RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001073-93.2020.4.03.6302
RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIA HELENA DE SOUZA MALAGUTI
Advogados do(a) RECORRIDO: VITOR HUGO VASCONCELOS MATOS - SP262504-A, DANIELA VILELA PELOSO VASCONCELOS - SP161110-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001073-93.2020.4.03.6302 RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA HELENA DE SOUZA MALAGUTI Advogados do(a) RECORRIDO: VITOR HUGO VASCONCELOS MATOS - SP262504-A, DANIELA VILELA PELOSO VASCONCELOS - SP161110-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A parte autora ajuizou a presente ação na qual requer a concessão do benefício aposentadoria por idade do trabalhador rural. O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido. Inconformada, recorre a autarquia ré para postular a reforma da sentença. Em contrarrazões, a demandante postula a manutenção da sentença e a condenação do INSS em litigância de má-fé. É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001073-93.2020.4.03.6302 RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA HELENA DE SOUZA MALAGUTI Advogados do(a) RECORRIDO: VITOR HUGO VASCONCELOS MATOS - SP262504-A, DANIELA VILELA PELOSO VASCONCELOS - SP161110-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O No tocante à atividade rural, impõe-se a comprovação do exercício efetivo da atividade, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou ao requerimento do benefício, em período idêntico ao número de meses correspondentes à carência do benefício (art. 48, §§ 1º e 2º, Lei n.8.213/91). Observada esta premissa e o implemento do requisito etário, o segurado especial tem direito ao recebimento de aposentadoria por idade no valor de 01 (um) salário mínimo (art.39, I, Lei n.8.213/91). Entende-se por segurado especial: “a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: 1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.” (art. 11, VII. Lei n.8.213/91) Por sua vez, regime de economia familiar é aquele em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração e sem a utilização de empregados permanentes (art.11, § 1º, Lei n.8.213/91). Quanto ao tempo de labor rural, certo é que a lei exige início de prova material, na dicção de seu art. 55, §3º, para fins de comprovação. Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 149. A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário.” Observo que são admitidos como início de prova material documentos em nome dos genitores ou do cônjuge, quando segurados especiais, se contemporâneos ao período pleiteado. Ressalte-se que, além dos segurados especiais que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, fazem jus à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, o empregado rural, ainda que sem vínculo em CTPS, o avulso rural e os trabalhadores rurais autônomos, conforme regra prevista no art. 143 da Lei nº 8.213/91. No caso dos autos, verifico que a sentença analisou a questão de forma detida e bem fundamentada, motivo pelo qual a adoto como razão de decidir. Eis a análise empreendida pelo juízo singular: “(...) Cuida-se de ação visando ao acolhimento do pedido de aposentadoria por idade rural, proposta por MARIA HELENA DE SOUZA MALAGUTI em face do Instituto Nacional do Seguro Social. Para tanto, requer o reconhecimento do período laborado como rurícola de 1975 até os dias atuais, em regime de economia familiar, sem registro em CTPS, juntamente de seu marido Sr. Dicleu Malaguti, no Sítio São Sebastião, localizado em Altinópolis/SP. (...) No caso vertente, a idade necessária - 55 anos -, nos termos do art. 48, § 1º do diploma legal supracitado, foi alcançada em 2013. Quanto à carência, seu cumprimento dependerá de 180 meses, conforme art. 25, II, da Lei de Benefícios da Previdência Social. Em seguida, destaco que em sede de comprovação ou de reconhecimento de tempo de serviço há que se observar, em princípio, o teor do disposto no art. 55, § 3º da Lei 8.213/91, que exige a conjunção do binômio início de prova material com a prova testemunhal, devendo o início de prova material ser contemporâneo aos fatos que se pretende demonstrar, de acordo com a Súmula n° 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados especiais Federais - TNU. Compulsando os autos, pude constatar que a autora apresentou documentos aptos a comprovar o desempenho de atividade rural, desde 1975, quais sejam: i) Certidão de casamento da Autora com Dicleu Malaguti, em 20/12/1975. Na qualificação, consta que o marido da Autora era lavrador e a Autora doméstica (evento 2, fl. 13); ii) Certidão de óbito da filha da Autora, em 29/08/2013. Na certidão, consta como residência o Sítio São Sebastião, município de Altinópolis/SP (evento 2, fl. 14); iii) Ficha de Inscrição cadastral – produtor constando o nome ADELINO MALAGUTTI E OUTROS, referente ao Sítio São José, município de Batatais. Documento datado de 16/06/1986 (evento 2, fl. 15); iv) INFBEN do Marido da Autora, constando que este recebe aposentadoria por idade rural desde 17/11/2008 (evento 2, fl. 27); v) Detalhamento da Relação previdenciária do marido da Autora, constando endereço na Rua Anita Garibaldi, nº 201, Centro, município de Altinópolis/SP. Com relação à propriedade, consta que se trata do Sítio São João, localizado no município de Altinópolis. Documento datado de 20/03/2018 (evento 2, fls. 37/38); vi) Detalhes de período CAFIR do marido da Autora, constando os seguintes períodos: 31/12/96 no Sítio Valinhos, município de Altinópolis/SP; 31/12/03 no Sítio Novo Horizonte, Municipal da Fazenda Altinópolis, município de Batatais; 31/12/07 no Sítio São João I, Sítio Batatais, Sítio Valinhos e Sítio São José, todos localizados no município de Altinópolis (evento 2, fls. 39/50); vii) Matrícula nº 746 no Registro de Imóveis, referente ao Sítio Batatais, localizado na comarca de Altinópolis. Dentre os proprietários do Sítio consta o nome de João Malaguti (pai de Dicleu Malaguti), datado de 30/05/77. Posteriormente, em 07/07/1980, passou a ser adquirente o Marido da Autora, sendo que o mesmo possuía a qualificação de agricultor (evento 2, fls. 51/57); viii) Levantamento planimétrico constando DICLEU MALAGUTI E OUTROS como proprietários, referente ao Sítio Batatais, comarca de Altinópolis/SP. No documento, consta que a área total é de 27.07.11 ha = 11,186 alqueires. Documento datado de 16/01/04 (evento 2, fl. 58); ix) Escritura de divisão amigável realizada por DICLEU MALAGUTI, Florindo Malaguti e Adelino Malaguti. Documento datado de 21/06/04 (evento 2, fl. 59); x) Pagamentos feitos ao condômino Florindo Malagutti e outro e ao condômino Dicleu Malagutti e outro. Quanto a gleba correspondente ao marido da Autora, consta área total de 9.02.37 há (evento 2, fl. 60); xi) Memorial descritivo para divisão do Sítio Batatais, de propriedade de DICLEU MALAGUTI E OUTROS, situado no município de Altinópolis/SP. No memorial, consta a divisão da propriedade em 3 glebas. Documento datado de 16/04/04 (evento 2, fls. 61/62); xii) Documento do Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos, em que as partes requereram ao Oficial do Registro de Imóveis proceder aos registros e averbações das matrículas, sendo divididas as áreas a cada proprietário. Com relação à DICLEU MALAGUTI e à Autora consta a gleba nº 03, denominada Sítio São Sebastião, contendo cinco mil pés de café e 9,02,37há. Na qualificação do marido da Autora, consta a profissão de “agricultor” (evento 2, fls. 63/76); xiii) Certificado de cadastro de imóvel rural CCIR 2000/2001/2002, referente ao Sítio Batatais, município Altinópolis-Batatais, constando como proprietário o marido da Autora (evento 2, fl. 77); xiv) ITR e DARF dos anos de 1999 a 2003, referentes ao imóvel Sítio Batatais, localizado no município de Altinópolis, constando como contribuinte ADELINO MALAGUTI (evento 2, fls. 78/82); xv) Notas fiscais de produtor constando o nome do marido da Autora, referente ao Sítio São Sebastião, município de Altinópolis/SP. Notas datadas de 28/10/16, 07/12/16, 03/01/17, 11/01/17 e 27/03/17, referentes à venda de café cru em grão (evento 2, fls. 83/90). Vale observar que em vários documentos apresentados está registrado ser o marido da autora lavrador, podendo essa qualificação profissional ser extensível à esposa, conforme entendimento já pacificado na Súmula n° 06, da Turma Nacional de Uniformização: Sumula n° 06 “A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola.“ Realizada audiência, as testemunhas corroboraram o início de prova material juntado aos autos, com depoimentos que criam a convicção de veracidade das alegações da parte autora, no sentido de que ela realmente trabalhou na propriedade identificada, por todo o período pretendido. Sendo assim, tenho que a autora trabalhou como rurícola por período suficiente à obtenção do benefício almejado. Portanto, reconhecido o efetivo exercício de atividade rural pela autora, são superados os 180 meses exigidos pelo art. 25, II, da Lei de Benefícios. (...)” Em que pesem as alegações da recorrente, verifico que a sentença analisou detalhadamente a questão e encontra-se bem fundamentada. Ressalto, apenas, que as notas fiscais apresentadas pelo INSS não têm o condão de, isoladamente, ilidirem o regime de economia familiar exaustivamente demonstrado nos autos por meio de farta prova documental. Ademais, o tamanho da propriedade, a forma de cultivo, a ausência de empregados ou maquinário, bem como o depoimento das testemunhas, convergem para o quanto alegado pela demandante. Por derradeiro, verifico que não houve impugnação da prova oral, motivo pelo qual restou incontroversa. No que tange ao pedido formulado pela autora em contrarrazões recursais a fim de que o INSS seja condenado em litigância de má-fé, verifico que o Código de Processo Civil assim dispõe: Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório. Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. § 1º Quando forem 2 (dois) ou mais os litigantes de má-fé, o juiz condenará cada um na proporção de seu respectivo interesse na causa ou solidariamente aqueles que se coligaram para lesar a parte contrária. § 2º Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo. § 3º O valor da indenização será fixado pelo juiz ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos. Neste panorama, há que se considerar que a mera interposição de recurso, com fundamentação diversa daquela exarada na sentença não tem o condão de, por si só, imputar à parte ré a litigância de má-fé. Objetivamente, a recorrente exerceu apenas seu direito de impugnar os fundamentos que foram utilizados a fim de caracterizar o regime de economia familiar alegado pela demandante e acatado pelo juízo singular. Assim, como não há nos autos outros elementos que possam levar a considerar a autarquia ré como litigante de má-fé, e também não podendo lhe imputar eventual atraso no deslinde do feito ou recurso meramente protelatório, entendo que a conduta da parte ré não pode ser equiparada a nenhuma das situações elencadas no artigo 80 do CPC, dessa forma, indevida sua condenação a esse título. Nestes termos, a sentença deve ser mantida, nas exatas razões e fundamentos nela expostos, que adoto como alicerce desta decisão, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. Destaco que o Supremo Tribunal Federal, sob a sistemática da repercussão geral, chancelou essa prática, fixando a seguinte tese: “Não afronta a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a decisão de Turma Recursal de Juizados Especiais que, em consonância com a Lei 9.099/1995, adota como razões de decidir os fundamentos contidos na sentença recorrida” (STF, Plenário Virtual, RE 635.729 RG/SP, rel. min. Dias Toffoli, j. 30/6/2011, DJe 23/8/2011, Tema 451). Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte ré, nos termos da fundamentação. Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98, do CPC – Lei nº 13.105/15. Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei. É o voto.
E M E N T A