Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002022-90.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: TCE SERVICOS EM TECNOLOGIA E INFORMATICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO DE SA MUNHOZ - SP131441-A, ANDREA ZUCHINI RAMOS - SP296994-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002022-90.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: TCE SERVICOS EM TECNOLOGIA E INFORMATICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO DE SA MUNHOZ - SP131441-A, ANDREA ZUCHINI RAMOS - SP296994-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

 

O Desembargador Federal Paulo Domingues:

Trata-se de apelação interposta por TCE Serviços em Tecnologia e Informática LTDA. contra sentença que denegou a ordem no mandado de segurança impetrado contra ato do Chefe da Delegacia Especial de Administração Tributária – DERAT/SP, objetivando ver reconhecida a nulidade do auto de infração constante do Processo Administrativo nº 10283.003071/2004-21 e o afastamento da multa aplicada com fundamento no artigo 83, I, da Lei n.º 4.502/64, referente às importações realizadas durante o ano de 2000.

Apela a impetrante, pugnando pela reforma da sentença e a concessão da ordem, invocando a aplicação do artigo 24 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, instituído pela Lei n.º 13.655/2018, para que seja reconhecida a irretroatividade da orientação administrativa posterior aos fatos e considerada na revisão aduaneira ocorrida no ano de 2004 para a imposição da multa ora questionada. Alega que na orientação anterior era incabível a multa na hipótese de importação irregular quando registrada a declaração de importação perante o Siscomex e concluído o despacho aduaneiro, como ocorrido no presente caso, descaracterizando assim a alegada fraude, com a conseqüente extinção do crédito tributário. Alega ainda que a matéria não foi devidamente apreciada na sentença e embargos declaratórios, ensejando sua nulidade. Nega ainda as irregularidades na documentação utilizada no despacho aduaneiro, além de não se caracterizar a hipótese de importação irregular que ensejou a multa, considerando o registro das declarações de importação. Por fim, alega a nulidade do lançamento fiscal por erro na tipificação dos fatos.

Com contrarrazões.

O Ministério Público Federal entendeu não se tratar de hipótese de sua intervenção.

A apelante requereu a redistribuição do presente feito em razão da alegada conexão com o recurso interposto no Mandado de Segurança nº 5006929-11.2019.4.03.6100, distribuído à E. 4ª Turma desta Corte, sob a relatoria do Exmo. Des. Federal André Nabarrete.

Consultado, o Exmo. Des. Federal André Nabarrete não reconheceu a prevenção, negando a existência de conexão entre os feitos, na medida em que diversos os pedidos e causa de pedir, pois distintas as autoridades apontadas como coatoras, além de se referirem a processos administrativos diferentes.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002022-90.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: TCE SERVICOS EM TECNOLOGIA E INFORMATICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: FLAVIO DE SA MUNHOZ - SP131441-A, ANDREA ZUCHINI RAMOS - SP296994-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

 

O Desembargador Federal Paulo Domingues:

 

Inicialmente, afasto a alegada conexão entre o presente feito e o Mandado de Segurança nº 5006929-11.2019.4.03.6100, distribuído à E. 4ª Turma desta Corte, considerando a ausência de identidade entre as partes e os objetos dos feitos, na mesma linha do entendimento manifestado pelo Exmo. Des. Federal André Nabarrete.

De outra parte, a preliminar relativa à nulidade da sentença por deficiência na fundamentação quanto à negativa de aplicação do artigo 24 da Lei n.º 13.655/2018 confunde-se com o mérito da impetração e com ele será apreciada.

A matéria versada no presente writ diz com a ilegalidade do auto de infração que impôs a pena de multa do IPI fundada no artigo 83, caput e inciso I da Lei n.º 4.502/64, no valor de R$94.734.141,08, lavrado pela Alfândega do Porto de Manaus em 15/06/2004 e constante do Processo Administrativo nº 10283.003071/2004-21, referente às importações realizadas pela impetrante durante o ano de 2000.

O artigo 83, inciso I, da Lei Federal n.º 4.502/64 dispõe:

 

“Art. 83. Incorrem em multa igual ao valor comercial da mercadoria ou ao que lhe é atribuído na nota fiscal, respectivamente: 

I - Os que entregarem ao consumo, ou consumirem produto de procedência estrangeira introduzido clandestinamente no País ou importado irregular ou fraudulentamente ou que tenha entrado no estabelecimento, dêle saído ou nêle permanecido desacompanhado da nota de importação ou da nota-fiscal, conforme o caso;”

 

A lavratura do auto de infração ocorreu no âmbito de investigação autorizada pela Justiça Federal de organização criminosa que utilizava vias falsas ou adulteradas de documentos relativos à importação (fatura comercial internacional - invoices e conhecimentos marítimos de diversas empresas exportadoras) para a instrução da Declaração de Importação (DI) e subsidiar o despacho aduaneiro de mercadorias estrangeiras com preços simulados, com o fim de fraudar os benefícios fiscais e cambiais do regime da Zona Franca de Manaus e a remessa de divisas para paraísos fiscais, documentos obtidos por meio de mandado de busca e apreensão.

Consta do auto de infração (ID 139341891):

 

“As autuadas, TCE Comércio e Serviços em Tecnologia e Informática Ltda (denominada a seguir como "TCE") e SDW Serviços Empresarias Ltda (referida aqui como "SDW) consumiram e entregaram a consumo produtos de procedência estrangeira importados fraudulentamente.

Diversas infrações cambiais e fiscais, além de crimes, foram cometidas pelas empresas auditadas, razão da lavratura deste Auto de Infração com fundamento, principalmente, no art. 83, inciso I, da Lei nº 4.502/64, no art. 1º , alteração 2º, do Decreto-Lei nº 400/68- regulamentado pelo art. 463, inciso I do Decreto nº 2.637/98 (RIPI/98), in verbis:

‘Art 463. Sem prejuízo de outras sanções administrativas ou penais cabíveis, incorrerão na multa igual ao valor comercial da mercadoria ou ao que lhe for atribuído na nota fiscal, respectivamente (Lei n° 4.502/64, art 83, e Decreto-lei n° 400, de 1968, art. 1º , alteração 2ª ):

I - os que entregarem a consumo, ou consumirem produto de procedência estrangeira introduzido clandestinamente no Pais ou importado irregular ou fraudulentamente ou que tenha entrado no estabelecimento, dele saído ou nele permanecido sem que tenha havido registro da declaração da importação no SISCOMEX, ou desacompanhado de Guia de Licitação ou nota fiscal conforme o caso (Lei nº 4.502, de 1964, art. 83, inciso L e Decreto-Lei nº 400, de 1968, art. 1º , alteração 2ª)’.

Por isso, ficam os autuados sujeitos ao pagamento de multa regulamentar de RS 94.734.141,08 (noventa e quatro milhões, setecentos e trinta e quatro mil, cento e quarenta e um reais e oito centavos), equivalentes ao valor da mercadoria constante do demonstrativo anexo, às fls.628/640.

Neste caso, a fraude consistiu, principalmente, na falsificação/adulteração de invoices e na constituição fraudulenta das autuadas. As infrações constatadas e provadas nesta peça são referentes às operações internacionais de comércio exterior ocorridas em 2000.”

 

Com isso, houve a revisão administrativa dos despachos aduaneiros que foram instruídos com documentos comprovadamente falsificados ou adulterados, já que a própria impetrante (importadora) admite ter confeccionado os documentos falsos, que intitula de “fatura pro forma”, contendo divergências de informações em relação a preço, descrição de mercadoria, quantidade, peso, nome de importador e exportador, em substituição aos originais emitidos pelos exportadores e que deveriam ter instruído o despacho aduaneiro.

Firmadas tais premissas, a aplicação da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), seu artigo 24, instituído pela Lei n.º 13.655/2018, estabelece que “A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas.”.

O impetrante afirma que à época dos fatos prevalecia a jurisprudência administrativa no sentido de não se configurar a infração tipificada no artigo 463, I, do RIPI/98 quando tiver havido o devido registro da declaração de importação do Siscomex.

No entanto, a autuação não derivou de mudança de orientação em desfavor do contribuinte acerca de jurisprudência e sua aplicação retroativa à época dos fatos.

O auto de infração e os julgamentos administrativos não se basearam em jurisprudência superveniente ao fato gerador e que permitisse a invocação do art. 24 da LINDB, já que a tipificação nele veiculada decorreu de fraude nas próprias declarações de importação, lastreadas em documentos de eivados de falsidades materiais e ideológicas, afigurando-se de plano inviável pretender-se invocá-las como elementos excludentes do ilícito fiscal e assim afastar subsunção dos fatos à hipótese de incidência da multa imposta.

Não se trata de alteração de orientação administrativa mas de revisão de despacho aduaneiro irregular em razão de falsidade dos documentos que instruíram as declarações de importação, documentos contendo não meros erros ou inexatidões materiais, imprecisões documentais ou descumprimento de obrigações acessórias, mas de falsificações/adulterações preordenadas e direcionadas à interferência na atividade fiscalizatória e de controle aduaneiro, caracterizadoras da importação fraudulenta e que sujeita o importador às penalidades previstas em lei.

Não colhe ainda a argüição de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, pois fundada em mera discordância da orientação nela veiculada, a sujeitá-la ao crivo revisional em sede de recurso e não sua anulação.

Em conclusão, não se verifica violação a direito líquido e certo do impetrante na lavratura do auto de infração e a imposição de multa com fundamento no art. 83, I da Lei nº 4.502/64, regulamentada pelo art. 463, I do Decreto nº 2.637/98, eis que tipificada a importação irregular ou fraudulenta decorrente da ilicitude verificada no procedimento de importação e desembaraço aduaneiro respectivo.

Ante o exposto, rejeito a preliminar de incompetência, não conheço da preliminar de nulidade do processo e NEGO PROVIMENTO à apelação.

É como VOTO.



E M E N T A

 

PROCESSO CIVIL E ADUANEIRO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENA DE MULTA DO IPI. ART. 83, CAPUT E INCISO I DA LEI N.º 4.502/64. IMPORTAÇÃO FRAUDULENTA E COMERCIALIZAÇÃO DOS PRODUTOS. CABIMENTO. FALSIDADE DOS DOCUMENTOS APRESENTADOS NA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. REGULARIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART 24 DA LINDB IMPERTINENTE. PRELIMINARES NÃO CONHECIDAS E REJEITADAS. RECURSO NÃO PROVIDO

1. Não verificada a conexão entre o presente feito e o Mandado de Segurança nº 5006929-11.2019.4.03.6100, distribuído à E. 4ª Turma desta Corte, considerando a ausência de identidade entre as partes e causa de pedir dos feitos.

2. A preliminar relativa à nulidade da sentença por deficiência na fundamentação quanto à negativa de aplicação do artigo 24 da Lei n.º 13.655/2018 confunde-se com o mérito da impetração e com ele será apreciada.

3. Legalidade do auto de infração que impôs a pena de multa do IPI fundada no artigo 83, caput e inciso I da Lei n.º 4.502/64, ocorrida após a revisão administrativa dos despachos aduaneiros ante a constatação, em investigação autorizada pela Justiça Federal, da atuação de organização criminosa que utilizava vias falsas ou adulteradas de documentos relativos à importação (fatura comercial internacional - invoices e conhecimentos marítimos de diversas empresas exportadoras) para a instrução da Declaração de Importação (DI) e subsidiar o despacho aduaneiro de mercadorias estrangeiras com preços simulados, com o fim de fraudar os benefícios fiscais e cambiais do regime da Zona Franca de Manaus.

4. Afastada a aplicação do artigo 24 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), tendo em conta que a autuação não derivou de mudança de orientação em desfavor do contribuinte acerca de jurisprudência administrativa no sentido de não se configurar a infração tipificada no artigo 463, I, do RIPI/98 quando tiver havido o devido registro da declaração de importação do Siscomex, já que a tipificação veiculada no auto de infração decorreu de fraude nas próprias declarações de importação, lastreadas em documentos de eivados de falsidades materiais e ideológicas, afigurando-se de plano inviável pretender-se invocá-las como elementos excludentes do ilícito fiscal e assim afastar subsunção dos fatos à hipótese de incidência da multa imposta, tratando-se de falsificações/adulterações preordenadas e direcionadas à interferência na atividade fiscalizatória e de controle aduaneiro, caracterizadoras da importação fraudulenta e que sujeita o importador às penalidades previstas em lei.

5.  Não verificada a violação a direito líquido e certo do impetrante na lavratura do auto de infração e a imposição de multa com fundamento no art. 83, I da Lei nº 4.502/64, regulamentada pelo art. 463, I do Decreto nº 2.637/98, eis que tipificada a importação irregular ou fraudulenta decorrente da ilicitude verificada no procedimento de importação e desembaraço aduaneiro respectivo.

6. Preliminar de incompetência rejeitada. Preliminar de nulidade do processo não conhecida. Apelação não provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, rejeitou a preliminar de incompetência, não conheceu da preliminar de nulidade do processo e negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.