APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013318-98.1999.4.03.6100
RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: AUGUSTO SABADIN
Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA GOFFI FLAQUER SCARTEZZINI - SP21709-A
APELADO: BANCO CENTRAL DO BRASIL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013318-98.1999.4.03.6100 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: AUGUSTO SABADIN Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA GOFFI FLAQUER SCARTEZZINI - SP21709-A APELADO: BANCO CENTRAL DO BRASIL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de apelação, em ação de rito comum, ajuizada por Augusto Sabadin em face do Banco Central do Brasil – BACEN, defendendo o descabimento da indisponibilidade de seus bens, por ter exercido cargo de Diretor do Banco Bamerindus, inquinado de vício a Lei 6.024/1974, incompatível com a CF/1988, pugnando por liberação de seus bens e a condenação do réu à indenização por danos materiais e morais. A r. sentença, lavrada sob a égide do CPC/1973, ID 107389443 - Pág. 210, declarou extinto o processo, sem exame de mérito, art. 267, IV, CPC, quanto ao tema indisponibilidade, por incompetência da Justiça Federal, pois o inquérito administrativo, conduzido pelo réu, já se encerrou e o processo foi remetido para a Justiça Estadual. No mais, julgou improcedente o pedido, porque presente legalidade na Lei 6.0247/1974 a amparar a conduta do polo réu, frente ao interesse coletivo envolto, não tendo o ente autoral requerido provas. Sujeitou o polo autor ao pagamento de honorários, no importe de R$ 500,00. Embargos de declaração privados improvidos, ID 107389443 - Pág. 227. Apelou o polo demandante, ID 107389443 - Pág. 234, alegando, em síntese, embora fosse Diretor, estava submetido a comando superior, portanto não possuía autonomia, sendo descabida a indisponibilidade de seus bens, inquinando de nulo o inquérito administrativo, porque não apurada sua responsabilidade, por isso malferida a razoabilidade, considerando inconstitucional a Lei 6.024/1974 e havido preclusão a respeito do tema competencial, suscitando responsabilidade do BACEN por danos morais e materiais proporcionados. Apresentadas as contrarrazões, ID 107389443 - Pág. 271, sem preliminares, subiram os autos a esta C. Corte. Informou a parte autora que o Ministério Público firmou acordo com os credores da massa falida do Grupo Bamerindus, proporcionando a finalização da liquidação extrajudicial e o levantamento da indisponibilidade de todos os bens dos envolvidos, pugnando, então, por julgamento de mérito com reconhecimento do pedido, ID 107389441 - Pág. 8. Manifestou-se o BACEN, no sentido da ausência de reconhecimento do pedido, porque sequer participou do acordo noticiado e, se pretende desistir da demanda, deverá o interessado postular por renúncia, ID 107389441 - Pág. 64. Contraditório privado, ID 107389441 - Pág. 72. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013318-98.1999.4.03.6100 RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: AUGUSTO SABADIN Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA GOFFI FLAQUER SCARTEZZINI - SP21709-A APELADO: BANCO CENTRAL DO BRASIL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Primeiramente, sem sentido a tese de reconhecimento do pedido, porque o acordo, que desfechou no encerramento da liquidação extrajudicial e liberação da indisponibilidade de bens, a ter sido costurado pelo Parquet junto aos credores, portanto sem qualquer relação com o BACEN, que, em sua última intervenção, negou qualquer assentimento às teses prefaciais. Prosseguindo-se, o caso concreto, nuclearmente, a se amoldar à perda superveniente do objeto, porque não há mais indisponibilidade de bens, deixando de existir, assim, litígio sobre a existência ou não de responsabilidade. Aliás, “no controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade”, RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Rel. p/ Acórdão Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019. O tema, outrossim, é pacífico desde a Suprema Corte : “a atuação do Poder Judiciário no controle do ato administrativo só é permitida quanto tal ato for ilegal ou abusivo, sendo-lhe defeso qualquer incursão no mérito administrativo”, RE 1222222 AgR, Relator : Edson Fachin, Segunda Turma, julgado em 29/06/2020. Assim, o único ângulo que remanesce a ser o da responsabilidade patrimonial e extrapatrimonial suscitada, soçobrando o polo apelante, também neste flanco. Com efeito, repousando incontroverso que o polo recorrente ocupava cargo de direção no Banco Bamerindus, a Lei 6.024/1974, que não afronta a Carta Magna vigente, prevê indisponibilidade dos bens dos administradores, providência de cunho cautelar e visando a resguardar o interesse público, ao passo que referida restrição não impede o uso e gozo do patrimônio, impondo, por outro lado, restrição à disposição da coisa, entendimento este pacífico pelo C. STJ, por isso nenhuma ilegalidade praticou o Banco Central, direcionando, então, para a ausência de prática de ato antijurídico a justificar o reconhecimento de danos morais ou materiais, nada sendo devido a título de ressarcimento : “ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 36 DA LEI 6.024/1974. ART. 2º DA LEI 9.447/1997. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DOLO OU CULPA DO ADMINISTRADOR OU CONTROLADOR. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. ANÁLISE DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL PREJUDICADA. ... 2. Ser administrador ou controlador direto ou indireto de instituição financeira traz pesadas responsabilidades, entre elas a de responder com seu patrimônio por prejuízos causados e de sofrer indisponibilidade de bens, independentemente de apuração de dolo ou culpa. ... 6. Consoante a Lei 6.024/1974, plenamente compatível com o sistema constitucional atual, em caso de intervenção, liquidação extrajudicial ou administração temporária de instituição financeira, a decretação de indisponibilidade de bens - medida preventiva e acautelatória, sem caráter punitivo - independe de qualquer consideração sobre o grau de culpabilidade, dolo ou culpa, do sujeito. Decorre - de maneira objetiva, vinculada, de pleno direito, ipso facto - do mero ato do Banco Central de instauração do regime especial e da condição pessoal de administrador, ex-administrador ou controlador direto ou indireto. Essa exatamente a dicção expressa do texto legal: "A indisponibilidade prevista neste artigo decorre do ato que decretar a intervenção, a extrajudicial ou a falência" (art. 36, § 1º, grifo acrescentado). Ora, sendo efeito inevitável de prescrição legal obrigatória, o Banco Central não goza de liberdade para abdicar da indisponibilidade. Nessa fase, não se passa julgamento sobre a responsabilidade em si, pois em jogo apenas resguardar a satisfação dos créditos dos clientes da instituição financeira. "A indisponibilidade não priva o ex-administrador de administrar os seus bens patrimoniais, cria-se somente restrição ao direito de livre disposição, com o fito de conservá-los como garantia de eventual execução" (REsp 86.431/DF, Relator Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, DJ 25/11/1996, p. 46152). CONCLUSÃO 7. Agravo Interno não provido.” (AgInt no REsp 1803162/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 18/09/2020) “In casu”, a partir do momento em que o autor aceitou o cargo de direção, enquadrou-se na hipótese normativa de ser possível alvo daquelas restrições, não podendo alegar desconhecimento da lei, “data venia”. Em suma, havendo positivação para a decretação de indisponibilidade, agiu o BACEN no estrito cumprimento da legalidade a que jungido, art. 37, “caput”, Lei Maior, porque independia a restrição patrimonial de exame de dolo ou culpa, tratando-se de ônus a ser experimentado por aquele que se amolda na condição legal. Prejudicados, pois, demais temas suscitados. Ausentes honorários recursais, por sentenciada a causa sob a égide do CPC/1973, EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017. Por conseguinte, em âmbito de prequestionamento, refutados se põem os demais ditames legais invocados em polo vencido, que objetivamente a não socorrer, com seu teor e consoante este julgamento, ao mencionado polo (artigo 93, IX, CF). Ante o exposto, pelo reconhecimento da perda superveniente do objeto, em relação aos temas indisponibilidade de bens e responsabilidade do ex-diretor do Banco Bamerindus, extinguindo-se o processo, neste flanco, sem exame de mérito, e pelo improvimento à apelação, no mais, tudo na forma retro estatuída. É como voto.
E M E N T A
AÇÃO DE RITO COMUM – ADMINISTRATIVO – LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO BANCO BAMERINDUS – PERDA DE OBJETO EM RELAÇÃO AOS TEMAS RESPONSABILIDADE DO EX-DIRETOR E INDISPONIBILIDADE DE SEUS BENS : EXTINÇÃO SEM EXAME DE MÉRITO – LEGALIDADE DA LEI 6.024/1974, CUIDANDO A INDISPONIBILIDADE DE BENS DE CAUTELA DO LEGISLADOR, A FIM DE RESGUARDAR OS INTERESSES PÚBLICOS ENVOLVIDOS E, ASSIM AGINDO O BACEN, CUMPRIU À ESTRITA LEGALIDADE, POR ISSO AUSENTES DANOS MORAL OU MATERIAL – IMPROCEDÊNCIA AO PEDIDO – IMPROVIMENTO À APELAÇÃO PRIVADA
1 - Sem sentido a tese de reconhecimento do pedido, porque o acordo, que desfechou no encerramento da liquidação extrajudicial e liberação da indisponibilidade de bens, a ter sido costurado pelo Parquet junto aos credores, portanto sem qualquer relação com o BACEN, que, em sua última intervenção, negou qualquer assentimento às teses prefaciais.
2 - O caso concreto, nuclearmente, a se amoldar à perda superveniente do objeto, porque não há mais indisponibilidade de bens, deixando de existir, assim, litígio sobre a existência ou não de responsabilidade.
3 - Aliás, “no controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade”, RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Rel. p/ Acórdão Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019.
4 - O tema, outrossim, é pacífico desde a Suprema Corte : “a atuação do Poder Judiciário no controle do ato administrativo só é permitida quanto tal ato for ilegal ou abusivo, sendo-lhe defeso qualquer incursão no mérito administrativo”, RE 1222222 AgR, Relator : Edson Fachin, Segunda Turma, julgado em 29/06/2020.
5 - O único ângulo que remanesce a ser o da responsabilidade patrimonial e extrapatrimonial suscitada, soçobrando o polo apelante, também neste flanco.
6 - Repousando incontroverso que o polo recorrente ocupava cargo de direção no Banco Bamerindus, a Lei 6.024/1974, que não afronta a Carta Magna vigente, prevê indisponibilidade dos bens dos administradores, providência de cunho cautelar e visando a resguardar o interesse público, ao passo que referida restrição não impede o uso e gozo do patrimônio, impondo, por outro lado, restrição à disposição da coisa, entendimento este pacífico pelo C. STJ, por isso nenhuma ilegalidade praticou o Banco Central, direcionando, então, para a ausência de prática de ato antijurídico a justificar o reconhecimento de danos morais ou materiais, nada sendo devido a título de ressarcimento :
7 - “In casu”, a partir do momento em que o autor aceitou o cargo de direção, enquadrou-se na hipótese normativa de ser possível alvo daquelas restrições, não podendo alegar desconhecimento da lei, “data venia”.
8 - Havendo positivação para a decretação de indisponibilidade, agiu o BACEN no estrito cumprimento da legalidade a que jungido, art. 37, “caput”, Lei Maior, porque independia a restrição patrimonial de exame de dolo ou culpa, tratando-se de ônus a ser experimentado por aquele que se amolda na condição legal.
9 - Ausentes honorários recursais, por sentenciada a causa sob a égide do CPC/1973, EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.
10 - Reconhecimento da perda superveniente do objeto, em relação aos temas indisponibilidade de bens e responsabilidade do ex-diretor do Banco Bamerindus, extinguindo-se o processo, neste flanco, sem exame de mérito. Improvimento à apelação, no mais, tudo na forma retro estatuída.