Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009176-31.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: JULIAO DALMO DA SILVA DE OLIVEIRA, NEIDE APARECIDA COSTA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ABRIL HERRERA - SP83016-A
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ABRIL HERRERA - SP83016-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009176-31.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: JULIAO DALMO DA SILVA DE OLIVEIRA, NEIDE APARECIDA COSTA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS ABRIL HERRERA - SP83016-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

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R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação interposta contra sentença que JULGOU IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação e com isto declarou extinto o processo, com exame do mérito da causa, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

A ação de conhecimento foi ajuizada por JULIÃO DALMO DA SILVA DE OLIVEIRA e NEIDE APARECIDA COSTA DE OLIVEIRA em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL objetivando a revisão de contrato de financiamento habitacional para que seja declarada nula a cláusula que prevê o anatocismo, bem como para estabelecer o reajuste do contrato mediante a contagem de juros simples ou de outra maneira menos gravosa aos autores, assim como declarar nula a Taxa de Administração, com a devolução de todos os valores pagos a mais, corrigidos monetariamente. Fundamentando a pretensão, sustentaram terem firmado com a CEF contrato de financiamento habitacional em 02.04.1997, por meio do qual adquiriram e deram em hipoteca à ré o imóvel situado na Rua José Benedito da Rosa, nº 19. O valor do mútuo foi de R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais), dos quais R$ 9.942,01 (nove mil e novecentos e quarenta e dois reais e um centavo) referiam-se à utilização dos recursos da conta vinculada ao FGTS e R$ 26.057,99 (vinte e seis mil e cinquenta e sete reais e noventa e nove centavos), a serem pagos mediante financiamento à luz das normas do Sistema Financeiro da Habitação — SFH. Apontaram que no contrato, realizou-se no Plano de Equivalência Salarial — PES no reajuste de prestações e amortização pelo Sistema Francês de Amortização do capital (PRICE), com encargo inicial no importe de R$ 308,93 (trezentos e oito reais e noventa e três centavos), sendo R$ 226,26 (duzentos e vinte e seis reais e vinte e seis centavos) a título de prestação; R$ 50,25 (cinquenta reais e vinte e cinco centavos) concernente ao seguro e R$ 32,42 (trinta e dois reais e quarenta e dois centavos) de Taxa Administrativa. Aduziram que o prazo para a amortização do encargo era de 240 (duzentos e quarenta) meses, com um tempo adicional de 108 (cento e oito) meses para eventual renegociação de dívida e taxa de juros efetiva de 7,2290% (sete inteiros e dois mil e duzentos e noventa milésimos por cento) ao ano. Discorreram acerca da aplicação do CDC ao contrato objeto dos autos. Sustentaram que o emprego da Tabela Price configura anatocismo, bem como a ilegalidade da cobrança da taxa de administração. Por fim, teceram considerações a respeito da dignidade da pessoa humana e da função social dos contratos.

Em razões de apelação, a parte autora sustenta, em síntese, que o contrato de financiamento utilizou o Plano de Equivalência Salarial - PES como plano de reajuste e o Sistema Francês (Tabela Price) de Amortização do capital. Aduz que a forma de amortização da dívida configuraria a capitalização de juros. Assenta ser ilegal a utilização da Tabela Price. Sustenta que a sistemática utilizada pela apelada implica em amortização negativa. Argumenta que é nula a cláusula que prevê a capitalização mensal de juros. Afirma ser ilegal a cobrança de taxa de administração e taxa de risco de créditos.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009176-31.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: JULIAO DALMO DA SILVA DE OLIVEIRA, NEIDE APARECIDA COSTA DE OLIVEIRA

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V O T O

Os contratos de financiamento imobiliário regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) obedecem não apenas às cláusulas estipuladas por acordo entre as partes, mas também a toda uma legislação própria que delimita o alcance dessas cláusulas ao estabelecer parâmetros para o reajuste das prestações, critérios de correção do saldo devedor, taxas de juros, amortização, entre outras, como previsto no artigo 5º da Lei 4.380/64 e artigo 30 da Lei 4.864/65. 

A Lei 4.380/64 foi aprovada por rito ordinário e se restringe ao SFH, não estabelecendo normas gerais sobre o sistema financeiro nacional, sendo descabido formal e materialmente cogitar que a referida lei tenha sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com força de lei complementar (artigo 192). 

As fontes tradicionais de recursos para o SFH são a Caderneta de Poupança e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Aplicam-se para correção do saldo devedor nos contratos do SFH os mesmos índices de remuneração das contas que o custeiam, medida necessária ao equilíbrio e à consistência financeira do sistema. Além das determinações legais, são também de ordem estrutural as razões que determinam a correção do saldo devedor, as quais não podem ser consideradas abusivas, sob pena de se considerar igualmente abusiva a remuneração de suas fontes de financiamento. 

Plano de Equivalência Salarial, Coeficiente de Equiparação Salarial, Fundo de Compensação de Variações Salariais. 

O Decreto-Lei 2.164/84 regulamentou, no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação, o Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES/CP concebido como um critério para a atualização das prestações dos contratos de mútuo habitacional regulados pelas normas do SFH. A redação original de seu artigo 9º, caput, previa que o reajuste das prestações nestes contratos corresponderia ao mesmo percentual e periodicidade do aumento de salário da categoria profissional a que pertencesse o adquirente. O PES foi concebido para se aplicar ao reajuste das prestações, não guardando relação com os índices de correção monetária aplicáveis ao saldo devedor do contrato. 

Pela redação original do Decreto-lei, havia um limitador que incidiria sempre que o aumento de salário de determinada categoria profissional superasse em mais de sete pontos percentuais a variação da Unidade Padrão de Capital - UPC, (artigo 9º, § 1º). A alteração da categoria profissional acarretaria a adaptação dos critérios de reajuste das prestações previstos no contrato à nova situação do adquirente, que deveria ser prévia e obrigatoriamente comunicada ao Agente Financeiro (artigo 9º, § 6º). 

A Lei 8.004/90, por meio de seu artigo 22, alterou a redação do caput e de todos os parágrafos do artigo 9º do Decreto-Lei 2.164/84, afastando a utilização do UPC e do referido limitador, mas garantindo o direito ao mutuário de, a qualquer tempo, solicitar alteração de data-base nos casos de mudança da categoria profissional (artigo 9º, § 3º). A cláusula PES tem a intenção de preservar a proporção entre o valor da prestação e o salário do mutuário (artigo 9º, §5º) sendo seu ônus comprovar a não aplicação da cláusula ou requerer o recálculo da prestação diante da quebra da relação prestação/renda em virtude de fatores extracontratuais, como a mudança de categoria profissional. Não se trata de índice de correção monetária, e não se aplica, repita-se, à atualização do saldo devedor. 

A Resolução do Conselho n. 36/69 do Banco Nacional da Habitação regulou o reajustamento das prestações no sistema financeiro da habitação e criou, propriamente dito, o plano de equivalência salarial. Esta resolução alterou critérios da RC nº 25/67 que criou o Fundo de Compensação de Variações Salariais. Deste modo, ao término do prazo contratual, e uma vez pagas todas as prestações a que se obrigara o mutuário, seria apurado o saldo residual porventura existente e o FCVS o liquidaria junto ao credor. Este saldo residual decorre das condições de amortização do contrato em contraste com a correção do saldo devedor. 

Nesta esteira, a Resolução 36/69 criou o Coeficiente de Equiparação Salarial - CES, intimamente ligado ao PES, posteriormente regulado na Lei 8.692/93, para suprir prováveis disparidades entre a adoção de índices e periodicidades diversos na correção das prestações e do saldo devedor dos mutuários. A cobrança de valores a título do CES não está condicionada à vigência da Lei 8.692/93 se antes da sua aprovação havia previsão contratual para a sua cobrança. Em suma, o PES busca majorar o valor das prestações em harmonia com a evolução salarial do mutuário para garantir que a amortização do empréstimo seja bem sucedida. 

Em condições normais, a amortização se completa no prazo estipulado, do contrário, subsistindo saldo residual, o FCVS assumiria a responsabilidade de cobrir os valores junto à instituição financeira. Esta, por sua vez, encerrado o prazo contratual e adimplidas as prestações do contrato, tem de dar a quitação sem condicioná-la à liberação do valor referente ao saldo residual pelo referido fundo, por se tratar de relações jurídicas distintas e não condicionadas. A cobertura pelo FCVS, no entanto, não pode ser requerida se o mutuário está inadimplente em relação a prestações originalmente previstas em contrato e não relacionadas ao saldo residual. 

O PES não é índice de correção monetária aplicável ao saldo devedor, o CES é um de seus instrumentos e sua cobrança é legítima mesmo antes da Lei 8.692/93, se prevista em contrato. 

A corroborar os entendimentos acima expostos, cito jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região. 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. PES. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ. 
1. O PES somente é aplicável no cálculo das prestações mensais a serem pagas pelo mutuário, sendo, portanto, incabível sua utilização como índice de correção monetária do saldo devedor dos contratos de mútuo regidos pelo SFH, o qual deverá ser atualizado segundo indexador pactuado pelas partes. 
2. No caso concreto, a partir da análise do instrumento contratual que rege a relação havida entre as partes, o Tribunal a quo concluiu que os contratantes pactuaram a utilização da Taxa Referencial para a atualização do saldo devedor. A modificação dessa decisão é inviável na instância especial ante os obstáculos erigidos pelas Súmulas n. 5 e 7 do STJ. 
(STJ, AgRg no AREsp 417096 / RJ, Agravo Regimental No Agravo Em Recurso Especial 2013/0356020-0, Quarta Turma, Relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJe 03/02/2015) 

ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. FUNDO DE COMPENSAÇÃO DE VARIAÇÕES SALARIAIS - FCVS. AMORTIZAÇÃO. ANATOCISMO. TABELA PRICE. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. TR. ATUALIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR. IMPOSSIBILIDADE, POIS NÃO PREVISTA A UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE CORREÇÃO APLICÁVEL À CADERNETA DE POUPANÇA. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 10%. INEXIGIBILIDADE. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC. FORMA DE IMPUTAÇÃO DOS PAGAMENTOS MENSAIS. APLICAÇÃO, NA AUSÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EM OUTRO SENTIDO, DO CRITÉRIO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL. APLICAÇÃO DO COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL - CES. CONTRATOS FIRMADOS ANTES DA LEI N. 8.692/93. APENAS NA HIPÓTESE DE EXPRESSA PREVISÃO NO AJUSTE. PRECEDENTES DO STJ. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL POR CATEGORIA PROFISSIONAL - PES/CP. COMPARAÇÃO DOS ÍNDICES DE FORMA ACUMULADA E LINEAR. PRECEDENTES DO STJ. VERIFICAÇÃO DE LEGALIDADE OU ABUSIVIDADE DA COBRANÇA DE SEGURO HABITACIONAL. VEDAÇÃO SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. PRECEDENTES DO STJ. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CDC. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. DECISÃO MONOCRÁTICA FUNDAMENTADA EM JURISPRUDÊNCIA DO STJ (ART. 557 DO CPC). RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 
1. (...). 
5. Quanto ao Coeficiente de Equiparação Salarial - CES, o STJ admite sua cobrança, inclusive nos contratos pactuados antes da Lei n. 8.692/93, desde que expressamente previsto, o que ocorreu na hipótese dos autos. Além disso, a análise da incidência do CES, se de acordo ou não com a previsão contratual, esbarra nas Súmulas n. 5 e 7 do STJ. Precedentes. 
6. Por ocasião do julgamento do REsp n. 966.333/PR, realizado sob a relatoria da Ministra Denise Arruda, firmou-se o posicionamento nesta Corte de que a possibilidade de incidência do limitador deve ser verificada sempre que houver aumento salarial da categoria profissional do mutuário, adotando-se, no entanto, a seguinte técnica: (1º) apura-se a variação do limitador (UPC, IPC ou INPC, a depender da previsão contratual ou da legislação vigente) para o período em que o mutuário ficou sem aumento salarial; (2º) esse resultado, acrescido do percentual previsto na norma (+7% ou +0,5%, conforme o caso), deve ser comparado com o índice de variação salarial da categoria profissional do mutuário, prevalecendo o menor para fins de atualização do valor da prestação. Além disso, analisar se a aplicação do PES foi adequada incide no óbice das Súmulas n. 5 e 7 do STJ. Precedentes. 
7. (...) 
8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que, nos contratos do Sistema Financeiro de Habitação, com cobertura do FCVS, como a hipótese dos autos, não se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, como Código de Defesa do Consumidor não é aplicável ao contrato de mútuo habitacional, com vinculação ao FCVS, como no caso em apreço, descabe a restituição em dobro do pagamento indevido. Precedentes 
9. Recurso especial não provido. 
(Stj, Resp 201402302282, REsp - Recurso Especial - 1483061, Segunda Turma, Relator Mauro Campbell Marques, Dje Data:10/11/2014) 
 
PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - ART. 50, LEI 10.931/2004 - INEPCIA AFASTADA - INOVAÇÃO DE PEDIDO NA FASE RECURSAL - IMPOSSIBILIDADE - CDC - PES - CES - TR - INVERSÃO NA FORMA DE AMORTIZAÇÃO - URV - ÍNDICE DE 84,32% - DECRETO-LEI 70/66 - CONSTITUCIONALIDADE. 
1 - (...) 
4 - Nos contratos de financiamento firmados em data anterior a 14 de março de 1990 (data da publicação da Lei 8.004/90), as cláusulas atinentes aos reajustes das prestações mensais encontram-se reguladas pelo Decreto-lei nº 2.164/84, que estabeleceu a atualização pelo Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional (PES/CP). Por esse sistema, as prestações mensais serão reajustadas no mesmo percentual e periodicidade do aumento de salário da categoria profissional a que pertencer o mutuário, mesmo em caso de alteração de categoria ou mudança de local de trabalho, ainda que não comunicada a tempo a instituição financeira. 
5 - Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ a cobrança do CES é legal, mesmo antes do advento da Lei 8.692/93, desde que previsto contratualmente. 
(...) 
12 - Apelação da parte autora desprovida. Apelação do réu parcialmente provida. 
(TRF3, AC 00417959720004036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1256570, Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Mauricio Kato, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/07/2015)

Capitalização de Juros. Anatocismo 

Grande controvérsia envolve a interpretação e a aplicação das regras que disciplinam o anatocismo no Brasil. Não raro, defende-se que a legislação pátria proibiria a utilização de juros compostos, juros efetivos ou qualquer mecanismo que envolvesse "capitalização de juros". 

Neste diapasão, estaria configurado o paroxismo de proibir conceitos abstratos de matemática financeira, prestigiando somente a aplicação de juros simples ou nominais, sem necessariamente lograr atingir uma diminuição efetiva dos montantes de juros remuneratórios devidos, já que a maior ou menor dimensão paga a este título guarda relação muito mais estreita com o patamar dos juros contratados que com a frequência com que são "capitalizados". 

Em tempos modernos, a legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira ou a qualquer situação pré-contratual, os quais pressupõem um regular desenvolvimento da relação contratual. Como conceito jurídico, as restrições a "capitalização de juros" ou "juros sobre juros" disciplinam as hipóteses em que, já vigente o contrato, diante do inadimplemento, há um montante de juros devidos, vencidos e não pagos que pode ou não ser incorporado ao capital para que incidam novos juros sobre ele. 

Em outras palavras, na data em que vencem os juros, pode haver pagamento e não ocorrerá "capitalização", em sentido jurídico estrito. Na ausência de pagamento, porém, pode haver o cômputo dos juros vencidos e não pagos em separado, ou a sua incorporação ao capital/saldo devedor para que incidam novos juros. Apenas nesta última hipótese pode-se falar em "capitalização de juros" ou anatocismo para efeitos legais. 

A ilustrar a exegese, basta analisar o texto do artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura": 

Art. 4º. E proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano. 

Se a redação da primeira parte do dispositivo não é das mais cuidadosas, a segunda parte é suficiente para delimitar o alcance do conceito e afastar teses das mais variadas em relação à proibição do anatocismo. 

Feitas tais considerações, é de se ressaltar que não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta para a "capitalização de juros" (vencidos e não pagos). As normas que disciplinam a matéria, quando muito, restringiram a possibilidade de capitalização de tais juros em prazo inferior a um ano. Desde o Artigo 253 do Código Comercial já se permitia a capitalização anual, proibindo-se a capitalização em prazo inferior, restrição que deixou de existir no texto do artigo 1.262 do Código Civil de 1916. O citado artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura", retoma o critério da capitalização anual. 

mens legis do art. 4º do Decreto 22.626/33, ao restringir a capitalização nestes termos, é evitar que a dívida aumente em proporções não antevistas pelo devedor em dificuldades ao longo da relação contratual. O dispositivo não guarda qualquer relação com o processo de formação da taxa de juros, como a interpretação meramente literal e isolada de sua primeira parte poderia levar a crer. Neste sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Segunda Seção, EREsp. 917.570/PR, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 4.8.2008 e REsp. 1.095.852-PR, DJe 19.3.2012). 

Deste modo, tem-se o pano de fundo para se interpretar a Súmula 121 do STF: 

É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. 
(Súmula 121 do STF) 

A súmula veda a capitalização de juros mesmo quando convencionada. Veda a capitalização de juros (vencidos e não pagos), mesmo quando convencionada (em período inferior ao permitido por lei). 

A Súmula 596 do STF, mais recente e abordando especificamente o caso das instituições financeiras, por sua vez, prevê: 

As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional. 
(Súmula 596 do STF) 

A jurisprudência diverge quanto ao alcance da Súmula 596 do STF no que diz respeito ao anatocismo. De toda sorte, a balizar o quadro normativo exposto, o STJ editou a Súmula 93, segundo a qual a legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros. 

Em outras palavras, nestas hipóteses admite-se a capitalização de juros vencidos e não pagos em frequência inferior à anual, nos termos da legislação específica. As normas legais que disciplinam cada tipo de financiamento passaram a ser um critério seguro para regular o anatocismo. 

Deste modo, mesmo ao não se considerar como pleno o alcance da Súmula 596 do STF, há na legislação especial do Sistema Financeiro da Habitação autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64. 

Há que se considerar, ainda, que desde a MP 1.963-17/00, com o seu artigo 5º reeditado pela MP 2.170-36/01, já existia autorização ainda mais ampla para todas as instituições do Sistema Financeiro Nacional. A consequência do texto da medida provisória foi permitir, como regra geral para o sistema bancário, não apenas o regime matemático de juros compostos, mas o anatocismo propriamente dito. 

O Supremo Tribunal Federal entendeu que não há inconstitucionalidade na MP 2.170-36/01 em razão de seus pressupostos: 

CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO. 
1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência. 
2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país. 
3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados. 
4. Recurso extraordinário provido. 
(STF, RE 592377 / RS - RIO GRANDE DO SUL, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. TEORI ZAVASCKI, 04/02/2015) 

Ressalte-se que tanto a legislação do SFN quanto a do SFH são especiais em relação à Lei de Usura e às normas do Código Civil. 

A reforçar todo o entendimento anteriormente exposto, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 539, nos seguintes termos: 

É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. 
(Súmula 539 do STJ) 

Em suma, não ocorre anatocismo em contratos de mútuo pela simples adoção de sistema de amortização que se utilize de juros compostos. Tampouco se vislumbra o anatocismo pela utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Por fim, a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos é permitida nos termos autorizados pela legislação e nos termos pactuados entre as partes. 

Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento de determinada prestação, a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal.

Forma de Amortização

A atualização do saldo devedor anterior à subtração do valor da prestação vencida não é abusiva. Na realidade, configura mecanismo de remuneração do mutuante, sendo, portanto, inerente ao empréstimo de dinheiro, conforme o esclarecedor ensinamento de Edson de Queiroz Penna: "O raciocínio de que a amortização deve preceder o cálculo dos juros é muito singelo e não se sustenta. Após o decurso do primeiro mês, os juros são calculados sobre o valor do financiamento pelo período em que o capital ficou à disposição do tomador - um mês. Admitamos, para argumentar, que o mutuário do exemplo apresentado, após decorrido o prazo de um mês, opte por liquidar integralmente o financiamento pagando $ 11.255,08. Amortizando antes de calcular os juros, o saldo ficaria zerado e, portanto, não lhe seria cobrado nenhum valor a título de juros, mesmo tendo o capital ficado à sua disposição por um mês" (Tabela Price e a Inexistência de Capitalização, Porto Alegre/RS, Editora AGE, 2007, p. 81).

A propósito a Súmula 450, do Superior Tribunal de Justiça, exara o seguinte:

"Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação".
(Súmula 450 do STJ)

A reforçar o entendimento, o STJ, em julgamento da Corte Especial pelo rito dos recursos especiais representativos de controvérsia, assentou que se aplica aos contratos do SFH a regra de imputação do artigo 354 do CC, segundo a qual, havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital.

SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. FORMA DE IMPUTAÇÃO DOS PAGAMENTOS MENSAIS. APLICAÇÃO, NA AUSÊNCIA DE ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EM OUTRO SENTIDO, DO CRITÉRIO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL.
1. Salvo disposição contratual em sentido diferente, aplica-se aos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação a regra de imputação prevista no art. 354 do Código Civil de 2002, que reproduz o art. 993 do Código Civil de 1916 e foi adotada pela RD BNH 81/1969.
2. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.
(REsp 1194402 / RS, RECURSO ESPECIAL 2010/0088776-9, Corte Especial, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 14/10/2011)

Sistema de Amortização Constante (SAC), Sistema de Amortização Crescente (Sacre), Sistema Francês de Amortização (SFA ou Tabela Price) 

O contrato de mútuo é um dos cernes da atividade empresarial praticada pelas instituições financeiras pela qual ofertam quantia em dinheiro em troca de remuneração por juros. Ao efetivar pagamentos parcelados, o mutuário tem de realizar o reembolso do capital que inicialmente lhe foi disponibilizado, além de remunerar o mutuante por meio de juros incidentes em função do tempo necessário para que a dívida seja extinta. 

Três são os sistemas de amortização que são utilizados com mais frequência pelas instituições financeiras para operacionalizar a atividade: SAC, Sacre e Price. 

A adoção do SAC adota amortização constante, mas para tanto trabalha com prestações variáveis, inicialmente mais altas e decrescentes ao longo do tempo, compreendendo uma quantia decrescente paga a título de juros a cada prestação, e uma quantia total menor paga a título de juros remuneratórios em relação ao Sistema Francês de Amortização. 

A Tabela Price, por sua vez, trabalha com prestações constantes, inicialmente menores se comparadas ao SAC e ao Sacre, e amortização variada, crescente em condições regulares. A cada prestação adimplida é reduzida a quantia paga a título de juros remuneratórios, na medida em que diminui o saldo devedor. 

O Sacre combina características dos sistemas anteriores. As prestações também são variáveis, inicialmente mais altas, decrescendo por meio de patamares constantes e periódicos. A amortização, por sua vez, é crescente. A parcela paga a título de juros é reduzida de forma progressiva. O Sacre é o sistema pelo qual se paga o menor montante de juros, mas as parcelas iniciais são maiores que no SAC. 

Se considerados de maneira isolada, supondo o desenvolvimento regular da relação obrigacional, não é possível pressupor que a escolha de qualquer desses sistemas implique em desequilíbrio econômico-financeiro, enriquecimento ilícito ou qualquer ilegalidade, cada qual possuindo uma configuração própria de vantagens e desvantagens. 

É certo que a utilização da Tabela Price implica no pagamento de uma quantia total maior a título de juros, mas essa desvantagem é decorrência da utilização de uma prestação constante e inicialmente inferior a que é utilizada no SAC e no Sacre. As regras da Tabela Price não guardam qualquer relação com o anatocismo, que, como já exposto anteriormente, diz respeito à incorporação ao saldo devedor dos juros vencidos e não pagos. 

Como se vê a sua utilização, não implica, de per si, qualquer irregularidade, sendo ônus da parte Autora demonstrar a ocorrência de outros fatores, que, aliados a este sistema de amortização, supostamente provocaram desequilíbrio contratual. É de se ressaltar que mesmo nos contratos que se desenvolvem com uma grande disparidade entre os índices de correção monetária e os reajustes salariais do mutuário, em regra, há a previsão de cobertura pelo fundo de compensação de variações salariais que garantem o equilíbrio econômico financeiro da relação obrigacional. 

O mero inadimplemento, reforçado por uma interpretação meramente literal e assistemática da Lei de Usura que questiona a própria lógica dos sistemas de amortização, não é favorável aos direitos do consumidor, ao princípio da transparência e à segurança jurídica, nem é suficiente para obter a revisão de contrato realizado dentro dos parâmetros legais. 

PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - LEI 4.380/64 - LEI ORDINÁRIA - SACRE - JUROS - ANATOCISMO. 
1 - (...). 
2 - Não há nenhuma ilegalidade na adoção do Sistema de Amortização Crescente - SACRE, até porque referido sistema pressupõe a criação de uma planilha com uma taxa de juros previamente estabelecida e amortização progressiva do saldo devedor. 
3 - A diferença de taxa de juros nominal e efetiva decorre do sistema de amortização eleito entre as partes que implica, na prática, o cálculo de juros sobre juros. Os juros embutidos nas prestações mensais, porém, não caracterizam anatocismo vedado por lei, já que esse método de cálculo define o valor das prestações destinadas à amortização do financiamento, mediante a aplicação de determinada taxa de juros e em certo prazo, com capitalização de juros que não encontra óbice na legislação vigente. A ocorrência de amortização negativa não constitui qualquer irregularidade, uma vez que provém de pagamento de valor de prestação que não se mostra suficiente sequer à quitação dos juros devidos. 
4 - Apelação desprovida. 
(TRF3, AC 00029879620094036103, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1753160, Relator Desembargador Federal Mauricio Kato, Quinta Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015) 
 
CIVIL - ALTERAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL - CORREÇÃO MENSAL DAS PARCELAS PELO IPC A PARTIR DE JULHO DE 1994 - CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR PELA TR - PLANO REAL - SISTEMA FRANCÊS DE AMORTIZAÇÃO - APLICAÇÃO DO CDC - REDUÇÃO DO PLANO MENSAL DO SEGURO - RECURSO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 
(...) 
9. Não se vislumbra qualquer ilegalidade na adoção do Sistema Francês de Amortização - SFA ou Tabela Price, para regular o contrato de mútuo em questão. Trata-se de um sistema de amortização de dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, cujo valor de cada prestação é composto de uma parcela de capital (amortização) e outra de juros, como previsto no art. 6º, "c", da Lei 4380/64. 
10. Esse tipo de amortização, ademais, não acarreta incorporação de juros ao saldo devedor, já que os juros são pagos mensalmente, juntamente com as prestações, não havendo qualquer possibilidade de ocorrer anatocismo. 
(...) 
(TRF3, AC 00505420719984036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 882073, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO HELIO NOGUEIRA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:13/01/2009) 
 
CIVIL. SFH. PRESTAÇÕES. PES/CP. CES - COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL. LEI Nº 8.692/93. REAJUSTES CONTRATUAIS. PLANOS ECONÔMICOS. CDC. NORMAS APLICÁVEIS AO CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. TR. SUBSTITUIÇÃO PELO INPC. SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO. AMORTIZAÇÃO. LEI Nº 4.380/64. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DL 70/66. JUROS. CAPITALIZAÇÃO. SEGURO. RECURSO DE APELAÇÃO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 
(...) 
Diversamente do que em geral acontece nos contratos de mútuo, os regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação encontram previsão legal de amortização mensal da dívida, como se dessume do art. 6º, "c", da Lei n. 4.380/1964. Dessa disposição decorre para as instituições operadoras dos recursos do SFH a possibilidade de utilização da Tabela Price - bem como da SACRE e da SAC (atualmente os três sistemas mais praticados pelos bancos) - para o cálculo das parcelas a serem pagas, tendo em vista que, por esse sistema de amortização, as prestações são compostas de um valor referente aos juros e de um outro, referente à própria amortização. Os três sistemas importam juros compostos, que todavia encontram previsão contratual e legal, sem qualquer violação a norma constitucional. A capitalização de juros, quando prevista contratualmente, como no caso, tendo sido fixada a taxa de juros efetiva, não importa desequilíbrio entre os contratantes, que sabem o valor das prestações que serão pagas a cada ano. 
(...) 
Recurso de apelação improvido. Sentença mantida. 
(TRF3, AC 00050589020034036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1570053, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO PAULO PUPO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2012)

Taxa de Administração e Taxa de Crédito 

Em contratos anteriores a 2008, é lícita a cobrança de Taxa de Administração de Taxa de Crédito que servem para custear despesas administrativas, desde que expressamente contratadas, não configurando abuso ou condição suficiente para levar o mutuário à inadimplência. 

Neste sentido é a jurisprudência da Quinta Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região: 

CIVIL - PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL - COEFICIENTE DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL - CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR PELA TR - SISTEMA FRANCÊS DE AMORTIZAÇÃO - TAXA DE JUROS EFETIVOS - LIMITE DE 12% AO ANO - APLICAÇÃO DO CDC - VALIDADE DO PROCEDIMENTO EXECUTÓRIO - CONSTITUCIONALIDADE - AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADES - RECURSO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 
(...) 
16. Não se verifica ilegalidade na cobrança das Taxas de Administração e de Risco de Crédito, vez que se encontra expressamente prevista no contrato. E, havendo previsão contratual para tal cobrança, é ela legítima e não pode a parte autora se negar a pagá-la. As referidas taxas servem para fazer frente às despesas administrativas com a celebração e a manutenção do contrato de mútuo e não possuem o condão de, por si só, levar o mutuário à condição de inadimplência. 
(...) 
28. Recurso improvido. Sentença mantida. 
(TRF3, AC 00055820920024036105, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1263908, QUINTA TURMA, Relator Juiz Convocado Hélio Nogueira, e-DJF3 Judicial 2 DATA:16/12/2008) 

Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação.

Honorários advocatícios majorados para 11% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.

É o voto.



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. PES. ANATOCISMO. SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA.

I - O PES não é índice de correção monetária aplicável ao saldo devedor, o CES é um de seus instrumentos e sua cobrança é legítima mesmo antes da Lei 8.692/93, se prevista em contrato. 

II - A atualização do saldo devedor anterior à subtração do valor da prestação vencida não é abusiva. Na realidade, configura mecanismo de remuneração do mutuante, sendo, portanto, inerente ao empréstimo de dinheiro, conforme o esclarecedor ensinamento de Edson de Queiroz Penna: "O raciocínio de que a amortização deve preceder o cálculo dos juros é muito singelo e não se sustenta. Após o decurso do primeiro mês, os juros são calculados sobre o valor do financiamento pelo período em que o capital ficou à disposição do tomador - um mês. Admitamos, para argumentar, que o mutuário do exemplo apresentado, após decorrido o prazo de um mês, opte por liquidar integralmente o financiamento pagando $ 11.255,08. Amortizando antes de calcular os juros, o saldo ficaria zerado e, portanto, não lhe seria cobrado nenhum valor a título de juros, mesmo tendo o capital ficado à sua disposição por um mês" (Tabela Price e a Inexistência de Capitalização, Porto Alegre/RS, Editora AGE, 2007, p. 81).

II - A legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira ou a qualquer situação pré-contratual, os quais pressupõem um regular desenvolvimento da relação contratual. Como conceito jurídico, as restrições a "capitalização de juros" ou "juros sobre juros" disciplinam as hipóteses em que, já vigente o contrato, diante do inadimplemento, há um montante de juros devidos, vencidos e não pagos que pode ou não ser incorporado ao capital para que incidam novos juros sobre ele. Não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta para a "capitalização de juros" (vencidos e não pagos).

III - Na esteira da Súmula 596 do STF, desde a MP 1.963-17/00, atual MP 2.170-36/01, admite-se como regra geral para o sistema financeiro nacional a possibilidade de se pactuar capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Há na legislação especial do SFH autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64. (REsp 973827/RS julgado pelo artigo 543-C do CPC). Ademais, a Súmula 539 do STJ reforçou a possibilidade de aplicação da capitalização de juros inferior a um ano para os contratos ligados ao SFH a partir da edição da MP 1.963-17/00, desde que expressamente pactuada.

IV - Em suma, não ocorre anatocismo em contratos de mútuo pela simples adoção de sistema de amortização que se utilize de juros compostos. Tampouco se vislumbra o anatocismo pela utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Por fim, a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos é permitida nos termos autorizados pela legislação e nos termos pactuados entre as partes. 

V - Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento de determinada prestação, a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal. 

VI - Três são os sistemas de amortização que são utilizados com mais frequência pelas instituições financeiras para operacionalizar a atividade: SAC, Sacre e Price. A adoção do SAC adota amortização constante, mas para tanto trabalha com prestações variáveis, inicialmente mais altas e decrescentes ao longo do tempo, compreendendo uma quantia decrescente paga a título de juros a cada prestação, e uma quantia total menor paga a título de juros remuneratórios em relação ao Sistema Francês de Amortização. A Tabela Price, por sua vez, trabalha com prestações constantes, inicialmente menores se comparadas ao SAC e ao Sacre, e amortização variada, crescente em condições regulares. A cada prestação adimplida é reduzida a quantia paga a título de juros remuneratórios, na medida em que diminui o saldo devedor. O Sacre combina características dos sistemas anteriores. As prestações também são variáveis, inicialmente mais altas, decrescendo por meio de patamares constantes e periódicos. A amortização, por sua vez, é crescente. A parcela paga a título de juros é reduzida de forma progressiva. O Sacre é o sistema pelo qual se paga o menor montante de juros, mas as parcelas iniciais são maiores que no SAC. 

VII - É certo que a utilização da Tabela Price implica no pagamento de uma quantia total maior a título de juros, mas essa desvantagem é decorrência da utilização de uma prestação constante e inicialmente inferior a que é utilizada no SAC e no Sacre. As regras da Tabela Price não guardam qualquer relação com o anatocismo, que, como já exposto anteriormente, diz respeito à incorporação ao saldo devedor dos juros vencidos e não pagos. 

VIII - Como se vê a sua utilização, não implica, de per si, qualquer irregularidade, sendo ônus da parte Autora demonstrar a ocorrência de outros fatores, que, aliados a este sistema de amortização, supostamente provocaram desequilíbrio contratual. É de se ressaltar que mesmo nos contratos que se desenvolvem com uma grande disparidade entre os índices de correção monetária e os reajustes salariais do mutuário, em regra, há a previsão de cobertura pelo fundo de compensação de variações salariais que garantem o equilíbrio econômico financeiro da relação obrigacional. 

IX - Em contratos anteriores a 2008, é lícita a cobrança de Taxa de Administração de Taxa de Crédito que servem para custear despesas administrativas, desde que expressamente contratadas, não configurando abuso ou condição suficiente para levar o mutuário à inadimplência. 

X - Apelação improvida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação. Honorários advocatícios majorados para 11% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.