Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174201-02.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: APARECIDA ESCARSO PEREIRA

Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA SILVA FACIOLI - SP142593-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174201-02.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: APARECIDA ESCARSO PEREIRA

Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA SILVA FACIOLI - SP142593-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de apelação interposta em face de sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de auxílio por incapacidade temporária, seguido da posterior conversão para aposentadoria por incapacidade permanente, desde 28/6/2018, discriminados os consectários legais e antecipados os efeitos da tutela.

A Autarquia Previdenciária alega a ausência de incapacidade laboral da parte autora e exora a reforma integral do julgado. Subsidiariamente, requer a observância da Emenda Constitucional n. 103/2019 quanto à forma de cálculo do benefício.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5174201-02.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: APARECIDA ESCARSO PEREIRA

Advogado do(a) APELADO: MARIA APARECIDA SILVA FACIOLI - SP142593-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus requisitos.

Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade laboral.

A cobertura do evento incapacidade para o trabalho é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II, da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), cuja redação atual é dada pela Emenda Constitucional n. 103, publicada em 13/11/2019 (EC n. 103/2019):

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.

Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.

A aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente (EC n. 103/2019), é devida ao segurado que for considerado permanentemente incapaz para o exercício de quaisquer atividades laborativas, não sendo possível a reabilitação em outra profissão.

Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, o benefício será devido ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e será pago enquanto perdurar esta condição.

Por sua vez, o auxílio-doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária (EC n. 103/2019), é devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o trabalho e, à luz do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.213/1991, "não para quaisquer atividades laborativas, mas para (...) sua atividade habitual" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).

São requisitos para a concessão desses benefícios, além da incapacidade laboral: a qualidade de segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida, bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de benefício por incapacidade permanente ou temporária. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).

O reconhecimento da incapacidade laboral, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.

Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema.

Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.

Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social”.

Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.

No caso em análise, a perícia médica judicial, realizada no dia 9/12/2020 por médica especialista em ortopedia e traumatologia, constatou a ausência de incapacidade laboral da autora (nascida em 1956, qualificada no laudo como do diarista), conquanto portadora de artralgia nos joelhos, síndrome do túnel do carpo à esquerda e hipertensão arterial.

A perita esclareceu:

"(...) O exame físico pericial não evidenciou déficits neurológicos ou sinais de compressão do nervo mediano, não sendo possível comprovar a presença de síndrome do túnel do carpo incapacitante. A parte autora apresenta artropatia degenerativa difusa, que é o envelhecimento habitual das articulações, normal para idade, sem restrições articulares, hipotrofia, assimetria ou qualquer sinal de desuso. O exame dos membros superiores apontou ampla mobilidade dos pontos articulares investigados, assim como o trofismo e força muscular estão preservados em todo membro, portanto, sem déficit a ser considerado."

E concluiu: 

"A doença apresentada não causa incapacidade nem redução da capacidade, nem de maior gasto de energia para as atividades anteriormente desenvolvidas.

A data provável do início da doença é faz tempo, segundo conta.

Para tanto não se aplica data de início da incapacidade, nem de redução da capacidade e nem de maior gasto de energia."

Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial. 

Não obstante a autora seja portadora de males ortopédicos, verifico que não está patenteada a contingência necessária à concessão dos benefícios pleiteados, pois ausente a incapacidade para quaisquer atividades laborais, seja temporária ou permanente.

Nesse passo, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido. 

Atestados e exames particulares juntados não possuem o condão de alterar a convicção formada pelas conclusões do laudo, esse produzido sob o pálio do contraditório.

Apesar de preocupar-se com os fins sociais do direito, o juiz não pode julgar com base em critérios subjetivos, quando não estiver patenteada no laudo a incapacidade total para o trabalho.

Com efeito, embora as doenças enfrentadas pela parte autora estejam estampadas nos exames e atestados médicos apresentados, há que se demonstrar a incapacidade laborativa total, seja permanente ou temporária, requisito inarredável para caracterização do direito à concessão de aposentadoria por incapacidade permanente ou de auxílio por incapacidade temporária.

Ausente a incapacidade laboral total da autora, não é possível a concessão dos benefícios pretendidos, na esteira dos precedentes que cito:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIODOENÇA. RECEBIMENTO ADMINISTRATIVO. SEGURADA FACULTATIVA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE TOTAL. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. APELAÇÃO DA AUTORA DESPROVIDA. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA.

1 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.

2 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.

3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).

4 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiarse ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.

5 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.

6 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

7 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.

8 - O laudo pericial (ID 425196 - páginas 14/21), elaborado em 12/12/14, constatou que a autora está em tratamento de câncer de mama esquerdo. Salientou que a demandante foi submetida à mastectomia e que foi colocada prótese de mama esquerda. Observou que atualmente está realizando sessões de radioterapia, com última sessão prevista no início de fevereiro de 2015. Consignou que, após o término do tratamento, a autora poderá exercer atividades laborativas, devendo evitar atividades com sobrecarga em braço esquerdo (a pericianda é destra). Concluiu pela incapacidade parcial e temporária após o término do tratamento (quatro meses após as sessões de radioterapia - em fevereiro de 2015 - poderá ocorrer retorno à função usual).

9 - Registre-se que na data do ajuizamento da ação a autora estava recebendo o benefício de auxílio-doença (18/06/14), bem como na data da perícia (12/12/14). Conforme se verifica do extrato do CNIS, a demandante recebeu o benefício de auxílio-doença até 02/05/15. Destarte, durante o período em que esteve incapacitada de forma total e temporária, a autora recebeu o benefício de auxílio-doença administrativamente. Após esse período, o perito concluiu tratar-se de incapacidade parcial e temporária.

10 - Observa-se por meio da análise do CNIS, que a autora é cadastrada no Regime Geral da Previdência Social, como facultativa, desde 01/08/13.

11 - Assim, sendo a autora segurada inscrita na Previdência Social como "facultativa" não estando incapacitada para o labor de forma total e permanente, nem de forma total e temporária, não há falar em aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. Nessa diretriz posiciona-se a jurisprudência deste E. Tribunal: AC 00356646320114039999, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/12/2016. e AC 00377555320164039999, DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/03/2017.

12 - Apelação da autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000797-46.2017.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 29/01/2020, Intimação via sistema DATA: 31/01/2020)

“PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. LEI 8.213/1991. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. SEGURADO FACULTATIVO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE RURAL. BENEFÍCIO INDEVIDO.

- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.

- No caso dos autos, o laudo médico pericial concluiu que a autora está parcial e permanentemente incapacitada para atividades que exijam força física e provoquem alto risco ergonômico.

- Não restou demonstrada, in casu, a atividade laboral exercida pela demandante, inexistindo nos autos quaisquer elementos que comprovem que ela exerce atividade laboral que requeira força física e ocasione alto risco ergonômico.

- Não evidenciada a incapacidade laborativa, descabe falar-se em concessão de benefício por incapacidade, restando prejudicada a análise dos demais requisitos cumulativos necessários à concessão do benefício pleiteado.

- Apelação da parte autora desprovida.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 6077553-11.2019.4.03.9999, Rel. Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 26/02/2020, Intimação via sistema DATA: 28/02/2020)

Cabe destacar que as hipóteses de isenção legal da necessidade de submissão à reavaliação médica administrativa somente são aplicáveis a beneficiário de aposentadoria por incapacidade permanente, o que não é o caso dos autos, pois a autora percebia auxílio por incapacidade temporária (NB 31/502.346.979-0).

Invertida a sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Código de Processo Civil, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.

Em decorrência, revogo a tutela jurídica provisória.

Diante do exposto, dou provimento à apelação para julgar improcedentes os pedidos.

Informe-se ao INSS, via sistema, para fins de revogação da tutela provisória de urgência concedida.

É o voto.



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE LABORAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORAL ATESTADA EM LAUDO PERICIAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA.

- São requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade laboral: a qualidade de segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por incapacidade permanente) e a incapacidade temporária (auxílio pro incapacidade temporária), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social. 

- A ausência de incapacidade laboral total do segurado (temporária ou definitiva) atestada por meio de perícia médica judicial, afasta a possibilidade de concessão de aposentadoria por incapacidade permanente ou auxílio por incapacidade temporária.

- Inversão da sucumbência. Condenação da parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Código de Processo Civil, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.

- Apelação provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.