA EM RAZÃO DE CULPA OU DOLO DE TERCEIROS.

1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 548.181/PR, de relatoria da em. Ministra Rosa Weber, decidiu que o art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa.

2. Abandonada a teoria da dupla imputação necessária, eventual ausência de descrição pormenorizada da conduta dos gestores da empresa não resulta no esvaziamento do elemento volitivo do tipo penal (culpa ou dolo) em relação à pessoa jurídica.

3. De acordo com o entendimento deste Tribunal, a Lei de Crimes Ambientais deve ser interpretada à luz dos princípios do desenvolvimento sustentável e da prevenção, indicando o acerto da análise que a doutrina e a jurisprudência têm conferido à parte inicial do art. 54, da Lei n. 9.605/1998, de que a mera possibilidade de causar dano à saúde humana é suficiente para configurar o crime de poluição, dada a sua natureza formal ou, ainda, de perigo abstrato.

4. Concretização do dano que evidencia a potencialidade preexistente.

5. Responsabilidade que não se afasta em razão de culpa ou dolo de terceiros, considerando-se a existência de laudo técnico que atesta diversos vícios referentes à segurança da estrutura utilizada pela empresa para o transporte de minério destinado à sua atividade econômica.

6. Agravo regimental desprovido.

(STJ, AgRg no RMS n. 48.085, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. 05.11.15)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA POR CRIME AMBIENTAL: DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO CONCOMITANTE À PESSOA FÍSICA E À PESSOA JURÍDICA.

1. Conforme orientação da 1ª Turma do STF, "O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação." (RE 548181, Relatora Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 6/8/2013, acórdão eletrônico DJe-213, divulg. 29/10/2014, public. 30/10/2014).

2. Tem-se, assim, que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome. Precedentes desta Corte.

3. A personalidade fictícia atribuída à pessoa jurídica não pode servir de artifício para a prática de condutas espúrias por parte das pessoas naturais responsáveis pela sua condução.

4. Recurso ordinário a que se nega provimento.

(STJ, RMS n. 39.173, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06.08.15)

Direito líquido e certo. Constatação de plano. Necessidade. O mandado de segurança pressupõe que o direito invocado seja líquido e certo. A segurança somente será concedida quando comprovado de plano o direito líquido e certo, não se admitindo dilação probatória.

Precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ, EDcl no RMS n. 24137-RS, Rel. Min. Denise Arruda, j. 06.08.09).

Denúncia. Inépcia. Para não ser considerada inepta, a denúncia deve descrever de forma clara e suficiente a conduta delituosa, apontando as circunstâncias necessárias à configuração do delito, a materialidade delitiva e os indícios de autoria, viabilizando ao acusado o exercício da ampla defesa, propiciando-lhe o conhecimento da acusação que sobre ele recai, bem como, qual a medida de sua participação na prática criminosa, atendendo ao disposto no art. 41, do Código de Processo Penal (STF, HC n. 90.479, Rel. Min. Cezar Peluso, j. 07.08.07; STF, HC n. 89.433, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 26.09.06 e STJ, 5a Turma - HC n. 55.770, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17.11.05).

Denúncia. Juízo de admissibilidade. O juízo realizado no recebimento da denúncia é de cognição sumária e requer a verificação da existência de suporte probatório mínimo da materialidade do crime e de indícios suficientes da autoria. A denúncia deve atender aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal e não incidir em nenhuma das hipóteses do art. 395 do Código de Processo Penal. Atenderá aos requisitos legais a denúncia que contiver a exposição do fato criminoso com todas as circunstâncias necessárias à configuração do delito, os indícios de autoria, a classificação jurídica do delito e, se necessário, o rol de testemunhas, possibilitando ao acusado compreender a acusação que sobre ele recai e sua atuação na prática delitiva para assegurar o exercício do contraditório e da ampla defesa. A rejeição da denúncia ocorrerá apenas quando, de plano, não se verificarem os requisitos formais a evidenciar sua inépcia, faltar pressuposto processual para seu exercício ou não houver justa causa, incidindo, em casos duvidosos, o princípio in dubio pro societate, a determinar a instauração da ação penal para esclarecimento dos fatos durante a instrução processual penal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF, Inq n. 2589, Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.09.14; Inq n. 3537, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 09.09.14 e HC n. 100908, Rel. Min. Carlos Britto, j. 24.11.09).

Trancamento. Ação penal. Exame aprofundado de provas. Inadmissibilidade. O trancamento da ação penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que só é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade (STJ, 5ª Turma, HC n. 89.119-PE, Rel. Jane Silva, unânime, j. 25.10.07, DJ 25.10.07, DJ 12.11.07, p. 271; HC n. 56.104-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, unânime, 13.12.07, DJ 11.02.08, p. 1; TRF da 3ª Região, HC n. 2003.03.019644-6, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, unânime, j. 24.11.03, DJU 16.12.03, p. 647). O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o trancamento da ação penal por falta de justa causa reveste-se do caráter da excepcionalidade (STF, HC n. 94.752-RS, Rel. Min. Eros Grau, j. 26.08.08).

Do caso dos autos. A decisão impugnada restou assim fundamentada:

Fundamento e decido.

2. Verifico, prima facie, que a denúncia foi devidamente especificada em relação à conduta imputada à acusada, com descrição suficiente dos fatos e suas circunstâncias em relação à imputação, possibilitando o exercício da ampla defesa.

3. Da mesma forma, há nos autos prova da materialidade dos delitos e indícios suficientes da autoria da ré nos crimes a ela imputados - cfr. se depreende do Ofício CETESB n.1686/2014 e documentos anexos (fls.30-167), da Certidão de Sinistro de fls.174, dos Laudos Periciais n.241/2015 (fls.179-195) e n.520.371/2013 (313-328), e dos Termos de Declarações de fls.260-261, 269-271, 272-273, e 299-300, bem como do Relatório de Avaliação de Toxidade de fls.339-349 e demais documentos juntados aos autos. Exsurge, assim, a justa causa para a presente ação penal.

4. Quanto às demais alegações defensivas, por se tratarem de questões de mérito, terão sua apreciação postergada para o momento da sentença, posto que mais apropriado e em consonância com os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, uma vez que a matéria suscitada demanda instrução probatória. Nessa linha:

"HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO-CABIMENTO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO DESTA CORTE, EM CONSONÂNCIA COM O DO PRETÓRIO EXCELSO. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. RESPOSTA À ACUSAÇÃO. NULIDADE DA DECISÃO QUE REJEITA AS TESES DEFENSIVAS APRESENTADAS NA FORMA DO ART. 396-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MOTIVAÇÃO SUCINTA. VÍCIO INEXISTENTE. PRECEDENTES. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. JUÍZO EXAURIENTE DAS TESES DEFENSIVAS. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DO WRIT. ORDEM DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDA. 1. (...). 2. (...). 3. Este Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido de que, não sendo a hipótese de absolvição sumária do acusado, a manifestação do magistrado processante não precisa ser exaustiva, sob pena de antecipação prematura de um juízo meritório que deve ser naturalmente realizado ao término da instrução criminal, em estrita observância aos princípios da ampla defesa e do contraditório. Precedentes. 4. Na espécie, o Juízo de primeira instância, após analisar a resposta à acusação oferecida pelo Paciente, examinou, ainda que de modo conciso, as arguições apresentadas, concluindo por determinar o prosseguimento da ação penal. Nesse contexto, não se verifica a nulidade apontada. 5. Conforme entendimento deste Tribunal Superior, eventual ausência de fundamentação da decisão que recebe a denúncia fica superada pela superveniência de sentença condenatória. Essa orientação aplica-se, mutatis mutandis, quanto à análise das teses defensivas apresentadas na fase do art. 396-A do Código de Processo Penal. 6. Isso porque na sentença condenatória emite-se um juízo definitivo a respeito de eventuais causas de absolvição sumária do acusado, suscitadas pela defesa, nos termos do art. 397 do Código de Processo Penal. 7. Ordem de habeas corpus não conhecida." (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTÇA - QUINTA TURMA - HABEAS CORPUS - Processo 201102374152, data da decisão: 27/08/2013, Fonte DJE DATA:04/09/2013, Relator(a) LAURITA VAZ).

5. Assim, tendo em vista que não estão presentes as hipóteses de absolvição sumária, previstas no art. 397 do CPP, determino o regular prosseguimento do feito. (ID n. 2532795)

Inicialmente, anoto que o oferecimento da denúncia apenas em desfavor da pessoa jurídica ora impetrante não constitui óbice à persecução penal, consoante a jurisprudência dos Tribunais Superiores.

No mais, não se verifica no caso o direito líquido e certo da impetrante ao trancamento da ação penal.

A denúncia atende aos requisitos do art. 41 do Código Penal e não incide em nenhuma das hipóteses do art. 395 do Código de Processo Penal, porque qualifica a acusada e descreve os fatos criminosos e suas respectivas circunstâncias, viabilizando o exercício da ampla defesa e do contraditório, de modo que a decisão que determinou o regular prosseguimento do feito não padece da nulidade alegada.

Nada obstante, afigura-se descabido o trancamento da ação penal, o qual se trata, ademais, de medida excepcional, que não se justifica no presente caso.

Ante o exposto, DENEGO a segurança (divirjo do Relator).

É o voto. (Id n. 4598440, pp. 6/15)

 

Estão expostas, portanto, as razões de decidir da Turma julgadora.

A parte visa à alteração do julgado, com a adoção de teses que lhe são favoráveis.

No entanto, os embargos de declaração não são recurso predestinado à rediscussão da causa. Servem para integrar o julgado, escoimando-o de vícios que dificultam sua compreensão ou privam a parte de obter o provimento jurisdicional em sua inteireza, em congruência ao que fora postulado na pretensão inicial.

Há na denúncia da ação penal originária uma imputação razoavelmente discernível do resultado à pessoa jurídica denunciada, ora impetrante. O juízo, vale dizer, o julgamento da adequação dessa imputação, sua consistência perante os fatos efetivamente ocorridos e respectiva qualificação jurídica, demanda exame pleno e exauriente dos elementos de prova a serem produzidos ao longo da instrução. Não se afigura, nesta oportunidade, hipótese que se possa excluir a priori a apreciação pelo Poder Judiciário da pretensão veiculada na denúncia: formalmente em ordem, cumpre dar andamento ao processo.

Cumpre recordar que a via eleita constitui-se em mandado de segurança. Este é um remédio específico para a tutela do direito líquido e certo, por sua vez conceituado como uma faculdade juridicamente assegurada e passível de ser exercida ao talante do respectivo titular. Em outros termos, o titular de um direito subjetivo com semelhante predicação não pode ser tolhido no gozo desse mesmo direito por parte da autoridade. Se esta impedir ou de qualquer forma estiolar a fruição do gozo desse direito, incidirá em abuso ou desvio de poder.

Mas assentadas essas premissas, revela-se inçada de dificuldades a tese proposta na impetração, cujo acolhimento não se restringe a conferir utilidade prática a uma determinada faculdade passível de ser usufruída no comércio jurídico. Ao contrário, pretende-se, em última instância, o julgamento do próprio mérito, isto é, da justiça ou da injustiça do quanto pretendido pela acusação no âmbito da ação penal.

De certo modo, por intermédio dos embargos declaratórios, pretende a impetrante instaurar um juízo de mérito que não concerne à fruição de um direito subjetivo, no qual não se resolve seu interesse (prático) de impedir o julgamento da ação penal. Em outros termos, para além de os embargos de declaração não se prestarem à rediscussão da causa, também não servem para forçar um julgamento de improcedência do pedido de condenação deduzido na denúncia.

Por fim, conforme entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, também adotado por esta 5ª Turma (TRF da 3ª Região, EDeclACr n. 200761810019846, Rel. Des. Fed. André Nekastchalow, unânime, j. 03.11.09, EDeclACr n. 200061110081767, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, unânime, j. 08.03.10; EDeclACr n. 200661190059361, Rel. Des. Fed. Peixoto Junior, j. 19.05.08), é desnecessária a menção explícita a todos os dispositivos legais citados pela parte embargante, considerando-se indispensável, para efeito de prequestionamento, a menção implícita às questões impugnadas.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO aos embargos de declaração.

É o voto.



EMENTA

PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REDISCUSSÃO. INADMISSIBILIDADE.

1. Os embargos de declaração não se prestam a rediscutir a matéria julgada, para que desse modo se logre obter efeitos infringentes.

2. Não se verifica qualquer omissão, obscuridade ou contradição no acórdão, mas apenas o inconformismo do recorrente com o resultado do julgado, o qual para ser reformado deve ser objeto de recurso dotado de efeitos infringentes.

3. Embargos de declaração não providos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO aos embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.