RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000784-61.2020.4.03.6335
RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP
RECORRENTE: FATIMA QUITERIA DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: ANTONIO JOSE PANCOTTI - SP60957-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000784-61.2020.4.03.6335 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: FATIMA QUITERIA DA SILVA Advogado do(a) RECORRENTE: ANTONIO JOSE PANCOTTI - SP60957-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Ação ajuizada em face do INSS, buscando-se a concessão de aposentadoria por idade rural.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
A sentença assim dispôs:
“Diante do exposto ACOLHO o pedido e resolvo o mérito, nos termos do inciso I do art. 487 do Código de Processo Civil, para determinar a concessão da aposentadoria por idade n. 41/192.266.483-6, desde o requerimento administrativo, formulado em 05/02/2019, acrescida do abono atual. Condeno o INSS ao pagamento das prestações em atraso, corrigidas monetariamente desde os respectivos vencimentos A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral ( Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do INPC, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.”
Recurso do INSS alegando, em síntese, inexistência de início de prova material do trabalho rural alegado sem registro em CTPS. Subsidiariamente, requereu a aplicação integral do artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/2009.
É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000784-61.2020.4.03.6335 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: FATIMA QUITERIA DA SILVA Advogado do(a) RECORRENTE: ANTONIO JOSE PANCOTTI - SP60957-N RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O V E N C E D O R Ação ajuizada em face do INSS, buscando-se a concessão de aposentadoria por idade rural. A sentença assim dispôs (ID 183089194): “Diante do exposto ACOLHO o pedido e resolvo o mérito, nos termos do inciso I do art. 487 do Código de Processo Civil, para determinar a concessão da aposentadoria por idade n. 41/192.266.483-6, desde o requerimento administrativo, formulado em 05/02/2019, acrescida do abono atual. Condeno o INSS ao pagamento das prestações em atraso, corrigidas monetariamente desde os respectivos vencimentos A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral ( Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do INPC, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.” Recurso do INSS pugnando pela reforma da sentença, destacando (ID 183089195): “EMENTA. RECURSO INOMINADO.RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL. PERÍODOS DE DESEMPREGO. IMPOSSIBILIDADE DE PRESUMIR LABOR RURAL ENTRE VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL DE TRABALHO NOS PERÍODOS DE DESEMPREGO. PEDIDO DE REFORMA DA SENTENÇA”. É o relatório. VOTO Os artigos 46 e 82, § 5°, da Lei n. 9.099/95, facultam à Turma Recursal dos Juizados Especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n. 86.553-0, reconheceu que este procedimento não afronta o artigo 93, IX, da Constituição Federal. Veja-se a transcrição do v. Acórdão: “O § 5° do artigo 82 da Lei n. 9.099/95 dispõe que ‘se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão’. O preceito legal prevê a possibilidade de o órgão revisor adotar como razão de decidir os fundamentos do ato impugnado, o que não implica violação do artigo 93, IX da Constituição do Brasil. É fora de dúvida que o acórdão da apelação, ao reportar-se aos fundamentos do ato impugnado, não é carente de fundamentação, como sustentado pela impetrante.”. (HC n° 86553-0/SP, rel. Min. Eros Grau, DJ de 02.12.2005). Fundamentou o juízo de origem (ID 183089194): “Na espécie, a autora traz como início de prova material a certidão de casamento, na qual o marido é qualificado como lavrador, e anotação em carteira de trabalho dele como trabalhador rural. A autora juntou com a inicial sua CTPS, sendo a quase totalidade dos vínculos como rural, início de prova material que foi corroborado pela prova oral. Entendo que a sentença está em harmonia com a jurisprudência majoritária, como segue: os documentos em nome do cônjuge e familiares servem de início de prova material; desnecessária a apresentação de documento para cada ano a ser comprovado; o rol de documentos é exemplificativo; o tamanho da propriedade e o exercício de atividade urbana pelo requerente ou seus familiares, não afastam, de plano, o alegado tempo rural, situação a ser verificada em cada caso concreto; o tempo de serviço do trabalhador rural, anterior à Lei 8.213/91, sem recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser considerado para concessão de benefício no RGPS (Súmulas 06, 14, 24, 30, 41 e 46 da TNU). Ainda: INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO SUSCITADO PELA PARTE RÉ. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PROVA MATERIAL. BOIA-FRIA. FLEXIBILIZAÇÃO DA EXIGÊNCIA. PESQUISA REALIZADA IN LOCO PELA AUTARQUIA. POSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO DO INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. 1. Sentença de improcedência do pedido de aposentadoria por idade rural, reformada pela Turma Recursal do Paraná, que julgou procedente o pedido de aposentadoria rural por idade. 2. Incidente de Uniformização de Jurisprudência interposto tempestivamente pela Autora, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. Alegação de que há divergência com o entendimento do STJ (REsp nº 1.133.863/RN, Representativo de Controvérsia), AgRg no REsp nº 1.213.305/PR, AgRg no REsp nº 1.309.694/PR) e da TNU (PEDILEF nº 0002643-79.2008.4.04.7055) (...) Com efeito, já decidiu este Colegiado que: No caso dos boias-frias, ante a flagrante e inegável dificuldade de apresentação de documentos relativos à atividade rural, permite-se que o seu reconhecimento ocorra com base em mínima prova material, ou, nos casos mais extremos, na completa ausência de prova material, desde que a prova testemunhal seja robusta e idônea. Precedentes desta TNU (PEDILEF 200770550012380 e 200570510019810) - PEDILEF 200770660005046 - Rel. Juiz Federal Antônio Fernando Shcenkel do Amaral e Silva. 7. Não obstante isso, devo reconhecer que o acórdão impugnado utilizou como premissa jurídica o fato de não haver nenhum início de prova material, o que contraria o entendimento do STJ manifestado no julgamento do REsp nº 1.133.863/RN, julgado pela sistemática dos recursos repetitivos, no sentido da inadmissibilidade de concessão do benefício baseado exclusivamente em prova testemunhal, ainda que no caso do boia-fria. 8. Todavia, não seria apropriado admitir a completa ausência de prova material, uma vez que no caso em estudo o acórdão recorrido faz referência à existência de estudo realizado in loco pelo INSS durante o processo administrativo, em que o funcionário do INSS teria concluído que a parte autora efetivamente era rurícola. Tal documento materializa levantamento feito pelo órgão oficial de Previdência e que deveria, em tese, ser admitido ao menos como “início” de prova material. 9. Nesse passo, ainda que a fundamentação do acórdão impugnado tenha contrariado entendimento já manifestado pelo STJ em Recurso Especial julgado pela sistemática dos recursos repetitivos, isso não é suficiente para descartar a possibilidade de concessão do benefício, levando em consideração que, conforme acima assinalado, há nos autos documento que poderia em tese ser considerada início de prova material. 10. Com efeito, dispõe a Questão de Ordem nº 20 da TNU que: Se a Turma Nacional decidir que o incidente de uniformização deva ser conhecido e provido no que toca a matéria de direito e se tal conclusão importar na necessidade de exame de provas sobre matéria de fato, que foram requeridas e não produzidas, ou foram produzidas e não apreciadas pelas instâncias inferiores, a sentença ou acórdão da Turma Recursal deverá ser anulado para que tais provas sejam produzidas ou apreciadas, ficando o juiz de 1º grau e a respectiva Turma Recursal vinculados ao entendimento da Turma Nacional sobre a matéria de direito. 11. Assim, entendo que deverá a Turma de origem manifestar expressamente sobre a natureza do estudo realizado pela autarquia in loco, pronunciando especificamente sobre a possibilidade de o referido documento suprir ou não a exigência legal de apresentação de início de prova material. 12. Diante do exposto, voto no sentido de que seja o incidente de uniformização de jurisprudência conhecido e provido em parte, determinando o retorno dos autos à Turma de origem para que promova a adequação do acórdão à premissa acima estabelecida. A Turma Nacional de Uniformização conheceu e deu parcial provimento ao incidente de uniformização, nos termos do voto-ementa do juiz federal relator. (PEDILEF 50001988120124047016, JUIZ FEDERAL PAULO ERNANE MOREIRA BARROS, TNU, DOU 31/10/2014 PÁGINAS 179/285) Com fulcro no artigo 46, da Lei n. 9.099/95, combinado com o artigo 1º, da Lei n. 10.259/01, nego provimento ao recurso e mantenho a sentença. Caso a parte autora tenha constituído advogado neste feio, condeno o recorrente vencido ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% da condenação, nos termos do art. 85, em especial seus parágrafos 2º, 3º e 4º do Código de Processo Civil vigente, bem como art. 55 da Lei nº 9099/95, tendo em vista a baixa complexidade do tema. É o voto.
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Exige-se início de prova material, que não precisa abranger todo o período laboral.
Há razoável início de prova material, em nome próprio, consistente nas anotações de vínculo rural na carteira de trabalho.
(...)
O exercício de atividade rural também restou demonstrado, no período imediatamente anterior ao implemento da idade mínima à aposentação, consoante da prova oral produzida a corroborar o início de prova material acostado à peça inaugural.
Transcrevo os depoimentos prestados:
Fátima Quitéria da Silva: nasceu em Maratai, fica no estado de sp. trabalhava na roça. Ela trabalhava para os outros. Começou a trabalhar com 08 anos, chegava da escola e ia para roça. Estudava de manhã até o primeiro ano. Parou de estudar porque mudaram para outro sítio, pai pôs para trabalhar. Tem 14 irmãos. Não é a mais velha, é segunda. Carpia, plantava arroz, plantava para o dono da terra, pai trabalhava como meeiro. Moravam na terra. Não lembro o nome, nem onde fica para o lado do Paraná. Morou no Paraná, já era adulta quando veio para o interior de sp, já era amasiada. Tinha um filho. Tem 5 cinco filhos. No paraná trabalhou na roça no Paraná é vir. Nasceu para o interior de sp. não sabe a data de nascimento. No interior trabalhando para o João do Bicho, na região de Planura. Trabalhando também cortando cana, ia de ônibus, que saía perto do velório. Não sabe para quais fazendas ia, morava em pitangueiras. O empreiteiro era conhecido como bicho. Depois trabalhou como boia fria. Voltou a trabalhar mesmo depois do infarto. Ficou menos de um ano parada. Semana passada trabalhou pegando limão. Nos lados da Cutrale. Foi chamada pelo João do Bicho.
Fábio Junior de Souza: conhecendo ela trabalhando na roça, na colheita de laranja, corte de cana. Trabalharam juntos, numa época, com o João do Bicho, na colheita de laranja, na região de Colômbia e Planura/MG. Ela pegava o ônibus próximo ao velório. Não sabe o ano certinho, foram 6/7 anos atrás. Não tem contato com ela além, no corte de cana também trabalharam juntos. Tem 40 anos de idade, começou a trabalhar com 14 anos de idade, registrado como agricultor, serviços gerais, numa fazenda de laranja. Nas vezes que trabalhou com ela, não tinha carteira de trabalho assinada, era o gato que contratava. Ela ainda trabalhava na roça. Não sabe se ela teve problema de saúde. Agora é motorista. Cargueiro. Faz uns 4 anos. Antes trabalhava na roça, foi nessa que trabalharam juntos. Não sabe se tem mais alguém da família trabalha na roça.
Silvana Aparecida de Souza: trabalharam juntas durante muito tempo, colhendo laranja e corte de cana. Campo grande colhendo laranja. Avulso, não tinha carteira assinada. Foi registrada com o serviço de roça, em pitangueiras, numa fazenda. Mor em Colômbia vai fazer cinco anos em junho. Conhecia ela antes do trabalho, parou de trabalhar com ela em 2020, ela continuou trabalhando. Não sabe se ela teve infarto. Não sabe se ela trabalhou na cidade, só trabalharam juntas na roça. Conheceu tem uns 15 anos ela trabalhando na roça. Ela ia sozinha, João do Bicho pegava em Laranjeiras, agora começou a pegar em colômbia, ela pega perto do velório. Só trabalhou com João do Bicho.
Vera Lucia Pereira de Souza: mora em Colômbia/SP, há 6 anos. Antes não conhecia Dona Fátima. Trabalhando na laranja, na cama, no limão. Na Cutrale. As outras não se lembra. Iam cedo, não sabe direito. João do Bicho era o empreiteiro. Pegava ônibus em locais distintos. Ela pegava no velório. Ela também trabalhou em seringal. Não sabe se ela teve problema de saúde. Trabalharam juntas pela última vez até o ano passado, catando limão. Ela continua trabalhando na roça. Ela ia sozinha para a roça. A autora se dedicou, a vida toda, à atividade campesina.
A prova testemunhal, acompanhada de início de prova material, dá conta da atividade rural, enquanto segurado especial, pelo período superior à carência exigida.
Por fim, a autora tem pequeno vínculo urbano, mas logo depois regressou ao campo, onde ainda trabalha. A idade mínima, de 55 anos, foi implementada em 23-09-2017.
Cumpridos todos os requisitos, de rigor a concessão do benefício pleiteado.”.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000784-61.2020.4.03.6335
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V O T O
Para a concessão de aposentadoria por idade é necessária, em apertada síntese, a comprovação da idade mínima e do período de carência. A aferição do preenchimento destes requisitos legais, no entanto, demanda interpretação conjugada dos artigos 25, inciso II, 48, 142 e 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, que em suas redações atuais assim dispõem:
“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...)
II – aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180 contribuições mensais. (Redação dada pela Lei n.º 8.870, de 15 de abril de 1994)
(...)”
“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) se mulher. (Redação dada pela Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995)
§ 1º Os limites fixados no ‘caput’ são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea ‘a’ do inciso I, na alínea ‘g’ do inciso V e nos incisos VI e VII, do art. 11. (Redação dada pela Lei n.º 9.876, de 26 de novembro de 1999)
§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008)
§ 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008)
§ 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do ‘caput’ do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei n.º 11.718, de 20 de junho de 2008)”
No tocante ao reconhecimento e cômputo de períodos trabalhados em atividades rurais para fins previdenciários, destaco, inicialmente, o disposto no artigo 55, §§ 2º e 3º, da Lei n.º 8.213/91:
“Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado.
(...)
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.’
Decorre do dispositivo legal acima transcrito que a prova testemunhal, produzida de forma exclusiva, é inapta à comprovação do tempo de serviço, seja em atividades rurais, seja em atividades urbanas. É exigido pela lei um mínimo e documentação, que torne verossímeis as alegações do segurado.
Nesse sentido, mais precisamente quanto ao trabalho campesino, destaca-se a Súmula n.º 149 do C. Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 149 – A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação de atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.”
O artigo 106 do referido diploma legal, com a redação dada pela Lei n.º 11.718/2008, apresenta um rol exemplificativo dos documentos aptos a configurar início de prova material para fins de comprovação do exercício de trabalho rural:
“Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será feita, alternativamente, por meio de:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III – declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS;
IV – comprovante de cadastro do Instituto nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V – bloco de notas do produtor rural;
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata o § 7º do art. 30 da lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, emitidas pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros, com indicação do segurado como vendedor ou consignante;
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social decorrentes da comercialização da produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente da comercialização de produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo Incra.”
Saliento, por oportuno, que o artigo 106 da Lei n.º 8.213/91 deve ser interpretado em conformidade com o princípio constitucional que garante ao cidadão acesso irrestrito à tutela jurisdicional (artigo 5º, XXXV, da CF/88). Interpretá-lo de forma taxativa/restritiva representaria, acima de tudo, a mitigação do livre convencimento do magistrado, privando-o da liberdade de valorar as provas que lhe são apresentadas.
Considera-se prova material toda prova não testemunhal. Há necessidade, no entanto, de estabelecer a distinção da “prova material efetiva” e do chamado “início de prova material”.
A “prova material efetiva” é aquela capaz de comprovar fatos e direitos por si só, de maneira taxativa. É a prova plena, que independe de outras para produzir efeitos no mundo jurídico. Como “início de prova material”, por sua vez, são classificadas aquelas provas, notadamente documentais, que evidenciam indício, probabilidade, sinais aparentes. Não são provas diretas, dependem de outras que as complementem para produzirem efeitos no mundo jurídico.
Estabelecida estas definições, ressalto que, no entendimento adotado por esta Relatora (em consonância com a Jurisprudência majoritária), a exemplo da prova testemunhal, o mero início de prova material, isoladamente, não se presta à comprovação do trabalho rural para fins previdenciários. Ambas se complementam, prova testemunhal e início de prova material, em conjunto, podem definir o rumo da ação e firmar o convencimento do Julgador acerca da veracidade dos fatos narrados na petição inicial. Separadas, no entanto, não se sustentam.
A corroborar:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. GENITORA FALECIDA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA TESTEMUNHAL. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. CERCEAMENTO DE DEFESA DO INSS. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. SENTENÇA ANULADA. TUTELA ANTECIPADA.
1. Muito embora o art. 273, caput, do CPC, expressamente, disponha que os efeitos da tutela pretendida na inicial poderão ser antecipados, a requerimento da parte, total ou parcialmente, firmou-se nesta Primeira Turma a possibilidade de o órgão jurisdicional antecipá-la de ofício, tendo em vista a natureza alimentar do benefício previdenciário e em razão da verossimilhança do direito material alegado. Precedentes desta Corte.
2. A pensão por morte prevista no art. 74 da Lei 8.213/91, que é devida ao conjunto dos dependentes de trabalhador rural, está subordinada à demonstração da condição de dependente do segurado, nos termos do art. 16 da mencionada lei, e à comprovação da atividade rural exercida pelo falecido, por meio de início de prova material corroborada por prova testemunhal coerente e robusta.
3. A sentença julgou procedente o pedido inicial, sem a oitiva de testemunha, por considerar suficiente a prova material juntada aos autos, dispensando a produção de prova testemunhal.
4. Não obstante tenha sido juntado aos autos início razoável de prova material do exercício de atividade rural, verifica-se, contudo, que tais documentos não fazem prova direta sobre a atividade profissional da genitora da parte autora, de forma a autorizar o deferimento da pensão por morte de trabalhadora rural.
5. Na hipótese, o julgamento da lide, antes da oitiva das testemunhas, cerceia o direito do INSS, uma vez que o pedido foi julgado procedente. É forçoso, assim, anular a sentença, para que seja colhida a prova testemunhal e examinada a pretensão como de direito. Precedentes desta Corte.
6. Embora seja necessária, para comprovação do direito ao recebimento do benefício previdenciário pleiteado a demonstração simultânea de início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal, verifica-se, pelas regras ordinárias de experiência, que a existência nos autos de documentação registrando o labor rural, amplamente aceita pela jurisprudência e contemporânea aos fatos a que se visa comprovar, confere verossimilhança ao direito alegado na inicial, pelo que, impõe-se, nesses casos, a antecipação do provimento jurisdicional, ainda que em caráter excepcional, determinando-se a implantação imediata do benefício, até o julgamento final da presente ação, evitando-se, assim, maiores prejuízos à parte autora, que não concorreu para a demora na solução do direito aqui vindicado.
7. Sentença anulada, em face da inaplicabilidade do provimento previsto no art. 515, § 3º, do CPC.
8. Remessa oficial e apelação do INSS a que se dá parcial provimento.
9. Apelação da parte autora prejudicada.
10. Implantação imediata do benefício, no prazo máximo de 30 dias, com comunicação imediata à autarquia previdenciária.
(TRF1, Primeira Turma, AC – Apelação Cível, Relator Desembargador Federal Néviton Guedes, julgado em 11/12/2013, e-DJF1 de 14/03/2014 página 1285). (grifo nosso)
No tocante à valoração do indigitado início de prova material, cumpre-me reportar-me, ainda, às Súmulas 14 e 34 das Turmas Nacionais de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, cujo teor se presta a estabelecer critérios de valorização e validação da prova:
“Súmula 14 – Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo período equivalente à carência do benefício.”
“Súmula 34 – Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar.”
No caso em tela, assiste razão à parte recorrente.
Com efeito, ao analisarmos conjuntamente o início de prova material constante dos autos, somado à prova oral, verifico que a autora não se desincumbiu de seu ônus probatório em relação ao pedido de reconhecimento do labor rural além dos vínculos como empregada rural entre 01/06/1990 a 11/07/1990, 03/05/1993 a 30/07/1993, 01/07/1995 a 21/07/1995, 13/11/2001 a 13/11/2001, 11/07/2007 a 12/01/2008, 17/08/2009 a 19/10/2009 e 14/03/2012 a 21/11/2016 (fls. 10-23, ID 183.089.130).
No presente caso, no caso de ausência de prova material robusta, é necessário que a prova oral seja consistente e elucidativa, a fim de comprovar os fatos alegados, o que não se verificou.
A prova testemunhal foi superficial, não sendo suficiente para comprovar os fatos alegados. Não há como se reconhecer a pretensão da autora, quer pela prova material juntada, quer pela prova oral realizada, não faz jus, portanto, ao benefício de Aposentadoria por Idade rural nos termos concedidos pela r. sentença recorrida.
Isso posto, dou provimento ao recurso do INSS para julgar improcedente o pedido inicial.
Sem honorários - art. 55 da Lei nº 9099/95.
Dispensada ementa nos termos da legislação de regência.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA ORAL. SENTENÇA EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA MAJORITÁRIA. SÚMULAS 06, 14, 24, 30, 41 e 46 da TNU.