RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0019321-13.2020.4.03.6301
RELATOR: 43º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: DORVAL TEMOTEO MARTINS
Advogado do(a) RECORRENTE: LETICIA ROMUALDO SILVA - SP320447-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0019321-13.2020.4.03.6301 RELATOR: 43º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: DORVAL TEMOTEO MARTINS Advogado do(a) RECORRENTE: LETICIA ROMUALDO SILVA - SP320447-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de pedido de uniformização de interpretação de lei federal interposto pela parte autora em face de acórdão proferido por esta 15ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária de São Paulo. Alega, em apertada síntese, que é portador de doença (cegueira – visão monocular) a qual, por sua gravidade, incapacita-lhe para sua atividade laborativa habitual. Em razão disso, requer a concessão de benefício por incapacidade. Sustenta o seguinte: "Interposto o recurso inominado, com a alegação de que, o estado de saúde da ParteAutora não condizcom o alegado na sentença proferida. Ademais, foi baseada em uma prova que contraria toda a documentação médica juntada aos autos. Além do mais, em que pese o Nobre Perito tenha entendido pela capacidade laboral do Demandante, caberia ser feita uma análise de suas condições pessoais, uma vez que, a investigação da situação incapacitante transcende a mera patologia, devendo ser considerado todo o entorno ao qual está inserida, conforme súmula 29/TNU.ATurma Recursal manteve a decisão denegatória, mantendo a sentença por seus próprios fundamentos: Veja-se que o entendimento adotado pelo Juízo “a quo”, e confirmado pela Turma Recursal é no sentido de que pessoas com cegueira de um olho só, como o periciando, é incapaz de exercer atividades que necessitam de visão binocular. Como apresenta visão normal no olho esquerdo o periciando é capaz de exercer atividades profissionais que lhe garantam sua subsistência. Diante desse quadro, não ficou caracterizada incapacidade atual para a sua atividade habitual de ajudante geral. Tal entendimento esposado na sentença e mantido no acórdão da Turma Recursal não merece prosperar, estando em desconformidade com Súmula 377 do STJ, que reconhece a condição incapacitante do portador de visão monocular. Assim, havendo contrariedade entre a decisão apresentada no corrente feito, e a sumula do STJ, bem como a decisão da TNU, cabe o presente pedido de uniformização, a ser julgado e provido." Acrescenta que “o entendimento da Turma Nacional de Uniformização diverge e muito da decisão Recorrida. Segundo o posicionamento firmado por esta egrégia Turma de Uniformização, portadores de visão monocular, devem ser investigadas, no caso concreto, as condições pessoais, sociais e econômicas da parte requerente, ou seja, a cegueira de um dos olhos, por si só, não inviabiliza a concessão do benefício por incapacidade: Para que não reste dúvidas, veja-se a decisão proferida do PEDILEFnº 0003746-95.2012.4.01.4200”. É o breve relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0019321-13.2020.4.03.6301 RELATOR: 43º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: DORVAL TEMOTEO MARTINS Advogado do(a) RECORRENTE: LETICIA ROMUALDO SILVA - SP320447-A RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Nos termos do artigo 14, IV, da Resolução n. 586/2019 - CJF, os autos devem ser encaminhados à Turma de origem para eventual juízo de retratação, quando o acórdão recorrido divergir de entendimento consolidado: a) em regime de repercussão geral ou de acordo com o rito dos recursos extraordinários e especiais repetitivos pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça; b) em recurso representativo de controvérsia pela Turma Nacional de Uniformização ou em pedido de uniformização de interpretação de lei dirigido ao Superior Tribunal de Justiça; c) em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em incidente de assunção de competência que irradiem efeitos sobre a Região; ou d) em súmula ou entendimento dominante do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou da Turma Nacional de Uniformização. No caso concreto, a discussão levantada refere-se a entendimento da Turma Nacional de Uniformização, no sentido de que, em se tratando de portadores de visão monocular, devem ser investigadas, no caso concreto, as condições pessoais, sociais e econômicas da parte requerente. Veja-se, a propósito: “INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR. DECRETO 3.298/99. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. INCAPACIDADE QUE DEVE SER CONJUGADA COM AS CONDIÇÕES PESSOAIS. SÚMULA 29 DA TNU. ESTUDO SOCIOECONÔMICO NÃO REALIZADO. QUESTÃO DE ORDEM 20/TNU. INCIDENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (...) Como se sabe, a jurisprudência desta Turma Nacional de Uniformização é remansosa no sentido de que a parcialidade da incapacidade não impede, por si só, o deferimento do benefício perseguido, sendo de rigor a análise das condições pessoais da parte e da possibilidade da sua reinserção no mercado de trabalho. Nessa esteira, a Súmula 29 desta Corte afirma que, para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, a incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a que a impossibilita de prover ao próprio sustento. No caso vertente, verifico que o acórdão recorrido, após efetuar interpretação da prova médico-pericial, afirmou que a autora é capaz para o trabalho, só que, passo seguinte, atestou categoricamente que ela é cega do olho esquerdo (visão monocular) e possui visão embaçada (20/60) no olho direito, podendo desempenhar outra profissão que não a de cabelereira. Todavia, sendo a requerente portadora de deficiência visual grave, a mesma se enquadra no conceito de deficiência previsto no art. 4º, III, do Decreto nº3.298/99, que regulamentou a Lei 7.853, de 24/10/1989 (dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência), mostrando-se irrelevante, portanto, que o expert tenha consignado sua capacidade para atividades laborativas. A propósito, a Súmula 377 do STJ reconhece essa condição ao asseverar que "o portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes". Reputo que a condição da autora, retratada no acórdão recorrido, por si só, já representa um quadro de incapacidade severa, deixando a sua portadora, inclusive, com grandes dificuldades para competir no mercado normal de trabalho, máxime em tempos como estes, nos quais as pessoas com sentidos favoráveis já padecem para conseguir um emprego para sua sobrevivência. Assim, é imperioso que se afirme nesta oportunidade a incapacidade parcial e permanente da autora, hoje com 55 anos de idade, e, ato contínuo, determine-se a instância "a quo" a que proceda ao exame das condições socioeconômicas da requerente, na esteira do entendimento consolidado por esta TNU nas Súmulas 29 e 80. Por conseguinte, deve ser anulado o acórdão recorrido para que se cumpra esse desiderato, especialmente em face da impossibilidade de reexame de matéria fática por esta TNU. (...) 0003523-82.2015.4.03.6302 900000069411 .V5 (PEDILEF n. 0003746-95.2012.4.01.4200)”. O acórdão recorrido, no essencial ao exame do pedido de uniformização, adotou os seguintes fundamentos: "Da análise do laudo pericial e dos documentos constantes dos autos, conclui-se que não há motivo para se desconsiderar a conclusão do médico nomeado pelo Juízo de origem. Com efeito, o perito do juízo diagnosticou cegueira no olho direito e visão normal no olho esquerdo. Nesse contexto, registro que a visão monocular impõe limitações somente para atividades que exijam maior precisão e amplo campo visual, percepção sensorial aguçada dos olhos e de profundidade da visão, como pontuado no laudo pericial. No caso, o autor exercia a atividade de ajudante geral, a qual, segundo a opinião do perito, pode ser exercida a despeito da deficiência visual. Logo, diante do que consta do laudo pericial, devem ser acolhidos os fundamentos expostos pela sentença recorrida, abaixo reproduzidos: “Constitui, outrossim, condição inafasável para a concessão da aposentadoria por invalidez incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. Por incapacidade deve reconhecer-se a impossibilidade de exercer atividade laborativa em virtude da enfermidade que acomete o segurado, o que demanda, à evidência, produção de prova pericial. Se é certo que o disposto no art. 42, § 1º, da Lei 8.213/91 determina, no âmbito administrativo, a produção de prova pericial a cargo do Instituto Nacional do Seguro Social, também e de se reconhecer que mesmo no bojo do processo judicial o reconhecimento da impossibilidade do exercício de atividade laborativa depende da produção de prova pericial. A perícia realizada em juízo concluiu pela inexistência de incapacidade que justifique a concessão do benefício. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO.” Logo, do exame dos autos, constata-se que todas as questões discutidas no recurso foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Primeiro Grau." Do exame dos autos, constata-se que não é cabível o juízo de retratação. Isso porque o entendimento da TNU mencionado no pedido de uniformização refere-se à concessão de benefício assistencial e, por isso, não encontra integral aplicação no caso concreto, no qual se postula a concessão de benefício por incapacidade. Outrossim, o perito não apontou a existência de incapacidade para o trabalho, como se nota da transcrição do trecho do laudo abaixo: "ANÁLISEEDISCUSSÃODOSRESULTADOS Trata-se de periciando submetido à cirurgia de catarata do olho direito em outubro/19 que evoluiu com descolamento de retina e sem melhora da acuidade visual, comprovado por relatório médico de 21/9/20 anexado ao laudo pericial (anexo). Odescolamento de retina é caracterizado pela separação anatômica entre o epitélio pigmentar da retina e a retina neuro-sensorial, ficando esse espaço preenchido por líquido sub-retiniano. Esta condição pode ser causada por trauma, processo de envelhecimento, tumor ou distúrbio inflamatório, mas muitas vezes ocorre espontaneamente. A miopia pode ser um fator predisponente. O tratamento na maior parte dos casos é cirúrgico. O periciando apresenta visão normal no olho esquerdo não sendo encontradas, no exame oftalmológico, alterações ou patologias que pudessem interferir com a função visual desse olho além de discreto vício de refração corrigido com o uso dos óculos, obrigatórios para curtas distancias por sua idade.A acuidade visual obtida no exame pericial alcança 0,8 (95% capacidade) nesse olho. Em recente avaliação de setembro/20 a acuidade visual do olho direito alcançou 20/25, valores concordes aos achados na perícia atual (anexo). Acegueira de um olho traz prejuízos para a função da visão binocular a qual pode acarretar certas dificuldades em manusear objetos, porém estas dificuldades variam de indivíduo para indivíduo e cedem com o passar do tempo. Na presente situação o Autor tem déficit tanto no campo visual binocular (conjunto de imagens percebidas), como também na estereopsia (noção de profundidade). No caso da estereopsia, embora haja déficit pela falta de visão de um dos olhos, ela não depende, entretanto, exclusivamente da presença de visão dos dois olhos, pois é também composta pelas informações recebidas, por exemplo, pelo tamanho aparente dos objetos (os pequenos situam-se mais distantes, os maiores, mais próximos), pela sobreposição de contornos (os mais próximos se sobrepõem aos mais distantes), etc. Com cegueira de um olho o periciando é incapaz de exercer atividades que necessitam da visão binocular. Desvinculado em 05/2020, sua atividade habitual é de ajudante geral, atividade que não necessita da visão binocular podendo ser exercida com visão monocular e com a atual visão do periciando. A visão binocular proporciona principalmente a noção de distância, profundidade e perspectiva (estereopsia) sendo importante em profissões que envolvam segurança no trabalho para a própria pessoa e/ou usuários desse trabalho como aviadores, motoristas profissionais, atividades em altura ou trabalhadores em área de segurança. Como apresenta visão normal no olho esquerdo o periciando é capazde exercer atividades profissionais que lhe garantam sua subsistência. Diante desse quadro, não ficou caracterizada incapacidade atual para a sua atividade habitual de ajudante geral. COM BASE NOS ELEMENTOS E FATOS EXPOSTOS E ANALISADOS, CONCLUI-SE Não caracterizada situação de incapacidade atual para sua atividade habitual no âmbito da Oftalmologia. O periciando é capaz de exercer atividades profissionais que lhe garanta sua subsistência, inclusive sua atividade habitual." Aplica-se no caso, portanto, a Súmula 77 da TNU, segundo a qual, “o julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”. Ante o exposto, voto por não exercer o juízo de retratação. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE UNIFORIZAÇÃO NACIONAL. PLEITO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUTOR PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR. LAUDO PERICIAL QUE NÃO APONTA INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE HABITUAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA 77 DA TNU. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDO.