Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003218-52.2020.4.03.6103

RELATOR: Gab. 24 - JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL

Advogado do(a) APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL - SP383310-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003218-52.2020.4.03.6103

RELATOR: Gab. 24 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

 

APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL

Advogado do(a) APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL - SP383310-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Juíza Federal Convocada Vanessa Mello:

Trata-se de apelação interposta pelo INSS em ação proposta por JOÃO GABRIEL ASSIS MACIEL, inscrito no CPF sob o nº 381.190.788-37, nascido em 14-07-1987, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, cujo pedido é o pagamento de pensão por morte de VICTOR FRANCISCO DE SOUZA, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o nº 000.992.779-33, no período de dezembro de 2014 a outubro de 2018.

A sentença de procedência consta dos autos – ID 142995695. Conforme o julgado:

“Em face do exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo procedente o pedido, para condenar o INSS a efetuar o pagamento ao autor das parcelas vencidas referentes à pensão por morte (NB 192.120.390-8), no período de dezembro de 2014 a outubro de 2018.

Tais valores serão acrescidos de juros e correção monetária, calculados na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução CJF nº 134/2010, com as alterações da Resolução CJF nº 267/2013.

Condeno-o, finalmente, ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação.

Tópico síntese (Provimento Conjunto nº 69/2006):

Nome do segurado: Adriana dos Santos.

Nome da beneficiária: João Gabriel Assis Albuquerque Souza.

Número do benefício: 192.120.390-8.

Benefício concedido: Pensão por morte.

Renda mensal atual: A calcular pelo INSS.

Data de vigência do benefício: dezembro de 2014 a outubro de 2018.

Renda mensal inicial: A calcular pelo INSS.

Data do início do pagamento: Prejudicada, tendo em vista que não há cálculo do contador judicial.

CPF: 381.190.788-37.

Nome da mãe Soraia Assis.

PIS/PASEP 21067704924.

Endereço: Rua Sabará, nº 710, Jardim Ismênia, São José dos Campos/SP.

Deixo de submeter a presente sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório, nos termos do art. 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil.

P. R. I.

São José dos Campos, na data da assinatura”.

 

 

A autarquia previdenciária apresentou recurso de apelação – ID 142995701.

Relatou que o falecimento do segurado ocorreu em 2012. Aduziu que o irmão do autor recebeu o benefício até a maioridade em 2014, enquanto o autor requereu, administrativamente, a pensão no ano de 2018.

Suscitou a prescrição. Defendeu inaplicabilidade da causa impeditiva da prescrição do artigo 198, inciso I, do Código Civil. Apontou que o autor possui capacidade de discernimento, tanto que é advogado em causa própria nos presentes autos.

Asseverou que, diante da capacidade de discernimento do autor, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo “ex vi” do artigo 74, inciso II, da Lei Federal nº. 8.213/91.

Subsidiariamente, requereu dedução do benefício assistencial recebido no período. E postulou que a incidência de juros e correção monetária observem o disposto nas Leis Federais nº 11.960/2009 e 12.703/12.

Instada a fazê-lo, a parte autora ofertou contrarrazões – ID 142995707.

Vieram os autos a esta Corte.

Em manifestação, a Procuradoria Regional da República opinou pelo prosseguimento do feito sem que haja sua intervenção – ID 145636523.

O autor requereu juntada de laudos médicos comprobatórios do seu estado atual de saúde, bem como documentação acerca de suas despesas recorrentes – ID 150777148 e anexos.

Intimado a se manifestar quanto à documentação, o INSS deixou transcorrer “in albis” o prazo judicial.

É o relatório.

 

 

 

 


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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003218-52.2020.4.03.6103

RELATOR: Gab. 24 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

 

APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL

Advogado do(a) APELADO: JOAO GABRIEL ASSIS MACIEL - SP383310-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

A Juíza Federal Convocada Vanessa Mello:

Conheço da apelação em razão da satisfação de seus requisitos.

De início, analiso a preliminar de prescrição deduzida pelo INSS na apelação.

Importante consignar, nesse ponto, que a análise será realizada a partir da legislação vigente no momento do óbito do segurado, Sr. Victor Francisco de Souza, em 20-09-2012. A certidão de óbito consta de fls. 4 do ID 142995276.

À época, assim dispunha o Código Civil, na sua redação original:

Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I - os menores de dezesseis anos;

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

 

Art. 197. Não corre a prescrição:

I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.

 

Art. 198. Também não corre a prescrição:

I - contra os incapazes de que trata o art. 3º;

II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;

III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

 

De acordo com o artigo 3º, inciso II, do Código Civil (redação original), consideravam-se absolutamente incapazes os que, por deficiência mental ou enfermidade, não podiam exercer pessoalmente os atos da vida civil.

A norma não exigia ausência de discernimento. Referia-se à impossibilidade de prática de atos da vida civil, seja por deficiência mental ou enfermidade.

De outro lado, a partir da edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência - Lei Federal nº. 13.146/15, as pessoas com deficiência deixaram de figurar no rol dos absolutamente incapazes do artigo 3º do Código Civil, não sendo mais aplicável a causa interruptiva da prescrição do artigo 197, inciso I, do Código.

Especificamente com relação à pessoa portadora de deficiência, o Estatuto da Pessoa com Deficiência - Lei Federal nº. 13.146/15, esclareceu que “a pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas”." Trata-se do artigo 83.

Assim, regra geral, a pessoa portadora de deficiência é capaz para os atos da vida civil, sendo aplicável a prescrição quinquenal a partir do início da vigência das alterações da Lei Federal nº. 13.146/15, em atenção ao princípio do “tempus regit actum”.

Ressalvo, contudo, que quando inexistente acuidade para os atos da vida civil, a prescrição continua a ser obstada por força da interpretação constitucional protetiva, como já declarado na jurisprudência desta C. Corte:

PREVIDENCIÁRIO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. BENEFÍDIO DE AMPARO SOCIAL À PESSO COM DEFICIÊCIA. DIB FIXADA NA DER. PARTE AUTORA MAIOR DE 16 ANOS INCAPAZ NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. EXISTÊNCIA DE AÇÃO DE INTERDIÇÃO. ART. 3º C.C. ART. 198 DO CC. INTERPRETAÇÃO DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. RECURSO PROVIDO.

- A decisão agravada, ao considerar que o título executivo judicial reconheceu o direito ao benefício de amparo social à pessoa portadora de deficiência, mas não estipulou sua data de início, fixou a data inicial no requerimento administrativo, ressalvando todavia a observância à prescrição quinquenal, o que ensejou a interposição do agravo de instrumento.

- A parte agravante nasceu em 18.02.1982, e possuía, em 10.01.2008, quando ingressou com a ação, 26 anos de idade, contudo, em 23.05.1997, em ação de interdição, fora nomeada curadora a sua genitora, que também lhe representa nesta ação.

- De acordo com o art. 198, I, do Código Civil, não corre a prescrição contra os incapazes de que trata o art. 3º, nestes compreendidos os absolutamente incapazes de exercer os atos da vida civil, os menores de 16 (dezesseis) anos. De se salientar que, quanto ao menor incapaz, não corre prescrição e decadência, sendo que, para parte da jurisprudência, tal circunstância pode ser reconhecida de ofício, por se tratar de questão de ordem pública, passível de alteração quanto ao ponto, mesmo que em recurso exclusivo do INSS, beneficiando a parte autora (menor incapaz), sem que com isso se possa cogitar de "reformatio in pejus".

- Há razão da parte agravante, em ver afastado o decreto de prescrição quinquenal.

- É que a redação do art. 3º, do Código Civil foi alterada pela Lei n. 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), o qual incluiria na definição de absolutamente incapaz, contra o qual não corre prescrição, os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática de ato da vida civil e, os que mesmo transitoriamente não pudessem exprimir sua vontade.

- Por tais razões é que a doutrina e jurisprudência vêm se manifestando no sentido de que, para que não se incorra em vício de inconstitucionalidade, a interpretação que deve ser dada ao referido diploma protetivo da pessoa com deficiência é no sentido de que sobre as pessoas com deficiência dotadas de acuidade para os atos da vida civil, não devem mais recair as normas relativas aos incapazes, podendo realizar atos como o casamento, e, ao contrário, àqueles que falta o discernimento em razão de doença mental, como é o caso dos autos, devem ser tratados como incapazes, notadamente no que toca à aplicação da prescrição de direitos, tema tratado nos autos.

- Referida interpretação se dá justamente porque, uma lei "destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania" (art. 1º), como é o Estatuto da Pessoa com Deficiência, não pode servir para destruir direitos das pessoas em relação à qual ela visa proteger.

- Nesse sentido, o escorreito parecer ministerial, é de ser adotado em sua totalidade, como razões de decidir: "Importante relembrar que a revogação de tais hipóteses se deu com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência, constituído à luz da Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, objetivando assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania, como determina seu art. 1o (...) Porém, relevante dizer que dependendo da deficiência, o discernimento da pessoa pode ser altamente afetado, assim como sua capacidade. No caso em tela, o autor é portador de retardo do desenvolvimento neuropsicomotor, deficit visual, e nada sabe escrever. Descreve o perito médico que sua deficiência mental está no nível da imbecilidade (Num. 1659394 - p. 30). Por ser interditado (Num. 1659381 - p.8) e, como visto, segundo parecer médico, é notória sua incapacidade a qual, conforme regra revogada, seria tida como absoluta, fato este que merece proteção do Direito".

- Agravo de instrumento provido.

(TRF-3, 8ª Turma, AI 5001637-46.2018.4.03.0000, Intimação via sistema DATA: 16/08/2021, Rel. Des. Fed. LUIZ STEFANINI – grifei).

 

PROCESSUAL CIVIL. CARÊNCIA DE AÇÃO. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONTESTAÇÃO DO MÉRITO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. TERMO INICIAL. DECADÊNCIA. PRESCRIÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.

1. Nos casos em que o INSS já apresentou contestação de mérito no curso do processo judicial, restou caracterizado o interesse de agir, uma vez que há resistência ao pedido (RE 631.240 com repercussão geral reconhecida).

2. A suspensão do prazo de prescrição para os indivíduos absolutamente incapazes ocorre no momento em que se manifesta a sua incapacidade, sendo a sentença de interdição, para esse fim específico, meramente declaratória. Precedentes do STJ.

3. As alterações trazidas pela Lei n° 13.146/2015 não podem ser aplicadas às situações constituídas sob a vigência dos dispositivos modificados, não devendo correr a prescrição - seja ela do fundo de direito ou ao recebimento das parcelas vencidas - ou a decadência, antes de entrar em vigor o Estatuto da Pessoa com Deficiência.

4. Assim, considerando que a parte autora é absolutamente incapaz, em face de quem não corre prescrição ou decadência (art. 3º c/c arts. 198, I, e 208, do CC/2002, com a redação vigente à época), os valores atrasados do benefício serão devidos desde a data da cessação indevida.

5. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.

6. Preliminar rejeitada. Apelação desprovida. Implantação imediata do benefício.

(TRF-3, 10ª Turma, ApCiv 0006056-44.2016.4.03.6119, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/07/2018, Rel. Des. Fed. NELSON PORFIRIO – grifei).

 

No caso concreto, a perícia realizada pelo médico do INSS constatou que o autor é “portador de paralisia cerebral, tetraparisia, dependente de terceiros para vida diária. Faz jus à majoração 25%”. Refiro-me a fls. 55, ID 142995276.

A análise é corroborada pela documentação médica recente acostada pelo autor – ID 150777148 e anexos: o autor necessita de auxílio constante para a prática dos atos da vida comum em decorrência de sua enfermidade física.

Assim, por ocasião do óbito, com relação ao autor, o prazo prescricional estava suspenso nos termos dos então vigentes artigos 3º, inciso II e 198, inciso I, ambos do Código Civil (redação original).

E, diante da documentação médica que prova a impossibilidade de prática de atos diário sem auxílio de terceiro, também não há que incidir a prescrição a partir da vigência do Estatuto.

Superada a preliminar, passo à análise do mérito.

Trata-se de pedido de concessão de pensão por morte.

Extrai-se da doutrina a importância do benefício objeto dos autos, cujos requisitos são qualidade de segurado e dependência daquele que vier a falecer ou ter morte declarada.

Neste sentido:

"PENSÃO POR MORTE

A pensão por morte é o benefício pago aos dependentes do segurado, homem ou mulher, que falecer, aposentado ou não, conforme previsão expressa do art. 201, V, da Constituição Federal. Trata-se de prestação de pagamento continuado, substitutiva da remuneração do segurado falecido.

A pensão por morte pode ter origem comum ou acidentária.

Quando se trata de falecimento por acidente do trabalho ou doença ocupacional, a pensão por morte é considerada acidentária. Quando o óbito for decorrente de causas diversas é considerada como de origem comum. A diferenciação é importante para definição da competência jurisdicional para concessão e revisão do benefício (Justiça Federal ou Justiça Estadual) e também para os reflexos que podem gerar, dentre os quais a indenização a ser exigida dos causadores do acidente do trabalho (competência da Justiça do Trabalho).

A partir da Lei n. 8.213/ 1991, os benefícios de natureza acidentária passaram a ter o mesmo tratamento dispensado aos demais benefícios previdenciários, salvo quanto à carência e ao cálculo da RMI. A fórmula de cálculo da renda mensal foi unificada com a Lei n. 9.032, de 28.4.1995, permanecendo, a partir de então, com o mesmo sistema de cálculo dos benefícios por morte em geral. Necessário destacar que a pensão por morte é devida com o óbito do segurado, comprovada pela respectiva certidão lavrada pelo cartório competente, ou quando este tiver sua morte presumida. Daí por que não há como se cogitar de regras de transição em matéria de pensão por morte: a regra a ser aplicada é a da data do óbito (princípio tempus regit actum). Nesse sentido, a Súmula n. 340 do STJ: “A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado”.

Requisitos para a concessão do benefício

O risco social a ser coberto pela Previdência Social, no caso, é a subsistência de dependentes do segurado do RGPS, assim considerados os que estão arrolados no art. 16 da Lei de Benefícios. Assim, os requisitos para a concessão do benefício são:

– a qualidade de segurado do falecido;

– o óbito ou morte presumida deste;

– a existência de dependentes que possam se habilitar como beneficiários perante o INSS;

– para os óbitos ocorridos a partir de 15.1.2015, o cônjuge, companheiro ou companheira terá que comprovar que o óbito ocorreu depois de vertidas 18 contribuições mensais e pelo menos dois anos após o início do casamento ou da união estável (na inexistência dessas provas, a pensão tem duração de quatro meses, salvo na hipótese de o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou doença profissional ou do trabalho; ou se o cônjuge ou companheiro for portador de invalidez ou deficiência)", (Castro, Carlos Alberto Pereira de; Lazzari, João Batista. Manual de Direito Previdenciário (Locais do Kindle 18801-18810). Forense. Edição do Kindle).

 

No caso em exame, o autor é filho do segurado, conforme declarado por sentença da Justiça Estadual, prolatada em 27-09-2018 (ID 142995273). Nasceu em 14-07-1987, consoante certidão de nascimento acostada aos autos – fls. 37, ID 142995276.

Apresenta necessidade de acompanhamento médico e fisioterápico desde o nascimento.

Destaco que os documentos médicos estão bem fundamentados.

Consequentemente, presume-se a situação de dependência, a teor do disposto no art. 16, inciso I, da Lei nº 8.213/91, "in verbis":

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;"

 

Referida dependência é presumida, conforme se infere do § 4º do dispositivo citado.

No caso concreto, está incontroversa a qualidade de segurado do falecido. O INSS não impugnou a questão, em nenhum momento.

É devido o benefício de pensão por morte.

Neste sentido:

"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO. FILHO INVÁLIDO. DEPENDÊNCIA COMPROVADA NA DATA DO ÓBITO. 1. A pensão por morte é benefício devido ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer e, para a sua concessão, é indispensável que se prove, no momento do óbito, a qualidade de segurado do instituidor e a condição de dependente econômico (a) do (a) requerente. 2. O INSS resiste ao reconhecimento do direito, alegando que a incapacidade adveio após o óbito da segurada. Todavia, não resta dúvida de que a invalidez antecedeu o falecimento da instituidora, vez que a perícia realizada em 2015 firmou que a doença incapacitante - transtorno mental grave - se deu desde o nascimento. Assim, embora a incapacidade total tenha sido firmada com o processo de interdição posterior ao falecimento da mãe do autor, a incapacidade era a ele anterior. 3. Apelação desprovida", (TRF-1 - AC: 00445097420154019199, Relator: JUIZ FEDERAL SAULO JOSÉ CASALI BAHIA, Data de Julgamento: 29/03/2019, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, Data de Publicação: 03/05/2019).

 

A controvérsia dos autos diz com o pagamento dos valores atrasados, no período de dezembro de 2014 a outubro de 2018, data do requerimento administrativo.

O artigo 76 da Lei Federal nº. 8.213/91 determina que “a concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação”.

Na hipótese, o reconhecimento judicial da filiação ocorreu por injunção de sentença prolatada em 27-09-2018 (ID 142995273).

Tratando-se de inclusão posterior de dependente, não é possível retroagir o pagamento do benefício para momento anterior ao requerimento administrativo, quando o INSS pode ter ciência da existência da situação de fato.

Consoante doutrina:

"No julgamento do Resp 1.479.948, prevaleceu o entendimento de que a habilitação posterior do dependente somente deverá produzir efeitos a contar desse episódio, de modo que não há falar em efeitos financeiros para momento anterior à inclusão do dependente, sob pena de o INSS ter de pagar duplamente o valor da pensão.732 No caso, o anterior beneficiário era pai da autora e marido da instituidora, razão pela qual, integrando o mesmo núcleo familiar, não haveria sentido determinar o pagamento de valores que já beneficiaram a própria demandante. Não concordamos, contudo, com esta solução quando estiver em discussão o direito de dependente absolutamente incapaz que não integra o núcleo familiar que foi favorecido com o pagamento do benefício. Entretanto, o STJ vem decidindo que o dependente incapaz não teria direito ao recebimento do referido benefício a partir da data do falecimento do instituidor se outros dependentes já recebiam o benefício. Do contrário, a Autarquia previdenciária seria condenada duplamente a pagar o valor da pensão733", (da Rocha, Daniel Machado. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social (pp. 485-486). Atlas. Edição do Kindle).

 

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRlO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. FILIAÇÃO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE AJUIZADA TRÊS ANOS DEPOIS DO ÓBITO DO INSTITUIDOR. HABILITAÇÃO TARDIA (ARTS. 74 E 76 DA LEI 8.213/1991). OUTROS DEPENDENTES HABILITADOS. INÍCIO DO BENEFÍCIO. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.

1. Consoante a jurisprudência do STJ, o dependente incapaz que não pleiteia a pensão por morte no prazo de trinta dias a contar da data do óbito do segurado (art. 74 da Lei n. 8.213/1991) não tem direito ao recebimento do referido benefício a partir da data do falecimento do instituidor, considerando a informação de que outros dependentes já recebiam o benefício, evitando-se a dupla condenação da autarquia previdenciária.

2. No caso dos autos, há considerar que somente em 6/5/2010, passados quase 3 (três) anos da data do óbito (31/7/2007), é que a ora recorrente ingressou com requerimento administrativo junto ao INSS pleiteando o benefício de pensão por morte, mas sem apresentar a documentação necessária para comprovar a sua filiação, o que só ocorreu com o ajuizamento da ação de investigação de paternidade (2010).

3. Conforme precedente desta Corte, "a concessão do benefício para momento anterior à habilitação da autora acarretaria, além da inobservância dos arts. 74 e 76 da Lei 8.213/1991, inevitável prejuízo à autarquia previdenciária, que seria condenada a pagar outra duplamente o equivalente a uma cota do valor da pensão, sem que, para justificar o duplo custo, tenha praticado qualquer ilegalidade na concessão do benefício aos dependentes regularmente habilitados por ocasião do óbito do instituidor e que receberam 100% do benefício" (REsp 1.377.720/SC, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 5/8/2013).

4. Agravo interno não provido.

(STJ, 1ª Turma, AgInt nos EDcl no REsp 1610128/PR, j. 16/10/2018, DJe 22/10/2018, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES – grifei).

 

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. TERMO INICIAL. MENOR ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. DATA DO ÓBITO. TEMPUS REGIT ACTUM. PLURALIDADE DE PENSIONISTAS. RATEIO DO BENEFÍCIO. RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE POST MORTEM. RECEBIMENTO DE VALORES PELA VIÚVA, PREVIAMENTE HABILITADA. INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DAS VERBAS PREVIDENCIÁRIAS.

1. A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é a vigente na data do óbito do segurado (tempus regit actum).

2. Aplica-se o art. 74 da Lei de Benefícios, na redação vigente à época da abertura da sucessão (saisine), motivo pelo qual o termo inicial da pensão por morte é a data do óbito.

3. Havendo mais de um pensionista, a pensão por morte deverá ser rateada entre todos, em partes iguais, visto ser benefício direcionado aos dependentes do segurado, visando à manutenção da família.

4. Antes do reconhecimento da paternidade, seja espontâneo, seja judicial, o vínculo paterno consiste em mera situação de fato sem efeitos jurídicos. Com o reconhecimento é que tal situação se transforma em relação de direito, tornando exigíveis os direitos subjetivos do filho.

5. Ainda que a sentença proferida em ação de investigação de paternidade produza efeitos ex tunc, há um limite intransponível: o respeito às situações jurídicas definitivamente constituídas.

6. O mero conhecimento sobre a existência de ação de investigação de paternidade não é suficiente para configurar má-fé dos demais beneficiários anteriormente habilitados no recebimento de verbas previdenciárias e afastar o princípio da irrepetibilidade de tais verbas.

7. A filiação reconhecida em ação judicial posteriormente ao óbito do instituidor do benefício configura a hipótese de habilitação tardia prevista no art. 76 da Lei n. 8.213/1991.

8. Recurso especial conhecido e provido.

(STJ, 3ª Turma, REsp 990.549/RS, j. 05/06/2014, DJe 01/07/2014, Rel. p/ Acórdão Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – grifei).

 

O pedido é, portanto, improcedente.

Inverto os ônus sucumbenciais. Condeno a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios de 10% do valor dado à causa, observada a suspensão de exigibilidade decorrente da gratuidade judicial.

Diante do exposto, dou provimento à apelação do INSS.

É o voto.

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. CAUSA OBSTATIVA DA PRESCRIÇÃO. ALTERAÇÃO DECORRENTE DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INACUIDADE PARA A VIDA DIÁRIA. FILHO INVÁLIDO. INVALIDEZ ANTECEDENTE À DATA DO ÓBITO. DEPENDÊNCIA PRESUMIDA. RECONHECIMENTO JUDICIAL DA FILIAÇÃO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO A PARTIR DA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.

1- De acordo com o artigo 3º, inciso II, do Código Civil (redação original), considerava-se absolutamente incapazes os que, por deficiência mental ou enfermidade, não podiam exercer pessoalmente os atos da vida civil. A norma não exigia a ausência de discernimento. Referia-se a impossibilidade de prática de atos da vida civil, seja por deficiência mental ou enfermidade.

2- De outro lado, a partir da edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei Federal nº. 13.146/15), as pessoas com deficiência deixaram de figurar no rol dos absolutamente incapazes do artigo 3º do Código Civil, não sendo mais aplicável a causa interruptiva da prescrição do artigo 197, inciso I, do Código. Assim, regra geral, a pessoa portadora de deficiência é capaz para os atos da vida civil, sendo aplicável a prescrição quinquenal a partir do início da vigência das alterações da Lei Federal nº. 13.146/15, em atenção ao princípio do “tempus regit actum”.

3- Ressalvo, contudo, que quando inexistente acuidade para os atos da vida civil, a prescrição continua a ser obstada por força da interpretação constitucional protetiva, como já declarado na jurisprudência desta C. Corte.

4- A controvérsia dos autos diz com o pagamento dos valores atrasados em período anterior ao requerimento administrativo.

5- O artigo 76 da Lei Federal nº. 8.213/91 determina que “a concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação”.

6- Tratando-se de inclusão posterior de dependente, não é possível retroagir o pagamento do benefício para momento anterior ao requerimento administrativo, quando o INSS pode ter ciência da existência da situação de fato. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

7- Apelação do INSS provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.