RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001229-97.2019.4.03.6308
RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: AILTON ZANDONA
Advogado do(a) RECORRIDO: GUILHERME TRINDADE ABDO - SP271744-N
OUTROS PARTICIPANTES:
Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0001229-97.2019.4.03.6308 RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: AILTON ZANDONA Advogado do(a) RECORRIDO: GUILHERME TRINDADE ABDO - SP271744-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO E CONVERSÃO DE TEMPO TRABALHADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS EM COMUM. RUÍDO. EXIGÊNCIA DE LAUDO TÉCNICO ATÉ 28/4/1995. TÉCNICA DE MEDIÇÃO EM CONFORMIDADE COM A NHO-01 DA FUNCENTRO PARA OS PERÍODOS TEMA 174 TNU. RESPONSÁVEL TÉCNICO EXTEMPORÂNEO. INADMISSIBILIDADE. TEMA 208 TNU. PPP. POSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE ESPECIAL SOMENTE ATÉ A DATA DA ASSINATURA. PRECEDENTES. RECURSO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA. 1. Ação proposta para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. O pedido foi julgado procedente em parte. 2. Recurso da parte autora em que pleiteia o reconhecimento adicional de períodos de atividade especial por exposição a ruído. Recurso do INSS em que alega indevido reconhecimento de atividade especial por exposição a ruído após a data de assinatura do PPP e em período com exposição a ruído em intensidade variável. 3. Cabe esclarecer que com o advento do formulário PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), disciplinado desde a IN nº. 90-INSS/DC, de 16/06/1993, que foi revogada pela IN nº. 95-INSS/DC, de 07/10/2003, que por sua vez cedeu vigência à IN nº. 118-INSS/DC, de 14/04/2005 não mais se exigiu a apresentação junto ao INSS do Laudo Técnico concernente às atividades nocivas à saúde dos trabalhadores para comprovação de tempo especial, muito embora este não tenha sido abolido pela legislação e deva ser apresentado pelas empresas quando assim determinar a autoridade pública da Previdência Social. 4. A propósito dos períodos sujeitos a condições especiais, o § 3º do art. 57 da Lei nº 8.213, em sua redação original, dispunha: “O tempo de serviço exercido alternativamente em atividade comum e em atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, para e feito de qualquer benefício”. E o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 611, de 21.7.1992, esclarecia: “Art. 292. Para efeito de concessão das aposentadorias especiais serão considerados os Anexos I e II do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, até que seja promulgada a lei que disporá sobre as atividades prejudiciais à saúde e à integridade física”. 5. A Lei 9.032, de 28/4/1995, deu nova redação ao dispositivo, nesses termos: “A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Nacional-INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado”. E acrescentou a norma do § 4º: ”O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício”. 6. Assim, a Lei 9.032/95 passou a exigir a comprovação da exposição a agentes nocivos. Todavia, tal comprovação é de ser exigida apenas para os períodos posteriores a 28/04/1995, data da publicação da referida lei. Até aquela data, basta a comprovação do exercício da atividade considerada especial pela legislação. Nesse sentido: “Até o advento da Lei 9.032/95, em 29-04-95, era possível o reconhecimento do tempo de serviço especial, com base na categoria profissional do trabalhador. A partir desta norma, a comprovação da atividade especial é feita por intermédio dos formulários SB-40 e DSS-8030, até a edição do Decreto 2.172 de 05-03-97, que regulamentou a MP 1523/96 (convertido na Lei nº 9.528/97), que passou a exigir o laudo técnico (STJ, AGRESP 493.458-RS, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 23/6/2003)”. 7. Conforme entendimento firmado recentemente pela TNU (Tema 174), “a partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma”. 7.1. Em complementação, definiu-se que “em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma”. 8. Há possibilidade de conversão do tempo de serviço a qualquer momento, conforme Súmula 50 da TNU, vazada nos seguintes termos: “é possível a conversão do tempo de serviço especial em comum do trabalho prestado em qualquer período”. A TNU tem admitido a chamada “conversão inversa”, de tempo especial em comum, para vínculos laboratícios ocorridos entre 1/1/1981 e 28/4/1995, porém apenas para casos com requerimento administrativo anterior à promulgação da Lei 9.032/1995. 9. Os períodos de tempo especial suscetíveis de conversão para comum são regulados, nos termos da IN/INSS 78, de 16/07/2002 e IN nº. 118-INSS/DC, de 14/04/2005 (data a partir da qual não mais se exigiu a apresentação junto ao INSS do Laudo Técnico, mas apenas PPP), a saber: 1) até 28/04/1995 - Decreto nº 53.831/64, anexos I e II do RBPS aprovado pelo Decreto nº 83.080/79, dispensada apresentação de Laudo Técnico, exceto para ruído (nível de pressão sonora elevada = acima de 80 decibéis); 2) de 29/04/1995 a 05/03/1997 - anexo I do Decreto nº 83.080/79 e código “1.0.0” do anexo ao Decreto nº 53.831/64, com apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando for ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 80 decibéis); 3) de 06/03/1997 a 18/11/2003 - anexo IV do Decreto nº 2.172/97, substituído pelo Decreto nº 3.048/99, exigida apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 90 decibéis). 4) a partir de 19/11/2003 - art. 2º do Decreto nº 4.882 de 18/11/2003, exigida a apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 85 decibéis). 9.1. Sobre a técnica de medição de ruído, a TNU firmou o seguinte entendimento (tema 174): a) "A partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma"; (b) "Em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma". 10. O uso de EPI, ainda que amenize ou mesmo elimine a insalubridade no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado, consoante expresso na Súmula 9 da TNU, in verbis: O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado. 10.1. O Colendo STF, em repercussão geral reconhecida recentemente sobre o assunto (ARE 664335/SC), decidiu no mesmo sentido. 10.2. Cabe observar que o uso de EPI eficaz apenas tem o condão de afastar a exposição a agentes nocivos a partir de 3/12/1998, data da publicação da MP 1.729, posteriormente convertida na Lei 9.732/1998. 11. O PPP serve como um retrato do período laborado pelo empregado, ao indicar os vínculos empregatícios e suas respectivas durações, as atividades desenvolvidas e eventuais agentes nocivos com que o trabalhador teve contato. Contudo, para que se apure referida exposição, é necessário que tal análise seja técnica, feita por profissional especializado, sob as penas da lei. Exatamente pela natureza dessa avaliação, o PPP serve como meio de prova da especialidade. 11.1. Por outro lado, o PPP emitido sem a indicação do responsável pelos registros ambientais perde a chancela especializada supramencionada, servindo como mera reprodução das informações constantes na carteira de trabalho do segurado. Mais que isso, a admissão de um PPP preenchido de forma incompleta como meio de prova de atividade especial representaria considerável risco ao sistema de Previdência Social, por viabilizar fraudes. 12. Acerca da extemporaneidade do PPP, passei a adotar a tese firmada no julgamento do tema 208 da TNU: “para a validade do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) como prova do tempo trabalhado em condições especiais nos períodos em que há exigência de preenchimento do formulário com base em Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), é necessária a indicação do responsável técnico pelos registros ambientais, sendo dispensada a informação sobre monitoração biológica. 2. A ausência da informação no PPP pode ser suprida pela apresentação de LTCAT ou por elementos técnicos equivalentes, cujas informações podem ser estendidas para período anterior ou posterior à sua elaboração, desde que acompanhados da declaração do empregador sobre a inexistência de alteração no ambiente de trabalho ou em sua organização ao longo do tempo”. 13. Firmadas tais premissas, passo à análise do caso. 14. Para os períodos de 15/05/1985 a 30/11/1986 e de 03/11/1986 a 15/06/1994 (Posto Flash Car Ltda.), o PPP de fls. 52/53 da inicial informa exposição a benzeno e tolueno, sem uso de EPI eficaz, porém com responsável técnico extemporâneo (2015 a 2019). Portanto, diante do entendimento da TNU no tema 208, que passei a aplicar recentemente, não pode ser reconhecido como especial. 15. Para o período de 03/11/1986 a 15/06/1994, o PPP de fls. 67/68 da petição 172857674 (juntada em 19/12/2019) informa responsável técnico somente a partir de 2009. Com efeito, pelo mesmo fundamento, não comporta reconhecimento como especial. O recurso da parte autora não comporta provimento. 16. Assiste parcial razão ao INSS. Para o período de 13/8/2013 a 18/3/2019, a parte apresentou o PPP de fls. 24/25 da mesma petição. O documento informa ruído variável de 78 a 97 decibéis. 16.1. Sobre a questão da exposição a ruído variável, destaco que nos autos do PEDILEF 5002543-81.2011.4.04.7201, representativo da controvérsia, a Turma Nacional de Uniformização firmou a tese de que na hipótese de exposição ao agente nocivo ruído em níveis variados, deve ser realizada a média aritmética simples entre as medições de ruído encontradas, afastando-se a técnica de picos de ruído, que considera apenas o limite máximo da variação. No caso concreto, a média encontrada é superior ao limite de tolerância da época. 16.2. Nesse ponto, portanto, sem razão o INSS. 17. Nada obstante, o PPP em questão foi assinado em 29/11/2018, e em sentença houve o reconhecimento de atividade especial até 18/3/2019, o que não se pode admitir, uma vez que a análise técnica não se reveste de caráter prospectivo, por coerência lógica, ainda que o vínculo tenha se pertetuado no tempo. Em outras palavras, “não se pode considerar, sem qualquer lastro documental para tanto, que tais condições especiais perduraram após a data em que o documento foi expedido, sob pena de haver julgamento baseado em hipótese que, apesar de possível, não se encontra comprovada nos autos” (ApCiv 5005282570184036183, rel. Des. Fed. Marisa Ferreira dos Santos, TRF3, j. em 2/12/2019). 17.1. Com lastro em tal entendimento, conclui-se que o período de 30/11/2018 a 18/3/2019 não pode ser reconhecido como especial. 18. Com efeito, assiste razão parcial ao INSS. Melhor sorte não assiste à parte autora. 19. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso do INSS, para deixar de reconhecer como especial o período de 30/11/2018 a 18/3/2019, e nego provimento ao recurso da parte autora. 20. Deixo de condenar a parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios segundo prevê o artigo 55 da Lei 9.099/1995 c/c artigo 1º da Lei 10.259/2001 e do artigo 1.046, § 2º do Código de Processo Civil/2015, na medida em que, não tendo sido apresentadas contrarrazões de recurso pelo patrono da parte recorrida, inexiste embasamento de ordem fática para a aplicação do artigo 85, caput e seu § 1º, em virtude do que dispõe o § 2º do mesmo artigo do CPC/2015. É como voto. São Paulo, 16 de fevereiro de 2022 (data do julgamento). JUIZ FEDERAL RELATOR
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO E CONVERSÃO DE TEMPO TRABALHADO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS EM COMUM. RUÍDO. EXIGÊNCIA DE LAUDO TÉCNICO ATÉ 28/4/1995. TÉCNICA DE MEDIÇÃO EM CONFORMIDADE COM A NHO-01 DA FUNCENTRO PARA OS PERÍODOS TEMA 174 TNU. RESPONSÁVEL TÉCNICO EXTEMPORÂNEO. INADMISSIBILIDADE. TEMA 208 TNU. PPP. POSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE ESPECIAL SOMENTE ATÉ A DATA DA ASSINATURA. PRECEDENTES. RECURSO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA.