RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0003421-70.2019.4.03.6318
RELATOR: 44º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MARIA ELIZADETH SILVA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRIDO: MARCOS DA ROCHA OLIVEIRA - SP201448-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0003421-70.2019.4.03.6318 RELATOR: 44º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA ELIZADETH SILVA DE OLIVEIRA Advogado do(a) RECORRIDO: MARCOS DA ROCHA OLIVEIRA - SP201448-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré de sentença que julgou procedente o pedido para condenar o INSS a implantar o benefício assistencial de prestação continuada em favor da parte autora com DIB na data do ajuizamento da ação, 06/09/2019. A parte recorrente requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso. No mérito, sustenta que a parte autora não comprovou ser pessoa com deficiência de longo prazo, nem que está em situação de miserabilidade, que a DIB deve ser fixada na data da juntada do laudo médico e que os juros e correção monetária devem ser fixados de acordo com o artigo 1º-F da lei 9.494/1996, com redação dada pela Lei 11.960/2009, observada a prescrição quinquenal, motivos pelos quais postula a reforma do julgado. Foram apresentadas contrarrazões. É o relatório.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0003421-70.2019.4.03.6318 RELATOR: 44º Juiz Federal da 15ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: MARIA ELIZADETH SILVA DE OLIVEIRA Advogado do(a) RECORRIDO: MARCOS DA ROCHA OLIVEIRA - SP201448-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, nego efeito suspensivo ao recurso, pois não foi demonstrado o risco de dano irreparável a que se refere o art. 43 da Lei 9.099/95. Passo à análise do mérito. O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, inciso V, da Constituição de 1988, e foi regulamentado pelo art. 20 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), consistindo na garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. São requisitos para a sua concessão: de um lado, sob o aspecto subjetivo, a deficiência ou a idade, e de outro lado, sob o aspecto objetivo, a incapacidade de prover à própria subsistência ou de tê-la provida por seus familiares (miserabilidade). Pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo, assim considerado aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 20, §§ 2º e 10). Nos termos do art. 20, §3º: “Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”. O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE 567985/MT, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, dessa disposição. Entendeu-se que é possível a aferição da miserabilidade a partir de outros critérios, com atenção para as Leis 10.836/2004, 10.689/2003, 10.219/01 e 9.533/97, que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais. O art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/03, determina que o benefício assistencial concedido a qualquer membro da família idoso não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. O STF reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, para o fim de estender os efeitos da norma aos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por idosos (RE 580963/PR). Atualmente, a LOAS expressamente autoriza a utilização de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade (art. 20, §11, introduzido pela Lei 13.146/15). Nesse sentido, o critério que deve nortear o exame do requisito econômico é o da efetiva necessidade do auxílio (TNU, PEDILEF 2008709500006325). Por isso mesmo, a presunção de miserabilidade que decorre do enquadramento no critério da renda per capita do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 pode ser afastada por outros elementos de prova (TNU, PEDILEF 50004939220144047002, representativo de controvérsia). No caso dos autos, o requisito subjetivo foi preenchido. Segundo o perito, a parte autora é portadora de esquizofrenia, com incapacidade total e temporária desde 09/05/2019. O perito estimou o período de 12 meses para reavaliação da parte, a contar da data da perícia médica. Considerando a existência de incapacidade desde maio de 2019 e da estimativa de manutenção do quadro ao menos até novembro de 2021, resta configurado o impedimento de longo prazo (superior a 2 anos), capaz de obstruir a participação plena e efetiva da autora na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 20, §§ 2º e 10), restando preenchido o requisito subjetivo. Quanto ao requisito objetivo, denota-se do laudo socioeconômico o seguinte: o grupo familiar é composto apenas pela parte autora, que não aufere renda, cujo sustento é garantido pela ajuda esporádica da filha, de um irmão e da ex-patroa. Desta forma, diante da ausência de renda da parte autora e da conclusão do laudo socioeconômica no sentido de que ela encontra-se em situação de vulnerabilidade social, concluo que restou demonstrada a efetiva necessidade do auxílio assistencial, a justificar a procedência do pedido. Contudo, a sentença merece reparo quanto à data de início do benefício. Considerando que a data de início da incapacidade - DII é posterior à data de entrada no requerimento e anterior ao ajuizamento da ação, o benefício é devido desde a data da citação, conforme tranquilo entendimento jurisprudencial: Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (STJ, Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016) PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. DII FIXADA NA PERÍCIA EM DATA POSTERIOR À DER, PORÉM ANTERIOR À DATA DO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. EM CASOS COMO ESTE, A DII DEVE SER FIXADA JUDICIALMENTE NA DATA DA CITAÇÃO. PRECEDENTES DESTE COLEGIADO. INCIDENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Trata-se de incidente de uniformização, suscitado pelo ente público, pretendendo a reforma de acórdão oriundo de Turma Recursal que, alterando a sentença, entendeu que o benefício de auxílio-doença é devido desde a DII fixada no laudo pericial, não desde a data do ajuizamento. No caso, entendeu-se que, como a DII era posterior à DER, porém anterior à data do ajuizamento, a DIB deveria com ela coincidir. 2. O acórdão recorrido, no ponto em que é atacado pelo presente recurso, após examinar os documentos apresentados nos autos, concluiu nos seguintes termos: “A perícia judicial (evento 18) realizada por médica especialista em fisiatria bem como medicina do trabalho, apontou que a postulante é portadora de transtornos especificados de discos intervertebrais (CID M51.8), desde aproximadamente 2009-2010, estando incapacitado para o labor desde aproximadamente abril de 2011, ou seja, data posterior a DER - 04/01/2011. Em casos como o em tela, a jurisprudência permite a concessão do amparo desde a data de início de incapacidade fixada pelo perito, conforme precedentes: [...] Desta forma, o benefício é devido desde a data de início da incapacidade, nos termos do artigo 60 da Lei 8213/91.” 3. O ente público sustenta o cabimento do pedido de uniformização, por entender que o acórdão recorrido está em confronto com a jurisprudência da TNU: “Ante o exposto, voto por conhecer e dar parcial provimento ao pedido para uniformizar o entendimento de que “quando a perícia e o acórdão recorrido concluíram que a incapacidade iniciou após o requerimento administrativo e antes do ajuizamento da ação, o termo inicial da condenação ou data de início da aposentadoria por invalidez (DIB) deve corresponder à data do ajuizamento da ação”. (PEDILEF n.º 200663060104838, relatora a Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva, julgado no dia 18/12/2008. 4. A Lei nº 10.259/2001 prevê o incidente de uniformização quando “houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei” (art. 14, caput). Caberá à TNU o exame de pedido de uniformização que envolva “divergência entre decisões de turmas de diferentes regiões ou da proferida em contrariedade a súmula ou jurisprudência dominante do STJ” (art. 14, § 4º). 5. No caso, o incidente comporta conhecimento. Do cotejo entre o acórdão recorrido e o julgado paradigma, observo que está caracterizada a divergência de entendimento quanto ao direito material posto em análise nos autos. 6. Este colegiado já firmou sua jurisprudência no sentido de que, em casos como este, o benefício é devido desde a citação: “A respeito da matéria debatida, esta TNU já decidiu que, se a data da incapacidade é posterior ao requerimento administrativo/cessação do benefício e anterior ao ajuizamento da ação, deve ser fixada como DIB a data da citação do INSS, consoante, dentre vários no mesmo sentido, precedente a seguir transcrito, plenamente aplicável à hipótese ora analisada [...].” (PEDILEF n.º 0502822-61.2014.4.05.8107, relatora o Juíza Federal Maria Lúcia Gomes De Souza, julgado no dia 22/06/2017). 7. Pedido de uniformização conhecido e provido em parte, para determinar o retorno dos autos à Turma Recursal de origem para aplicação da diretriz ora fixada. Decide a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência DAR PROVIMENTO AO INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO, nos termos do voto-ementa do relator.” (PEDILEF 50078230920114047112, JUIZ FEDERAL BIANOR ARRUDA BEZERRA, TNU, DOU 12/09/2017 PÁG. 49/58.). Por fim, a correção monetária e os juros da mora incidentes sobre o valor da condenação foram fixados corretamente pela sentença, na forma prevista na Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal, cujos critérios estão de acordo com o julgamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 870.947, ao afastar a atualização monetária pela variação da TR e estabelecer a incidência de juros da mora em percentual idêntico aos aplicados à caderneta de poupança para débitos não tributários, a partir de julho de 2009, nas ações condenatórias em geral e nas ações previdenciárias, e atualização e juros da mora pela variação da Selic para os débitos tributários. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso do INSS para fixar a DIB em 06/11/2019. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios tendo em vista que o art. 55 da Lei nº 9.099/95 prevê que só poderá haver condenação do recorrente vencido. É o voto.
E M E N T A
LOAS. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. RECURSO DO INSS IMPUGNA O REQUISITO OBJETIVO E SUBJETIVO. LAUDO SOCIOECONÔMICO. MISERABILIDADE COMPROVADA. LAUDO MÉDICO. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO CONFIGURADO. BENEFÍCIO DEVIDO. DATA DE INÍCIO DA INCAPACIDADE POSTERIOR À DER E ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE A CITAÇÃO. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO.