APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5258965-52.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES TEIXEIRA
CURADOR: MARLENE TEIXEIRA
Advogado do(a) APELADO: APARECIDA DONIZETE RICARDO - SP203773-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5258965-52.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LOURDES TEIXEIRA Advogado do(a) APELADO: APARECIDA DONIZETE RICARDO - SP203773-N, OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da r. sentença, não submetida ao reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a conceder, à parte autora, o benefício de prestação continuada, desde a data de entrada do requerimento administrativo, em 01/05/2017, confirmando os efeitos da tutela de mérito antecipados no curso da lide. O decisum condenou, ainda, o ente autárquico, ao pagamento dos atrasados, acrescidos de correção monetária pelo IPCA-E, juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, observando-se a prescrição quinquenal, e verba honorária arbitrada em 10% do valor atualizado da condenação, incidente sobre as parcelas vencidas até a sentença, nos termos da Súmula nº 111 do c. Superior Tribunal de Justiça. Postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que seja reformado o julgado, sustentando, em síntese, a ausência de comprovação de miserabilidade. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de recursos. Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal. O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo desprovimento da apelação. É o relatório.
CURADOR: MARLENE TEIXEIRA
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5258965-52.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 30 - JUÍZA CONVOCADA MONICA BONAVINA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LOURDES TEIXEIRA Advogado do(a) APELADO: APARECIDA DONIZETE RICARDO - SP203773-N, OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, é importante salientar que, de acordo com o art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil atual, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos. Na hipótese dos autos, embora a sentença seja ilíquida, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico obtido na causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se perfeitamente à norma insculpida no parágrafo 3º, I, art. 496, da atual lei processual. Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à análise do recurso em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual. Previsto no art. 203, caput, da Constituição Federal e disciplinado pela Lei nº 8.742/1993, de natureza assistencial e não previdenciária, o benefício de prestação continuada tem sua concessão desvinculada do cumprimento dos quesitos de carência e de qualidade de segurado, atrelando-se, cumulativamente, ao implemento de requisito etário ou à detecção de deficiência, nos termos do art. 20, §2º, da Lei n° 8.742/93, demonstrada por exame pericial; à verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-lo suprido pela família; e, originalmente, à constatação de renda mensal per capita não superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Recorde-se, a este passo, da sucessiva redução da idade mínima, primeiramente de 70 para 67 anos, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, ao depois, para 65 anos, conforme art. 34 da Lei nº 10.741/ 2003. No que diz respeito ao critério da deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social demonstram a evidente evolução na sua conceituação. Em sua redação originária, a Lei 8.742/1993 definia a pessoa portadora de deficiência, para efeito de concessão do benefício assistencial, aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei n. 12.435/2011 promoveu modificação ao dispositivo legal, ampliando o conceito de deficiência, com base no Decreto n. 6.949/2009, que promulgou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. O § 2º da art. 20 da Lei n. 8.742 passou então a vigorar com a seguinte redação: "Art. 20 (...) § 2º - para efeito de concessão deste benefício, considera-se: I - pessoa com deficiência, aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas. II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos." Vê-se, portanto, que ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei n. 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei n. 13.146/2015, a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência: "Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas." De se registrar que o § 10 do mesmo dispositivo, incluído pela Lei n. 12.470/2011, considera de longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos. Acerca do derradeiro pressuposto, o C. STF, no âmbito da Reclamação nº 4374 e dos Recursos Extraordinários nºs. 567985 e 580963, submetidos à sistemática da repercussão geral, reputou defasado esse método aritmético de aferição de contexto de miserabilidade, suplantando, assim, o que outrora restou decidido na ADI 1.232-DF, ajuizada pelo Procurador-Geral da República e em cujo âmbito se declarara a constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A motivação empregada pela Excelsa Corte, no RE nº 580963, reside no fato de terem sido "editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas". À vista disso, a mensuração da hipossuficiência não mais se restringe ao parâmetro da renda familiar, devendo, sim, aflorar da análise desse requisito e das demais circunstâncias concretas de cada caso, na linha do que já preconizava a jurisprudência majoritária, no sentido de que a diretiva do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não consistiria em singular meio para se verificar a condição de miserabilidade preceituada na Carta Magna, cuidando-se, tão-apenas, de critério objetivo mínimo, a revelar a impossibilidade de subsistência do portador de deficiência e do idoso, não empecendo a utilização, pelo julgador, de outros fatores igualmente capazes de denotar a condição de precariedade financeira da parte autora. Veja-se, a exemplo, STJ: REsp nº 314264/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Félix Fischer, j. 15/05/2001, v.u., DJ 18/06/2001, p. 185; EDcl no AgRg no REsp 658705/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Felix Fischer, j. 08/03/2005, v.u., DJ 04/04/2005, p. 342; REsp 308711/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 19/09/2002, v.u., DJ 10/03/2003, p. 323. Em plena sintonia com o acima esposado, o c. STJ, quando da apreciação do RESP n. 1.112.557/MG, acentuou que o art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 comporta exegese tendente ao amparo do cidadão vulnerável, donde concluir-se que a delimitação do valor de renda familiar per capita não pode ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. Em substituição à diretriz inicialmente estampada na lei, a jurisprudência vem evoluindo para eleger a renda mensal familiar per capita inferior à metade do salário mínimo como indicativo de situação de precariedade financeira, tendo em conta que outros programas sociais, dentre eles o bolsa família, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação e o bolsa escola, instituídos pelas Leis nºs 10.836/04, 10.689/03 e 10.219/01, nessa ordem, contemplam esse patamar. Consultem-se arestos da Terceira Seção nesse diapasão: “AGRAVO LEGAL EM EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA IDOSA. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO (...) 3 - Da análise do sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se que o filho da autora possui apenas pequenos vínculos de trabalho, na maioria inferior a 03 meses, sendo que na maior parte do tempo esteve desempregado. Desse modo, mesmo incluindo a aposentadoria do marido da autora, a renda familiar per capita corresponde a pouco mais de R$ 300,00, ou seja, inferior a meio salário mínimo. 4 - Restou demonstrada, quantum satis, no caso em comento, situação de miserabilidade, prevista no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, a ensejar a concessão do benefício assistencial. 5 - Agravo improvido." (EI 00072617120124036112, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, TRF3, j. 22/10/2015, e-DJF3 05/11/2015) “PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO LEGAL. CARÁTER INFRINGENTE. IMPOSSIBILIDADE. CONTRADIÇÃO INEXISTENTE. (...)- No caso em exame, não há omissão a ser sanada, sendo o benefício indeferido pelo fato da renda familiar "per capita" ser superior a 1/2 salário mínimo. (...) 5- Embargos de declaração rejeitados." (AR 00082598120084030000, Relator Juiz Convocado Silva Neto, TRF3, j. 25/09/2014, e-DJF3 08/10/2014) Nesse exercício de sopesamento do conjunto probatório, importa averiguar a necessidade, na precisão da renda familiar, de abatimento do benefício de valor mínimo percebido por idoso ou deficiente, pertencente à unidade familiar. Nesta quadra, há, inclusive, precedente do egrégio STF, no julgamento do RE nº 580.963/PR, disponibilizado no DJe 14.11.2013, submetido à sistemática da repercussão geral, em que se consagrou a inconstitucionalidade por omissão do art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, considerando a "inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.". Quanto à questão da composição da renda familiar per capita, o C. STJ, no julgamento do RESP n. 1.355.052/SP, exarado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia, assentou, no mesmo sentido, a aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso, com vistas à exclusão do benefício previdenciário recebido por idoso ou por deficiente, no valor de um salário mínimo, no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. De se realçar que a jurisprudência - antes, mesmo, do aludido recurso repetitivo - já se firmara no sentido da exclusão de qualquer benefício de valor mínimo recebido por idoso com mais de 65 anos, por analogia ao disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, preceito esse que, na origem, limitava-se a autorizar a desconsideração de benefício de prestação continuada percebido pelos referidos idosos. Note-se que os precedentes não autorizam o descarte do benefício de valor mínimo recebido por qualquer idoso, assim compreendidas pessoas com idade superior a 60 anos, mas, sim, pelos idosos com idade superior a 65 anos. Essa é a inteligência reinante na jurisprudência. A propósito, os seguintes julgados: STJ, AGP 8479, Rel. Des. Convocada Marilza Maynard, 3ª Seção, DJE 03/02/2014; STJ, AGP 8609, Rel. Min. Assusete Magalhães, 3ª Seção, DJE 25/11/2013; STJ, AGRESP 1178377, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJE 19/3/2012. E da atenta leitura da íntegra do acórdão do recurso representativo de controvérsia - nº 1.355.052/SP - chega-se à idêntica conclusão. Outro dado sobremodo relevante diz respeito à acepção de família, para a finalidade da Lei nº 8.742/1993, cujo conceito experimentou modificação ao longo do tempo. Num primeiro lanço, o art. 20, § 1º, do citado diploma nomeava família "a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes". Ao depois, a Lei nº 9.720, em 30/11/98, fruto de conversão da Medida Provisória nº 1.473-34, de 11/08/97, passou a compreendê-la como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, dês que conviventes sob mesmo teto. Finalmente, na vigência da Lei nº 12.435/2011, é havida como o núcleo integrado pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais, ou, na ausência destes, pela madrasta ou padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, todos, também, sob o mesmo teto. SITUAÇÃO DOS AUTOS Na espécie, o requisito da deficiência restou incontroverso no átrio judicial. Apenas, por elucidativo, o laudo médico colacionado ao doc. 132960497 considerou a autora, então, com 54 anos de idade, interditada, portadora de retardo mental moderado desde a infância, que lhe acarreta inaptidão laboral e dependência de terceiros para os atos da vida diária. A esse respeito, haure-se, do estudo social coligido ao doc. 132960577, págs. 17/20, produzido em 31/07/2019, que a postulante "apresenta delírios, com perseguições constantes, diz ter sempre uma pessoa querendo agredi-la, esquece a torneira e a chama do fogão acesos, como também costuma esconder tudo enrolado no lençol, dorme na cama de casal com a irmã e necessita ser orientada durante o banho e higiene pessoal". Avançando, então, na análise da hipossuficiência, importa examinar o mencionado estudo social. Segundo o laudo adrede confeccionado, a autora reside com a sua irmã e curadora, Marlene Teixeira da Silva, de 50 anos, divorciada, um sobrinho, de 23 anos, filho da Srª Marlene, e o companheiro deste, de 24 anos, idades correspondentes à data do estudo socioeconômico. Consta, do processo administrativo acostado aos autos (doc. 132960301), que, quando do requerimento administrativo (01/05/2017), a postulante e a irmã moravam com a genitora. A irmã da autora informou, à assistente social, que, no início de 2019, mudaram-se da cidade de Leme/SP, para Tambaú/SP, em razão do falecimento da genitora, ocorrido em novembro de 2018. Transcrevo excerto do laudo, sobre as condições de moradia: "A família reside em casa alugada, em bairro periférico do município. No tocante ao aspecto físico, a residência é construída em alvenaria, dispondo de uma área na frente da casa, com grade e garagem. A residência possui seis cômodos, assim distribuídos: um quarto que serve de sala com um sofá e uma televisão, um quarto com uma cama de casal e um guarda-roupas, um quarto com uma cama de casal e uma televisão, uma cozinha com um fogão, uma geladeira e um armário e uma outra sala para cultos religiosos. O tanque e uma máquina de lavar estão na cozinha. Um banheiro com azulejos. O chão no interior da casa é de piso cerâmico e madeira no teto. A pintura nas paredes, tanto na parte interna como externa da casa estão desgastadas pela ação do tempo. Os móveis e utensílios estão em condições razoáveis de uso e conservação." A família não possui telefone físico, nem computador. A irmã da promovente possui veículo, um Ford KA, ano 1998, "para uso em casos emergenciais". As despesas, à época do laudo, consistiam em aluguel (R$ 550,00), tarifas de água (R$ 47,00) e energia elétrica (R$ 150,00), alimentação (R$ 700,00), combustível (R$ 50,00) e medicamentos (R$ 200,00). A vindicante segue em acompanhamento médico na Unidade Básica de Saúde do município de Leme, que lhe fornece os medicamentos dos quais necessita, inclusive, de alto custo. À época do estudo social, os ganhos da família advinham do trabalho do sobrinho e de seu companheiro, cabeleireiros, percebendo, juntos, em torno de R$ 1.300,00. Contudo, estes não integram o conceito de família, na acepção da Lei nº 12.435/2011, para efeito de concessão do Benefício de Prestação Continuada. Em relação à irmã, consta o recolhimento de contribuições previdenciárias, apenas, entre 01/01/2018 a 30/06/2018, abaixo do valor mínimo. Não se descura, ainda, que esta detém a propriedade de veículo automotor, circunstância, a priori, algo incompatível com o propalado cenário de precisão econômica. Não obstante, e ainda que seja curadora da autora, certo é que a irmã, também, não integra o conceito de família, seja por ser divorciada, seja por não se incluir no rol do § 1º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. Essa a dicção do § 1º, III, do art. 8º, da Portaria Conjunta MDS/INSS nº 3/2018, com as alterações trazidas pela Portaria Conjunta nº 7/2020: "Das Informações sobre a Composição do Grupo e Renda Familiar Art. 8º Na fase de requerimento, as informações do CadÚnico serão utilizadas para registro da composição do grupo familiar e da renda mensal bruta familiar, conforme disposto no Decreto nº 6.214, de 2007, obedecendo aos seguintes procedimentos: (...) § 1º Não compõem o grupo familiar, para efeitos do cálculo da renda mensal familiar per capita: (...) III - o irmão, o filho ou o enteado que seja divorciado, viúvo ou separado de fato, ainda que vivam sob o mesmo teto do requerente; IV - o tutor ou curador, desde não seja um dos elencados no rol do § 1º do art. 20 da Lei nº 8.742, de 1993." Registre-se, por fim, que a genitora da apelada titularizava o benefício de pensão por morte, de valor mínimo. De toda sorte, aludida benesse não se inclui no cômputo da renda familiar, em aplicação analógica ao art. 34 do Estatuto do Idoso, nos moldes do citado precedente do Excelso Pretório, visto que a mesma contava com mais de 70 anos de idade, já, por ocasião do requerimento administrativo do beneplácito agilizado pela vindicante. Desse modo, não resta, como passível de consideração jurídica, qualquer valor percebido pela proponente. Divisa-se, por conseguinte, caracterizada conjuntura de miserabilidade. Reforça mais essa conclusão, a opinião da perita no sentido de que, do ponto de vista sociológico, justifica-se a concessão do benefício assistencial requerido, como segue: "O que se observa no caso em tela, é que os gastos na família são muitos e que a renda da família se baseia no valor de R$ 1.300,00 do sobrinho e de seu companheiro e do BPC da Requerente, no valor de R$ 998,00. Diante dos dados coletados, a Srª Lourdes Teixeira necessita continuar a receber o benefício de prestação continuada para suprir as suas necessidades básicas e melhorar a sua qualidade de vida." Assim, restou demonstrada situação de hipossuficiência econômica, como indicado no sobredito paradigma do C. Supremo Tribunal Federal, exarado em repercussão geral, a autorizar o implante da benesse nos moldes do comando sentencial. Passo à análise dos consectários. Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n. 11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina." Por derradeiro, assinale-se que o STF, por maioria, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, decidiu não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida, rejeitando todos os embargos de declaração opostos, conforme certidão de julgamento da sessão extraordinária de 03/10/2019. Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral. Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux. No que toca à majoração da verba honorária de sucumbência recursal, a Primeira Seção do c. Superior Tribunal de Justiça, na sessão eletrônica iniciada em 12/08/2020 e finalizada em 18/08/2020, afetou ao rito do art. 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil, a questão discutida nos Recursos Especiais n. 1.865.553/PR, 1.865.223/SC e 1.864.633/RS, restando assim delimitada a controvérsia: "(Im)Possibilidade de majoração, em grau recursal, da verba honorária fixada em primeira instância contra o INSS quando o recurso da entidade previdenciária for provido em parte ou quando o Tribunal nega o recurso do INSS, mas altera de ofício a sentença apenas em relação aos consectários da condenação.” Sendo assim, na liquidação do julgado deverá ser observado o julgamento final dos Recursos Especiais n. 1.865.553/PR, 1.865.223/SC e 1.864.633/RS, pelo E. Superior Tribunal de Justiça. Nesse sentido, os seguintes julgados deste e. Nona Turma: ApCiv 0001185-85.2017.4.03.6005, Relator Desembargador Federal Batista Gonçalves, intimação via sistema DATA: 02/02/2021; ApCiv 5000118-70.2017.4.03.6111, Relator Desembargador Federal Batista Gonçalves, intimação via sistema DATA: 19/02/2021. Acerca do prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais. Por fim, tendo em vista o teor da presente decisão, resta prejudicado o pleito de efeito suspensivo formulado pelo INSS em suas razões recursais. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS. Explicito os critérios de incidência dos juros de mora e da correção monetária e, em relação à majoração da verba honorária de sucumbência recursal, determino a observância, na liquidação do julgado, do julgamento final dos Recursos Especiais n. 1.865.553/PR, 1.865.223/SC e 1.864.633/RS, pelo E. Superior Tribunal de Justiça, na forma delineada. É como voto.
CURADOR: MARLENE TEIXEIRA
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, § 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
- A hipótese em exame não excede os 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- Atrelam-se, cumulativamente, à concessão do benefício de prestação continuada, o implemento de requisito etário ou a detecção de deficiência, demonstrada por exame pericial, e a verificação da ausência de meios hábeis ao provimento da subsistência do postulante da benesse, ou de tê-la suprida pela família.
- Não compõe o grupo familiar, para efeitos do cálculo da renda mensal familiar per capita, a irmã da parte autora, por ser divorciada, e, ainda que seja curadora desta, não está incluída no rol do § 1º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
- Incontroversa a deficiência e constatada, pelo laudo pericial, a hipossuficiência econômica, é devido o Benefício de Prestação Continuada.
- Juros de mora e correção monetária fixados na forma explicitada.
- Observância, quanto à majoração da verba honorária de sucumbência recursal, do julgamento final dos Recursos Especiais n. 1.865.553/PR, 1.865.223/SC e 1.864.633/RS pelo E. Superior Tribunal de Justiça (Tema Repetitivo nº 1059), na liquidação do julgado.
- Apelo do INSS desprovido.