Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010085-08.2014.4.03.6120

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL DA ROCHA - SP247085

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010085-08.2014.4.03.6120

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL DA ROCHA - SP247085

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de apelação interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado na inicial da presente ação civil pública, proposta pelo órgão ministerial contra a União, por meio da qual se objetivou a condenação da ré no cumprimento de obrigação de fazer, consistente em prestar imediata assistência jurídica integral e gratuita a todos os necessitados no âmbito da Subseção Judiciária de Araraquara/SP, através da instalação de unidade própria da Defensoria Pública da União (DPU) nesta localidade ou por meio da celebração de convênio com Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DPE/SP), a Ordem dos Advogados do Brasil ou outra entidade pública capaz de desempenhar tal função; além de condená-la a dar ampla divulgação na imprensa do teor da sentença, objetivando a informação da sociedade sobre o atendimento gratuito ao público carente da Defensoria Pública da União de questões jurídicas que necessitem de advogado no âmbito da Justiça Federal.

O pleito de antecipação da tutela foi indeferido (fl. 106).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença que, cujo dispositivo restou assim consignado:

“Diante o exposto, julgo extinto sem resolução de mérito o pedido de obrigar a União a custear os honorários dos advogados nomeados pelos Juízos Eleitorais das Zonas Eleitorais, territorialmente localizadas nesta Subseção Judiciária, o que faço com fundamento no art. 267, VI (ausência de interesse processual)”.

No mais, julgou improcedente o pedido, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I do CPC. Sem custas e honorários, a teor do art. 18 da Lei nº 7.347/85.

Sentença proferida sob a égide do CPC/73.

Irresignado, o MPF interpôs apelação, pugnando pela reforma da sentença, sob os seguintes fundamentos:

a) inexistência de violação ao princípio da separação dos poderes, seja do Judiciário em relação ao Executivo, seja do Judiciário quanto à seara legislativa;

b) é imperioso o reconhecimento de que a implementação de assistência jurídica integral e gratuita às pessoas pobres não está sujeita ao mero arbítrio do administrador e no presente caso restou patente a negligência/omissão da União para fins de execução desta garantia;

c) inexistência de expressa previsão em lei orçamentária anual não pode impedir o cumprimento dos comandos constitucionais e legais;

d) obrigação da União no tocante à celebração de convênios com entidade pública capaz de prestar assistência jurídica aos necessitados no âmbito da Justiça Federal;

e) obrigação da União de custear os honorários dos advogados nomeados pelos juízos eleitorais das Zonas Eleitorais localizadas na Subseção Judiciária de Araraquara.

Requer a reforma integral da sentença para:

“(a) condenar a União, por intermédio da Defensoria Pública da União, a prestar imediata assistência jurídica integral e gratuita a todos os necessitados no âmbito da Subseção Judiciária de Araraquara, através da: (i) instalação de unidade própria da Defensoria da União nesta localidade; ou, da (ii) celebração de convênio com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Ordem dos Advogados do Brasil ou outra entidade pública capaz de desempenhar essa função, nos termos dos § l e 20 do art. 14 da Lei Complementar 80/94;

b) condenar a recorrida a dar ampla divulgação na imprensa do teor da sentença, objetivando a informação da sociedade sobre o atendimento gratuito ao público carente da Defensoria Pública da União de questões jurídicas que necessitem de advogado no âmbito da Justiça Federal”.

Com contrarrazões da União (ID 89863540, fls. 03/39), subiram os autos a esta E. Corte Regional.

Parecer ministerial pelo provimento do apelo do MPF (ID 89863540, fls. 49/64).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010085-08.2014.4.03.6120

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: GABRIEL DA ROCHA - SP247085

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

Centra-se a controvérsia em analisar se houve violação a direitos e garantias fundamentais de hipossuficientes, tais como o de acesso à justiça e o da assistência jurídica integral e gratuita, em razão da alegada omissão estatal na implantação de uma unidade da Defensoria Pública da União na Subseção Judiciária de Três Araraquara/SP.

Ausentes alegações preliminares.

No mérito, a r. sentença não comporta reparos. Vejamos.

Inicialmente, consigne-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento nº 598.212/PR, posicionou-se no sentido da possibilidade de intervenção jurisdicional para implantação da Defensoria Pública no Estado do Paraná, em razão da omissão estatal tida por inconstitucional. Conforme entendimento da Suprema Corte, o referido Estado violou, na espécie, direitos fundamentais de pessoas necessitadas, configurando "situação constitucionalmente intolerável".

Ocorre que, diversamente do mencionado julgado, no presente caso, há sede da Defensoria Pública da União no Estado de São Paulo, com unidades da DPU implantadas tanto na capital, como em diversas cidades do Estado de São Paulo, contando, ainda com “convênios para prestar atendimento nas cidades onde não possui unidade própria”, conforme consta do sítio eletrônico deste órgão (https://www.defensoria.sp.def.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=3092).

Cumpre mencionar que a Defensoria Pública da União possui autonomia funcional, administrativa e iniciativa para a elaboração de sua proposta orçamentária, cabendo-lhe abrir concursos públicos e prover os cargos de suas Carreiras e de seus serviços auxiliares, nos termos do art. 97-A da LC nº 80/1994. Nesse sentido, colho precedente do Supremo Tribunal Federal: STF - ADI: 4056 MA, Relator: RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 26/05/2009, Data de Publicação: DJe-100 DIVULG 29/05/2009 PUBLIC 01/06/2009.

Na hipótese dos autos, esclareceu, a União Federal, que o Poder Executivo Federal, por meio da Lei nº 12.763/12, criou 789 cargos de Defensor Público Federal para a implantação do “Plano de Interiorização da Defensoria Pública da União”, que prevê a expansão e a interiorização da Defensoria Pública para possibilitar o atendimento nas sessões judiciárias federais, destacando a implantação de uma de suas unidades no Município de Araraquara/SP, na 4ª Fase, na 113ª posição em grau de prioridade.

Importa salientar que, para a criação deste Plano, foram observados alguns critérios para a distribuição dos cargos, previstos na Portaria DPU nº 482, de 09/12/2008 e na Portaria DPU nº 231, de 29 de maio de 2015, a saber (destaquei):

“Art. 2º Considerar os seguintes critérios e pesos para realizar a distribuição dos cargos de Defensor Público da União de Segunda Categoria:

I - número de varas federais com peso de 60%;

II - população dos municípios atendidos pela seção ou subseção da Justiça Federal com peso de 20%;

III - média do índice de desenvolvimento humano (IDH) dos municípios atendidos pela seção ou subseção da Justiça Federal com peso de 15%;

IV - média do número de novos processos de assistência jurídica abertos nas Unidades da Defensoria Pública da União, no ano de 2007 e nºs 09 (nove) primeiros meses de 2008 com peso de 5%.

(...)

§ 2º Em segundo lugar, considera-se o peso médio a população e a média do índice de desenvolvimento humano (IDH) dos municípios abrangidos pela Seção ou Subseção Judiciária Federal, como forma de, fazendo-se gradativamente presente nas localidades em que há maior número de pessoas economicamente necessitadas, atender ao disposto no art. 3º, inciso III, da Constituição Federal .

§ 3º Com peso mais reduzido, consideram-se as estatísticas do E-PAJ do último ano e dos 09 (nove) primeiros meses do atual exercício, como forma de prestigiar tal instrumento e, via de conseqüência, as unidades que tem uma demanda atual mais expressiva.”

"Art. 3º Fica estabelecida a distribuição dos 121 (cento e vinte e um) cargos de Defensor Público da União de Segunda Categoria, para reforçar as Unidades da Defensoria Pública da União já existentes, nos seguintes moldes:

Unidade         Nº de Varas  Nº de Cargos  IDH/2000      População                      E-paj        Total após

                          Federais           Atuais                                                                               Distribuição

1) DPU/AC          04           02           0,697     655.385              120,28     3 (+1)

2) DPU/AL          07           03           0,596     2.024.889           131,47     6 (+3)

3) DPU/AM         06           04           0,624     3.009.392           438,85     6 (+2)

4) DPU/AP           03           02           0,753     587.311              87,16       2 (+0)

5) DPU/BA          23           10           0,670     4.458.240           185,71     15 (+5)

(...)

32) DPU/SP         64           30           0,801      14.047.022           920,85   42 (+12)

(...)”

Afigura-se descabido ao Judiciário adentrar no mérito administrativo e decidir pelo Executivo em quais regiões deve ser implantada a unidade da Defensoria Pública da União, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes, um dos pilares do Estado Democrático de Direito.

Nessa linha, confiram-se os seguintes precedentes desta Turma Julgadora:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS FUNDAMENTAIS DE ACESSO À JUSTIÇA E ASSISTÊNCIA GRATUITA AOS NECESSITADOS. DETERMINAÇÃO JUDICIAL COMPULSÓRIA. INSTITUIÇÃO DE SEDE DA DPU NA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE FRANCA/SP. VIOLAÇÃO À GARANTIA DA INAMOVIBILIDADE DO DEFENSOR E AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. MÉRITO ADMINISTRATIVO. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO PROVIDAS.

1. O pedido de efeito suspensivo ativo fica prejudicado em razão do julgamento exauriente realizado por esta decisão.

2. Não é possível a utilização da ação civil pública como sucedâneo de ações direta de inconstitucionalidade por omissão, por se tratar de matéria reservada à competência do Supremo Tribunal Federal. Ademais, não se está postulando omissão normativa, mas a condenação da União ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na prestação de atendimento, por meio da Defensoria Pública da União, aos hipossuficientes submetidos à jurisdição da Subseção Judiciária de Franca.

3. A ação civil pública é a via adequada para o objeto proposto, pois fundada no art. 1º, IV, da Lei nº 7347/85.

4. Não obstante tenha o Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento nº 598.212/PR, proferido decisão no sentido de possibilidade de intervenção do Poder Judiciário para implantação da Defensoria Pública no Estado do Paraná, em razão da omissão estatal tida por inconstitucional, a situação dos presentes autos é diversa.

5. No Estado de São Paulo, diferentemente do Paraná, há Defensoria Pública da União, com sede na Subseção de São Paulo e outras dez unidades no interior do Estado, não havendo, destarte, omissão administrativa.

6. A Lei nº 12.763/2012 criou, no quadro da Defensoria Pública da União, 789 (setecentos e oitenta e nove) cargos de Defensor Público Federal, dessa assertiva se extrai que os cargos só podem ser criados por lei, função atípica do Poder Judiciário.

7. Nos termos do art. 2º da citada lei, o provimento dos cargos criados será realizado de forma gradual e está condicionado a expressa autorização em anexo próprio da lei orçamentária anual, com dotação suficiente, nos termos do §1º do art. 169 da Constituição Federal.

8. A determinação de instalação de unidade da Defensoria Pública da União pelo Poder Judiciário se mostra indevida, visto que se caracterizaria uma violação à separação dos Poderes, esculpida no art. 2º da Constituição Federal, e delineada no § 4º, do artigo 60 da mesma Carta como cláusula pétrea.

9. Os defensores já investidos na carreira são inamovíveis, sendo que eventual deslocamento de defensor público para a Subseção Judiciária de Franca ofenderia tal garantia e poderia acarretar em prejuízos em outras localidades.

10. Cabe exclusivamente ao Poder Executivo decidir pela conveniência e oportunidade, aqui compreendidas a possibilidade legal, física e orçamentária para determinar a criação da Defensoria Pública na região.

11. Ao Poder Judiciário o controle do ato administrativo quanto ao seu contorno de legalidade, não podendo interferir nas decisões administrativas, quando estas se encontram revestidas de todos os pressupostos de validade, como no caso dos autos.

12. A implantação de políticas públicas pelo Judiciário é medida excepcional, ficando reservada a "situação configuradora de inescusável omissão estatal" a fim de dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana, conforme decidiu o E. STF, no julgamento do AI 598.212 ED/PR, supra transcrito.

13. Por força da Emenda Constitucional n.º 80/2014, inseriu-se no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o artigo 98, conferindo oito anos de prazo à União, aos Estados e ao Distrito Federal para instalarem a Defensoria Pública em todas as unidades jurisdicionais. Destarte, até que esse prazo se implemente, não há mora do Poder Público a ensejar sua condenação.

14. A realidade verificada não indica que ocorra violação de tal monta que o núcleo essencial de garantia tenha sido comprometido pela inação do Estado. Isso em virtude da Resolução nº 558/2007, do Conselho da Justiça Federal, que permite a nomeação de advogados dativos e voluntários, quando não for possível a atuação de Defensor Público da União, pela inexistência ou pela deficiência de quadros.

15. Remessa Oficial e Apelação providas.”

(TRF3, APELAÇÃO 0001520-13.2013.4.03.6113/SP, Rel. Des. Federal NELTON DOS SANTOS, J. 18/10/2017, DJe 27/10/2017)

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INSTALAÇÃO DE UNIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO NA SUBSEÇÃO DE JALES/SP. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NÃO CONFIGURAÇÃO. SENTENÇA QUE ANALISOU TODOS OS ASPECTOS TRAZIDOS NA INICIAL. INTERFERÊNCIA DO JUDICIÁRIO. VEDAÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CELEBRAÇÃO DO CONVÊNIO, EM NOME DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, COM AS SUBSEÇÕES DA OAB LOCALIZADAS NA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE JALES, PARA FINS DO EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DISCIPLINADAS NO ART. 14, CAPUT, E §§, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 80/94. APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NEGADO. PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL.

"1. A falta de Defensoria Pública da Subseção Judiciária de Jales/SP ensejou o autor a propor a Ação Civil Pública, ou seja, visa a ação a disponibilização de um serviço público, com o fim de garantir direito ou interesse difuso, "transindividual, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato", nos moldes do que reza o art. 81, I, da Lei nº 8.078/90,

2. Assim, a presente ação civil pública é a via adequada para o objeto proposto, pois fundada no art. 1º, IV, da Lei nº 7347/85.

3. A propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão seria cabível diante de fato abstrato, mas o que ocorre, "in casu", é a apresentação de um fato concreto, qual seja, a ausência da Defensoria Pública da União na Subseção Judiciária de Jales/SP, de forma que o pedido da ação visa prover o acesso à justiça aos hipossuficientes naquela subseção. Além da instalação do órgão público, há o pedido alternativo de celebração de convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil ou com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

4. Em relação ao alegado pelo Ministério Público, acerca da não manifestação do magistrado acerca da implantação, em definitivo, da unidade da Defensoria Pública da União no município de Jales, também improcede. Esse pedido foi julgado improcedente, fundamentado na discricionariedade do ato a que se busca a ação, baseados na conveniência e oportunidade, para o cumprimento paulatino das atribuições constitucionais afetas à instituição. Concluiu que o atendimento desse pedido implicaria em não respeito à igualdade e que as escolhas privativas da administração não podem sofrer intromissão indevida.

5. Embora tenha se revelado a necessidade de garantir o direito constitucional ao exercício e a defesa de direitos aos cidadãos hipossuficientes, a determinação de instalação de unidade da Defensoria Pública da União pelo Poder Judiciário se mostra indevida, visto que se caracterizaria uma violação à separação dos Poderes, esculpida no art. 2º da Constituição Federal, e delineada no § 4º, do artigo 60 da mesma Carta como cláusula pétrea.

6. A criação de cargo de defensor de público depende de lei (que, aliás, foi promulgada no final de 2012), e os servidores já investidos na carreira são inamovíveis. Eventual deslocamento de defensor público para a Subseção Judiciária de Jales/SP poderá acarretar em prejuízos de outras localidades. Assim, cabe ao Poder Executivo eleger as prioridades administrativas e qual o rumo das políticas públicas, de acordo com a conveniência, a possibilidade legal, física e orçamentária.

7. Embora haja a necessidade premente da população local à assistência judiciária aos carentes/hipossuficientes, não se olvida qualquer desvio, ilegalidade ou desproporcionalidade da Administração Pública, ao deixar de destinar e prover cargo de defensor público para a Subseção Judiciária de Jales. Pelo contrário, com o intuito repor as necessidades, foram criados mais cargos para a Defensoria Pública da União. Porém, dadas questões inerentes às dificuldades referentes à disponibilidade orçamentária, bem como à adequação em torno das políticas públicas vigentes, o provimento desses cargos se dá de forma gradual.

8. Não cabe ao Poder Judiciário adentrar ao mérito administrativo, ao definir acerca da implantação de uma unidade de Defensoria Pública da União, alterando assim critérios estabelecidos pelo administrador, segundo sua conveniência e oportunidade.

9. Embora a lei disponha acerca da celebração do convênio com a Defensoria Pública Estadual e, em caso de inexistência da Defensoria Pública Estadual no local, autoriza a celebração de convênio com outra entidade pública, até que seja criado o órgão próprio, a determinação judicial de celebração do convênio esbarra na esfera livre de atuação exclusiva do Estado e da União, bem como viola a separação de poderes.

10. Não obstante a Resolução nº 558/2007 permita a nomeação de defensor dativo, em caso da impossibilidade de atuação do Defensor Público, os honorários fixados na Resolução ainda são diminutos, e muitos poucos advogados se interessam a atuar voluntariamente, certo ademais que se restringe a órbita criminal. Nesse passo, a sua existência não supre a necessidade dos hipossuficientes de acesso ao judiciário, continente maior e demais providências alusivas a assistência jurídica.

11. O Poder Judiciário não pode intervir na esfera administrativa do Poder Executivo e da própria Defensoria Pública da União, determinando a instalação de unidade da Defensoria ou a celebração de convênio, porém a ação tem por objeto garantir à população carente da subseção de Jales o direito à jurisdição e à assistência judiciária, já assegurados na Lei Complementar nº 98, de 1999, art. 14 e §§ 1º e 2º, faltando apenas sua efetiva e cabal implementação. Não se pode admitir que um direito fundamental de nossa Constituição não possa ser exercido em sua plenitude, por falta do Poder Executivo Federal.

12. Assim, a atividade estatal de conduzir a atuação da Defensoria Pública da União (onde instalar, criação de cargos, etc) é discricionária. Porém, o Estado tem o dever de suprir os direitos fundamentais amparados na Constituição Federal, nesse caso específico, prover a necessidade de assistência jurídica e judiciária dos desamparados. Logo, sua atuação, de forma a garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, é vinculada. Deve garantir o direito dos hipossuficientes, ou seja, os necessitados possuem o direito objeto da presente ação civil pública.

13. Apesar da conclusão pela reforma da sentença, no sentido de excluir da condenação a obrigatoriedade da celebração do convênio, deve a União, de alguma forma, garantir o direito constitucional fundamental, no prazo de 03 meses, contados da sua intimação, mantendo a cominação de multa diária fixada na sentença, em caso de descumprimento injustificado da imposição.

14. A forma pela qual a União irá cumprir (ex: instalação de Defensoria Pública da União, deslocamento temporário de defensores lotados em outra subseção, celebração de convênio com a Defensoria Pública Estadual ou com outra instituição pública, celebração de convênio com a OAB) será definida segundo os critérios discricionários da autoridade administrativa.

15. Pelo exposto, negado provimento ao apelo do Ministério Público Federal e dado parcial provimento ao apelo da União e à remessa oficial.”

(TRF3, APELREEX 00010289020104036124, Rel. Juiz Convocado ROBERTO JEUKEN, TERCEIRA TURMA, Julgado em:24/07/2014, Publicado no DJF3 em: 29/07/2014) (grifos meus)

Tampouco compete ao Estado-juiz determinar a remoção de Defensores Públicos, invocando o interesse público como fundamento, o que representa quebra da garantia de inamovibilidade de seus membros, cuja exceção somente se dá a pedido ou compulsoriamente, mediante decisão do Conselho Superior da DPU, nos termos do artigo 34 ao 38 e 43, inciso II da LC nº 80/94, e não à critério do Judiciário.

Acrescente-se que o remanejamento orçamentário e a intervenção judicial poderiam afetar outras políticas públicas mantidas pelo Poder Executivo, com maior urgência à população, notadamente, em meio ao cenário atual de grave crise de saúde pública, em razão dos transtornos causados pela pandemia do coronavírus. De fato, as atenções voltam-se, nesse momento, ao enfrentamento desta terrível doença que pode dizimar a população brasileira e mundial em poucos meses.

Embora tenha se revelado a necessidade de se garantir o direito constitucional de acesso à justiça e a defesa dos cidadãos hipossuficientes, a determinação forçada de instalação de unidade da Defensoria Pública da União pelo Poder Judiciário se afigura ilegítima e inconstitucional, visto que se caracterizaria em violação ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal, amparada por cláusula pétrea, nos termos do artigo 60, § 4º, III da CF/88.

Destarte, a implantação de políticas públicas pelo Judiciário é medida excepcional, a ser concedida em "situação configuradora de inescusável omissão estatal", para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana, conforme decidiu o C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do AI 598.212 ED/PR.

Ainda sob o prisma da ordem constitucional, a regra adotada pelo constituinte originário, em seu artigo 2º, consiste na tripartição dos poderes, sob o prisma da indelegabilidade de atribuições. Como exceção, lança-se mão do mecanismo de "freios e contrapesos", no qual se admite o controle judicial dos atos administrativos, em caso de comprovado abuso ou desvio de finalidade por parte do administrador, inocorrente na espécie. Consoante escólio de Celso Antônio Bandeira de Mello:

"(...) ao Judiciário compete fulminar todo comportamento ilegítimo da Administração que apareça como frontal violação da ordem jurídica, compete-lhe, igualmente, fulminar qualquer comportamento administrativo que, a pretexto de exercer apreciação ou decisão discricionária, ultrapassar as fronteiras dela, isto é, desbordar dos limites de liberdade que lhe assistiam, violando, por tal modo, os ditames normativos que assinalam os confins de liberdade discricionária." (Mello, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo, 21. Ed., p. 932)

No vertente caso, não se verifica qualquer desvio, ilegalidade ou desproporcionalidade na atuação do Poder Público Federal, tendo em vista que a Lei Complementar nº 80/1994 instituiu a criação de convênios entre a DPU e as Defensorias Públicas dos Estados e do Distrito Federal, nos moldes do art. 14, §§ 1º e 2º, restando amparado o acesso à justiça gratuita pelos mais necessitados. Tampouco restou comprovada a alegada omissão por parte da DPU, ante a previsão de implantação de uma unidade da DPU na Subseção Judiciária de Araraquara/SP, na 4ª Fase do Plano de Expansão.

Ainda, cumpre mencionar que a Lei nº 12.763/ 2012 criou, no quadro da Defensoria Pública da União, 789 (setecentos e oitenta e nove) cargos de Defensor Público Federal, a serem providos de forma gradual e condicionados à expressa autorização da lei orçamentária anual, nos termos do art. 2º da citada lei, in verbis:

"Art. 2o O provimento dos cargos criados por esta Lei será realizado de forma gradual e será condicionado a expressa autorização em anexo próprio da lei orçamentária anual, com dotação suficiente, nos termos do § 1º do art. 169 da Constituição Federal."

"Art. 169: A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas:

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista."

Imperioso salientar que a criação de novos cargos de defensor público depende de lei orçamentária anual, cuja elaboração de sua proposta compete à DPU, nos termos do art. 134, §§ 2º e 3º - acrescido pela EC nº 74/2013 -, ambos da CF/88, e do art. 97-A da LC nº 80/1994.

Por fim, o aludido pleito recursal configura ingerência indevida do Judiciário na implementação de políticas públicas, porquanto impõe ao Estado o remanejamento de verbas públicas, o que poderá acarretar problemas de alocação de recursos públicos, em meio ao atual cenário de crise sanitária, em que se exige atenção mais acurada com prioridades e proteção aos direitos sociais, notadamente, a saúde pública.

Por fim, destaco trecho do voto da então Min. Ellen Gracie, porquanto oportunas, ao apreciar o pedido de suspensão da execução de decisão proferida por magistrado federal nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.71.01.003191-7 (STA 183), in verbis:

"Na hipótese em apreço, a sentença impugnada impõe à Administração a efetivação de lotação de Defensor Público da União em Rio Grande/RS, atribuição que se encontra, em princípio, dentro do seu juízo discricionário de conveniência e oportunidade, interferindo, dessa forma, diretamente na destinação do limitado número de Defensores Públicos de que dispõe a União.

Verifico, ainda, que a decisão impugnada determinou que a requerente providenciasse, no prazo de sessenta dias, a implantação de um Núcleo da Defensoria Pública da União na cidade de Rio Grande, motivo pelo qual entendo que se encontra devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à ordem jurídico-constitucional, porquanto a execução da sentença ora impugnada repercutirá na programação orçamentária federal, ao gerar impacto nas finanças públicas. Ademais, para a execução da sentença em tela, será necessário o remanejamento de verbas públicas, o que certamente causará problemas de alocação de recursos públicos.

No presente caso, poderá, ainda, haver o denominado "efeito multiplicador" (SS 1.836-AgR, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, unânime, DJ 11.10.2001), tendo em vista a existência de outras subseções judiciárias em situação potencialmente idêntica àquela de Rio Grande/RS".

Ante o exposto, nego provimento ao apelo do MPF, nos termos da fundamentação supra, e mantenho a r. sentença tal como lançada.

É COMO VOTO.

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITOS FUNDAMENTAIS DE ACESSO À JUSTIÇA E ASSISTÊNCIA GRATUITA AOS NECESSITADOS. DETERMINAÇÃO JUDICIAL COMPULSÓRIA. INSTITUIÇÃO DE UNIDADE DA DPU NA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE ARARAQUARA/SP. VIOLAÇÃO À GARANTIA DA INAMOVIBILIDADE DO DEFENSOR E AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. ARTIGOS 34 AO 38 e 43, II DA LC 80/94 E ARTIGO 2º DA CF/88. IMPOSSIBILIDADE DE INGERÊNCIA DO JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL INTOLERÁVEL. MÉRITO ADMINISTRATIVO. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Centra-se a controvérsia em analisar se houve violação a direitos e garantias fundamentais de hipossuficientes, tais como o de acesso à justiça e o da assistência jurídica integral e gratuita, em razão da alegada mora estatal na implantação de uma unidade da Defensoria Pública da União na Subseção Judiciária de Araraquara/SP.

2. Conforme relatado pela União, a DPU elaborou um Plano de Expansão para fins de interiorização e viabilização de acesso à justiça aos mais necessitados, destacando a implantação de uma de suas unidades no Município de Araraquara/SP na 4ª Fase, mediante o cumprimento de alguns critérios para a distribuição dos cargos, previstos na Portaria nº 482, de 09/12/2008 e na Portaria nº 231, de 29 de maio de 2015.

3. Afigura-se descabido ao Judiciário adentrar no mérito administrativo e decidir pelo Executivo em quais regiões deve ser implantada unidade da Defensoria Pública da União, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes, um dos pilares do Estado Democrático de Direito.

4. Tampouco compete o Estado-juiz determinar a remoção de Defensores Públicos, invocando o interesse público como fundamento, o que representa quebra da garantia de inamovibilidade de seus membros, cuja exceção somente se dá a pedido ou compulsoriamente, mediante decisão do Conselho Superior da DPU, nos termos do artigo 34 ao 38 e 43, inciso II da LC nº 80/94, e não à critério do Judiciário.

5. Acrescente-se que o remanejamento orçamentário e a intervenção judicial poderiam afetar outras políticas públicas mantidas pelo Poder Executivo, com maior urgência à população, notadamente, em meio ao cenário atual de grave crise de saúde pública, em razão dos transtornos causados pela pandemia do coronavírus. De fato, as atenções voltam-se, nesse momento, ao enfrentamento desta terrível doença que pode dizimar a população brasileira e mundial em poucos meses.

6. Embora tenha se revelado a necessidade de se garantir o direito constitucional de acesso à justiça e a defesa dos cidadãos hipossuficientes, a determinação forçada de instalação de unidade da Defensoria Pública da União pelo Poder Judiciário se afigura ilegítima e inconstitucional, visto que se caracterizaria em violação ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal, e amparada por cláusula pétrea, nos termos do artigo 60, § 4º, III da CF/88.

7. Destarte, a implantação de políticas públicas pelo Judiciário é medida excepcional, a ser concedida em "situação configuradora de inescusável omissão estatal" para dar efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana, conforme decidiu o Col. STF, no julgamento do AI 598.212 ED/PR.

8. Ainda sob o prisma da ordem constitucional, a regra adotada pelo constituinte originário em seu artigo 2º consiste na tripartição dos poderes, sob o prisma da indelegabilidade de atribuições. Como exceção, lança-se mão do mecanismo de "freios e contrapesos", no qual se admite o controle judicial dos atos administrativos, em caso de comprovado abuso ou desvio de finalidade por parte do administrador, inocorrente na espécie.

9. No vertente caso, não se verifica qualquer desvio, ilegalidade ou desproporcionalidade na atuação do Poder Público Federal, tendo em vista que a Lei Complementar nº 80/1994 instituiu a criação de convênios entre a DPU e as Defensorias Públicas dos Estados e do Distrito Federal, nos moldes do art. 14, §§ 1º e 2º, restando amparado o acesso à justiça gratuita pelos mais necessitados. Tampouco restou comprovada a alegada omissão por parte da DPU, ante a previsão de implantação de uma unidade da DPU na Subseção Judiciária de Araraquara/SP na 4ª Fase do Plano de Expansão.

10. Ainda, cumpre mencionar que a Lei nº 12.763/ 2012 criou, no quadro da Defensoria Pública da União, 789 (setecentos e oitenta e nove) cargos de Defensor Público Federal, a serem providos de forma gradual e condicionados à expressa autorização da lei orçamentária anual, nos termos do art. 2º da citada lei.

11. Por fim, o aludido pleito recursal configura ingerência indevida do Judiciário na implementação de políticas públicas, porquanto impõe ao Estado o remanejamento de verbas públicas, o que poderá acarretar problemas de alocação de recursos públicos, em meio ao atual cenário de crise sanitária, em que se exige atenção mais acurada com prioridades e proteção aos direitos sociais, notadamente, a saúde pública.

12. Apelação improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo do MPF, nos termos da fundamentação, e manteve a r. sentença tal como lançada, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.