RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000446-78.2020.4.03.6338
RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: FRANCISCO QUEIROZ FELIX
Advogado do(a) RECORRIDO: TERESINHA CHERPINSKI - SP409428-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000446-78.2020.4.03.6338 RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: FRANCISCO QUEIROZ FELIX Advogado do(a) RECORRIDO: TERESINHA CHERPINSKI - SP409428-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A parte autora ajuizou a presente ação na qual objetiva a concessão do benefício assistencial de prestação continuada, previsto na Lei 8.742/1993. O juízo singular proferiu sentença e julgou parcialmente procedente o pedido. Inconformadas, ambas as partes recorreram. A autarquia ré postula a ampla reforma da sentença. Subsidiariamente, requer seja alterada a fixação de multa e prazo para cumprimento da tutela concedida. Por sua vez, o demandante requer a fixação da DIB na DER. Contrarrazões pela parte autora. É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000446-78.2020.4.03.6338 RELATOR: 45º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: FRANCISCO QUEIROZ FELIX Advogado do(a) RECORRIDO: TERESINHA CHERPINSKI - SP409428-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Passo à análise do recurso. Observo que o benefício de prestação continuada de um salário mínimo foi assegurado pela Constituição Federal nos seguintes termos: “Art. 203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: (...) V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei”. Apesar de a Lei 10.741/2003 considerar idoso o indivíduo com idade igual ou superior a 60 anos (art. 1º), estabeleceu como idade mínima para o recebimento desse benefício assistencial 65 anos (art. 34, caput), requisito também previsto no art. 20, caput, da Lei 8.742/1993, com redação dada pela Lei 12.435/2011. No caso concreto, o requisito etário foi atendido na DER (01/10/2019, não contestada pelo INSS), pois a parte autora nasceu em 22/09/1954 (ID 172928611, p. 3). Quanto à hipossuficiência econômica, a Lei 8.742/1993 instituiu um critério objetivo, considerando incapaz de prover a própria manutenção a pessoa portadora de deficiência ou idosa pertencente a família cuja renda mensal per capita seja a inferior a ¼ do salário mínimo. O Superior Tribunal de Justiça vinha decidindo pela possibilidade de utilização de outros critérios para a aferição da miserabilidade do postulante. Em julgamento de recurso especial repetitivo, fixou a seguinte tese: “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo” (STJ, 3ª Seção, REsp 1.112.557/MG, rel. min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28/10/2009, public. 20/11/2009, Tema 185). Anos mais tarde, o Pretório Excelso alterou sua posição a respeito do critério legal de miserabilidade, firmando a seguinte tese de repercussão geral: “É inconstitucional o § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993, que estabelece a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo como requisito obrigatório para concessão do benefício assistencial de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição” (STF, Plenário, RE 567.985/MT, rel. min. Marco Aurélio, rel. para acórdão min. Gilmar Mendes, j. 18/4/2013, DJe 2/10/2013, Tema 27). Para melhor compreensão desse entendimento, transcrevo trecho da ementa (grifo no original): “Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que ‘considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo’. O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento”. Tratando-se de decisão proferida em controle concreto de constitucionalidade, a eficácia se restringe ao caso analisado e ao campo dos precedentes judiciais, não tendo o condão de retirar o dispositivo legal do ordenamento jurídico, tal como se dá no controle abstrato (art. 102, § 2º, da CF). De toda forma, apesar de o Pretório Excelso ter declarado a inconstitucionalidade parcial do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993, não lhe aplicou a sanção de nulidade. Como relata Frederico Amado (“Curso de Direito e Processo Previdenciário”. 9. ed. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 57), tentou-se modular a eficácia da decisão para 31/12/2015, a fim de que o Congresso Nacional tivesse tempo de alterar a Lei Orgânica da Assistência Social, porém não foi alcançado o quórum de 2/3. A posição do STF foi encampada pelo legislador em 2015, quando da edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que acrescentou o § 11 ao art. 20 da Lei 8.742/1993, in verbis: “§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento”. Como se nota, o critério da renda mensal inferior a 1/4 do salário-mínimo continua em vigor no ordenamento jurídico, mas deve ser analisado em conjunto com outros elementos para que se possa detectar a hipossuficiência econômica do requerente. Para tanto, nos termos da Súmula 79 da TNU, aprovada em 15/4/2015: “Nas ações em que se postula benefício assistencial, é necessária a comprovação das condições socioeconômicas do autor por laudo de assistente social, por auto de constatação lavrado por oficial de justiça ou, sendo inviabilizados os referidos meios, por prova testemunhal”. A conclusão acima é chancelada pela Turma Nacional de Uniformização, que, em julgamento de recurso representativo da controvérsia, fixou a seguinte tese: “O critério objetivo consubstanciado na exigência de renda familiar per capita inferior a ¼ do salário-mínimo gera uma presunção relativa de miserabilidade, que pode, portanto, ser afastada por outros elementos de prova” (TNU, PEDILEF 5000493-92.2014.4.04.7002, rel. juiz federal Daniel Machado da Rocha, j. 14/4/2016, public. 15/4/2016, Tema 122). Sem embargo dessas constatações, proliferaram no território nacional inúmeras decisões em Ações Civis Públicas que passaram a impor ao INSS adoção de critérios regionais e diferenciados para a concessão do benefício. Esse fato contribuiu para nova e recente alteração legislativa a respeito do tema (Lei 14.176/21) que deu a seguinte redação ao §11 do artigo 20 da Lei 8.472/93 O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. .....................................................................................................................” (NR) “Art. 20-B. Na avaliação de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade de que trata o § 11 do art. 20 desta Lei, serão considerados os seguintes aspectos para ampliação do critério de aferição da renda familiar mensal per capita de que trata o § 11-A do referido artigo: I – o grau da deficiência; II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo Suas, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida. § 1º A ampliação de que trata o caput deste artigo ocorrerá na forma de escalas graduais, definidas em regulamento. § 2º Aplicam-se à pessoa com deficiência os elementos constantes dos incisos I e III do caput deste artigo, e à pessoa idosa os constantes dos incisos II e III do caput deste artigo. § 3º O grau da deficiência de que trata o inciso I do caput deste artigo será aferido por meio de instrumento de avaliação biopsicossocial, observados os termos dos §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e do § 6º do art. 20 e do art. 40-B desta Lei. § 4º O valor referente ao comprometimento do orçamento do núcleo familiar com gastos de que trata o inciso III do caput deste artigo será definido em ato conjunto do Ministério da Cidadania, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e do INSS, a partir de valores médios dos gastos realizados pelas famílias exclusivamente com essas finalidades, facultada ao interessado a possibilidade de comprovação, conforme critérios definidos em regulamento, de que os gastos efetivos ultrapassam os valores médios.” Nestes termos, o deferimento da prestação deverá observar a existência dessas situações que permitem a superação do limite de ¼ de salário mínimo como renda per capita no núcleo familiar. Por último, anoto que o STJ, no julgamento do Tema 640 ampliou o alcance da norma que consta do artigo 34 do Estatuto do Idoso. Eis a decisão do Tribunal: STJ – Tema 640 (Recursos Repetitivos) – Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. Dessa forma, nos casos de núcleos familiares compostos simultaneamente por idosos e deficientes, o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo não e computado no cálculo da renda per capita. No que tange ao grupo familiar, assinalo que com o advento da Lei 12.435/2011, a família é integrada pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. Em relação a esse ponto, não se pode perder de vista o princípio da subsidiariedade, pelo qual a atuação do Estado só se justifica quando o indivíduo e os grupos sociais intermediários são incapazes de resolver determinado problema. Apesar de a Constituição Federal não empregar essa expressão, a norma jurídica pode ser extraída, no campo da assistência social, tanto do art. 203, V, quanto de outros dispositivos analisados de forma sistemática. Segundo o art. 193, “A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”. Dentro do Título VIII (“Da Ordem Social”) está o capítulo relativo à seguridade social, que se divide em três subsistemas: saúde, previdência e assistência social (art. 194, caput). O Capítulo VII do mesmo Título, por sua vez, trata da família, criança, adolescente, jovem e idoso. O art. 226 reconhece a família como base da sociedade e lhe assegura especial proteção do Estado. O art. 229 contempla o princípio da solidariedade familiar, assim expresso: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. Do exposto, pode-se afirmar que o indivíduo é o principal responsável pelo atendimento de suas necessidades. Caso enfrente situação que não lhe permita prover o seu sustento, deverá ser amparado por sua família, nos termos da lei de regência (art. 5º, II, da CF). Na hipótese de os familiares legalmente obrigados a colaborar com o sustento do membro carente também não terem condições de fazê-lo, aí sim o indivíduo poderá acionar o Estado, para deste receber assistência social. Vê-se, portanto, que o BPC-LOAS não é instrumento para afastar o dever de prestar alimentos de modo a “socializar” os gastos da família com seus idosos e dependentes portadores de deficiência. Além disso, não tem por finalidade complementar a renda familiar ou proporcionar maior conforto à parte interessada, mas amparar a pessoa deficiente ou idosa em efetivo estado de miserabilidade. Estabelecidas essas premissas, sublinho que, no caso concreto, do exame do estudo socioeconômico, constata-se que há situação de miserabilidade a ser tutelada. Nos termos do § 1º do art. 20 da Lei 8.742/1993, o grupo familiar é composto pelo autor, sua esposa e seu filho, pessoa com deficiência. A renda fixa do grupo familiar provém exclusivamente do trabalho formal da esposa como caixa de supermercado, pelo qual aufere cerca de R$ 1.550,00. O demandante alega que não recebe auxílio financeiro dos demais filhos, uma vez que não vivem no mesmo imóvel e possuem suas próprias famílias e despesas. Por conseguinte, a renda per capita do grupo familiar é inferior à metade do salário mínimo vigente à época da perícia socioeconômica (08/09/2020), o que, por si só, denota a miserabilidade do autor. Não obstante, a perícia socioeconômica revelou que o demandante vive em imóvel simples na zona rural, em condições precárias, com móveis e eletrodomésticos essenciais, que não destoam das condições de miserabilidade alegada pela parte autora, conforme também se comprova do acervo fotográfico anexo (ID 172928796). Acrescento, ainda, que a autora conta com idade relativamente avançada, baixa escolaridade, saúde comprometida e histórico profissional em atividades braçais, de modo que sua recolocação no mercado de trabalho formal e de forma estável é evidentemente remota. No ponto, assim restou fundamentada a sentença: “(...) Quanto ao requisito etário: A parte autora conta, atualmente, com 66 anos de idade (nascida em 22.09.1954), razão pela qual é idosa, nos termos da Lei n. 8.742/93, conforme RG das fls. 03 do item 02 dos autos. Quanto ao requisito da miserabilidade: No caso dos autos, conforme laudo pericial juntado aos autos e considerando o disposto no §1º do artigo 20 da lei 8742/93 (Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto), o grupo familiar é composto de 03 pessoas (o autor e sua esposa Zilda e o filho Evandino). A renda familiar per capita computa-se em R$ 510,98. Tendo em vista que a esposa do autor labora formalmente e recebe uma renda mensal aproximadamente de R$ 1.532,95. O filho Evandino, conforme informações do laudo pericial, é deficiente intelectual, razão pela qual não labora. Esta conclusão é condizente com a condição de vida do grupo familiar, conforme informações carreadas no laudo socioeconômico apresentado, e é corroborada por consultas ao sistema CNIS, juntadas aos autos. Sendo, portanto, o valor da renda per capita inferior ao patamar de meio salário-mínimo e evidente o estado de grave hipossuficiência econômica do grupo familiar, resta cumprido o requisito da miserabilidade. Quanto ao requisito da impossibilidade do apoio familiar: Conforme entendimento adiantado na fundamentação, após apurada a renda per capita, é necessária também a aferição da capacidade financeira da família da parte autora (aqui entendida de forma ampla) em prover o seu sustento, visto que a assistência estatal é subsidiária à assistência que deve ser provida pelos entes familiares (parte final do art.203, V, da CF88). Ou seja, apenas na impossibilidade da família sustentar seus idosos ou deficientes é que deve a sociedade arcar com este custo, na esteira da principiologia constitucional (Princípio da Solidariedade, art. 3º, I, da CF88), transpassando o direito de família (Princípio da Solidariedade Familiar, art. 1.694 do Código Civil). Conforme consultas ao sistema CNIS e ao laudo social, juntados aos autos, resta demonstrada a impossibilidade da família em socorrer em grau razoável seu ente em situação de miséria, resta cumprido o requisito da impossibilidade do apoio familiar. Sendo, portanto, demonstrada a impossibilidade da família em socorrer em grau razoável seu ente em situação de miséria, resta cumprido o requisito da impossibilidade do apoio familiar. Logo, preenchidos os requisitos legais, A PARTE AUTORA TEM DIREITO AO BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA, no valor correspondente a 1 (um) salário mínimo, nos moldes da Lei nº 8.742/93. (...)” A partir dos elementos que dos autos constam, conclui-se que a parte autora é idosa e não tem condições de prover seu sustento. Não há familiares que possam ajudá-la sem prejuízo de sua subsistência ou de seus dependentes. Nesse cenário, justifica-se a intervenção do Poder Público por meio do pagamento do BPC-LOAS. Considerando o curto período de tempo transcorrido entre a data de entrada do requerimento (01/10/2019) e o ajuizamento da ação (10/02/2020), fixo a DIB na DER. Ademais, observa-se que não houve mudança substancial da situação socioeconômica da parte autora, uma vez que permaneceu vivendo com a mesma composição familiar, no mesmo endereço e não há notícia nos autos de alteração substancial da renda. Os extratos do CNIS acostados aos autos não indicam nenhuma outra fonte de renda formal ou recebimento de benefício previdenciário, além daquele já mencionado na sentença, seja por parte da parte autora ou de seus familiares próximos. Em relação a eventual recebimento de auxílio emergencial, ressalto que os valores recebidos deverão ser descontados em relação aos períodos em que houver concomitância dos benefícios, haja vista a impossibilidade de cumulação. O INSS deverá apurar a RMI e a RMA devidas, bem como os atrasados vencidos, autorizada a compensação dos valores eventualmente já recebidos a mesmo título ou de benefícios inacumuláveis, na forma da lei. Em relação ao valor da multa fixada, observo que não é possível sustentar desrespeito, a priori, dos parâmetros do artigo 537 do CPC. No ponto, a sentença restou assim fundamentada: “(...) Passo ao exame de tutela provisória, conforme autorizado pelos artigos 296 e 300 do CPC. A probabilidade do direito está suficientemente demonstrada pelas mesmas razões que apontam para a procedência do pedido. O perigo de dano revela-se na privação do autor de parcela das prestações destinadas a garantir a sua subsistência até a fase de cumprimento de sentença à pessoa comprovadamente inapta para trabalhar por razões de saúde ou idade. Assim sendo, DEFIRO O PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA para determinar a(o) implantação/ restabelecimento do benefício previdenciário, na forma ora decidida. Prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$100,00 a partir da mora, sem prejuízo de exasperação. O INSS deverá anotar a tutela aqui concedida nos seus sistemas CNIS e PLENUS, comprovando o registro juntamente com o cumprimento da obrigação principal. (...)” (destaquei) É bom lembrar que a finalidade da imposição dessa multa é coagir a parte a adotar um comportamento, razão pela qual deve haver repercussão financeira importante, única capaz de atingir esse objetivo. Eventual excesso no valor da multa só poderá ser melhor aquilatado, e consequentemente reformado, na fase de execução, e por essa razão não desafia a interposição de recurso inominado nesse sentido. Nesse ponto, constata-se que a sentença impugnada adotou uma linha de raciocínio razoável e coerente, e não incidiu em nenhum dos vícios supramencionados. A parte recorrente apresentou mero inconformismo com os fundamentos da decisão. Em relação ao prazo para cumprimento da tutela, entendo que deve ser fixado no prazo de 45 dias a fim de que a autarquia ré tenha tempo razoável para cumprimento da decisão. Em remate, reformo a sentença apenas a fim de fixar a DIB na data da DER (01/10/2019) e estipular o prazo para cumprimento da tutela em 45 (quarenta e cinco) dias contados da intimação da sentença. Ante todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso do réu e dou provimento ao recurso do autor, nos termos da fundamentação acima. Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15. Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei. É o voto. SÚMULA ESPÉCIE E NÚMERO DO BENEFÍCIO (ESP/NB): 87/704.680.023-6 RMI: RMA: DER: 01/10/2019 DIB: 01/10/2019 DIP: DCB: PERÍODO(S) RECONHECIDO(S) EM SENTENÇA: PERÍODO(S) RECONHECIDO(S) EM SEDE RECURSAL: PERÍODO(S) RETIRADO(S) EM SEDE RECURSAL:
E M E N T A
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. IDOSO. 66 ANOS. PERÍCIA SOCIAL. MISERABILIDADE. RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A ½ DO SALÁRIO MÍNIMO VIGENTE. AUTOR RESIDE COM A ESPOSA E O FILHO, PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMÓVEL PRÓPRIO SIMPLES EM ÁREA RURAL. NECESSIDADES BÁSICAS NÃO ATENDIDAS. INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO QUE SE JUSTIFICA. BENEFÍCIO DEVIDO. DIB NA DER. MULTA E PRAZO PARA CUMPRIMENTO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA REFORMADA. RECURSO DA PARTE RÉ PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO.