Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5026797-68.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: CRISTIANO PIVATO RUIZ MARQUES

Advogados do(a) IMPETRANTE: RENAN DASSIE ROSA - SP278541-A, GUILHERME AUGUSTO FIGUEIREDO CEARA - SP268059-A, WELLINGTON SPEGIORIN DE SOUSA LEITE - SP269062-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO CARLOS/SP - 1ª VARA FEDERAL

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5026797-68.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: CRISTIANO PIVATO RUIZ MARQUES

Advogados do(a) IMPETRANTE: RENAN DASSIE ROSA - SP278541-A, GUILHERME AUGUSTO FIGUEIREDO CEARA - SP268059-A, WELLINGTON SPEGIORIN DE SOUSA LEITE - SP269062-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO CARLOS/SP - 1ª VARA FEDERAL

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de mandado de segurança impetrado por Cristiano Pivato Ruiz Marques contra decisão do Juízo da 1ª Vara Federal de São Carlos (SP), proferida nos Autos da Medida Cautelar n. 5001611-65.2020.4.03.6115, que manteve ordem de indisponibilidade de bens do impetrante malgrado sua absolvição nos autos da ação penal originária (Id n. 206724843, p. 139).

Alega-se, em resumo, o seguinte:

a) em 29.09.21, a autoridade impetrada deferiu pedido de manutenção de indisponibilidade de bens do impetrante, malgrado tê-lo absolvido nos Autos da Ação Penal n. 5001246-11.2020.4.03.6115;

b) o mandado de segurança, dadas as circunstâncias, é medida cabível contra referido ato ilegal;

c) o impetrante fora denunciado por cometimento dos crimes previstos no art. 312, por 3 (três) vezes, e no art. 171, § 3º, do Código Penal – a acusação é no sentido de que teria auxiliado empreitada criminosa na condição de administrador de fato da pessoa jurídica Lotérica Tambaú Ltda.;

d) no curso do processo, porém, não restou demonstrada qualquer participação do impetrante em relação aos fatos denunciados;

e) além disso, houve confissão espontânea do corréu, afastando qualquer participação do impetrante;

f) à míngua de comprovação da participação criminosa, o impetrante foi absolvido pela autoridade impetrada;

g) o Ministério Público Federal, no entanto, interpôs recurso de apelação nos autos da ação penal originária e, nos autos da Medida Cautelar n. 5001611-65.2020.4.03.6115, pediu a manutenção da indisponibilidade de bens do impetrante;

h) a autoridade impetrada, sem nenhuma fundamentação, deferiu o pedido do Ministério Público Federal – ou seja, malgrado não haja indícios de autoria criminosa contra o impetrante, restou mantida a ordem de indisponibilidade de seus bens, o que é ilegal e justifica a impetração deste mandado de segurança;

i) considerando o direito líquido e certo do impetrante, o qual decorre de sua absolvição na ação penal, impõe-se o levantamento da indisponibilidade de bens;

j) o Ministério Público Federal argumentou que não seria caso de levantar a indisponibilidade de bens considerando não haver trânsito em julgado da absolvição, consoante o disposto no art. 131, III, do Código de Processo Penal;

k) não se trata, porém, de medida cautelar de sequestro, pois em nenhum instante houve indicação de que os bens objeto da restrição teriam sido adquiridos como proveito dos crimes;

l) o presente caso é de indisponibilidade de bens por hipoteca legal, conforme o art. 134 do Código de Processo Penal, para o qual se exige certeza da infração e indícios suficientes de autoria;

m) havia indícios de autoria quando oferecida a denúncia, porém da instrução criminal não se extraiu prova de participação criminosa e o impetrante restou absolvido;

n) embora tenha sido interposto recurso contra a absolvição – o qual não possui efeito suspensivo – não é caso de se manter a indisponibilidade de bens do impetrante;

o) estão presentes os pressupostos para a concessão da segurança em caráter liminar (Id n. 206724026).

Foram juntadas cópias extraídas dos Autos da Medida Cautelar n. 5001611-65.2020.4.03.6115 (Id n. 206724843).  

O impetrante promoveu a juntada de cópia de pagamento de custas processuais (Id n. 206771653).

O pedido liminar foi indeferido (Id n. 209821784).

A autoridade impetrada prestou informações (Id n. 210335249).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Álvaro Luiz de Mattos Stipp, manifestou-se pela denegação da segurança (Id n. 220291865).

É o relatório.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

 

 


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5ª Turma
 

MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL (1710) Nº 5026797-68.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

IMPETRANTE: CRISTIANO PIVATO RUIZ MARQUES

Advogados do(a) IMPETRANTE: RENAN DASSIE ROSA - SP278541-A, GUILHERME AUGUSTO FIGUEIREDO CEARA - SP268059-A, WELLINGTON SPEGIORIN DE SOUSA LEITE - SP269062-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO CARLOS/SP - 1ª VARA FEDERAL

 

V O T O

Direito líquido e certo. Para fazer jus à ordem de segurança, o impetrante deve demonstrar a presença dos seus pressupostos específicos, que em última análise se resolvem na existência de direito líquido e certo, cujo conceito amplamente aceito é o seguinte:

 

Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança. Evidentemente, o conceito de liquidez e certeza adotado pelo legislador do mandado de segurança não é o mesmo do legislador civil (...). É um conceito impróprio – e mal-expresso – alusivo a precisão e comprovação do direito quando deveria aludir a precisão e comprovação dos fatos e situações que ensejam o exercício desse direito.

Por se exigir situações e fatos comprovados de plano é que não há instrução probatória no mandado de segurança. Há, apenas, uma dilação para informações do impetrado sobre as alegações e provas oferecidas pelo impetrante, com subseqüente manifestação do Ministério Público sobre a pretensão do postulante. Fixada a lide nestes termos, advirá a sentença considerando unicamente o direito e os fatos comprovados com a inicial e as informações.

(MEIRELLES, Hely Lopes, Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, “habeas data”, 16ª ed., São Paulo, Malheiros, 1995, p. 28-29, n. 4)

 

Assim, a segurança somente será concedida quando comprovado de plano o direito líquido e certo, não se admitindo dilação probatória:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. (...)

3. O mandado de segurança, previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, com procedimento regulado pela Lei 1.533/51, é ação de natureza sumária, indicado para a proteção de direito líquido e certo ameaçado ou violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade, que deve ser comprovado de plano, não se permitindo dilação probatória. Para que o impetrante obtenha êxito em sede de mandamus é essencial que traga aos autos as provas pré-constituídas necessárias para demonstrar a existência de seu direito líquido e certo. Todos os fatos devem estar documentalmente comprovados no momento da impetração, ou seja, com a inicial devem estar presentes os elementos necessários para o exame das alegações apresentadas na petição inicial pelo impetrante (...).

(STJ, EDcl no RMS n. 24137-RS, Rel. Min. Denise Arruda, j. 06.08.09)

 

Do caso dos autos. Extrai-se dos autos que, em 25.09.20, com fundamento no art. 134 do Código de Processo Penal,  o Ministério Público Federal propôs medida cautelar para a constrição de bens pertencentes a Sidney Ruiz Marques e Cristiano Pizato Ruiz Marques (impetrante), réus na Ação Penal n. 5001246-11.2020.403.6115.

A medida cautelar foi proposta a fim de se obter a indisponibilidade prévia de bens imóveis dos acusados e posterior registro de hipoteca legal, com o objetivo de garantir o ressarcimento de danos em tese causados à Caixa Econômica Federal pelo cometimento dos crimes de peculato e estelionato imputados aos denunciados (Id n. 206724843, pp. 5/10).

O pedido cautelar foi inicialmente rejeitado pela autoridade impetrada, por ausência de legitimidade do Ministério Público Federal para pleitear a medida, dado que o pedido de hipoteca legal deveria ter sido deduzido pela própria ofendida, Caixa Econômica Federal, empresa pública não compreendida no conceito de Fazenda Pública para os fins do art. 142 do Código de Processo Penal (Id n. 206724843, pp. 31/32).

Posteriormente, após novas manifestações do Ministério Público Federal e da ofendida Caixa Econômica Federal (Id n. 206724843, pp. 26/27, 29/30, 33/34, 36/38 e 43/52), foi deferido o pedido de hipoteca legal, com fundamento nos arts. 134 e 135 do Código de Processo Penal, para assegurar eventual ressarcimento em caso de condenação dos acusados, determinando-se, cautelarmente, a indisponibilidade de bens imóveis de propriedade do impetrante Cristiano Pizato Ruiz Marques (imóveis objeto das Matrículas ns. 11.060, 12.340 5.012 e 2.291, do Cartório de Registro de Imóveis de Tambaú) (Id n. 206724843, pp. 52/53).

No curso dos trâmites de avaliação dos bens imóveis objeto da indisponibilidade, sobreveio a sentença que, nos autos da ação penal originária, condenou o réu Sidney Ruiz Marques nos termos da denúncia, mas absolveu o denunciado Cristiano Pivato Ruiz Marques dos fatos que lhe foram imputados, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (Id n. 206724843, pp. 121/133).

Nos autos da medida cautelar, manifestou-se o Ministério Público Federal pela manutenção da ordem de indisponibilidade de bens do réu absolvido. Argumentou, em síntese, que ainda não havia trânsito em julgado da sentença absolutória, restando pendente o julgamento da apelação interposta pela acusação, voltada a obter a condenação do réu absolvido (Id n. 206724843, pp. 135/138).

A autoridade impetrada acolheu a manifestação do Ministério Público Federal e determinou a continuidade da constrição, nos seguintes termos:

 

DEFIRO o requerido pelo Ministério Público Federal, considerando que a Ação Penal não transitou em julgado, pois foi interposto recurso de apelação pela acusação e defesa.

Dê-se continuidade ao feito cumprindo-se o determinado no despacho ID 57366956.(Id n. 206724843, p. 139)

 

O impetrante aduz a ilegalidade da decisão, considerando a absolvição proferida nos autos da ação penal originária e o fato de que a medida decretada não configura sequestro de bens – não seria caso de aplicar, portanto, o disposto no art. 131, III, do Código de Processo Penal, impondo-se a imediata liberação dos bens.

Não lhe assiste razão.

A medida cautelar decretada em relação aos bens do impetrante realmente não se caracteriza como sequestro nos termos do art. 126 do Código de Processo Penal, não se lhe aplicando, portanto, o disposto no art. 131, III, do Código de Processo Penal.

No entanto, ainda que a constrição seja de natureza diversa e tenha sido decretada com fundamento nos arts. 134 e 135 do Código de Processo Penal, há fundamento legal para a sua manutenção por ausência de trânsito em julgado da decisão absolutória. Nesse sentido, dispõe o art. 141 do Código de Processo Penal:

 

Art. 141.  O arresto será levantado ou cancelada a hipoteca, se, por sentença irrecorrível, o réu for absolvido ou julgada extinta a punibilidade.

 

No caso dos autos, ainda não se verificou o trânsito em julgado da decisão absolutória, sendo conveniente anotar que a Procuradoria Regional da República, em seu parecer, registra que ainda está pendente o julgamento das Apelações Criminais interpostas na ação penal originária (Autos n. 5001246-11.2020.4.03.6115), em relação às quais opinara pelo desprovimento do apelo do réu Sidney e pelo provimento do apelo da acusação, para a reforma da sentença e condenação do impetrante (Id n. 220291865, p. 3).

Há, portanto, fundamento legal para a manutenção da indisponibilidade, não se constatando ofensa a direito líquido e certo que justifique a concessão da segurança.

Ante o exposto, DENEGO a segurança pleiteada.

É o voto.



E M E N T A

PENAL. PROCESSO PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CONSTATAÇÃO DE PLANO. EXIGIBILIDADE. INDISPONIBILIDADE DE BENS. PEDIDO DE LEVANTAMENTO DA MEDIDA. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. NÃO CONSTATAÇÃO DE OFENSA A DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE. SEGURANÇA DENEGADA.

1. Para fazer jus à ordem de segurança, o impetrante deve demonstrar a presença dos seus pressupostos específicos, que em última análise se resolvem na existência de direito líquido e certo.

2. O impetrante alega ter direito líquido e certo ao imediato levantamento da medida de indisponibilidade de bens imóveis de sua propriedade, considerando ter sido absolvido em primeira instância nos autos da ação penal originária.

3. Constata-se, porém, que a acusação interpôs recurso de apelação voltado à reforma da sentença. Há, portanto, fundamento para a manutenção da indisponibilidade, considerando a ausência de trânsito em julgado da decisão absolutória, consoante o art. 141 do Código de Processo Penal (“Art. 141.  O arresto será levantado ou cancelada a hipoteca, se, por sentença irrecorrível, o réu for absolvido ou julgada extinta a punibilidade”).

4. Segurança denegada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu, DENEGAR a segurança pleiteada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.