Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002476-37.2020.4.03.6322

RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: SEBASTIAO FAUSTINO DOS SANTOS

Advogado do(a) RECORRENTE: LIZANDRY CAROLINE CESAR CUSIN - SP264821-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95. 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002476-37.2020.4.03.6322

RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: SEBASTIAO FAUSTINO DOS SANTOS

Advogado do(a) RECORRENTE: LIZANDRY CAROLINE CESAR CUSIN - SP264821-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

VOTO - EMENTA

 

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 20 DA LEI 8742/93. AMPARO AO IDOSO. MISERABILIDADE. CRITÉRIO OBJETIVO. RENDA PER CAPITA INFERIOR A ¼ DO SALÁRIO-MÍNIMO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTE DO PRETÓRIO EXCELSO. RE 567985/MT, RE 580963/PR E RCL 4374/PE. MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA. RECURSO DO INSS PROVIDO.

 

1. Ação proposta para obtenção do benefício de assistencial de prestação continuada (amparo ao idoso) cujo pedido fora julgado procedente.

 

2. Recurso do INSS no qual alega, em síntese, a falta de comprovação de miserabilidade para a concessão do benefício.

 

3. Assiste razão à parte recorrente.

 

4. O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal estabelece como parâmetro para a concessão do benefício assistencial a coexistência de dois pressupostos, de um lado, ser a pessoa idosa ou com deficiência, e de outro lado, a hipossuficiência econômica.  Tais requisitos estão disciplinados no art. 20 da Lei n° 8.742, de 07/12/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS).

 

5. Critério etário modificado com a edição do Estatuto do Idoso (Lei federal nº 10.741, de 01º/10/2003), consoante a disposição de seu artigo 34: “aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS.” Requisito etário preenchido.

 

6. Critério objetivo da miserabilidade de ¼ do salário mínimo, previsto pelo art. 20, §3º, da Lei 8742/1993, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, conforme RE 567.985/MT, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 17 e 18.4.2013, RE 580.963/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 17 e 18.4.2013 e Rcl 4374/PE, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.4.2013 (Fonte: Informativo de Jurisprudência n° 702 – Brasília 15 a 19 de abril de 2013). Apontou a utilização do valor de meio salário mínimo como valor padrão da renda familiar per capita para análise do preenchimento do requisito da hipossuficiência econômica que deve ser analisado em conjunto com as peculiaridades do caso concreto. Nas referidas decisões, também foi declarada a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2003, ao entender que não há justificativa plausível para a discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo.

 

6.1 Insta mencionar a súmula n. 22 da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região (TRU): “Apenas os benefícios previdenciários e assistenciais no valor de um salário mínimo recebidos por qualquer membro do núcleo familiar devem ser excluídos para fins de apuração da renda mensal per capita objetivando a concessão de benefício de prestação continuada”.

 

7. A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), em decisão proferida em 09.04.2014, no processo n. 5009459-52.2011.4.04.7001, entendeu que o critério legal objetivo não deve ser o único na aferição da miserabilidade para a concessão do benefício assistencial (LOAS). Para a TNU, a miserabilidade não pode ser presumida, muito menos de forma absoluta, sobretudo quando outros elementos de convicção apontam no sentido da sua ausência. Fundamenta, ainda, que a adoção da presunção de miserabilidade baseada exclusivamente na renda formal, retira do juiz o livre convencimento motivado com base na prova dos autos.

 

7.1 Nesse passo, recentemente, foi editada a Súmula n. 21 pela Turma Regional de Uniformização do TRF da 3ª Região, dispondo que “na concessão do benefício assistencial, deverá ser observado como critério objetivo a renda per capita de ½ salário mínimo gerando presunção relativa de miserabilidade, a qual poderá ser infirmada por critérios subjetivos em caso de renda superior ou inferior a ½ salário mínimo”. (g.n)

 

8. Com relação ao conceito de núcleo familiar para fins de apuração da renda per capita na aferição da miserabilidade, consolidou-se o entendimento de que na composição da renda, a noção de grupo familiar deve ser obtida mediante interpretação restritiva das disposições contidas no § 1°, do art. 20, da Lei n. 8.742/93 e no art. 16, da Lei n. 8213/91, devendo ser levada em consideração a redação dos dispositivos em vigor na data do requerimento do benefício. (TNU, PEDILEF 200663010523815, Relator Juiz Federal Alcides Saldanha Lima, julgado em 16.08.2012, DOU 31.08.2012). No entanto, é fundamental a análise do caso concreto à luz do princípio da razoabilidade, para considerar a situação econômica dos ascendentes e descendentes, quando se verificar sinais de riqueza que imponha o dever de alimentos.

 

8.1 Por sua vez, cumpre destacar a súmula n. 23 da TRU: “O benefício de prestação continuada (LOAS) é subsidiário e para sua concessão não se prescinde da análise do dever legal de prestar alimentos previsto no Código Civil".

 

9. No presente caso, o grupo familiar é composto apenas pelo autor (66 anos, pedreiro). A subsistência é provida pela renda do aluguel da casa da frente, no valor de R$ 250,00 e pela ajuda de familiares. No entanto, embora a renda per capita não supere meio salário-mínimo, verifica-se pela descrição do laudo social, bem como pelas fotos a ele anexadas, que o imóvel está bem conservado, assim como os móveis que o guarnecem e as condições de habitabilidade são dignas e satisfatórias, não demonstrando situação de penúria capaz de ensejar a concessão do benefício pleiteado. O autor possuí um veículo Chevrolet Monza, ano 1995. Assim, entendo que a renda auferida de aluguel, com o auxílio dos filhos, está sendo suficiente no momento para suprir as necessidades básicas do autor e garantir uma vida digna. Miserabilidade não comprovada.

 

10. Quanto ao pedido de restituição dos valores pagos pelo INSS sob a vigência da tutela antecipada, destaco que nos casos de demandas previdenciárias, o artigo 115, Inciso II e parágrafo 3º. da Lei 8213/91, introduzido pela MP 871/2019, estabeleceu que o crédito decorrente de pagamento judicial indevido seja constituído pelo próprio INSS e descontado dos benefícios ou inscritos em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal. É o que se depreende da leitura do dispositivo legal a seguir transcrito:

 

Art. 115.  Podem ser descontados dos benefícios:

 

(...)

 

II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento;

 

(...)

 

§ 3º Serão inscritos em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal os créditos constituídos pelo INSS em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, nos termos do disposto na Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, para a execução judicial. (Redação dada pela Lei n. 13.846, de 18-6-2019)

 

10.1 Tratando-se de norma de direito processual, ele é de aplicação imediata, inclusive aos processos em curso.

 

10.2 Assim, tratando-se de benefício previdenciário ou assistencial, atualmente não é mais possível à cobrança nos próprios autos dos valores pagos a título de tutela antecipada revogada, devendo o crédito ser constituído pelo próprio INSS e cobrado na forma estabelecida no artigo 115, §3º, da Lei n. 8.213/91. Portanto, nesta parte o recurso não merece ser provido.

 

11. Diante do exposto, dou provimento ao recurso do INSS para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, cassando a antecipação dos efeitos da tutela.

 

12. Oficie-se o INSS para cancelamento do benefício.

 

13. No que toca aos honorários de advogado, como a Lei 9.099/1995 é norma especial (que derroga a norma geral do CPC/2015, segundo o princípio lex specialis derogat generali), deixo de condenar quaisquer das partes a esse título, com fulcro no artigo 55 da Lei em comento c/c artigo 1° da Lei 10.259/2001, em face de não haver recorrente integralmente vencido.

 

É como voto.

 

São Paulo, 02 de fevereiro de 2022. (data do julgamento).

 

JUIZ FEDERAL RELATOR

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 20 DA LEI 8742/93. AMPARO AO IDOSO. MISERABILIDADE. CRITÉRIO OBJETIVO. RENDA PER CAPITA INFERIOR A ¼ DO SALÁRIO-MÍNIMO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTE DO PRETÓRIO EXCELSO. RE 567985/MT, RE 580963/PR E RCL 4374/PE. MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA. RECURSO DO INSS PROVIDO.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso do INSS., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.