Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000103-77.2018.4.03.6136

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: MUNICIPIO DE CATANDUVA

Advogado do(a) APELADO: RENATA GERLACK DELOJO MORAES - SP132207-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000103-77.2018.4.03.6136

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: MUNICIPIO DE CATANDUVA

Advogado do(a) APELADO: RENATA GERLACK DELOJO MORAES - SP132207-A

 

R E L A T Ó R I O

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

 

Cuida-se de embargos à execução fiscal ajuizada pela Municipalidade de Catanduva /SP, inicialmente contra a FEPASA FERROVIA PAULISTA S/A, posteriormente incorporada à Rede Ferroviária Federal S/A - RFFSA, com o objetivo de cobrar crédito tributário inscrito em dívida ativa, referente à cobrança de IPTU, correspondente ao exercício de 1995. Valor dado à causa: R$ 3.590,26.

Ao proferir a sentença, o MM. Juízo a quo julgou improcedentes os embargos, com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, I, do CPC. Condenada a embargante ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, caput, e §§, do CPC.

Apela a União Federal aduzindo, em apertada síntese, a ocorrência da imunidade tributária recíproca.

Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000103-77.2018.4.03.6136

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: MUNICIPIO DE CATANDUVA

Advogado do(a) APELADO: RENATA GERLACK DELOJO MORAES - SP132207-A

 

V O T O

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

 

O executivo fiscal que ora se embarga tem por objeto a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU e Taxa de Lixo, referente ao exercício de 1995, sobre imóvel pertencente à época dos fatos geradores a Fepasa Ferrovia Paulista S/A, posteriormente incorporada à Rede Ferroviária Federal S/A.

Cabe destacar que a referida sociedade de economia mista foi extinta em 22 de janeiro de 2007, por disposição da MP 353, convertida na Lei nº 11.483/07, sucedendo-lhe a União nos direitos, obrigações e ações judiciais.

Pois bem.

Nos termos do art. 3º, parágrafo único, da LEF, a dívida ativa regularmente inscrita goza de presunção juris tantum de certeza e liquidez, só podendo ser ilidida por meio de prova inequívoca. A inscrição, por sua vez, gera a certidão de dívida ativa, a qual constitui título executivo extrajudicial para efeito de ajuizamento da execução pelo rito especial da Lei nº 6.830, de 1980.

A simples indicação nas certidões de dívida ativa dos números dos processos administrativos que deram origem aos créditos excutidos é suficiente para atender a exigência estabelecida no art. 2º, §5º da Lei nº 6.830/80, o que possibilita o pleno exercício do direito de defesa.

Ainda, a Lei nº 6.830/80, em seu art. 2º, §§ 5º e 6º, trata dos requisitos que o termo de inscrição em dívida ativa e a respectiva certidão devem conter, in verbis:

 

"Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

(...)

§ 5º - O Termo de Inscrição de Dívida Ativa deverá conter:

I - o nome do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros;

II - o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato;

III - a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida;

IV - a indicação, se for o caso, de estar a dívida sujeita à atualização monetária, bem como o respectivo fundamento legal e o termo inicial para o cálculo;

V - a data e o número da inscrição, no Registro de Dívida Ativa; e

VI - o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.

§ 6º - A Certidão de Dívida Ativa conterá os mesmos elementos do Termo de Inscrição e será autenticada pela autoridade competente.

(...)

§ 8º - Até a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos."

 

A regra é também disposta pelo art. 202 do CTN:

 

"Art. 202. O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente:

I - o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros;

II - a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos;

III - a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado;

IV - a data em que foi inscrita;

V - sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito.

Parágrafo único. A certidão conterá, além dos requisitos deste artigo, a indicação do livro e da folha da inscrição."

 

A presunção da liquidez e certeza da inscrição da dívida ativa e do título executivo é bem explanado por Maria Helena Rau de Souza, em Execução Fiscal - Doutrina e Jurisprudência, Ed. Saraiva, São Paulo, 1.998. In verbis:

 

"Assim porque, traduzindo-se a inscrição em ato de controle administrativo da legalidade do crédito, a cargo da autoridade competente, formalizado através de termo, com observância dos requisitos do art. 2º, § 5º, supra - entre os quais devem constar o valor originário da dívida, bem como o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora e demais encargos (liquidez) e a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida (certeza) - , " a presunção de legalidade dos atos administrativos e a idoneidade dos procedimentos estatais", como anota Cândido Dinamarco, "dão ao legislador a convicção de uma razoável probabilidade de existência do crédito, razão pela qual lhe empresta a força de título executivo".

 

Tal presunção de certeza e liquidez da regular inscrição da dívida, no entanto, é de caráter juris tantum, porquanto admite prova em contrário, a cargo do embargante. Assim, a certeza da regularidade da inscrição será questionável ao tempo em que o embargante provar a inexistência do fato gerador, fatos ensejadores da decadência do direito ao lançamento, omissão no procedimento administrativo de constituição do crédito, por exemplo. A liquidez restará afastada ao tempo em que o embargante igualmente comprovar a inexigibilidade da dívida exequenda.

Quanto a questão da alegada imunidade recíproca, dada a natureza de sociedade anônima da RFFSA, vinha eu entendendo que sua atividade ostentava cunho econômico e, portanto, visava ao lucro, o que, por conseguinte, impedia que a empresa se beneficiasse da imunidade tributária recíproca (CF/88, art. 150, VI, "a", §§ 2º e 3º).

Todavia, com a sobrevinda do decidido pelo STF no RE nº 943.885 (j. 17/02/2016, Rel. Min. Celso de Mello) que considerou as atividades desenvolvidas pela RFFSA como imunes aos impostos, modifiquei o entendimento para passar a acompanhar a posição do Excelso Pretório.

Destaco que a decisão do RE nº 943.885, além de ter transitado em julgado, utilizou como esteio precedentes do próprio STF que envolveram outras empresas governamentais igualmente consideradas imunes aos impostos (v.g. os Correios).

Assim, não obstante os efeitos meramente inter pars do aludido RE, entendi que o respeito à orientação jurisprudencial da Corte Suprema, ou mesmo dos Tribunais Superiores, era (e ainda é) medida que privilegia a isonomia e a segurança jurídica, na modalidade de previsibilidade das decisões judiciais, elemento que auxilia os jurisdicionados a decidirem acerca de sua atuação perante a lei, propiciando inclusive menores custos no desenvolvimento de suas atividades.

Ocorre que o STF, mais precisamente em 12/08/2016, em sede de exame de repercussão geral no RE 959.489, por meio de seu Plenário, decidiu que o tema envolvendo a suposta imunidade recíproca da RFFSA não é de índole constitucional e, por tal motivo, não é dotado de repercussão geral. A ementa do julgado é a seguinte:

 

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S/A (RFFSA). PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS AO GOZO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA (ART. 150, VI, A, DA CF/88). MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. 1. Possui natureza infraconstitucional a controvérsia relativa ao preenchimento, pela Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA), dos pressupostos necessários ao gozo da imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, a, da CF/88). 2. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Carta Magna ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/3/2009). 3. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 1.035 do CPC/2015."

 

Em suma, sinalizou o STF às instâncias judiciais a quo que a solução do tema não necessita passar pelas normas constitucionais, sendo suficiente, portanto, que o juiz o examine dos textos legais pertinentes ao caso.

Desse modo, entendo não mais aplicável como razão de decidir a posição antes explicitada pelo STF no RE nº 943.885, justamente porque suas bases repousam na questão constitucional, tendo a Excelsa Corte frisado, repita-se, por seu órgão Plenário, que a solução do tema não requer o emprego das normas da mais alta hierarquia do sistema jurídico.

Nesse contexto, volto a adotar o antigo posicionamento, qual seja, a possibilidade de tributação do patrimônio, da renda e dos serviços prestados pela extinta RFFSA, ante a existência de caráter econômico e finalidade lucrativa.

Isso fica bastante claro, aliás, pelo disposto no art. 3º da Lei 3.115/57 (a norma que criou a empresa) que estatui a aplicação à RFFSA das normas próprias das sociedades anônimas, sabidamente entidades "de capital" e que visam obter lucro.

Filio-me, destarte, ao que vem decidindo a 2ª Seção do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com o seguinte destaque:

 

"(...) Portanto, a sociedade de economia mista federal não era responsável pela prestação de serviço público de natureza exclusiva, essencial ou em regime de monopólio, o que afasta a imunidade tributária recíproca, não havendo espaço para equiparação da situação da RFFSA, para efeito de imunidade tributária, com a de outras empresas públicas, as quais, até hoje, desempenham serviços públicos em regime de monopólio, como ECT e INFRAERO, até porque se assim fosse admitido teria a União de suportar, contra si, a alegação dos titulares de concessões de tais serviços, ainda que empresas do setor privado, de que também teriam "herdado" imunidade em relação a tributos federais, em razão da natureza da atividade e sua imprescindibilidade, desde que não demonstrado lucro, ampliando o rol do § 2º do artigo 150, CF, para além do que excepcionalmente fixado, contrariando a própria jurisprudência consolidada a respeito de sua interpretação (...)".

(Embargos Infringentes nº 00315387720084036182, DJ 16/09/2016, Rel. Des. Fed. Antônio Cedenho).

 

O art. 34 do Código Tributário Nacional estabelece que o contribuinte do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título.

Por sua vez, estabelece o artigo 130, caput, do Código Tributário Nacional: "Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título prova de sua quitação".

Outrossim, o art. 131 do CTN, inserto na seção destinada à "Responsabilidade dos Sucessores", qualifica o adquirente como pessoalmente responsável pelos tributos relativos ao bem adquirido, litteris:

 

"Art. 131. São pessoalmente responsáveis:

I - o adquirente ou remitente, pelos tributos relativos aos bens adquiridos ou remidos;

(...)"

 

Cabe destacar que a referida sociedade de economia mista foi extinta em 22 de janeiro de 2007, por disposição da MP 353, convertida na Lei nº 11.483/07, sucedendo-lhe a União nos direitos, obrigações e ações judiciais.

Por força do art. 2º da Lei nº 11.483/07, os bens da extinta RFFSA foram transferidos ao patrimônio da União. No momento em que o imóvel é transferido, a responsabilidade por sucessão afeta os créditos tributários cujos fatos geradores tenham ocorrido antes da sucessão.

Dessa feita, considerando a data da transferência dos bens da extinta RFFSA para a União Federal em 22.01.2007 (data da vigência da MP 353), e que o fato gerador do IPTU ocorre com a propriedade, o domínio útil ou a posse do bem imóvel em 1º de janeiro de cada ano, é a União, na qualidade de sucessora da obrigação tributária, a responsável pelo pagamento do IPTU devido pela extinta RFFSA, relativo aos exercícios de exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

 

Apelação da União Federal contra sentença que julgou improcedentes os embargos à execução fiscal que opôs contra a cobrança de IPTU e taxas exigidas pelo Município de Catanduva. Invoca nulidades por ausência de notificação e da CDA em virtude de errônea identificação do sujeito passivo, bem como a incidência da imunidade tributária recíproca quanto ao IPTU. 

A eminente Relatora negou provimento ao apelo da União. Com a devida vênia,  divirjo.

1 – ILEGITIMIDADE DE PARTE

Os débitos objeto da CDA, IPTU e taxas municipais do exercício de 1999, são cobrados por meio de execução fiscal ajuizada em 2016 pelo Município de Campinas contra a Ferrovia Paulista S/A - FEPASA, a qual, em 02.01.1998, foi incorporada à RFFSA . Não se trata de mero erro material ou formal, sob pena de alteração do próprio lançamento. Dizem Leandro Paulsen, René Bergmann Ávila e Ingrid Schroder Silva in Direito Processual Tributário: Processo Administrativo Fiscal e Execução Fiscal à luz da Doutrina e da Jurisprudência, Livraria do Advogado, 5º Ed., Porto Alegre, 2009, p. 205, verbis:

 

"Quando haja equívocos no próprio lançamento ou na inscrição em dívida, fazendo-se necessária alteração de fundamento legal ou do sujeito passivo, nova apuração do tributo com aferição de base de cálculo por outros critérios, imputação de pagamento anterior à inscrição etc., será indispensável que o próprio lançamento seja revisado, se ainda viável em face do prazo decadencial, oportunizando-se ao contribuinte o direito à impugnação, e que seja revisada a inscrição, de modo que não se viabilizará a correção do vício apenas na certidão de dívida. A certidão é um espelho da inscrição que, por sua vez, reproduz os termos do lançamento. Não é possível corrigir, na certidão, vícios do lançamento e/ou da inscrição. Neste casos, será inviável simplesmente substituir-se a CDA".

 

O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que: "a Fazenda Pública pode substituir a certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução" (Súmula 392/STJ), ainda que se trate de sucessão empresarial e tributária. Nesse sentido:

 

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. SUBSTITUIÇÃO DA CDA ATÉ A PROLAÇÃO DA SENTENÇA. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL OU FORMAL. POSSIBILIDADE. MODIFICAÇÃO DO LANÇAMENTO E SUJEITO PASSIVO. INVIABILIDADE. SÚMULA 392/STJ. ENTENDIMENTO FIRMADO EM RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC). RESP PARADIGMA 1.045.472/BA.

1. A jurisprudência do STJ reconhece que a emenda ou a substituição da CDA é admitida diante da existência de erro material ou formal, não sendo possível, entretanto, quando os vícios decorrem do próprio lançamento ou da inscrição, especialmente quando voltado à modificação do sujeito passivo do lançamento tributário (Súmula 392 do STJ). Referido entendimento já foi firmado inclusive em sede de recurso repetitivo (art. 543-C do CPC), quando a Primeira Seção promoveu o julgamento do REsp 1.045.472/BA, relatoria do e. Min. Luiz Fux.

2. O redirecionamento da execução contra o espólio só é admitido quando o falecimento do contribuinte ocorrer depois de ele ter sido devidamente citado nos autos da execução fiscal. Assim, se ajuizada execução fiscal contra devedor já falecido, mostra-se ausente uma das condições da ação, qual seja, a legitimidade passiva.

Agravo regimental improvido.

(AgRg no AREsp 729600; Rel. Min. HUMBERTO MARTINS; 2ª Turma; j. em 01/09/2015)

 

Confira-se também:

 

EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. ALIENAÇÃO DO IMÓVEL. ALTERAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO. SÚMULA 392/STJ. REDIRECIONAMENTO DO FEITO EXECUTÓRIO PARA O

ATUAL PROPRIETÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. NULIDADE DA CDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. A teor da Súmula 392/STJ: "A Fazenda Pública pode substituir a

certidão de dívida ativa (CDA) até a prolação da sentença de embargos, quando se tratar de correção de erro material ou formal, vedada a modificação do sujeito passivo da execução", ainda que em decorrência de sucessão tributária focada no art. 130 do CTN.

Precedentes: AgRg no AREsp 131.469/RS, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, DJe 02/05/2012; REsp 880.724/BA, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJ 25/02/2008. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 551.384/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 20/10/2014)

 

Assim, ao tempo do ajuizamento da execução (2011), já havia ocorrido a incorporação da FEPASA, em 02.01.1998, pela RFFSA, constituída sob a forma de sociedade de economia mista, para exploração de serviços públicos de transporte ferroviário, de competência da União (CF, art. 21, inciso XII, alínea "d", CF/88). Logo, a CDA é nula por indicar parte ilegítima. Inviável, ademais, substituí-la depois de prolatada a sentença.

2. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO

Na lição de Leandro Paulsen, a notificação ao sujeito passivo é condição para que o lançamento tenha eficácia. (in Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e jurisprudência, Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p. 982), porque, uma vez realizada, aperfeiçoa-se a relação entre a administração e o sujeito passivo com a possibilidade de impugnação de eventuais vícios existentes no ato. Denota-se, desse modo, que o ato é uma decorrência dos princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa. Nesse sentido manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça:

 

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. IPTU. LANÇAMENTO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. NOTIFICAÇÃO. EDITAL. EXCEPCIONALIDADE. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 387/STJ. VERIFICAÇÃO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Nos termos do art. 145 do CTN, o contribuinte deverá ser notificado pessoalmente e por escrito do lançamento do crédito tributário, somente sendo permitida a notificação por edital quando se encontrar em lugar incerto e não sabido.

2. Não é possível, no caso, a aplicação do entendimento exposto na Súmula 397 do STJ (O contribuinte do IPTU é notificado do lançamento pelo envio do carnê ao seu endereço), porquanto estabelecido na instância a quo que não há prova da remessa do carnê. Nessas circunstâncias, a verificação dos aspectos fático-probatórios da causa esbarra no óbice da Súmula 7/STJ.

3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1233778/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, j. 23.08.2011, DJe 30.08.2011, destaquei).

In casu, não se sustenta a tese da apelante acerca da presunção da notificação do contribuinte com o recebimento do carnê de cobrança do tributo, visto que não há nos autos a prova da sua emissão, tampouco a possibilidade de produção pela embargante de prova de fato negativo, qual seja, o não recebimento do documento. Nesse sentido:

 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ÔNUS DA PROVA. FATO NEGATIVO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EMBASADOR DA EXTRAÇÃO DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. NULIDADE. PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ E CERTEZA DA CDA AFASTADA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA FAZENDA.

1. A Certidão de Dívida Ativa é título que contém os requisitos da certeza e liquidez, conforme presunção estabelecida no art. 204 do CTN, mas admite prova em contrário, sendo afastada tal presunção se comprovado que o processo fiscal que lhe deu origem padece de algum vício.

2. Na espécie, o vício verificou-se anteriormente à própria inscrição, porquanto não realizada a notificação do lançamento, ato de importância fundamental na configuração da obrigação tributária. A sua ausência contaminou, por inteiro, o surgimento do crédito tributário executado.

3. A tese do exequente de que competiria ao contribuinte o ônus de comprovar as suas alegações não merece êxito por tratar-se de prova de fato negativo, não devendo ser exigido do contribuinte que demonstre em juízo que não foi devidamente notificado para se defender no processo administrativo, que se encontra em poder do exeqüente. No caso, caberia à Fazenda diligenciar e provar a efetiva notificação do contribuinte para se defender.

4. O aresto recorrido entendeu não procedente a argüição de nulidade invocada pela ausência de intimação pessoal do representante da Fazenda considerando diversas particularidades ocorridas no trâmite do processo. A Fazenda, atendendo a comunicação veiculada no diário oficial, compareceu inúmeras vezes nos autos, inclusive para dispensar a produção de provas e requerer o julgamento antecipado da lide, sem haver suscitado a nulidade.

5. Agravo regimental não-provido. (AgRg no Ag 1022208/GO, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 21.10.2008, DJe 21.11.2008, destaquei).

 

Assim, à falta de comprovação do exequente que tenha remetido o carnê (= notificação) ao executado, deve-se reconhecer a nulidade da cobrança do IPTU e das taxas municipais.

3.  IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

Ab initio, impende registrar o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 599.176/PR. A corte analisou o tema da imunidade recíproca (artigo 150, CF/1988) quando ocorrida a sucessão tributária e, consequentemente, a assunção de débitos exacionais pelo sucessor. O julgado, portanto, ficou adstrito à aplicação retroativa dos efeitos da imunidade. Confira-se o posicionamento dos Ministros Luiz Fux e Carmem Lúcia na votação do representativo, verbis:

Ministro Luiz Fux - "Vossa Excelência deu provimento, porque analisou o recurso sob o ângulo da responsabilidade pela sucessão. Vossa Excelência não analisou, digamos assim, a natureza jurídica da Rede Ferroviária Federal, que levaria a Corte ao raciocínio no sentido de que, se ela já era imune - ninguém pode transferir mais do que tem nem menos do que tem -, então, ela transferiria também a imunidade dela. Mas, não é isso que está em jogo. O que está em jogo é saber se o adquirente responde tributariamente pelas obrigações do predecessor. E é isso que está em jogo.

(...)

E há um outro aspecto, quer dizer, as regras imunizantes, elas são efetivamente de interpretação restrita. Não está em jogo aqui a questão subjacente do pacto federativo, e o Ministro Teori Zavascki citou, com muita propriedade, que nós não analisamos esses antecedentes que a Suprema Corte chancelou quanto à possibilidade de conceder imunidade a empresas públicas e sociedades de economia mista. Não são esses precedentes que estão em jogo.

(...)

De sorte que essa repercussão geral precisa ficar bem adstrita a esse tema da sucessão, e, nesse sentido, acompanho Vossa Excelência.

Ministra Carmem Lúcia - Presidente, também acompanho Vossa Excelência com a mesma delimitação, ou seja, não estamos a discutir a questão nem do serviço público, que era prestado, nem das condições. Então, voto restrita ao que definiu bem Vossa Excelência, que é a questão da sucessão. Até a sucessão ela era obrigada a pagar, e, portanto, quem sucede, sucede com esses ônus."

(destaques aditados)

O representativo de controvérsia apreciado versava sobre situação similar à dos presentes autos, qual seja, dívidas tributárias assumidas pela União em razão de ser sucessora da RFFSA , tema analisado, no entanto, somente à luz da possibilidade de aplicação da imunidade "retroativa", uma vez que o sucessor é o ente federal. Ao final, o Pretório Excelso decidiu, à unanimidade, que a imunidade tributária recíproca não afasta a responsabilidade tributária por sucessão nos casos em que o sujeito passivo era contribuinte regular do tributo devido. Transcreve-se a ementa:

"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. INAPLICABILIDADE À RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA POR SUCESSÃO. ART. 150, VI, A, DA CONSTITUIÇÃO.

- A imunidade tributária recíproca não exonera o sucessor das obrigações tributárias relativas aos fatos jurídicos tributários ocorridos antes da sucessão (aplicação "retroativa" da imunidade tributária).

- Recurso Extraordinário ao qual se dá provimento." (destaques aditados)

(STF, RE 599176/PR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Pleno, v.u., julgado em 05/06/2014).

A questão que envolve a assunção das dívidas da RFFSA pela União voltou a ser apreciada pelo Plenário do C. STF na sessão de julgamentos de 12/08/2016, a partir de outra perspectiva. Os ministros analisaram a linha de argumentação expendida pela União, recorrente, atrelada à natureza dos serviços prestados pela Rede Ferroviária, com o fito de demonstrar que não era contribuinte regular do imposto objeto da cobrança, dada a aplicação da imunidade tributária à própria RFFSA . Em suas razões recursais, sustentou que tal situação, por si só, atrairia a incidência, por extensão, dos normativos que cuidam da não tributação recíproca entre os entes federativos (§ 2º do artigo 150 da CF/1988), a tornar imperativo o reconhecimento da imunidade à Rede Ferroviária. A sucessão pelo ente federal, em consequência, operar-se-ia com os mesmos atributos, à vista do tratamento dispensado pela Magna Carta. Colacionam-se os correlatos dispositivos:

"Art. 21. Compete à União:

(...)

XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:

(...)

d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território;

(...)"

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

VI - instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

(...)

§ 2º. A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes.

(...)"

"Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º. A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

§ 2º. As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.

(...)"

"Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos."

(destaques aditados)

O Supremo Tribunal Federal, todavia, ao apreciar a existência de repercussão geral quanto à matéria, tema 909, Recurso Extraordinário nº 959.489/SP - preenchimento dos pressupostos necessários ao gozo da imunidade tributária recíproca pela Rede Ferroviária Federal S/A -, exarou entendimento no sentido de que a questão não tem natureza constitucional, posto que adstrita ao atendimento pela RFFSA dos requisitos indispensáveis ao gozo da imunidade recíproca (artigo 150, VI, alínea "a", da CF/1988), análise que se dá em âmbito infraconstitucional e, além disso, demanda reexame do conjunto fático-probatório, incabível na via recursal extraordinária. O julgado restou assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S/A ( RFFSA ). PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS AO GOZO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA (ART. 150, VI, "A", DA CF/88). MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

1. Possui natureza infraconstitucional a controvérsia relativa ao preenchimento, pela Rede Ferroviária Federal S/A ( RFFSA ), dos pressupostos necessários ao gozo da imunidade tributária recíproca (art.

150, VI, a, da CF/88).

2. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Carta Magna ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/3/2009).

3. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 1.035 do CPC/2015." (destaques aditados)

(STF, RE 959489, Rel. Min. Teori Zavascki, Plenário, julgado em 12/08/2016).

Transcreve-se, também, excerto do voto do relator, Ministro Teori Zavascki:

"(...)2. O Tribunal de origem decidiu a controvérsia com base no RE 599.176 (Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, DJe de 30/10/2014, Tema 224), no qual foi assentado que a imunidade tributária recíproca não exonera o sucessor das obrigações tributárias relativas aos fatos jurídicos ocorridos antes da sucessão (aplicação retroativa da imunidade tributária). Neste recurso extraordinário, sustenta-se que a própria pessoa jurídica sucedida, a RFFSA , gozaria de imunidade tributária recíproca em razão de prestar serviços públicos de titularidade da União. Trata-se, portanto, de temática evidentemente diversa daquela decidida no RE 599.176.

3. A discussão submetida pela União ao exame do Supremo Tribunal Federal não envolve a interpretação do art. 150, VI, a, da CF/88, mas apenas o exame do preenchimento, no caso concreto, dos pressupostos necessários ao gozo da imunidade tributária recíproca pela RFFSA . Não há, portanto, matéria constitucional a ser analisada, porquanto a controvérsia abordada pelo recurso extraordinário soluciona-se tão somente à luz da interpretação e aplicação das normas infraconstitucionais pertinentes à RFFSA e do reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência essa vedada nesta via recursal (Súmula 279/STF). O Supremo Tribunal Federal já pacificou a orientação de que é inviável a apreciação, em recurso extraordinário, de alegada violação a dispositivo da Constituição Federal que, se houvesse, seria meramente indireta ou reflexa, uma vez que é imprescindível a análise de normas infraconstitucionais. Nesse sentido, em casos idênticos:

(...)

4. O Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é possível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria constitucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Constituição Federal ocorra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Min. ELLEN GRACIE, DJe de 13/3/2009).

5. Diante do exposto, manifesto-me pela inexistência de repercussão geral da questão suscitada."

(destaques aditados)

Constata-se, assim, não haver decisão do Pretório Excelso sobre a quaestio atinente à imunidade tributária da RFFSA em virtude da prestação de serviço público de titularidade da União, o que significa inexistir óbice à resolução da lide sob tal prisma. Ausente qualquer efeito vinculante (artigo 543-B do CPC/1973, vigente à época), à vista do não pronunciamento do STF, deve a matéria ser resolvida pelas instâncias ordinárias, à luz dos normativos infraconstitucionais de sua regência. Em consequência, não mais subsiste o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o tema deve ser apreciado pela Suprema Corte, pois seu deslinde estaria atrelado exclusivamente aos normativos de âmbito constitucional, sob pena se usurpação de sua competência: "muito embora tenham sido citados dispositivos infraconstitucionais, a matéria foi decidida sob enfoque eminentemente constitucional, qual seja, a imunidade tributária, sendo defeso o exame por esta Corte, sob pena de usurpação da competência do Pretório Excelso. Consoante a reiterada jurisprudência desta Corte, não compete ao Superior Tribunal de Justiça, na via do recurso especial, analisar eventual contrariedade a preceito contido na CF/88, tampouco uniformizar a interpretação de matéria constitucional." (STJ, AGREsp 1564468, Rel. Des. Fed. Conv. Diva Malerbi, Segunda Turma, v.u., DJe 09/03/2016. No mesmo sentido: AGAREsp 825427, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, v.u., DJe 26/04/2016; REsp 1575338, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, v.u., DJe 11/03/2016).

Cabe registrar, contudo, que o exame do tema sob o enfoque da legislação ordinária não pode dar-se em descompasso com os normativos da Lei Maior, porque deve a eles se harmonizar, interpretado o ordenamento pátrio de modo a observar e atender à mens legis. Passa-se, assim, a tal análise, para o escopo de verificar o preenchimento, no caso concreto, dos pressupostos infraconstitucionais necessários ao gozo da imunidade tributária pela RFFSA , atinentes à natureza do serviço prestado, com indicação da legislação e, também, dos precedentes históricos pertinentes à solução da controvérsia, considerada sua interpretação em coadunação aos ditames constitucionais, conciliados os regramentos aplicáveis à espécie por meio da interpretação sistemática do ordenamento pátrio.

A exação objeto da presente ação, imposto predial e territorial urbano - IPTU, refere-se a exercício anterior a 2007, quando o imóvel tributado era de propriedade da Rede Ferroviária Federal S/A - RFFSA , sociedade de economia mista concebida para a exploração de serviços públicos de transporte ferroviário de competência da União (artigo 21, inciso XII, alínea "d", CF/1988, anteriormente transcrito). Estava funcionalmente vinculada ao Mistério dos Transportes e sua criação foi autorizada pela Lei nº 3.115/1957:

"Art. 1º. Fica o Poder Executivo autorizado a constituir, nos termos da presente lei, uma sociedade por ações sob a denominação de Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (R.F.F.S.A.), à qual serão incorporadas as estradas de ferro de propriedade da União e por ela administradas, assim como as que venham a ser transferidas ao domínio da União, ou cujos contratos de arrendamento sejam encampados ou rescindidos."

(destaques aditados)

A RFFSA foi instituída especificamente para promover e administrar os interesses da União, de natureza exclusiva (artigo 21, XII, "d", CF/1988), concernentes à atividade de transporte ferroviário. Era constituída pela consolidação de 18 ferrovias regionais e atendeu diretamente, por décadas, a 19 unidades da federação, com atuação em 4 das 5 regiões do país e malha ferroviária de aproximadamente 22 mil quilômetros.

A citada Lei nº 3.115/1957, em seu artigo 7°, "a", determinou ser de sua competência "administrar, explorar, conservar, reequipar, ampliar, melhorar e manter em tráfego as estradas de ferro a ela incorporadas". Delegou, portanto, a prestação de serviço público essencial atribuído pela Lei Maior exclusivamente à União (consoante o mencionado artigo 21, XII, "d"), cuja execução passou, por disposição da legislação infraconstitucional, à Rede Ferroviária, na forma autorizada pelo artigo 175 da Magna Carta (anteriormente transcrito).

Sobre a natureza jurídica da RFFSA , insta anotar que há dois tipos de sociedade de economia mista, a que é primariamente prestadora de serviço público por outorga estatal e aquela que tem por finalidade principal a exploração de atividade econômica. A Rede Ferroviária era ente da administração pública indireta que prestava de serviço público de relevante interesse da coletividade e, portanto, não tinha o escopo essencial de auferir lucro, o que não significa vedação à obtenção de rendimentos decorrentes do desempenho de suas atividades legalmente delegadas.

A Lei nº 3.115/1957 autorizou o poder público a criar a RFFSA e é um dos diplomas regentes não só da forma de sua constituição, como também da própria prestação do serviço ferroviário, abarcada a destinação de eventuais lucros dela auferida. A título ilustrativo, transcreve-se o teor dos artigos 19 e 21, que dispõem sobre a alocação dos rendimentos, acaso obtidos, por meio de rateio entre empregados e acionistas:

"Art. 19. Os Estatutos da R.F.F.S.A. prescreverão normas específicas para a participação de seus empregados, qualificados no art. 14, nos lucros da sociedade, as quais deverão prevalecer até que, de modo geral, seja regulamentado o inciso IV do art. 157 da Constituição."

"Art. 21. Enquanto a União for detentora da totalidade do capital da R.F.F.S.A., os lucros líquidos da sociedade serão considerados reservas, e, quando atingirem Cr$ 10.000.000.000,00 (dez bilhões de cruzeiros) anuais, os lucros líquidos que ela apurar terão o destino fixado neste artigo, ainda quando a União não seja a detentora da totalidade do seu capital.

Quando as dotações ou auxílios da União se tornarem inferiores a Cr$ 5.000.000.000,00 (cinco bilhões de cruzeiros) anuais, será permitida a distribuição de dividendos, ficando retidos, em conta especial, em poder da sociedade somente os atribuídos às ações de propriedade da União, para serem aplicados em aumento de capital, mantido, quanto a este, o direito de participação proporcional dos demais acionistas."

Conforme se observa, a União, ao instituir a RFFSA , objetivou alcançar o interesse público por meio da delegação da prestação do serviço de transporte ferroviário. Visou, inequivocamente, atender ao bem comum em primeiro plano e não perseguir lucro, o qual era mera decorrência do desenvolvimento das atividades para as quais foi criada, o que o torna legítimo e não descaracteriza sua intrínseca essência. Admite-se o proveito financeiro, portanto, quando não configura fim último da sociedade de economia mista. Em verdade, a lucratividade pode constituir o próprio meio necessário à consecução do interesse público primário por meio da prestação de serviço público essencial (CARVALHOSA, Modesto. Comentários à Lei de Sociedade Anônimas: Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, com as modificações da Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009).

A RFFSA procedeu à prestação do transporte ferroviário nos exatos termos ora apontados. Sua constituição se deu de forma a inequivocamente priorizar o aludido serviço público, de modo que a eventual percepção de lucros não traduz seu escopo fundamental. Por tais motivos, não se aplicam as disposições atinentes à exploração de atividade econômica, previstas no citado artigo 173 da CF/1988, em especial os privilégios fiscais concedidos à iniciativa privada - dos quais nunca foi beneficiária. Sua criação, enfatize-se, deu-se unicamente para o escopo de desenvolver atividade de competência exclusiva da União. Sobre o tema, assim se manifestou o Ministro Maurício Corrêa, por ocasião da relatoria do RE nº 220.906, que: "não se aplicam às empresas públicas, às sociedades de economia mista e a outras entidades estatais ou paraestatais que explorem serviços públicos a restrição contida no art. 173, § 1º, da CF, isto é, a submissão ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias, nem a vedação do gozo de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado (CF, art. 173, § 2º)" (STF, RE 220906, Rel. Min. Maurício Corrêa, Plenário, j. 16/11/2000, DJ 14/11/2002). Dessa forma, apenas quando as entidades de economia mista não se destinam à prestação exclusiva de serviço público é que podem ser caracterizadas como instrumentos de intervenção do Estado na atividade econômica em sentido estrito. Nesse caso, não podem receber o mesmo tratamento tributário conferido à fazenda pública, em razão de seu evidente propósito de obtenção de lucro (STF, ACO 2730/DF). Tal situação não ocorre no presente caso, uma vez que a Rede Ferroviária, frise-se, nunca foi equiparada aos particulares, considerada, assim, atrelada à consecução do bem comum por meio da prestação do transporte ferroviário.

As sociedades de economia mista prestadoras de serviço exclusivo dos entes federativos e para tal restrita finalidade criadas, como a RFFSA , estão regidas por regime predominantemente público e devem receber o mesmo tratamento dispensado ao poder público - não só para fixação do regime tributário como, e.g., para admissão de pessoal por meio de concurso público, observância aos primados da administração pública e submissão ao controle externo pelo Tribunal de Contas quanto a seus procedimentos e aplicação de recursos financeiros (STF, MS 25092, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, v.u., DJ 17/03/2016). Desse modo, mesmo em razão da possibilidade de colisão entre o interesse público perseguido e o intuito de lucro dos acionistas privados, tal circunstância não retira seu caráter e regime públicos, inclusive porque prevalece a função institucional da devida prestação do transporte ferroviário sobre os interesses privados.

Ainda sobre o propósito institucional da RFFSA , cumpre evidenciar que está insculpido não só na lei de sua criação, como nos demais normativos regentes do tema. Portanto, a presunção que milita em favor da sociedade de economia mista é a de que atua dentro de tais ditames, não o contrário - primado da presunção de legitimidade da atuação da administração pública direta e indireta. Em consequência, não se pode inferir que a consecução do serviço público a ela delegado tenha sido executada em desacordo com os preceitos legais. Incumbe à parte contrária, o município, comprovar que a Rede Ferroviária não se conduziu em estrita observância à correlata regulamentação e que sua existência não estava exclusivamente voltada à prestação do transporte ferroviário, o que inocorre in casu.

Vale transcrever, também, o magistério de Roque Antonio Carrazza (in Curso de Direito Constitucional Tributário, 22ª Edição, Editora Malheiros, 2006, pp. 706/709), verbis:

"Aprofundando o assunto, as empresas estatais, quando delegatárias de serviços públicos ou de atos de polícia - e que, portanto, não exploram atividades econômicas -, não se sujeitam à tributação por meio de impostos, justamente porque são a "longa manus" das pessoas políticas que por meio de lei, as criam e lhes apontam os objetivos públicos a alcançar.

A circunstância de serem revestidas da natureza de "empresa pública" ou de sociedade de economia mista" não lhes retira a condição de "pessoas administrativas", que agem em nome do Estado, para a consecução do bem comum.

(...)

Muito bem, as pessoas administrativas delegatárias de serviços públicos, que lhes dão grande cópia de prerrogativas, inclusive no que concerne à tributação, a elas se aplicando, por inteiro, a imunidade do art. 150, VI, "a", da CF.

Sendo mais específicos, tais pessoas, enquanto, no exercício de suas funções típicas, auferem rendimentos, são imunes ao IR e aos tributos que incidem sobre lucros, receitas, rendimentos etc.; enquanto proprietárias dos imóveis que lhes dão "base material" para o desempenho de suas atividades típicas, são imunes ao IPTU; enquanto proprietárias dos serviços públicos ou na prática de atos de polícia, são imunes ao IPVA; e assim avante.

Remarque-se que a circunstância de estas pessoas terem personalidade de direito privado não impede recebam especial proteção tributária, justamente pra possibilitar a prestação de serviços públicos ou a prática de atos de polícia.

(...)

Neste sentido, enquanto atuam como se pessoas políticas fossem, as empresas públicas e as sociedades de economia mista não podem ser embaraçadas ou anulada sua ação pública por meio de impostos. Esta é a consequência de uma interpretação sistemática do art. 150, VI, "a", da CF."

(destaques aditados)

Na mesma linha, a Ministra do STJ, Regina Helena Costa, assevera:

"Inicialmente, analisemos a situação da empresa estatal - empresa pública ou sociedade de economia mista - que recebeu a outorga, por meio de lei, da prestação de serviço público cuja competência pertence à pessoa política que a criou.

(...)

Recebendo tais entes o encargo de prestar serviço público - consoante a noção exposta -, o regime de sua atividade é o de Direito Público, o que inclui, dentre outras prerrogativas, o direito à imunidade fiscal.

O raciocínio resume-se no seguinte: se o serviço público for prestado diretamente pela pessoa política estará, indubitavelmente, imune à tributação por via de impostos. Ora a mera delegação da execução desse serviço público, pela pessoa que é titular da competência para prestá-lo à coletividade, por meio de lei, a uma empresa por ela instituída - empresa pública ou sociedade de economia mista -, que se torna delegatária do serviço, não pode, portanto, alterar o regime jurídico - inclusive tributário - que incide sobre a mesma prestação."

(in Imunidades Tributárias - Teoria e Análise da Jurisprudência do STF, São Paulo: Malheiros Editores, 2ª ed., 2006, pp. 143/144. Destaques aditados).

Pertinente analisar, também, para ponderar a respeito da natureza jurídica da RFFSA , o cenário de privatização promovido pelo governo Fernando Henrique Cardoso com a criação do Programa Nacional de Desestatização - PND por meio da Lei nº 8.031/1990 - diploma posteriormente revogado pela Lei nº 9.491/1997, o qual alterou normas de caráter procedimental relativas ao aludido programa. Em razão da autorização legal firmada, foi editado o Decreto nº 473, de 10 de março de 1992, que incluiu a RFFSA no programa e, assim, ensejou a promoção de estudos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), os quais "recomendaram a transferência para o setor privado dos serviços de transporte ferroviário de carga. Essa transferência foi efetivada no período 1996/1998, de acordo com o modelo que estabeleceu a segmentação do sistema ferroviário em seis malhas regionais, sua concessão pela União por 30 anos, mediante licitação, e o arrendamento, por igual prazo, dos ativos operacionais da RFFSA aos novos concessionários. Em 1998, houve a incorporação da Ferrovia Paulista S.A (FEPASA) à RFFSA , ao que se seguiu, em dezembro desse ano, a privatização daquela malha." (fonte: http://www.transportes.gov.br/orgaos-extintos.html). Transcrevem-se os correlatos dispositivos:

Lei nº 8.031/1990

"Art. 1º. É instituído o Programa Nacional de Desestatização, com os seguintes objetivos fundamentais:

I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público;

II - contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público;

III - permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada;

IV - contribuir para modernização do parque industrial do País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia;

V - permitir que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;

VI - contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa."

"Art. 2º. Poderão ser privatizadas, nos termos desta lei, as empresas:

I - controladas, direta ou indiretamente, pela União e instituídas por lei ou ato do Poder Executivo; ou

II - criadas pelo setor privado e que, por qualquer motivo, passaram ao controle, direto ou indireto, da União.

§ 1°. Considera-se privatização a alienação, pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente ou através de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade.

§ 2°. Aplicam-se os dispositivos desta lei, no que couber, à alienação das participações minoritárias diretas e indiretas da União, no capital social de quaisquer outras empresas.

§ 3°. Não se aplicam os dispositivos desta lei às empresas públicas ou sociedades de economia mista que exerçam atividades de competência exclusiva da União, de acordo com os arts. 21, 159, inciso I, alínea c e 177 da Constituição Federal, ao Banco do Brasil S.A., e, ainda, ao órgão oficial ressegurador referido no inciso II do art. 192 da Constituição Federal."

Decreto nº 473/1992

"Art. 1º. Ficam incluídas no Programa Nacional de Desestatização - PND, para os fins da Lei n° 8.031, de 12 de abril de 1990, as empresas:

I - Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA ;

(...)"

(destaques aditados)

Apenas a título de registro, a partir do cotejo dos normativos legais ora transcritos aos ditames constitucionais a respeito do tema, anteriormente mencionados, impende consignar que a inclusão da Rede Ferroviária no programa de desestatização do governo federal é circunstância que não tem o condão de modificar ou interferir, de qualquer forma, na natureza da prestação do serviço de transporte ferroviário, porquanto é inequivocamente caracterizado como público e essencial, de competência exclusiva da União, cuja execução, frise-se, pode dar-se de modo direto ou indireto, nos termos da legislação ordinária, com supedâneo na autorização constitucional contida no citado artigo 175 da CF/1988: "incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos". Atente-se à regulamentação trazida também no âmbito da Lei nº 8.987/1995:

"Art. 1º. As concessões de serviços públicos e de obras públicas e as permissões de serviços públicos reger-se-ão pelos termos do art. 175 da Constituição Federal, por esta Lei, pelas normas legais pertinentes e pelas cláusulas dos indispensáveis contratos.

Parágrafo único. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão a revisão e as adaptações necessárias de sua legislação às prescrições desta Lei, buscando atender as peculiaridades das diversas modalidades dos seus serviços."

(destaques aditados)

A delegação da administração e execução do transporte ferroviário à iniciativa privada não fez desaparecer sua natureza originária, pois a outorga da gestão e exploração do aludido serviço não modificou sua qualidade de público, na forma preceituada pela Lei Magna e que foi estritamente observada pela regulamentação procedida em âmbito infraconstitucional - a qual, em verdade, não poderia dispor sobre a matéria de forma diversa, sob pena de restar configurada afronta à normatização procedida pelo constituinte, que deve ser fielmente perseguida pelo legislador ordinário.

Não obstante tenha sido transferida a exploração da infraestrutura ferroviária federal sub judice, remanesce a titularidade constitucional de tal serviço público, em especial, saliente-se, porque seus atributos não são passíveis de alteração pela legislação ordinária. Tal situação traz como decorrência, inclusive, a responsabilidade subsidiária da concedente, União, em relação à devida prestação do serviço, em razão de ser titular exclusiva da atividade vinculada ao transporte férreo, ainda que a execução se dê por meio indireto. Legitimada, portanto, a inclusão da União nas lides em que a RFFSA figurar como autora, ré ou interveniente, bem como naquelas em que se discute acerca da gestão e execução do transporte ferroviário prestado por meio da concessionária (ementas a seguir colacionadas: STJ, REsp 1426884 e AGREsp 1119560).

Para finalizar o retrospecto histórico e legislativo, consigne-se que a RFFSA entrou em processo de dissolução, liquidação e extinção, nos termos do Decreto nº 3.277/1999, adotado expressamente o procedimento da Lei nº 8.029/1990 e Lei nº 9.491/1997 por força do disposto no mencionado decreto, nos seguintes termos:

Decreto nº 3.277/1999

"Art. 1º. Fica dissolvida a Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA , incluída no Programa Nacional de Desestatização pelo Decreto nº 473, de 10 de março de 1992."

"Art. 2º. A liquidação da RFFSA far-se-á de acordo com as disposições da Lei nº 8.029, de 12 de abril de 1990, conforme determina o art. 24 da Lei nº 9.491, de 9 de setembro de 1997."

Lei nº 8.029/1990

"Art. 1º. É o Poder Executivo autorizado a extinguir ou a transformar as seguintes entidades da Administração Pública Federal:

(...)"

"Art. 23. A União sucederá a entidade, que venha a ser extinta ou dissolvida, nos seus direitos e obrigações decorrentes de norma legal, ato administrativo ou contrato, bem assim nas demais obrigações pecuniárias. (Renumerado do art 20 pela Lei nº 8.154, de 1990)"

Lei nº 9.491/1997

"Art. 24. No caso de o Conselho Nacional de Desestatização deliberar a dissolução de sociedade incluída no Programa Nacional de Desestatização, aplicar-se-ão, no que couber, as disposições da Lei n° 8.029, de 12 de abril de 1990."

(destaques aditados)

A Rede Ferroviária foi extinta por meio da Lei nº 11.483/2007 (conversão da MPv nº 533/2007) e, então, sucedida pelo ente federal (artigos 1º e 2º), matéria que foi também regulada pelos Decretos nº 6.018/2007 e nº 7.929/2013. Confira-se:

Lei nº 11.483/2007

"Art. 1º. Fica encerrado o processo de liquidação e extinta a Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA , sociedade de economia mista instituída com base na autorização contida na Lei nº 3.115, de 16 de março de 1957.

Parágrafo único. Ficam encerrados os mandatos do Liquidante e dos membros do Conselho Fiscal da extinta RFFSA ."

"Art. 2º. A partir de 22 de janeiro de 2007:

I - a União sucederá a extinta RFFSA nos direitos, obrigações e ações judiciais em que esta seja autora, ré, assistente, opoente ou terceira interessada, ressalvadas as ações de que trata o inciso II do caput do art. 17 desta Lei; e

II - os bens imóveis da extinta RFFSA ficam transferidos para a União, ressalvado o disposto nos incisos I e IV do caput do art. 8o desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.772, de 2008

Parágrafo único. Os advogados ou escritórios de advocacia que representavam judicialmente a extinta RFFSA deverão, imediatamente, sob pena de responsabilização pessoal pelos eventuais prejuízos que a União sofrer, em relação às ações a que se refere o inciso I do caput deste artigo:

I - peticionar em juízo, comunicando a extinção da RFFSA e requerendo que todas as citações e intimações passem a ser dirigidas à Advocacia-Geral da União; e

II - repassar às unidades da Advocacia-Geral da União as respectivas informações e documentos."

"Art. 8º. Ficam transferidos ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT:

I - a propriedade dos bens móveis e imóveis operacionais da extinta RFFSA ;

II - os bens móveis não-operacionais utilizados pela Administração Geral e Escritórios Regionais da extinta RFFSA , ressalvados aqueles necessários às atividades da Inventariança; e

III - os demais bens móveis não-operacionais, incluindo trilhos, material rodante, peças, partes e componentes, almoxarifados e sucatas, que não tenham sido destinados a outros fins, com base nos demais dispositivos desta Lei.

IV - os bens imóveis não operacionais, com finalidade de constituir reserva técnica necessária à expansão e ao aumento da capacidade de prestação do serviço público de transporte ferroviário, ressalvados os destinados ao FC, devendo a vocação logística desses imóveis ser avaliada em conjunto pelo Ministério dos Transportes e pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, conforme dispuser ato do Presidente da República. (Incluído pela Lei nº 11.772, de 2008)"

Decreto nº 6.018/2007

"Art. 1º. Compete ao Ministério dos Transportes a coordenação e a supervisão dos procedimentos administrativos relativos à Inventariança da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA ."

Decreto nº 7.929/2013

"Art. 3º. O Ministério dos Transportes elaborará relação com os bens imóveis não operacionais oriundos da extinta RFFSA considerados total ou parcialmente essenciais e indispensáveis para a expansão e aumento da capacidade de prestação do serviço público de transporte ferroviário, conforme o disposto no art. 1º, encaminhando-a à Secretaria do Patrimônio da União para a manifestação prevista no art. 4º.

§ 1º. A relação deve conter delimitação e descrição precisa da situação físico-ocupacional de cada imóvel ou parcela de interesse para constituição da reserva técnica, e indicação do aproveitamento da integralidade da área para uma ou mais das destinações previstas no art. 1º.

§ 2º. A relação deverá ser concluída e submetida à Secretaria do Patrimônio da União no prazo de seis meses, contado da data de publicação deste Decreto."

(destaques aditados)

Analisados os normativos ora colacionados, constata-se que a natureza pública, exclusiva e essencial dos serviços administrados e executados pela RFFSA deriva, portanto, da interpretação sistemática e harmoniosa da legislação infraconstitucional regente da quaestio, que não alterou, ao revés, ratificou o norte constitucional conferido à matéria. É, de igual forma, corroborada por julgados do próprio Supremo Tribunal Federal aplicáveis por similitude e farta doutrina.

Não se desconhece haver entendimento da 2ª Seção deste E. Tribunal Regional Federal, no sentido de não ser reconhecido à RFFSA o gozo da imunidade tributária, em razão da natureza dos serviços que prestava (e.g., EI 0026518-66.2012.4.03.6182, EI 0011638-14.2009.4.03.6105). No entanto, considerados os fundamentos ora consignados, há de ser perfilhado o entendimento no sentido da aplicação das normas imunizantes ao ente delegatário, o qual é corroborado pelos precedentes do Supremo Tribunal Federal a seguir colacionados, que reconhecem a imunidade às sociedades de economia mista que se caracterizem inequivocamente como instrumentalidades estatais na prestação de serviço público:

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. IPTU. IMÓVEIS DO ACERVO PATRIMONIAL DO PORTO DE SANTOS, INTEGRANTES DO DOMÍNIO DA UNIÃO. CODESP - SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA INCUMBIDA DE EXECUTAR, COMO ATIVIDADE-FIM, EM FUNÇÃO DE SUA ESPECÍFICA DESTINAÇÃO INSTITUCIONAL, SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DE PORTO MARÍTIMO (ART. 21, XII, "F", DA CF). IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA (ART. 150, VI, "A", DA CF). ACÓRDÃO RECORRIDO EM DISSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO DO PLENÁRIO DESTA CORTE (RE N. 253.472). AGRAVO IMPROVIDO.

1. No julgamento do RE n. 253.472, Redator para o acórdão o Ministro Joaquim Barbosa, DJe de 01.02.11, o Plenário do STF reconheceu, por efeito da imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, "a", da CF), a inexigibilidade, por parte do Município tributante, do IPTU referente às atividades executadas pela CODESP - entidade delegatária de serviços públicos a que se refere o art. 21, XII, "f", da CF - , na prestação dos serviços públicos de administração de porto marítimo e daquelas necessárias à realização dessa atividade-fim. (Precedentes: RE n. 253.394, Relator o Ministro Ilmar Galvão, 1ª Turma, DJ de 11.4.03; AI n. 458.856, Relator o Ministro Eros Grau, 1ª Turma, DJ de 20.4.07; RE n. 265.749-Ed-Ed, Relator o Ministro Celso de Mello, 2ª Turma, DJe de 22.08.11; AI n. 738.332-AgR, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe de 26.11.10, entre outros).

2. In casu, o acórdão originariamente recorrido assentou: "Imposto - Predial e Territorial Urbano - Município de Santos - CODESP - Pretensão à imunidade do lançamento fiscal - Inviabilidade - Imunidade se aplica aos bens e serviços de ente estatal, não às sociedades de economia mista que os exploram - Isenção não renovada depois da Constituição Federal de 1.988 - Tributo devido. (...)"

3. Agravo Regimental a que se nega provimento." (destaques aditados)

(STF, RE 462704 AgR, Re. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 04/12/2012);

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE RECÍPROCA. ART. 150, INC. VI, ALÍNEA A, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. EXTENSÃO A SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO." (destaques aditados)

(STF, RE 647881 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 18/09/2012).

No mesmo sentido tem se manifestado esta E. Corte Regional:

"TRIBUTÁRIO. ADMNISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S/A, SUCEDIDA PELA UNIÃO FEDERAL. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU). IMUNIDADE RECÍPROCA. TAXA MUNICIPAL. DÉBITOS NÃO ABRANGIDOS POR CONTRATO DE DAÇÃO EM PAGAMENTO. JUNTADA DE DOCUMENTOS NOVOS EM GRAU RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. TAXA DE REMOÇÃO DE LIXO DOMICILIAR. REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B, § 3º DO CPC).

1. Com relação à cobrança do IPTU, a RFFSA foi constituída sob a forma de sociedade de economia mista, para exploração de serviços públicos de transporte ferroviário, de competência da União (art. 21, XII, d, CF/88), podendo se valer dos benefícios da imunidade consagrada aos entes políticos no art. 150, VI, a, da Carta Magna, não se sujeitando à tributação por meio de impostos. Precedentes deste Tribunal: 3ª Turma, AC n.º 2007.61.10.012098-9, Rel. Juiz Fed. Conv. Roberto Jeuken, DJF3 07.04.2009, p. 485; 4ª Turma, AC n.º 2008.61.17.001051-0, Rel. Des. Fed. Fábio Prieto, j. 15.10.2009, DJF3 CJ1 26.01.2010, p. 272.

(...)

8. Apelação e recurso adesivo improvidos." (destaques aditados)

(TRF 3ª Região, Sexta Turma, AC 0009906-35.2008.4.03.6104, Rel. Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, julgado em 20/06/2013, e-DJF3 Judicial 1 Data:28/06/2013).

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PREFEITURA MUNICIPAL DE PONTA PORÃ. IPTU. IMUNIDADE RECÍPROCA.

I. A RFFSA por ser prestadora de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado, está abrangida pela imunidade tributária recíproca no tocante aos impostos, a teor do artigo 150, VI, alínea "a" da Constituição Federal.

II. Honorários advocatícios reduzidos.

III. Reexame necessário parcialmente provido." (destaques aditados)

(TRF 3ª Região, Quarta Turma, REO 0001972-32.2008.4.03.6005, Rel. Desembargadora Federal Alda Basto, julgado em 02/05/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/05/2013).

 

Ressalte-se que em julgamento recente o STF decidiu:

"Vê-se, portanto, que a resolução do presente litígio há de resultar do reconhecimento, na espécie, de que a pretensão impositiva do Município, em tema de IPTU (imposto cuja exigibilidade está sendo questionada no caso), sofre as limitações decorrentes da garantia da imunidade tributária recíproca, que traduz uma das projeções concretizadoras do postulado constitucional da Federação.

(...)

Assim definida a questão, cumpre-me observar, desde logo, por relevante, que controvérsias assemelhadas à suscitada no presente recurso extraordinário - que concerniam a empresas governamentais incumbidas, por outorga, de explorar atividades constitucionalmente reservadas a determinada entidade política - já foram dirimidas por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal, em julgamentos nos quais se reconheceu, em favor dessas mesmas empresas governamentais delegatárias de serviços públicos, alguns dos quais instituídos em regime constitucional de monopólio, a garantia da imunidade tributária recíproca (RTJ 187/355, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - ACO 789/PI, Red. p/ o acórdão Min. DIAS TOFFOLI - ACO 814/PR, Red. p/ o acórdão Min. DIAS TOFFOLI - RE 318.185-AgR/SP, Rel. Min. NELSON JOBIM - RE 357.291-AgR/PR , Rel. Min. CEZAR PELUSO - RE 357.447-AgR/SP , Rel. Min. ELLEN GRACIE - RE 407.099/RS, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - RE 501.639-AgR/BA, Rel. Min. EROS GRAU - RE 542.454-AgR/BA, Rel. Min. AYRES BRITTO - RE 598.322-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g)".

(RE 943885, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 17/02/2016. No mesmo sentido: RE 971808, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 27/05/2016).

No tocante ao monopólio da atividade, extrai-se do excerto ora transcrito não ter sido considerado essencial para o reconhecimento da imunidade, uma vez que já fora admitida "em favor dessas mesmas empresas governamentais delegatárias de serviços públicos, alguns dos quais instituídos em regime constitucional de monopólio, a garantia da imunidade tributária recíproca". Ainda que assim não se entendesse, estaria caracterizado pela exclusividade da prestação do transporte férreo atribuída pelo constituinte ao ente federal, na forma dos fundamentos apresentados, delegada unicamente à RFFSA . Portanto, mesmo que tenha havido posterior desestatização, com concessão do dever de execução do serviço, sua natureza exclusiva não resta alterada, em especial quanto à Rede Ferroviária.

Tampouco se diga que os casos decididos pelo STF seriam diversos do presente. Tal realidade se verifica similar, inclusive, à da ECT e INFRAERO, às quais é reconhecido o direito ao gozo da imunidade tributária. Dessa forma, não há fator impeditivo à extensão do entendimento à RFFSA , porque se revela indubitavelmente prestadora de serviço exclusivo da União e atende aos requisitos constitucionais e legais para ser-lhe assegurada a imunidade tributária. Confira-se o posicionamento firmado pelo sodalício:

"Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Tributário. IPTU. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Imunidade recíproca (art. 150, VI, a, da CF).

1. Perfilhando a cisão estabelecida entre prestadoras de serviço público e exploradoras de atividade econômica, a Corte sempre concebeu a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos como uma empresa prestadora de serviços públicos de prestação obrigatória e exclusiva do Estado. 2. A imunidade recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição, alcança o IPTU que incidiria sobre os imóveis de propriedade da ECT e por ela utilizados. 3. Não se pode estabelecer, a priori, nenhuma distinção entre os imóveis afetados ao serviço postal e aqueles afetados à atividade econômica. 4. Na dúvida suscitada pela apreciação de um caso concreto, acerca, por exemplo, de quais imóveis estariam afetados ao serviço público e quais não, não se pode sacrificar a imunidade tributária do patrimônio da empresa pública, sob pena de se frustrar a integração nacional. 5. As presunções sobre o enquadramento originariamente conferido devem militar a favor do contribuinte. Caso já lhe tenha sido deferido o status de imune, o afastamento dessa imunidade só pode ocorrer mediante a constituição de prova em contrário produzida pela Administração Tributária. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento." (destaques aditados)

(STF, RE 773992, Rel. Min. Dias Toffoli, Plenário, j. 15/10/2014);

"IMUNIDADE RECÍPROCA - INFRAERO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO - ARTIGO 150, INCISO VI, ALÍNEA "A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O Tribunal reafirmou o entendimento jurisprudencial e concluiu pela possibilidade de extensão da imunidade tributária recíproca à Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO, na qualidade de empresa pública prestadora de serviço público." (destaques aditados)

(STF, AI-AgR 797034, Rel. Min. Marco Aurélio, v.u., Primeira Turma, j. 21/05/2013).

A RFFSA se enquadra nas situações ora colacionadas e, desse modo, atende aos requisitos tanto de âmbito infraconstitucional como aqueles listados pela Carta Magna para a ela ser reconhecido o direito à imunidade tributária.

A notoriedade do caráter público, exclusivo e essencial do transporte ferroviário pode ser aferida, também, a partir da análise das disposições da Lei nº 10.233/2001, que submetem a prestação e gestão do serviço à fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, não só em virtude de sua inconteste relevância para a coletividade, como porque a União mantém a titularidade do serviço e, em decorrência, responde subsidiariamente pelas concessionárias e permissionárias. Além disso, os ativos operacionais existentes e, também, os que vierem a ser instalados em decorrência da construção de novas linhas férreas deverão ser explorados por meio de contratos de concessão que contemplem cláusula de reversão à União, justamente porque se mantém titular do serviço. Atente-se ao teor dos artigos a seguir transcritos:

"Art. 24. Cabe à ANTT, em sua esfera de atuação, como atribuições gerais:

I - promover pesquisas e estudos específicos de tráfego e de demanda de serviços de transporte;

II - promover estudos aplicados às definições de tarifas, preços e fretes, em confronto com os custos e os benefícios econômicos transferidos aos usuários pelos investimentos realizados;

III - propor ao Ministério dos Transportes, nos casos de concessão e permissão, os planos de outorgas, instruídos por estudos específicos de viabilidade técnica e econômica, para exploração da infraestrutura e a prestação de serviços de transporte terrestre; (Redação dada pela Lei nº 12.996, de 2014)

IV - elaborar e editar normas e regulamentos relativos à exploração de vias e terminais, garantindo isonomia no seu acesso e uso, bem como à prestação de serviços de transporte, mantendo os itinerários outorgados e fomentando a competição;

V - editar atos de outorga e de extinção de direito de exploração de infra-estrutura e de prestação de serviços de transporte terrestre, celebrando e gerindo os respectivos contratos e demais instrumentos administrativos;

VI - reunir, sob sua administração, os instrumentos de outorga para exploração de infra-estrutura e prestação de serviços de transporte terrestre já celebrados antes da vigência desta Lei, resguardando os direitos das partes e o equilíbrio econômico-financeiro dos respectivos contratos;

VII - proceder à revisão e ao reajuste de tarifas dos serviços prestados, segundo as disposições contratuais, após prévia comunicação ao Ministério da Fazenda;

VIII - fiscalizar a prestação dos serviços e a manutenção dos bens arrendados, cumprindo e fazendo cumprir as cláusulas e condições avençadas nas outorgas e aplicando penalidades pelo seu descumprimento;

IX - autorizar projetos e investimentos no âmbito das outorgas estabelecidas, encaminhando ao Ministro de Estado dos Transportes, se for o caso, propostas de declaração de utilidade pública; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.217-3, de 4.9.2001)

X - adotar procedimentos para a incorporação ou desincorporação de bens, no âmbito dos arrendamentos contratados;

XI - promover estudos sobre a logística do transporte intermodal, ao longo de eixos ou fluxos de produção;

XII - habilitar o Operador do Transporte Multimodal, em articulação com as demais agências reguladoras de transportes;

XIII - promover levantamentos e organizar cadastro relativos ao sistema de dutovias do Brasil e às empresas proprietárias de equipamentos e instalações de transporte dutoviário;

XIV - estabelecer padrões e normas técnicas complementares relativos às operações de transporte terrestre de cargas especiais e perigosas;

XV - elaborar o seu orçamento e proceder à respectiva execução financeira.

XVI - representar o Brasil junto aos organismos internacionais e em convenções, acordos e tratados na sua área de competência, observadas as diretrizes do Ministro de Estado dos Transportes e as atribuições específicas dos demais órgãos federais. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.217-3, de 4.9.2001)

XVII - exercer, diretamente ou mediante convênio, as competências expressas no inciso VIII do art. 21 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, nas rodovias federais por ela administradas. (Incluído pela Lei nº 10.561, de 13.11.2002)

XVIII - dispor sobre as infrações, sanções e medidas administrativas aplicáveis aos serviços de transportes. (Incluído pela Lei nº 12.996, de 2014)

Parágrafo único. No exercício de suas atribuições a ANTT poderá:

I - firmar convênios de cooperação técnica e administrativa com órgãos e entidades da Administração Pública Federal, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, tendo em vista a descentralização e a fiscalização eficiente das outorgas;

II - participar de foros internacionais, sob a coordenação do Ministério dos Transportes.

III - firmar convênios de cooperação técnica com entidades e organismos internacionais. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.217-3, de 4.9.2001)"

"Art. 25. Cabe à ANTT, como atribuições específicas pertinentes ao Transporte Ferroviário: (Redação dada pela Medida Provisória nº 576, de 2012)

I - publicar os editais, julgar as licitações e celebrar os contratos de concessão para prestação de serviços de transporte ferroviário, permitindo-se sua vinculação com contratos de arrendamento de ativos operacionais;

II - administrar os contratos de concessão e arrendamento de ferrovias celebrados até a vigência desta Lei, em consonância com o inciso VI do art. 24;

III - publicar editais, julgar as licitações e celebrar contratos de concessão para construção e exploração de novas ferrovias, com cláusulas de reversão à União dos ativos operacionais edificados e instalados;

IV - fiscalizar diretamente, com o apoio de suas unidades regionais, ou por meio de convênios de cooperação, o cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados;

V - regular e coordenar a atuação dos concessionários, assegurando neutralidade com relação aos interesses dos usuários, orientando e disciplinando o tráfego mútuo e o direito de passagem de trens de passageiros e cargas e arbitrando as questões não resolvidas pelas partes;

VI - articular-se com órgãos e instituições dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para conciliação do uso da via permanente sob sua jurisdição com as redes locais de metrôs e trens urbanos destinados ao deslocamento de passageiros;

VII - contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória das ferrovias, em cooperação com as instituições associadas à cultura nacional, orientando e estimulando a participação dos concessionários do setor.

VIII - regular os procedimentos e as condições para cessão a terceiros de capacidade de tráfego disponível na infraestrutura ferroviária explorada por concessionários. (Incluído pela Lei nº 12.743, de 2012)

Parágrafo único. No cumprimento do disposto no inciso V, a ANTT estimulará a formação de associações de usuários, no âmbito de cada concessão ferroviária, para a defesa de interesses relativos aos serviços prestados."

"Art. 26. Cabe à ANTT, como atribuições específicas pertinentes ao Transporte Rodoviário:

(...)"

(destaques aditados)

Corrobora-se o ora expendido, ainda, por meio das ementas a seguir colacionadas da Superior Corte, concernentes ao julgamento de situações parelhas que se amoldam ao caso sub judice. Extrai-se dos julgados o reconhecimento da legitimidade ativa e passiva ad causam da União para figurar nos feitos que versem sobre a gestão e a execução dos serviços de transporte ferroviário, ainda que prestados por meio indireto (concessão, permissão, autorização), em decorrência de não poder ser afastado o interesse da União, até mesmo porque reflete a significativa dimensão do interesse público envolvido:

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO CONFIGURAÇÃO. DEMANDA PROPOSTA PELA RFFSA EM FACE DE ARRENDATÁRIA POR DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. UNIÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. CONFIGURAÇÃO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

(omissis)

6. O fato de a Lei 10.233/01 atribuir à ANTT a administração dos contratos de concessão e arrendamento de ferrovias celebrados até a sua vigência por si só não desnatura o interesse da União de ocupar o pólo ativo da presente demanda, tendo em vista a sua condição de titular de todos os serviços objeto de contrato de concessão em cumprimento ao que determina a CF/88. 7. Recurso especial não provido." (destaques aditados)

(STJ, REsp 1426884, rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, v.u., DJe 16/03/2015);

"ADMINISTRATIVO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ACIDENTE DE TRÂNSITO - DANO MATERIAL - RESPONSABILIDADE DA AUTARQUIA - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. A Jurisprudência desta Corte considera a autarquia responsável pela conservação das rodovias e pelos danos causados a terceiros em decorrência da má conservação, contudo remanesce ao Estado a responsabilidade subsidiária. Agravo regimental provido em parte para afastar a responsabilidade solidária da União, persistindo a responsabilidade subsidiária." (destaques aditados)

(STJ, AGREsp 875604, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, v.u., DJe 25/06/2009).

"ADMINISTRATIVO - RODOVIA FEDERAL - PEDÁGIO - CONTRATO DE CONCESSÃO -UNIÃO - MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES - ANTT - LEGITIMIDADE PASSIVA - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 126 DO STJ.

1. O acórdão recorrido abriga fundamentos de índole constitucional e infraconstitucional. A ora agravante, porém, não cuidou de interpor o devido recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, de modo a incidir a jurisprudência sedimentada por meio da Súmula 126 deste Tribunal.

2. Ademais, a jurisprudência desta Corte adotou o entendimento segundo o qual a União é parte legítima para integrar a lide que trate de cobrança de pedágio em rodovia federal delegada a Estado-membro. In casu, conforme consignado no acórdão recorrido, a participação da União Federal se dá por meio do Ministério dos Transportes, do qual a Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT subrogou-se nos direitos e obrigações.

Agravo regimental improvido." (destaque aditado)

(STJ, AGREsp 1119560, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, v.u., DJe 25/09/2009).

De conseguinte, conforme os fundamentos esposados, constata-se que a Rede Ferroviária Federal S/A era sociedade de economia mista prestadora de transporte ferroviário, serviço público de natureza essencial, obrigatória e exclusiva, de titularidade da União e exercido por delegação. Portanto, imperioso reconhecer a imunidade tributária da RFFSA , de modo que se torna incabível a cobrança do IPTU referente aos anos anteriores a 2007.

 

 

Ante o exposto, dou provimento ao apelo para julgar procedentes os embargos à execução fiscal e desconstituir o débito exigido pela exequente. Fixo os honorários em 10% do débito exigido, nos moldes do artigo 85, § § 2º e 3º, inciso I, do CPC.

 

É como voto.

 

André Nabarrete

Desembargador Federal


E M E N T A

 

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. IMÓVEL QUE PERTENCIA À RFFSA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE CARÁTER ECONÔMICO E FINALIDADE LUCRATIVA.

1. Nos termos do art. 3º, parágrafo único, da LEF, a dívida ativa regularmente inscrita goza de presunção juris tantum de certeza e liquidez, só podendo ser ilidida por meio de prova inequívoca. A inscrição, por sua vez, gera a certidão de dívida ativa, a qual constitui título executivo extrajudicial para efeito de ajuizamento da execução pelo rito especial da Lei nº 6.830 de 1980.

2. Dada a natureza de sociedade anônima da RFFSA, vinha entendendo que sua atividade ostentava cunho econômico e, portanto, visada ao lucro, o que, por conseguinte, impedia que a empresa se beneficiasse da imunidade tributária recíproca (CF/88, art. 150, VI, "a", §§ 2º e 3º).

3. O STF em sede de exame de repercussão geral no RE 959.489, por meio de seu Plenário, decidiu que o tema envolvendo a suposta imunidade recíproca da RFFSA não é de índole constitucional e, por tal motivo, não é dotado de repercussão geral.

4. Não é mais aplicável como razão de decidir a posição antes explicitada pelo STF no RE nº 943.885, justamente porque suas bases repousam na questão constitucional, tendo a Excelsa Corte frisado, por seu órgão Plenário, que a solução do tema não requer o emprego das normas da mais alta hierarquia do sistema jurídico.

5. É possível a tributação do patrimônio, da renda e dos serviços prestados pela extinta RFFSA, ante a existência de caráter econômico e finalidade lucrativa.

6. Considerando a data da transferência dos bens da extinta RFFSA para a União Federal em 22.01.2007 (data da vigência da MP 353), e que o fato gerador do IPTU ocorre com a propriedade, o domínio útil ou a posse do bem imóvel em 1º de janeiro de cada ano, é a União, na qualidade de sucessora da obrigação tributária, a responsável pelo pagamento do IPTU devido pela extinta RFFSA, relativo aos exercícios de exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006.

7. Apelação improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, na sequência do julgamento, após o voto do Des. Fed. NERY JÚNIOR no mesmo sentido da Relatora, foi proferida a seguinte decisão: a Quarta Turma, por maioria, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto da Des. Fed. MARLI FERREIRA (Relatora), com quem votaram a Des. Fed. MÔNICA NOBRE, o Des. Fed. SOUZA RIBEIRO e o Des. Fed. NERY JÚNIOR. Vencido o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE, que dava provimento ao apelo para julgar procedentes os embargos à execução fiscal e desconstituir o débito exigido pela exequente, honorários fixados em 10% do débito exigido, nos moldes do artigo 85, § § 2º e 3º, inciso I, do CPC. Fará declaração de voto o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. Ausente, justificadamente, em razão de férias, o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. O Des. Fed. SOUZA RIBEIRO e o Des. Fed. NERY JÚNIOR votaram na forma dos arts. 53 e 260 do RITRF3, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.