Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023085-67.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: LOURDE NEY DE JESUS TORRES SAMPAIO

Advogados do(a) APELANTE: RENATO CORDEIRO PAOLIELLO - SP317382, GABRIEL DRUDA DEVEIKIS - SP329752-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023085-67.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: LOURDE NEY DE JESUS TORRES SAMPAIO

Advogados do(a) APELANTE: RENATO CORDEIRO PAOLIELLO - SP317382, GABRIEL DRUDA DEVEIKIS - SP329752-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de apelação interposta por Lourde Ney de Jesus Torres Sampaio contra sentença que julgou improcedente o pedido de declaração de nulidade do Processo Administrativo nº 35664.00460/2014-12 e consequente anulação de sua demissão, requerendo a reintegração ao cargo anteriormente ocupado com o pagamento da remuneração que deixou de auferir. A autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados sobre o valor atualizado da causa, nos percentuais mínimos estabelecidos pelo art. 85, §3º, do CPC, observando-se a concessão da gratuidade da justiça.

Aduz, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, ante o indeferimento da produção de prova testemunhal. No mérito, sustenta, em síntese, a ofensa, no bojo do procedimento administrativo disciplinar, aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. Aduz não ter sido oportunizada a apresentação de contraprova e que qualquer prova produzida sem a sua devida intimação é nula. Alega vício na prova, consistente na apreensão de processos administrativos concessórios de benefícios de sua mesa de trabalho sem seu conhecimento e sem que tenha, antes de tudo, lhe indagado sobre os bilhetes anexados aos processos concessórios. Alega que as testemunhas ouvidas no PAD foram unânimes em afirmar que não havia informações acerca de privilégios concedidos pela autora. Afirma a ausência de nexo causal entre os fatos e o conjunto probatório. Por fim, pugna pela conversão da punição da apelante em mero erro administrativo e, com fundamento no princípio da proporcionalidade, seja aplicada sanção menos gravosa. Pede o reconhecimento dos danos morais.

Em contrarrazões, o INSS defende terem sido observadas os mandamentos que regem o procedimento administrativo disciplinar, assegurando-se à autora o devido processo legal e todos os princípios que dele decorrem, notadamente o contraditório e a ampla defesa. Aduz descabida a alegação de subtração irregular dos processos administrativos da mesa de trabalho da autora, já que não são parte de seu patrimônio, nem dizem respeito à sua intimidade, tratando-se de pedidos de terceiros a uma autarquia federal com vistas à obtenção de um benefício previdenciário, sendo lícita a retenção dos documentos para o correto esclarecimento dos fatos de que tomou conhecimento o ente público. Quanto aos fatos apurados no PAD, afirma que a autora confessou que atuava como intermediária para protocolo e concessão de benefícios previdenciários, ou seja, como procuradora de fato, protocolizando pedidos sem prévio agendamento ou emissão de senha e mesmo sem a assinatura da parte interessada ou de seu procurador legalmente constituído, infringindo os princípios da moralidade e impessoalidade e em clara ofensa ao princípio da isonomia.

Vieram os autos a esta E. Corte.

É o breve relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023085-67.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: LOURDE NEY DE JESUS TORRES SAMPAIO

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V O T O

 

 

 O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Versa o presente feito sobre a anulação de penalidade de demissão imposta a servidora pública federal em razão de alegados vícios no Processo Administrativo Disciplinar.

Consta dos autos que foi instaurado o Processo Administrativo Disciplinar para apuração de notícia envolvendo a parte autora, consistente no envolvimento em concessão irregular de benefícios no INSS. Ao fim, foi a autora condenada à penalidade de demissão por infringir o art. 117, inciso IX, da Lei nº 8.112/1990.

Imperioso salientar que a jurisprudência do STJ é rigorosamente torrencial e uniforme quanto aos limites da atuação do Poder Judiciário no controle do processo administrativo, o qual restringe-se à verificação de vícios capazes de ensejar a sua nulidade, sendo-lhe defeso incursionar no mérito administrativo, salvo patente infração a garantias processuais ou aos limites jurídicos da avaliação do julgador administrativo.

Nesse sentido, confira-se o entendimento do e. STJ:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REITOR DE UNIVERSIDADE FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). PENA DE DEMISSÃO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. IMPARCIALIDADE DOS MEMBROS DA COMISSÃO DE PAD QUE PARTICIPARAM DE OUTRAS COMISSÕES. CONTROLE JURISDICIONAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. EXAME DA REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO E DA LEGALIDADE DO ATO. IMPOSSIBILIDADE DE INCURSÃO DO MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. FUNDAMENTAÇÃO. PROPORCIONALIDADE.

1. Processo administrativo disciplinar (PAD) que aplicou penalidade de demissão ao impetrante, professor e ex-Reitor de Universidade Federal, por concluir que o impetrante valeu-se do cargo que ocupava junto à Universidade para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, ao assinar contrato com o Governo do Distrito Federal e subcontratos com Fundações ligadas à Universidade, utilizadas em desvio de finalidade, para que recursos do Distrito Federal fossem destinados a particulares, sem a realização de licitação. 2. O impetrante respondeu a quatro PADs por irregularidades constatadas ao tempo em que foi Reitor, sendo cada qual decorrente de um Relatório de Demandas Especiais (RDE) elaborado pela CGU (Controladoria-Geral da União). Embora os fatos sejam conexos e pudessem ser apurados em um único PAD, foram agrupados em 4 PADs por uma questão de eficiência, operando-se a interrupção da prescrição relativa a cada grupo de fatos com a abertura do respectivo PAD. Art. 142, parágrafo 3º, da Lei 8.112/90.

3. Não há parcialidade de membro da Comissão Processante apenas por compor outra Comissão Processante, que apura outros fatos pelos quais é investigado o mesmo servidor público. Precedente: MS 21859.

4. O exame da prova produzida no PAD foi feito de forma fundamentada pela autoridade impetrada, que concluiu pela participação dolosa do impetrante nos atos a ele imputados a partir dos elementos de prova indicados e sopesados no Relatório Final da Comissão processante, adotado pela autoridade impetrada.

5. O servidor acusado no processo administrativo disciplinar defende-se dos fatos a ele imputados e não da tipificação legal relacionada. O valimento do cargo (art. 117, IX) ou a improbidade administrativa já levariam por si só à imposição da penalidade de demissão (art. 132, IV e XIII, da Lei 8.112/90), não havendo que se falar em nulidade se não houve prejuízo à ampla defesa do impetrante.

6. A avaliação da gravidade da infração efetuada em sede de Processo Administrativo Disciplinar, se não ultrapassa a esfera do proporcional e do razoável, como nos presentes autos, não se sujeita à revisão judicial.

7. Ordem denegada.

(MS 21.773/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/10/2019, DJe 28/10/2019)

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. INCURSÃO NO MÉRITO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. PENA APLICADA. PROPORCIONALIDADE. PARÂMETROS. MAGISTRADO. CONDUTA INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, HONRA E DECORO DAS FUNÇÕES. SANÇÃO. ADEQUAÇÃO.

1. No controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade.

2. É firme o entendimento de que é possível o exame da penalidade imposta, acerca da proporcionalidade e da razoabilidade na aplicação da pena, já que estaria relacionada com a própria legalidade do ato administrativo.

3. Nos termos do art. 2º da Lei n. 9.784/1999, a Administração obedecerá, entre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa e contraditório, devendo os referidos postulados ser observados inclusive na aplicação dos atos sancionatórios.

4. Especificamente em relação à proporcionalidade, alguns parâmetros devem ser adotados, sendo três as balizas a serem observadas: i) adequação - verificando-se se a medida adotada é eficaz para alcançar o resultado pretendido; ii) necessidade - devendo ser observado se o fim almejado pode ser atingido por meio menos gravoso ou oneroso; iii) proporcionalidade em sentido estrito - consubstanciada na relação custo-benefício, ponderando-se se a providência acatada não irá sacrificar bem de categoria jurídica mais elevada do que aquele que se pretende resguardar.

5. Do magistrado exige-se comportamento ético, moral, ilibado e probo tanto na vida pública como na particular, devendo agir sempre de forma compatível com a relevante função que exerce, conforme inteligência do Código de Ética da Magistratura, aprovado pelo Conselho Nacional de Justiça em agosto de 2008, que estabeleceu preceitos complementares aos deveres funcionais dos juízes que emanam da Constituição Federal, do Estatuto da Magistratura e das demais disposições legais.

6. Hipótese em que mostra-se correta a aplicação da pena de aposentadoria compulsória com proventos proporcionais à magistrada ante a prática de conduta gravísssima, incompatível com a dignidade, honra e decoro de suas funções, qual seja, a determinação de busca e apreensão de armas que estariam em poder, supostamente, de um morador do condomínio no qual ela residia, sem provocação do Ministério Público ou de autoridade policial, diligência que ela conduziu pessoalmente, e, ainda, o confisco de câmera fotográfica e a voz de prisão dada à empregada doméstica da residência. Aplicação do art. 56, II, da LC 73/1979.

7. Recurso desprovido.

(RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019)

 

Portanto, ressalte-se que a análise dos pontos elencados pela parte-autora partirá dessa premissa, e apreciados segundo o respeito pela Administração aos princípios constitucionalmente garantidos.

De se registrar que da análise dos elementos que instruem o feito, tem-se que o procedimento administrativo impugnado foi conduzido regularmente, no qual as partes foram devidamente assistidas por advogados, houve a oitiva de testemunha e a colheita de diversas provas. Houve o interrogatório da requerida e a apresentação das defesas, culminando, ao final, com a aplicação da pena de demissão.

Refuto o alegado cerceamento de defesa em razão do indeferimento de testemunhas.

Os documentos juntados aos autos já se mostravam suficientes para a análise do pedido inicial, daí porque a produção da referida prova nada acrescentaria aos fatos já demonstrados para avaliação do mérito.

Frise-se que que o e. STJ e este TRF da 3ª Região reconhecem que o indeferimento de prova testemunhal, quando fundado na tese que outros meios de prova já se mostram suficientes para o deslinde da causa, bem como em razão do disposto no artigo 370, parágrafo único, do CPC, segundo o qual o juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

Nesse sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. ACERVO DOCUMENTAL SUFICIENTE. NÃO OCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. 1. O art. 130 do CPC consagra o princípio da persuasão racional, habilitando o magistrado a valer-se do seu convencimento, à luz das provas constantes dos autos que entender aplicáveis ao caso concreto. Não obstante, a aferição acerca da necessidade de produção de prova oral impõe reexame do conjunto fático-probatório encartado nos autos, o que é defeso ao STJ, ante o óbice erigido pela Súmula 7/STJ. 2. No tocante à suposta violação do art. 330, I, do CPC, sobreleva considerar que o acórdão recorrido consignou não haver o cerceamento de defesa, uma vez que o juiz encontrou nos autos elementos suficientes à formação de sua convicção, sendo-lhe facultado julgar o processo no estado em que se encontra, o que, à luz do ensinamento da Súmula 7 do STJ, não pode ser revisto em Recurso Especial. 3. Agravo Regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 550962/MG 2014/0178295-1, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 21/10/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/11/2014)  

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO. SÚMULA 85 STJ. GRATIFICAÇÃO POR TRABALHO COM RAIO-X E ADICIONAL DE IRRADIAÇÃO IONIZANTE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. VANTAGENS COM NATUREZA JURÍDICA DISTINTA. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELO PROVIDO. I - A realização de prova testemunhal sobre os fatos controvertidos é medida inútil e deve ser evitada em prol do princípio da economia processual, notadamente quando a prova documental ou os outros meios de prova determinados pelo magistrado forem suficientes para fornecer os dados esclarecedores, bem como em razão do disposto no artigo 130, do Código de Processo Civil-73, segundo o qual o magistrado deverá indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias. (...) IX - Agravo retido desprovido. Apelação provida. (TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2197667 - 0023341-15.2013.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 19/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/06/2018)

 

Como bem consignado na sentença, “a prova testemunhal não se presta à comprovação dos supostos vícios de que padeceria o PAD (ofensa aos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal), cuja ocorrência (ou não) demanda análise dos autos do processo administrativo disciplinar, prova eminentemente documental, que, no caso concreto, foi juntada em sua integralidade”.

As irregularidades apuradas no procedimento administrativo, estão assim descritas:

- Inexistência de assinatura dos segurados ou procuradores nos requerimentos de alguns benefícios;

- Requerimentos de benefícios cujas assinaturas se apresentam divergentes daquelas constantes no documento;

- Existência de dois requerimentos em um único processo, em que apenas um dos requerimentos se apresenta com assinatura;

- Não comparecimento do segurado ou procurador para protocolo de benefícios, conforme consulta ao SGA - Sistema de Gestão de Atendimento;

- Inexistência de procuração e cópia de documentos do procurador nos processos de benefícios;

- Enquadramento de atividade especial promovido administrativamente, embora em benefício anterior do mesmo segurado houvesse solicitação de enquadramento pela área médica, que não foi reconhecido.

Diante das irregularidades descritas, entendeu a Administração que "(..) a indiciada concedia tratamento privilegiado a procuradores do seu círculo de convivência, o que é confessado pela própria servidora e admitido por dois intermediários que atuaram nos processos sob exame. Nesse sentido, a servidora protocolou benefícios sem a presença dos segurados e sem que tenha sido juntada procuração aos processos concessórios. A acusada, em diversas ocasiões, atendeu os procuradores em data e horário divergentes do agendamento, segundo sua conveniência, fazendo-o sem o trâmite regular estabelecido pela autarquia e a rotina da agência, uma vez que procuradores favorecidos não retiravam senha nem se submetiam ao sistema SGA. Os protocolos de requerimento sequer eram assinados pelo segurado ou pelo procurador. O fato de não serem juntadas as procurações nem cadastrados os procuradores evidencia que a servidora procurava dissimular a intermediação e o procedimento adotado." Após o processamento, foi aplicada à demandante, por meio da Portaria n 2460, de 27 de abril de 2016, do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência Social, a penalidade de demissão com fundamento no art. 117, IX, por força do art. 132, XIII, e com os efeitos do art. 137, da Lei n 28.112/90, por ter praticado a infração administrativa de valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem em detrimento da dignidade da função pública.

Tenho que todas as assertivas do autor se mostram descabidas, como, aliás, bem refutadas na sentença recorrida. Vejamos.

No que diz respeito à alegação de não ter tido a autora a oportunidade de produzir contraprovas no procedimento administrativo disciplinar, verifica-se que não foi apontada qual a prova ou ato do processo disciplinar que pretendia produzir contraprova.

Ademais, da análise do PAD acostado aos autos, tem-se que tramitou de maneira com que se oportunizou o acompanhamento e a produção de provas pela autora. Aponte-se que houve a regular intimação da servidora da instauração do PAD, facultando-lhe a produção de provas, foi intimada das oitivas das testemunhas, facultando-lhe o acompanhamento. Ficou demonstrado que a servidora teve acesso ao inteiro teor do PAD, inclusive com a entrega de cópias das peças processuais, acompanhou as oitivas de seu interesse, arrolou testemunhas – que foram ouvidas pela comissão processante, procedeu-se ao seu interrogatório, o seu termo de indiciamento foi devidamente fundamentado, foi citada, apresentou defesa escrita, cujas alegações foram examinadas no relatório final do PAD. Enfim, não se vislumbra qualquer ofensa ao contraditório e à ampla defesa.

Não obstante isso, busca a autora opor irregularidades inexistentes. Sustenta a servidora, no tocante às testemunhas ouvidas, que deveria ter sido procedido à acareação delas.

A Lei nº 8.112/1990, ao dispor sobre o processo disciplinar do servidor, estabelece, em seu art. 158, §2º, que, na hipótese de depoimentos contraditórios ou que se infirmem, deverá se dar a acareação dos depoentes.

No caso em tela, a própria servidora admite a convergência dos depoimentos prestados; porém, busca confrontar o que foi dito pelas testemunhas e a conclusão da comissão processante.

Com efeito, aduz a servidora que as testemunhas teriam afirmado que outorgaram procurações para que despachantes protocolassem pedidos de benefícios previdenciários, ao passo que a conclusão do PAD foi a de que os processos concessórios não estavam instruídos com as referidas procurações.

Porém, como bem apontado pelo magistrado sentenciante, “era plenamente possível que um segurado assinasse uma procuração para o despachante e este, ao protocolar o benefício, deixasse de juntá-la ao pedido”, acrescentando que, na verdade, a conduta investigada no PAD foi a circunstância do pedido ter sido processado sem a juntada das procurações, independentemente te ter sido outorgada pelos segurados, situação essa que viola disposições da IN nº 45/2010 que impõem a juntada do respectivo instrumento de mandato nos processos.

Registre-se que a própria segurada admitiu, em interrogatório, que dispensava a juntada de procurações para as pessoas com quem nutria amizade.

Assim, não se justifica a acareação das testemunhas pretendida.

Com relação à argumentação de que há vício a macular a prova do PAD - que teria sido obtido de forma escusa, melhor sorte não lhe assiste.

A autora sustenta a existência de vício na prova, consistente na apreensão de processos administrativos concessórios de benefícios de sua mesa de trabalho sem seu conhecimento e sem que tenha, antes de tudo, lhe indagado sobre os bilhetes anexados aos processos concessórios.

Ora, como bem aduziu o INSS em suas contrarrazões, não há que se falar em “subtração irregular dos processos administrativos da mesa de trabalho da autora, já que não são parte de seu patrimônio, nem dizem respeito à sua intimidade, tratando-se de pedidos de terceiros a uma autarquia federal com vistas à obtenção de um benefício previdenciário, sendo lícita a retenção dos documentos para o correto esclarecimento dos fatos de que tomou conhecimento o ente público”.

Ademais, a autora não cuidou de provar ter havido qualquer adulteração de provas no PAD, nem mesmo indicar no que consistiria.

Não há que se falar em atipicidade da conduta. Com efeito, o art. 117, IX, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a proibição do servidor em “valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública”.

Assim, foi responsável pela concessão de benefícios previdenciários sem a observância dos regulamentos do INSS, favorecendo ilicitamente terceiras pessoas. Restou demonstrado que a autora concedia tratamento privilegiado a procuradores do seu círculo de convivência, aliás, por ela admitido, assim como por intermediários que atuaram nos processos.

No que diz com a alegada desproporcionalidade da pena, a conduta, tal como atribuída à servidora, feriu gravemente a lealdade para com a instituição que integrava, resultando em atos que atentaram contra a finalidade última da autarquia que é zelar pela correta concessão dos benefícios.

Sobre a questão, confira-se, julgados do e.STJ:

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AUXILIAR DE SANEAMENTO DA FUNASA. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PROVA EMPRESTADA DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. PENA DE DEMISSÃO. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. SEGURANÇA DENEGADA.

I - O Supremo Tribunal Federal adota orientação segundo a qual é possível a utilização, em processo administrativo disciplinar, como prova emprestada, de interceptações telefônicas obtidas no curso de investigação criminal ou de instrução processual penal, desde que obtidas com autorização judicial e assegurada a garantia do contraditório. Precedentes.

II - Extrai-se ter sido franqueado aos Impetrantes, pela comissão processante, acesso ao Processo Administrativo Disciplinar n. 25100.032.639/2010-37 e às provas colhidas por meio da interceptação telefônica, no bojo do Inquérito Policial n. 411/2009, devidamente autorizada pela Justiça Federal.

III - O ato impugnado foi devidamente fundamentado, não havendo, assim, falar em ausência de motivação.

IV - Apesar das interceptações telefônicas terem sido juntadas aos autos do processo administrativo disciplinar antes da realização dos interrogatórios dos Impetrantes, foi-lhes oportunizada manifestação a respeito de tais provas emprestadas por intermédio de defesa escrita devidamente examinada pela comissão processante por ocasião da elaboração do Relatório Final da CPAD, não havendo falar em cerceamento de defesa.

V - Em processo administrativo disciplinar, apenas se declara a nulidade de um ato processual quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa, por força da aplicação do princípio pas de nullité sans grief. Não havendo efetiva comprovação de prejuízos suportados pela defesa, concluir em sentido diverso demandaria dilação probatória, o que não é possível em sede de mandado de segurança, no qual se exige prova documental pré-constituída. Precedentes.

VI - Sanção aplicada em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo a pena de demissão adequada e necessária face aos elementos probatórios que apontam a consumação das infrações constantes do art. 117, IX e XII, da Lei n. 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União).

VII - Segurança denegada.

(MS 19.000/DF, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2021, DJe 06/04/2021)

 

MANDADO DE SEGURANÇA - SERVIDOR PÚBLICO - DEMISSÃO - CERCEAMENTO DE DEFESA - NÃO-OCORRÊNCIA - DILAÇÃO PROBATÓRIA - IMPOSSIBILIDADE PELA VIA ELEITA - PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE - OBSERVÂNCIA.

1. Havendo identidade na indicação dos dispositivos de lei referentes às infrações imputadas ao ora impetrante no indiciamento e na Portaria que impôs a penalidade, não subsiste a alegação de que a aplicação da sanção se deu com fundamentação diversa da indiciação, não havendo que falar em nulidade do ato por esse motivo.

2. Não há cerceamento de defesa ou abuso de autoridade quando devidamente apreciada e valorada a prova material apresentada pelo acusado pela Comissão de Processo Administrativo Disciplinar e pela autoridade responsável pela aplicação da penalidade.

3. Reabrir a discussão a respeito da ausência de capacidade do impetrante para discernir a respeito de sua conduta ou de intenção lesiva na prática do ato demandaria indispensável dilação probatória, circunstância esta incompatível com o rito do mandado de segurança. Precedentes.

4. Há observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade quando a punição se dá em decorrência de infração apurada em Processo Administrativo Disciplinar, comprovada a conduta e suficientemente motivadas as razões da sanção.

5. Segurança denegada.

(MS 18.081/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2013, DJe 13/05/2013)

 

Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o percentual da verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017), observando-se o art. 98, § 3º, do CPC, em vista de a parte ser beneficiária de gratuidade.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. CERCEAMENTO DE DIREITO DE DEFESA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. PENALIDADE APLICA. PROPORCIONALIDADE.

- No controle do processo administrativo, a análise do Poder Judiciário se restringe à verificação de vícios capazes de ensejar a sua nulidade, sendo-lhe defeso incursionar no mérito administrativo, salvo patente infração a garantias processuais ou dos limites jurídicos da avaliação do julgador administrativo.

- No caso dos autos,  de se registrar que da análise dos elementos que instruem o feito, tem-se que o procedimento administrativo impugnado foi conduzido regularmente, no qual as partes foram devidamente assistidas por advogados, houve a oitiva de testemunha e a colheita de diversas provas. Houve o interrogatório do requerido e a apresentação das defesas, culminando, ao final, com a aplicação da pena de demissão. As testemunhas ouvidas reforçaram a conclusão das irregularidades dos procedimentos adotados.

- Não há que se falar em atipicidade da conduta, na medida em que o art. 117, IX, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a proibição do servidor em “valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública”, ressaindo daí que sendo o autor responsável pela concessão indevida de benefícios previdenciários, por treze vezes, sempre envolvendo a mesma procuradora, agiu contrariamente aos regulamentos do INSS, favorecendo ilicitamente terceiras pessoas.

- Não se oponha a desproporcionalidade da pena, já que a conduta, tal como atribuída ao servidor, feriu gravemente a lealdade para com a instituição que integrava, resultando em atos que atentaram contra a finalidade última da autarquia que é zelar pela correta concessão dos benefícios.

- Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.