Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022755-70.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: ASTER SISTEMAS DE SEGURANCA LTDA

Advogado do(a) APELANTE: VICTOR SOLLA PEREIRA SILVA JORGE - SP357502-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022755-70.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: ASTER SISTEMAS DE SEGURANCA LTDA

Advogado do(a) APELANTE: VICTOR SOLLA PEREIRA SILVA JORGE - SP357502-A

APELADO: UNIAO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de ação ajuizada por Aster Sistemas de Segurança Ltda. em face da União, objetivando a anulação do Auto de Constatação e Infração n° 4649/2015 e do processo administrativo n° 2015/7497 - DELESP/DREX/SR/DPF/SP, a declaração de legalidade da prestação de serviços de segurança pessoal privada, nos termos da Lei n° 7.102/83, bem como a declaração de incompetência da Polícia Federal para cobrança de multa e juros de mora realizada por meio de Ofício-Circular.

A autora depositou em juízo o valor da multa questionada, ao passo que foi suspensa a exigibilidade do crédito (ID 127252756 - Pág. 159).

O MM. Juiz a quo julgou improcedente o pedido e condenou a autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, nos termos do artigo 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil. Determinou-se que, após o trânsito em julgado, seja convertido em renda, em favor da parte ré, o valor depositado em juízo pela autora (ID 127252756 - Pág. 248-253).

A autora apelou, sustentando, em síntese, que:

a) foi autuada por estar, supostamente, exercendo atividade em desacordo com a autorização concedida pela Polícia Federal, no entanto, a sentença não se atentou para a ausência de documento essencial, qual seja, a declaração do vigilante abordado, com sua assinatura, para reconhecer a validade da autuação, bem como conferiu interpretação equivocada do tipo de serviço prestado, reconhecendo a atividade como vigilância em vias públicas e não como segurança privada pessoal, que é o certo, além de não reconhecer a incompetência da Polícia Federal para a cobrança de multa aplicada por ela mesma;

b) no depoimento colhido em audiência de instrução e julgamento, o próprio agente federal declarou que não seguiu as normas legais para a lavratura do auto de infração, vez que fez “anotações num caderno e depois passou para o termo do auto de infração”, sem qualquer assinatura do vigilante, o que já seria suficiente para derrubar a tese de fé pública, pois o processo administrativo não é um rito sem nexo ou finalidade que pode ser conduzido pelo agente administrativo da forma que melhor entender, já que existem formalidades legais que devem ser respeitadas para que o ato tenha validade e para que o administrado possa se defender efetivamente;

c) o Juízo a quo considerou que a declaração do vigilante, ouvido em audiência, não afastaria o teor do depoimento do agente federal, mesmo tendo assumido que não seguiu as normas legais, porque a testemunha tinha aparentado nervosismo, mas não é razoável firmar entendimento com base no nervosismo de uma testemunha, isto é, em impressões pessoais do magistrado;

d) a demonstração do vício na formação do processo administrativo é patente, assim, é de se concluir que o processo administrativo é nulo, porque retirou da apelante o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa;

e) a apelante realiza a prestação de serviços de segurança pessoal a um grupo de contratantes específicos e individualizados, que residem na região em que houve a fiscalização, e que, como escopo do contrato firmado, a apelante possui uma base de apoio, em ponto estratégico do bairro, dispondo de um veículo com vigilante à disposição dos moradores, de forma que, quando o contratante necessita deixar sua residência ou se aproxima dela, entra em contato com a apelante e esta designa a viatura para que acompanhe o morador até a sua casa ou até a saída desta área, contudo, tal serviço não configura vigilância patrimonial ou escolta armada, como se decidiu, mas sim segurança pessoal, uma vez que o objetivo é assegurar a incolumidade física dos contratantes;

f) o fato de a apelante ter apresentado defesa administrativa não se traduz como o exercício da plenitude de defesa, visto que a apresentação de defesa foi realizada para que o processo não corresse à revelia, entretanto, não quer dizer que as formalidades legais foram seguidas pelo ente público, e que o administrado defendeu-se até do que não tinha conhecimento, além disso, a fundamentação da decisão administrativa se deu pelo art. 18 da Portaria nº 3.233/12, o qual trata de vigilância patrimonial em eventos sociais, mas o caso dos autos está baseado no art. 1º, § 3º, IV, da Portaria 3.233/12, que explicita a atividade da segurança pessoal;

g) a Polícia Federal não é competente para inovar, instituindo e cobrando multa de 10% sobre as multas aplicadas pelo próprio órgão e não pagas, uma vez que se trata de matéria tributária, e como tal, somente a autoridade competente é quem poderá fazê-lo.

Com contrarrazões, vieram os autos para este Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022755-70.2016.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: ASTER SISTEMAS DE SEGURANCA LTDA

Advogado do(a) APELANTE: VICTOR SOLLA PEREIRA SILVA JORGE - SP357502-A

APELADO: UNIAO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter a anulação do Auto de Constatação e Infração n° 4649/2015 e do processo administrativo n° 2015/7497 - DELESP/DREX/SR/DPF/SP, a declaração de legalidade da prestação de serviços, pela autora, de segurança pessoal privada, nos termos da Lei n° 7.102/83, bem como a declaração de incompetência da Polícia Federal para cobrança de multa e juros de mora realizada por meio de Ofício-Circular.

Narra a exordial que a autora é pessoa jurídica de direito privado, com atuação, há mais de 15 (quinze) anos, nas atividades de segurança patrimonial, nos termos da Portaria n° 314 de 04.05.2000, e segurança pessoal privada, nos termos do alvará n° 3686 de 14.09.2009, possuindo Autorização de Funcionamento válida até o dia 02.03.2017, expedida pela Polícia Federal.

Alega que, no dia 24.08.2015, sofreu fiscalização/abordagem realizada no endereço Av. Padre Pereira de Andrade, na cidade de São Paulo, quando foi constatado, erroneamente, que o vigilante Emanoel Ferreira de Araújo estava desempenhando suas funções fora dos limites do seu local de serviço, visto que o veículo da empresa Aster se encontrava em vias públicas com o giroflex ligado, fazendo a segurança das casas do local.

Afirma, ainda, que, segundo a autoridade policial, o vigilante, devidamente fardado, informou fazer a ronda, vigilância ostensiva e escolta dos veículos dos moradores pelas imediações daquela rua, configurando, em tese, a infração prevista no art. 171, IX, da Portaria DPF 3.233/2012, o que não merece subsistir, pois possui autorização para a prestação do serviço em questão.

Pois bem. A Polícia Federal tem atribuição definida pela Lei nº 7.102/83 e Decreto nº 89.056/83 para autorizar e fiscalizar as atividades de segurança privada, definidas pelo art. 10 da citada Lei (vigilância patrimonial em estabelecimentos públicos e privados, segurança de pessoas físicas, transporte de valores, escolta armada e atividade de formação de vigilantes).

De acordo com o artigo 1º, § 1º, da Portaria DPF 3.233/2012, “as atividades de segurança privada serão reguladas, autorizadas e fiscalizadas pelo Departamento de Polícia Federal - DPF e serão complementares às atividades de segurança pública nos termos da legislação específica”.

Essa atividade, cumpre asseverar, se dá por meio de pessoal treinado e investigado quanto à sua idoneidade e antecedentes criminais e, por isso, não pode ser desempenhada de maneira aleatória, sob pena de servir de fachada para todo tipo de atividade ilícita ou abuso no uso da força, sendo esta uma das razões de seu controle estatal.

Acerca dessa questão, o § 3º do supracitado dispositivo normativo especifica quais são as atividades consideradas de segurança privada. In verbis:

“I - vigilância patrimonial: atividade exercida em eventos sociais e dentro de estabelecimentos, urbanos ou rurais, públicos ou privados, com a finalidade de garantir a incolumidade física das pessoas e a integridade do patrimônio;

II - transporte de valores: atividade de transporte de numerário, bens ou valores, mediante a utilização de veículos, comuns ou especiais;

III - escolta armada: atividade que visa garantir o transporte de qualquer tipo de carga ou de valor, incluindo o retorno da equipe com o respectivo armamento e demais equipamentos, com os pernoites estritamente necessários;

IV - segurança pessoal: atividade de vigilância exercida com a finalidade de garantir a incolumidade física de pessoas, incluindo o retorno do vigilante com o respectivo armamento e demais equipamentos, com os pernoites estritamente necessários; e

V - curso de formação: atividade de formação, extensão e reciclagem de vigilantes” (grifei).

O artigo 18 da Portaria DPF 3.233/2012, por sua vez, prevê que a atividade de vigilância patrimonial somente poderá ser exercida dentro dos limites dos imóveis vigiados e, nos casos de atuação em eventos sociais, como show, carnaval, futebol, deve se ater ao espaço privado objeto do contrato” (grifei).

Assim, para realizar alguma atividade relacionada à segurança privada, a empresa deve se atentar para os limites e parâmetros estabelecidos nesse ato normativo.

Com efeito, a realização de rondas e patrulhas somente pode ocorrer no interior de estabelecimentos, públicos ou privados, nos quais exista efetivamente um posto de vigilância patrimonial, porquanto a segurança das vias públicas é dever e atribuição do Estado.

Deveras, a vigilância patrimonial desenvolve-se de forma fixa, no interior de estabelecimentos, objetivando prevenir a ocorrência de delitos como instrumento ostensivo de dissuasão de intentos criminosos, e não de forma itinerante, em vias públicas.

Registre-se que a circulação de vigilantes em vias públicas, armado ou desarmado, apenas é autorizada nas atividades de transporte de valores, escolta armada e segurança pessoal.

No que tange à atividade de segurança pessoal, o vigilante pode se certificar de que o local está seguro para a entrada ou saída do indivíduo contratante do serviço, desde que ele esteja efetivamente acompanhando o indivíduo.

No caso sub judice, todavia, o que se constata é que a empresa autora foi autuada pelo Departamento de Polícia Federal por desempenhar suas funções fora dos limites do seu local de serviço, visto que o veículo da empresa Aster se encontrava em vias públicas, com o giroflex ligado, fazendo a segurança das casas do local.

Conquanto a autora tivesse autorização, renovada todos os anos, para a prestação do serviço de segurança privada, verifica-se que o Alvará nº 1.165, de 20 de março de 2015, concedido pela DPF e válido à época da autuação, menciona que a atividade da empresa se dá nas áreas de vigilância patrimonial e de segurança pessoal (ID 127252756 - Pág. 92), mas, no momento da fiscalização, o funcionário da autora não fazia uma coisa nem outra.

Segundo informações prestadas pelo agente da Polícia Federal, uma viatura da empresa Aster estava em via pública com as luzes de emergência ("giroflex") piscando, primeiro, às 9h00, nas proximidades da Av. Fonseca Rodrigues, fazendo a segurança de uma das residências dessa avenida durante a chegada até a saída de um caminhão de entregas, depois, parado na altura do entroncamento com a Rua dos Escultores, onde o vigilante permaneceu fora do veículo, na calçada, com as luzes de emergência do carro ainda piscando, trajando uniforme ostensivo, das 9h15 até o momento da abordagem policial, às 9h45 (ID 127252756 - Pág. 67-68).

Note-se, deste modo, que o vigilante não acompanhava nenhuma pessoa, fazendo a sua segurança pessoal, tampouco se encontrava no interior de algum estabelecimento, em seu posto de vigilância, razão pela qual a multa foi corretamente aplicada, nos termos do art. 171, IX, da Portaria DPF 3.233/2012.

Muito embora o vigilante tenha afirmado em sua oitiva em juízo que não acompanhava os moradores durante o recebimento de encomendas diversas, o juízo a quo destacou na sentença o nervosismo da testemunha durante a audiência. A propósito, a prova exclusivamente testemunhal não tem força para, isolada dos demais elementos probatórios, afastar a presunção de legitimidade/veracidade do ato administrativo, devendo ser valorada de acordo com a qualidade do depoimento prestado em juízo.

Em verdade, a Administração não tem o ônus de provar que seus atos são legais e a situação que gerou a necessidade de sua prática realmente existiu, cabendo ao destinatário do ato o encargo de provar que o agente administrativo agiu de forma ilegítima.

Cabe destacar, ademais, que o fato de o vigilante não ter sido ouvido na via administrativa não tem o condão de anular a autuação ou mesmo o processo administrativo, pois o agente policial possui fé pública, afastada somente por prova robusta em sentido contrário.

A autora, porém, não logrou êxito em comprovar, seja por meio de prova testemunhal, seja por meio de prova documental, qualquer vício existente na autuação capaz de invalidá-la, destacando-se que a empresa foi devidamente intimada de todos os atos processuais ocorridos na esfera administrativa, podendo, assim, defender-se dos atos que lhe foram imputados, em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Além disso, a Portaria DPF 3.233/2012 não exige a assinatura do vigilante no auto de infração, bastando para a sua validade a indicação de data, hora, local, descrição do fato, qualificação dos vigilantes e outras circunstâncias relevantes (art. 186).

Ainda que assim não fosse, a ausência de assinatura do vigilante ocorreu por conta da fiscalização ter precedido à lavratura do auto de infração, o que, de forma alguma, prejudicou a defesa da empresa autuada, até mesmo porque o auto de infração não terá a sua eficácia condicionada à assinatura do infrator ou de testemunhas.

Por fim, como bem consignado na sentença, “a Polícia Federal é competente para cobrança da multa imposta e de seus consectários, sejam multas e juros, ambos de mora, pois devidamente caracterizada a mora. Situação diversa é a execução da multa, bem como dos acréscimos, que compete à Advocacia Geral da União, que não se confunde com a cobrança administrativa” (ID 127252756 - Pág. 252).

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO. EMPRESA DE SEGURANÇA PRIVADA AUTUADA POR PRESTAR SERVIÇOS EM DESACORDO COM A AUTORIZAÇÃO EXPEDIDA PELA POLÍCIA FEDERAL. LEI 7.102/83. PORTARIA 3233/12-DG/DPF. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter a anulação do Auto de Constatação e Infração n° 4649/2015 e do processo administrativo n° 2015/7497 - DELESP/DREX/SR/DPF/SP, a declaração de legalidade da prestação de serviços, pela autora, de segurança pessoal privada, nos termos da Lei n° 7.102/83, bem como a declaração de incompetência da Polícia Federal para cobrança de multa e juros de mora realizada por meio de Ofício-Circular.

2. A Polícia Federal tem atribuição definida pela Lei nº 7.102/83 e pelo Decreto nº 89.056/83 para autorizar e fiscalizar as atividades de segurança privada, definidas pelo art. 10 da citada Lei (vigilância patrimonial em estabelecimentos públicos e privados, segurança de pessoas físicas, transporte de valores, escolta armada e atividade de formação de vigilantes).

3. A realização de rondas e patrulhas somente pode ocorrer no interior de estabelecimentos, públicos ou privados, nos quais exista efetivamente um posto de vigilância patrimonial, porquanto a segurança das vias públicas é dever e atribuição do Estado.

4. A circulação de vigilantes em vias públicas, armado ou desarmado, apenas é autorizada nas atividades de transporte de valores, escolta armada e segurança pessoal. No que tange à esta última hipótese, o vigilante pode se certificar de que o local está seguro para a entrada ou saída do indivíduo contratante do serviço, desde que ele esteja efetivamente acompanhando o indivíduo.

5. No caso sub judice, todavia, o que se constata é que a empresa autora foi autuada pelo Departamento de Polícia Federal por desempenhar suas funções fora dos limites do seu local de serviço, visto que o veículo da empresa Aster se encontrava em vias públicas, com o giroflex ligado, fazendo a segurança das casas do local.

6. O vigilante, de fato, não acompanhava nenhuma pessoa, fazendo a sua segurança pessoal, tampouco se encontrava no interior de algum estabelecimento, em seu posto de vigilância, razão pela qual a multa foi corretamente aplicada, nos termos do art. 171, IX, da Portaria DPF 3.233/2012.

7. A Portaria DPF 3.233/2012 não exige a assinatura do vigilante no auto de infração, bastando para a sua validade a indicação de data, hora, local, descrição do fato, qualificação dos vigilantes e outras circunstâncias relevantes (art. 186).

8. Ainda que assim não fosse, a ausência de assinatura do vigilante ocorreu por conta da fiscalização ter precedido à lavratura do auto de infração, o que, de forma alguma, prejudicou a defesa da empresa autuada, até mesmo porque o auto de infração não terá a sua eficácia condicionada à assinatura do infrator ou de testemunhas.

9. A Polícia Federal é competente para cobrança da multa imposta e de seus consectários legais, pois devidamente caracterizada a mora. Situação diversa é a execução da multa, bem como dos acréscimos, que compete à Advocacia Geral da União, o que não se confunde com a cobrança administrativa.

10. Apelação desprovida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.