APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017513-82.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE CARLOS TRINDADE SOUSA
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE SANTOS DA SILVA - SP333894-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017513-82.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE CARLOS TRINDADE SOUSA Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE SANTOS DA SILVA - SP333894-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Sr. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator): Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL-INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição para deficiente físico, nos termos do art. 3º, da Lei Complementar 142/2013. A sentença (ID 147253820/ 147253825) julgou procedente o pedido para conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, a contar da data da DER reafirmada (10/08/2017). Determinou o pagamento dos valores devidos, acrescidos de juros moratórios, devidamente atualizados e corrigidos monetariamente. Condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Por fim, deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, para o fim de determinar a implantação do benefício à parte autora. Sentença não submetida ao reexame necessário. Irresignado, o INSS interpôs apelação (ID 147253827) alegando, em síntese, que a prova produzida nos autos dá conta de que a deficiência sofrida pela autora é de grau leve, motivo pelo qual, contando o tempo de contribuição auferido, não cumpriria os requisitos do art. 3º, da Lei Complementar 142/2013, para a concessão do benefício de aposentadoria da pessoa com deficiência. Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal Regional Federal. O Ministério Público Federal apresentou parecer (ID 152013154) no qual manifesta-se pelo provimento do recurso de apelação do INSS. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017513-82.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE CARLOS TRINDADE SOUSA Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE SANTOS DA SILVA - SP333894-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Sr. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator): Verifico, em juízo de admissibilidade, que os recursos ora analisados mostram-se formalmente regulares, motivados (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação (art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-os e passo a apreciá-los nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. Tendo em vista a data do requerimento administrativo do benefício previdenciário, o pedido será apreciado sob as regras vigentes anteriores à EC 103/2019. Passo à análise do mérito da presente demanda. In casu, o INSS nega que a parte autora tenha comprovado apresentar deficiência moderada, de forma que não teria tempo de contribuição suficiente à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição para o deficiente físico. A aposentadoria por tempo de serviço para portador de deficiência, modalidade de aposentadoria contributiva, positivada pela Lei Complementar 142/2013, é fruto do regramento excepcional contido no artigo 201, § 1º da Constituição Federal, referente à adoção de critérios diferenciados para a concessão de benefícios a portadores de deficiência. O art. 3º, da LC 142/13 dispõe: "Art. 3º - É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições: I - Aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; II - Aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; III- Aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período. Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar." Com o intuito de regulamentar a norma houve a edição do Decreto 8.145/13 que alterou o Decreto 3.048/99, ao incluir a Subseção IV-A, que trata especificamente da benesse que aqui se analisa: Art. 70-A. A concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ou por idade ao segurado que tenha reconhecido, em avaliação médica e funcional realizada por perícia própria do INSS, grau de deficiência leve, moderada ou grave, está condicionada à comprovação da condição de pessoa com deficiência na data da entrada do requerimento ou na data da implementação dos requisitos para o benefício. Art. 70-B. A aposentadoria por tempo de contribuição do segurado com deficiência, cumprida a carência, é devida ao segurado empregado, inclusive o doméstico, trabalhador avulso, contribuinte individual e facultativo, observado o disposto no art. 199-A e os seguintes requisitos: I - aos vinte e cinco anos de tempo de contribuição na condição de pessoa com deficiência, se homem, e vinte anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; II - aos vinte e nove anos de tempo de contribuição na condição de pessoa com deficiência, se homem, e vinte e quatro anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; e III - aos trinta e três anos de tempo de contribuição na condição de pessoa com deficiência, se homem, e vinte e oito anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve. Parágrafo único. A aposentadoria de que trata o caput é devida aos segurados especiais que contribuam facultativamente, de acordo com o disposto no art. 199 e no § 2o do art. 200. (...) Art. 70-D. Para efeito de concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência, compete à perícia própria do INSS, nos termos de ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União: I - avaliar o segurado e fixar a data provável do início da deficiência e o seu grau; e II - identificar a ocorrência de variação no grau de deficiência e indicar os respectivos períodos em cada grau. § 1° A comprovação da deficiência anterior à data da vigência da Lei Complementar n° 142, de 8 de maio de 2013, será instruída por documentos que subsidiem a avaliação médica e funcional, vedada a prova exclusivamente testemunhal. § 2° A avaliação da pessoa com deficiência será realizada para fazer prova dessa condição exclusivamente para fins previdenciários. § 3° Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 4° Ato conjunto do Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, dos Ministros de Estado da Previdência Social, da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Advogado-Geral da União definirá impedimento de longo prazo para os efeitos deste Decreto. Art. 70-E. Para o segurado que, após a filiação ao RGPS, tornar-se pessoa com deficiência, ou tiver seu grau alterado, os parâmetros mencionados nos incisos I, II e III do caput do art. 70-B serão proporcionalmente ajustados e os respectivos períodos serão somados após conversão, conforme as tabelas abaixo, considerando o grau de deficiência preponderante, observado o disposto no art. 70-A: (omissis) § 1° O grau de deficiência preponderante será aquele em que o segurado cumpriu maior tempo de contribuição, antes da conversão, e servirá como parâmetro para definir o tempo mínimo necessário para a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência e para a conversão. A Lei Complementar dispõe ainda, em seu art. 4°, que a avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do regulamento, e que o grau de deficiência será atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social, por meio de instrumentos desenvolvidos para esse fim. Cabe ressaltar que os critérios específicos para a realização da perícia estão determinados pela Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 001/14, que adota a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF da Organização Mundial de Saúde, em conjunto com o instrumento de avaliação denominado Índice de Funcionalidade Brasileiro aplicado para fins de Aposentadoria - IF-Bra. Conforme o item 4.e dessa Portaria, o critério para a classificação do grau da deficiência segue uma pontuação: "4.e. Classificação da Deficiência em Grave, Moderada e Leve Para a aferição dos graus de deficiência previstos pela Lei Complementar nº 142, de 08 de maio de 2.013, o critério é: Deficiência Grave quando a pontuação for menor ou igual a 5.739. Deficiência Moderada quando a pontuação total for maior ou igual a 5.740 e menor ou igual a 6.354. Deficiência Leve quando a pontuação total for maior ou igual a 6.355 e menor ou igual a 7.584. Pontuação Insuficiente para Concessão do Benefício quando a pontuação for maior ou igual a 7.585. Segundo a mesma Portaria, em seu item 4d, a pontuação total da avaliação médica e social deverão ser somadas e comparado o resultado com a pontuação acima indicada para a classificação do grau da deficiência. Nos termos do laudo médico judicial produzido (fls. 226/236), constatou-se que a parte autora é portadora de "amputação transfemural ao nível do terço proximal", no membro inferior esquerdo, decorrência de um acidente ocorrido em 27/05/1986. Tendo em vista o disposto no art. 4° da Lei Complementar 142/2013, cabe analisar a deficiência no contexto das atividades habituais desenvolvidas pela parte autora (barreiras). Cabe ressaltar que a pontuação para cada item, que compõe os domínios referidos são: 25, 50, 75 ou 100; sendo que 25 representa que a pessoa não realiza a atividade descrita no item ou é totalmente dependente de terceiros para realizá-la, e a pontuação 100 indica, por outro lado, que a pessoa realiza de forma independente a atividade, sem nenhum tipo de adaptação ou modificação, na velocidade habitual e em segurança (conforme quadro 01 da Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU nº 001/14 e Manual do Índice de Funcionalidade Brasileiro - IF-Br 30/04/2012 - IETS - Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade). Da análise da documentação juntada aos autos (ID 147253810 - Pág. 138/150 e 147253810 - Pág. 161), observa-se que foram realizadas duas perícias. Uma a fim de aferir os fatores clínicos que permeiam o caso em análise e outra tendente a aferir as condições socioeconômicas e a forma que tal limitação impacta na vida da parte autora. Do ponto de vista clínico, em perícia realizada, constatou-se que a Autora sofre, de fato, sequela de paralisia infantil em membro inferior direito com encurtamento classificada pelo perito como de grau moderado. Indagado acerca da data provável que teve início, indicou-se a desde à infância. Por sua vez, o laudo social, relata paralisia infantil na infância, o que gerou dificuldade de deambular e ficar longos períodos em pé, assim como pegar peso, conseguindo frequentar os comércios próximos, porém com percurso mais demorado, sendo possível também a utilização de transporte público. Constatou-se, ademais, que se trata de pessoa com ensino fundamental incompleto. Ressalte-se que a Lei Complementar 142/2013 não exige apenas a existência de impedimento de natureza sensorial, como é a situação presente nos autos. Vai além, exigindo que haja outras barreiras que em conjunto com tal impedimento dificultem a inserção de forma igualitária com os demais no seio da sociedade. Na hipótese dos autos, portanto, houve constatação dessas barreiras, o que permite que se enquadre a parte Autora como pessoa portadora de deficiência. Desse modo, computando-se o tempo de contribuição apurado pelo INSS (ID 147253810 - Pág. 174), perfazem-se mais de 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, suficientes ao exigido para concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ao deficiente físico (grau moderado), nos termos do artigo 3º, inciso II, da Lei Complementar 142/2013. Portanto, a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição para deficiente físico, nos termos do artigo 3º, da Lei Complementar 142/2013, a ser implantada a contar da data da DER reafirmada (10/08/2017). Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente. O INSS é isento de custas processuais, arcando com as demais despesas, inclusive honorários periciais (Res. CJF nºs. 541 e 558/2007), além de reembolsar as custas recolhidas pela parte contrária, o que não é o caso dos autos, ante a gratuidade processual concedida (art. 4º, I e parágrafo único, da Lei 9.289/1996, art. 24-A da Lei 9.028/1995, n.r., e art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/1993). Determino a majoração da verba honorária em 2% (dois por cento) a título de sucumbência recursal, nos termos do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS, para manter a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, nos termos acima expostos. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DO DEFICIENTE. CABIMENTO. GRAU MODERADO. BENEFÍCIO MANTIDO.
1. A aposentadoria por tempo de serviço para portador de deficiência, modalidade de aposentadoria contributiva, positivada pela Lei Complementar 142/2013, é fruto do regramento excepcional contido no artigo 201, § 1º da Constituição Federal, referente à adoção de critérios diferenciados para a concessão de benefícios a portadores de deficiência.
2. Do ponto de vista clínico, em perícia realizada, constatou-se que a Autora sofre, de fato, sequela de paralisia infantil em membro inferior direito com encurtamento classificada pelo perito como de grau moderado. Indagado acerca da data provável que teve início, indicou-se a desde à infância.
3. Computando-se o tempo de contribuição apurado pelo INSS, perfazem-se mais de 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, suficientes ao exigido para concessão da aposentadoria por tempo de contribuição ao deficiente físico (grau moderado), nos termos do artigo 3º, inciso II, da Lei Complementar 142/2013.
4. Apelação do INSS improvida. Benefício mantido.