APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0041943-55.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. Vice Presidência
APELANTE: CANAMOR AGRO - INDUSTRIAL E MERCANTIL S/A.
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO TADEU TELLES - SP162637-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0041943-55.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: CANAMOR AGRO - INDUSTRIAL E MERCANTIL S/A. Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO TADEU TELLES - SP162637 APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo interno interposto pelo contribuinte contra decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso especial no tocante a matéria decidida pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo (REsp 1.201.993 – Tema 444 do STJ) e não o admitiu nas outras questões. A parte recorrente pugna pela reforma do julgado em síntese sob os seguintes argumentos: (i) “a Fazenda, já em dezembro 2007, tinha a convicção de que a agravante seria responsável por dívidas do Grupo Matarazzo, tanto que, naquele ano, pleiteou o redirecionamento da execução onde proferida a sentença idêntica à ora impugnada”; (iii) “o argumento principal do recurso se refere à prescrição intercorrente operada em razão da inércia da Fazenda, posto que transcorridos 8 (oito) anos entres a ciência inequívoca desta quanto aos fatos autorizadores da corresponsabilização e o efetivo pedido de redirecionamento”. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0041943-55.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. Vice Presidência APELANTE: CANAMOR AGRO - INDUSTRIAL E MERCANTIL S/A. Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO TADEU TELLES - SP162637 APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O agravo interno não merece prosperar. Insurge-se a parte agravante contra decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso especial no tocante a matéria decidida pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo (REsp 1.201.993 – Tema 444 do STJ) e não o admitiu nas outras questões. O acórdão da turma julgadora, contra o qual o ora agravante interpôs recurso excepcional, está assim ementado: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - EMPRESA "DE FACHADA" CRIADA EXCLUSIVAMENTE PARA A TRANSFERÊNCIA FRAUDULENTA DE ATIVOS (PRECEDENTES NESSE SENTIDO, DESTA CORTE E DO TJSP) - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA REFORMADA APENAS PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Não há como se sustentar a nulidade da decisão que incluiu a embargante como devedora solidária na execução fiscal, pois o juiz atuou mediante provocação da Fazenda credora e a atuação jurisdicional se limitou à apreciação do requerimento formulado pela parte credora. 2. A questão central destes embargos é saber se a embargante é ou não uma pessoa jurídica realmente autônoma e independente em relação às empresas do Grupo Matarazzo, ou se se trata de mera empresa criada exclusivamente para a transferência fraudulenta de ativos, para afastar da penhora os bens do Grupo Matarazzo em relação aos débitos fiscais. 3. A conclusão é que a Canamor é mera empresa "de fachada"; sem qualquer existência fática, e criada pela Família Matarazzo para fraudar créditos de natureza tributária; tratando-se de pessoa jurídica decorrente de uma simulação absoluta (que acarreta a inexistência do ato jurídico de sua instituição e a absoluta ineficácia de sua personalidade jurídica meramente formal frente aos créditos fazendários). 4. Tratando-se de redirecionamento de execução fiscal, o termo inicial do prazo da prescrição intercorrente do crédito tributário (cinco anos) só se verifica depois de constatada a incapacidade patrimonial da devedora principal para o pagamento da obrigação. No caso de redirecionamento da execução fiscal contra sócios ou contra outras empresas do mesmo grupo econômico, a responsabilidade tributária é subsidiária, e só pode se dar se e quando o juiz verificar que a devedora principal não tem patrimônio idôneo e quanto verificada a relação de ilicitude e de responsabilidade entre a devedora principal e as pessoas a serem incluídas na lide. Essa responsabilidade não é automática, e a pretensão só surge com essas verificações (aplicando-se o princípio da actio nata). 5. Verifica-se simulação absoluta (fraudulenta), que gera a inexistência e a ineficácia do ato jurídico; sendo essa simulação passível de reconhecimento a qualquer tempo e não se sujeitando a qualquer convalescimento (por prescrição ou decadência). Além disso, por se tratar de ato jurídico inexistente, essa fraude dispensa ação judicial própria para seu reconhecimento; uma vez que, na realidade, tratando-se de "blindagem patrimonial" com transferência de bens, a empresa embargante, do ponto de vista jurídico e real, identifica-se com a empresa devedora principal da execução fiscal. 6. Como é da jurisprudência, no caso de constituição de empresas para transferência de ativos e "blindagem patrimonial" em fraude tributária, aplicam-se os artigos 50 do Código Civil e 135 do Código Tributário Nacional (o que autoriza o redirecionamento da execução fiscal contra a empresa criada, independentemente de ação judicial autônoma ou de reconhecimento da fraude de execução). 7. Na simulação absoluta, nenhum ato jurídico quis se praticar, nem o aparente nem outro qualquer. Falta a consciência da vontade (elemento essencial ao suporte fático). Por ser mera aparência, não entra no mundo jurídico. Não sendo ato jurídico, não há ato inválido. Ocorre a inexistência de ato jurídico, e o reconhecimento desse vício opera efeito ex tunc (desde o início; a partir da criação do ato inexistente). 8. Caso em que, evidentemente, não se aplica o prazo prescricional (ou melhor, decadencial) à simulação absoluta, por envolver a prática de ato inexistente, que não convalesce com o decurso do tempo. O que inexiste não passa a existir e a produzir efeitos válidos só pelo fato de os interessados não impugnarem a ilicitude do ajuste simulatório. Para que haja prescrição, é necessária a ocorrência de ato de existe e que aparece. A simulação absoluta, decorrente de ato inexistente, não se submete a prazo prescricional. 9. É legítima a aplicação das disposições gerais do Direito Civil e do Processo Civil quanto à responsabilização de pessoas por débitos tributários, notadamente quando há atos de simulação e fraude à lei, visando ao esvaziamento e à "blindagem patrimonial" de pessoas jurídicas pertencentes a único grupo familiar, mediante criação de pessoa jurídica fictícia em "paraíso fiscal" para frustrar a responsabilidade patrimonial do devedor principal e originário do tributo. 10. As normas especiais previstas no CTN (arts. 124, 134 e 135) não afastam a aplicação das gerais do Código Civil, haja vista que a fraude à lei, a fraude contra credores, a simulação e a declaração de nulidade de atos jurídicos são regras gerais de Direito Civil que se aplicam a todas as hipóteses jurídicas (inclusive tributárias); tanto isso é verdade, que o art. 105 do Código Civil de 1916 previa expressamente que a Fazenda Pública poderia demandar a nulidade dos atos simulados. 11. Os vícios do consentimento e os vícios sociais podem e devem ser alegados e reconhecidos, inclusive em Execuções Fiscais, pois as regras do CTN acerca da responsabilidade tributária não são incompatíveis com as normas gerais do Direito Civil acerca da desconsideração da personalidade jurídica (art. 50 do Código Civil). 12. Os princípios do direito tributário, em especial os da estrita legalidade e da tipicidade, não impedem a interpretação sistemática de todo o ordenamento jurídico, de maneira a suprir eventuais incongruências do sistema. A unidade e a adequação valorativa do sistema são pressupostos de aplicação do ordenamento jurídico, anterior inclusive aos princípios firmados em cada um dos ordenamentos jurídicos. Nessa linha, é necessário preservar o geral ainda que na especialidade. 13. Portanto, não se pode cogitar em prescrição intercorrente, pois o ato fraudulento mascara uma situação inexistente e que não convalesce com o decurso do tempo. Ademais, do ponto de vista real, a embargante nada mais é do que uma empresa criada para concentrar o patrimônio obtido pela Família Matarazzo, somente com o fim de impedir a satisfação de créditos tributários das demais empresas do mesmo grupo familiar. Portanto, não há contagem de prazo prescricional na espécie, uma vez que a embargante e seu patrimônio nada mais são do que a própria empresa e o próprio patrimônio da empresa executada inicialmente (a devedora principal). 14. Ainda que assim não fosse, a prescrição não se consumou no caso concreto; não houve qualquer inércia da Fazenda Nacional que justificasse o reconhecimento da prescrição no caso. Toda a demora na realização do crédito se deveu ao oferecimento, pela devedora originária, de bens inócuos e penhorados e arrematados em outros processos, oposição de embargos à execução e diversos recursos e incidentes manifestamente protelatórios e procrastinatórios, e, até mesmo, de exceções de pré-executividade e exceção de suspeição sempre com a finalidade de procrastinar o andamento processual e impedir a apuração de bens das empresas do Grupo Matarazzo. 15. O que se verifica, sempre, são sucessivas e vis manobras protelatórias da executada originária e da embargante Canamor para impedir o rápido julgamento dos feitos e retardar a realização do crédito tributário, sem qualquer desídia da Fazenda Pública. 16. O encargo legal previsto no Decreto-Lei 1.025/69 está incluído no valor da execução fiscal, substituindo, nos embargos, a condenação em honorários advocatícios, em caso de improcedência desses. 17. Apelação parcialmente provida. Opostos embargos de declaração, foram rejeitados pelo órgão fracionário, com imposição de multa. Como mencionado na decisão desta Vice-Presidência que negou seguimento ao referido recurso especial, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.201.993/SP (sistemática dos recursos repetitivos - Tema 444), fixou as balizas para a análise da matéria atinente à prescrição para o redirecionamento da execução fiscal. No caso concreto, conforme se verifica na transcrição supra, o órgão fracionário firmou compreensão no sentido de que não houve inércia fazendária. Cumpre, a propósito, destacar o seguinte excerto do aresto recorrido: “14. Ainda que assim não fosse, a prescrição não se consumou no caso concreto; não houve qualquer inércia da Fazenda Nacional que justificasse o reconhecimento da prescrição no caso. Toda a demora na realização do crédito se deveu ao oferecimento, pela devedora originária, de bens inócuos e penhorados e arrematados em outros processos, oposição de embargos à execução e diversos recursos e incidentes manifestamente protelatórios e procrastinatórios, e, até mesmo, de exceções de pré-executividade e exceção de suspeição sempre com a finalidade de procrastinar o andamento processual e impedir a apuração de bens das empresas do Grupo Matarazzo.” Com efeito, no referido julgado paradigmático (REsp 1.201.993 – Tema 444), o Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento no sentido de que “em qualquer hipótese, a decretação da prescrição para o redirecionamento impõe seja demonstrada a inércia da Fazenda Pública, no lustro que se seguiu à citação da empresa originalmente devedora (REsp 1.222.444/RS) ou ao ato inequívoco mencionado no item anterior (respectivamente, nos casos de dissolução irregular precedente ou superveniente à citação da empresa), cabendo às instâncias ordinárias o exame dos fatos e provas atinentes à demonstração da prática de atos concretos na direção da cobrança do crédito tributário no decurso do prazo prescricional” (destaques nossos). Resolvida a questão em julgamento efetuado sob a sistemática dos recursos repetitivos, cumpre à Vice-Presidência negar seguimento ao recurso excepcional se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior. Essa é a hipótese dos autos, pois o aresto recorrido não destoa do entendimento manifestado pelo STJ no paradigma em apreço. Desse modo, deve ser mantida a negativa de seguimento do recurso excepcional, por força do disposto no art. 1.030, I, “b”, do Código de Processo Civil. A parte agravante não traz nenhum fundamento novo capaz de alterar o entendimento firmado. Ressalte-se, ainda, não ser admitida a rediscussão dos termos do acórdão paradigma, devendo o Presidente ou o Vice-Presidente do Tribunal de origem verificar tão somente a adequação entre o julgado recorrido e o acórdão representativo de controvérsia, isso porque foi opção do legislador dar a máxima efetividade à sistemática dos recursos repetitivos, atribuindo, aos Tribunais estaduais e regionais, em caráter exclusivo e definitivo, a competência para proferir juízo de adequação do caso concreto ao precedente abstrato formado no recurso paradigma (Pet 011999, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data da Publicação 27/06/2017). Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. ART. 1.030, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. JULGADO EM CONSONÂNCIA COM ENTENDIMENTO FIRMADO EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO. TEMA 444 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Ao apreciar o REsp 1.201.993 (Tema 444 dos recursos repetitivos), o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a decretação da prescrição para o redirecionamento da execução fiscal impõe seja demonstrada a inércia da Fazenda Pública no lustro que se seguiu à citação da empresa originalmente devedora ou ao ato inequívoco previsto no art. 135, III, do CTN, cabendo às instâncias ordinárias o exame dos fatos e provas atinentes à demonstração da prática de atos concretos na direção da cobrança do crédito tributário no decurso do prazo prescricional.
2. O aresto recorrido não destoa do entendimento manifestado pelo STJ no paradigma em apreço.
3. A parte agravante não traz nenhum fundamento novo capaz de alterar o entendimento firmado.
4. Agravo interno não provido.