HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5006259-32.2022.4.03.0000
RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES
PACIENTE: MARCOS ANTONIO FERREIRA, MARIZA DA SILVA STRAMBECK TARGINO
IMPETRANTE: LARISSA PALERMO FRADE, FABIO NASCIMENTO RUIZ, JONATHAN ARIEL RAICHER
Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A
Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A
IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 9ª VARA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5006259-32.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES PACIENTE: MARCOS ANTONIO FERREIRA, MARIZA DA SILVA STRAMBECK TARGINO Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 9ª VARA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de habeas corpus impetrado por Larissa Palermo Frade Sinigallia, Jonathan Raicher e Fábio Ruiz em favor de MARCOS ANTONIO FERREIRA e MARIZA DA SILVA STRAMBECK TARGINO, contra ato imputado ao Juízo da 9ª Vara Federal de Campinas/SP, nos autos da ação penal nº 0003820-30.2017.4.03.6105. Consta da impetração que os pacientes foram denunciados pela prática de crimes dos arts. 90 e 96, inciso I da lei 8.666/93 c/c art. 29 do CP. Apontam que foi promulgada nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos - lei 14.133/2021 e o inciso I do art.190 determinou a revogação dos crimes previstos nos arts. 89 a 108 da lei 8.666/933, e, assim, operou-se a abolitio criminis da conduta atribuída aos pacientes e prevista no art. 96, inciso I da Lei 8.666/93. Sustentam que o novel art. 337-L do Código Penal promoveu parcial continuidade típico-normativa, uma vez que se dividiram e foram especificadas nos incisos I e IV do art. 337-L, do Código Penal, as condutas que, anteriormente, encontravam-se reunidas em um só inciso: o IV do art. 96 da Lei n.º 8.666/1993. Outrossim, a figura típica elevação arbitrária de preços não mais consta na redação, pois foi suprimida. Considerando as regras relativas à sucessão de leis penais no tempo, previstas no artigo 5º, XL, da Constituição Federal e no artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, requerem seja concedida ordem de Habeas Corpus para declarar a extinção da punibilidade dos pacientes, nos termos do artigo 107, III, do Código de Processo Penal, no que diz respeito à imputação do crime previsto no artigo 96, I, da Lei 8.666/93. Também alegam negativa de jurisdição em face da recusa de apreciação de pedido defensivo pela autoridade impetrada, pois a abolitio criminis é matéria de ordem pública, reconhecível a qualquer tempo, bem como porque com o reconhecimento da questão, os pacientes fariam jus ao oferecimento de proposta de suspensão condicional do processo ou de acordo de não persecução penal (ANPP), diante da imputação remanescente (art. 90, da lei 8.666/93). Discorrem sobre sua tese e requer a concessão da liminar que seja suspensa a ação penal de origem, bem como das audiências já designadas entre os dias 23 a 26 de maio de 2022 e 06 e 09 de junho de 2022 até apreciação do mérito deste writ. No mérito, requerem seja declarada a extinção da punibilidade dos Pacientes, por abolitio criminis, em relação à imputação do art. 96, I, da Lei de Licitações. Subsidiariamente, requerem seja a ordem concedida para que sejam canceladas as audiências de instrução designadas e se determine que a autoridade coatora aprecie esse mesmo pedido, já realizado nos autos de origem. A liminar foi indeferida (ID 254499905). A autoridade impetrada prestou suas informações (ID 254679746). O Exmo. Procurador Regional da República, Alvaro Luiz de Mattos Stipp, manifestou-se pela não concessão da ordem (ID 254672414). Os impetrantes informam que o writ perdeu parcialmente seu objeto, pois a autoridade impetrada decidiu por indeferir o pedido defensivo de reconhecimento da abolitio criminis e, assim, reiteram que esta E. Corte reconheça a abolitio criminis ocorrida em relação ao art. 96, I da Lei 8.666/93 (ID 254802256). O Ministério Público Federal reiterou o parecer anterior e pugnou pela denegação da ordem (ID 255386316). É o relatório.
IMPETRANTE: LARISSA PALERMO FRADE, FABIO NASCIMENTO RUIZ, JONATHAN ARIEL RAICHER
Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A
HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5006259-32.2022.4.03.0000 RELATOR: Gab. 16 - DES. FED. PAULO FONTES PACIENTE: MARCOS ANTONIO FERREIRA, MARIZA DA SILVA STRAMBECK TARGINO Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPINAS/SP - 9ª VARA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A ação de habeas corpus tem pressuposto específico de admissibilidade, consistente na demonstração primo ictu oculi da violência atual ou iminente, qualificada pela ilegalidade ou pelo abuso de poder, que repercuta, mediata ou imediatamente, no direito à livre locomoção, conforme previsão do art. 5.º, inc. LXVIII, da Constituição Federal e do art. 647 do Código de Processo Penal. É sob esse prisma, pois, que passo a analisar a presente impetração. Consta que os pacientes, e outros corréus, foram denunciados como incursos no art. 90 e 96, inciso I da Lei 8.666/93. A peça acusatória foi proposta perante este E. Tribunal, o qual considerou que apenas JAIME CÉSAR DA CRUZ detinha prerrogativa de função, e determinou o desmembramento do feito e continuidade em relação aos demais na primeira instância, o que originou a ação penal 0003820-30.2017.403.6105 que ora se pretende trancar. A denúncia foi recebida em 06/12/2017, tendo os pacientes apresentado resposta à acusação, na qual alegaram inépcia da denúncia e ausência de indícios de autoria e materialidade. O juízo entendeu que se trata de questão relativa ao mérito da demanda a qual não encontra amparo em nenhuma das hipóteses elencadas no artigo 397 do Código de Processo Penal, as quais serão devidamente apreciadas por ocasião da prolação da sentença. Desta forma, ausentes os fundamentos para a absolvição sumária, foi determinado o prosseguimento do feito. Verifica-se que os pacientes foram denunciados como incursos no art. 90 e 96, inciso I da Lei 8.666/93 em razão da realização de procedimentos licitatórios na modalidade de pregão público presencial, entre os anos de 2010 e 2013, portanto em período anterior à Lei 14.133/2021. No tocante à alegação de abolitio criminis, somente se mostra lícito acolher essa tese quando esta for flagrante ou manifesta, ou seja, constatável primo ictu oculi. Com a superveniência da edição da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, as Seções III (Dos Crimes e das Penas) e IV (Do Processo e do Procedimento Judicial) do Capítulo IV (Das Sanções Administrativas e da Tutela Judicial) da Lei nº 8.666/1993 foram expressamente revogadas na data de sua publicação, sendo que o art. 193 da Lei nº 14.133/2021 dispõe que: Revogam-se: I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei. Ao mesmo tempo o art. 178 da Lei nº 14.133/2021 fez incorporar o “CAPÍTULO II-B – DOS CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS” (arts. 337-E a 337-P) no Título XI da Parte Especial do Código Penal, prevendo os novos tipos penais. A revogação dos crimes da Lei 8.666/93 não significa, contudo, que, necessariamente, tenha ocorrido “abolitio criminis”. Ao cotejarmos o art. 337-F e o artigo 337-L com os arts. 90 e 96 da Lei 8.666/93, verifica-se uma continuidade normativo-típica, pois o caráter criminoso do fato foi mantido, mas apenas em outro dispositivo penal. Também não se pode falar em supressão da hipótese descrita no inciso I do art. 96, da Lei 8.666/93, (elevando arbitrariamente os preços). O novel art. 337-L, em seu inciso V, previu uma fórmula genérica, impondo o uso da interpretação analógica que abrange a elevação arbitrária de preços como um meio fraudulento que torne a licitação mais onerosa para a Administração Pública. Art. 337-L. Fraudar, em prejuízo da Administração Pública, licitação ou contrato dela decorrente, mediante: (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021) (...) V - qualquer meio fraudulento que torne injustamente mais onerosa para a Administração Pública a proposta ou a execução do contrato: (Incluído pela Lei nº 14.133, de 2021) (destaquei) Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa. Ademais, há a superveniência de novatio legis in pejus, uma vez que as penas cominadas foram agravadas com a nova lei, pois o preceito secundário dos arts. 90 e 96 eram mais benéficos aos pacientes, já que previam pena de detenção, em oposição à pena de reclusão agora cominada. Desta sorte não é possível acolher a alegação de que a conduta imputada aos pacientes seria atípica. Nesse sentido o recente julgado da Décima Primeira Turma desta e. Corte: PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ANÁLISE DO CASO CONCRETO: (A) IMPOSSIBILIDADE DE SE RECONHECER A ATIPICIDADE DAS CONDUTAS IMPUTADAS (SEQUER EM RAZÃO DA EDIÇÃO DA LEI Nº 14.133, DE 1º DE ABRIL DE 2021); (B) PRESENÇA DE SUPORTE PROBATÓRIO MÍNIMO (JUSTA CAUSA) PARA A DEFLAGRAÇÃO DA PERSECUÇÃO PENAL; E (C) RESPEITO, PELA DENÚNCIA PROTOCOLIZADA, DOS REQUISITOS ASSENTADOS NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ORDEM DENEGADA. - A possibilidade de trancamento da Ação Penal, por meio do manejo de Habeas Corpus, é medida excepcional, somente admitida quando restar evidenciada dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade do revolvimento do arcabouço fático-probatório, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção de sua punibilidade. Precedentes de nossas C. Cortes Superiores e deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. - Adentrando ao caso concreto, mostra-se defeso anuir com os argumentos apresentados pelo impetrante/paciente, de molde que impossível trancar a Ação Penal subjacente por meio da concessão de ordem mandamental de Habeas Corpus, seja porque não se nota, de plano, a atipicidade das condutas que lhe foram imputadas (sequer em razão da edição da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021), seja porque não há que se falar em ausência de suporte probatório mínimo (justa causa) para a deflagração da persecução penal, seja, ainda, porque a exordial acusatória não pode ser acoimada de inepta. - Analisando os elementos fático-probatórios trazidos à colação pelo impetrante/paciente (que se resumem a cópia da denúncia ofertada pelo órgão acusatório e a r. decisão que a recebeu), depreende-se a impossibilidade de se aquiescer com a alegação de que as condutas descritas pelo Parquet federal seriam atípicas, havendo a expressa imputação, segundo visão acusatória e respaldada em anterior investigação, dos delitos de dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais (art. 89 da Lei nº 8.666/1993), de frustração do caráter competitivo do certame (art. 90 da Lei nº 8.666/1993) e de infrações penais estampadas no Decreto-Lei nº 201/1967 (art. 1º, I, II e VII). - Os fatos descritos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL na Ação Penal subjacente não possuiriam por base a criminalização, pura e simples, da atividade de parecerista exercido por advogado público, mas sim a inferência de que, ao que consta e novamente lançando mão do que restou assentado pelo órgão ministerial, aquele parecer então proferido (pela inexigibilidade do certame licitatório), diante do apressamento como os fatos ocorreram e das peculiaridades dos eventos, teria sido executado ao arrepio da legislação de regência (especialmente do art. 25, III, da Lei nº 8.666/1993), de molde a ser etapa, em tese, imperiosa para que os ilícitos enxergados pela acusação pudessem ser perpetrados para a finalidade de se contratar bandas musicais que deveriam tocar no “Carnaval de Rua” do município de Uru/SP no ano de 2009. - Sequer tem o condão de beneficiar o impetrante/paciente o fato de que a Lei nº 8.666/1993 foi revogada, em sua parte criminal, pela edição da Lei nº 14.133/2021, não sendo possível anuir com tese atinente a ocorrência de abolitio criminis. Isso porque o cotejo dos preceitos incriminadores contidos nos arts. 337-E e 337-F, ambos do Código Penal, com aqueles que estavam dispostos nos arts. 89 e 90, ambos da Lei nº 8.666/1993, deixa claro que a sucessão legislativa acerca das condutas ora analisadas não se confunde com o fenômeno da abolitio criminis, reservado para a hipótese em que uma nova lei exclui totalmente a figura típica incriminadora do ordenamento jurídico então vigente, com a supressão formal e material do tipo penal, fazendo com que o fato antes considerado criminoso seja completamente extirpado do âmbito do Direito Penal. A mera supressão formal de um tipo penal, com manutenção substancial em preceito incriminador diverso, não torna insubsistente a criminalização da conduta, devendo incidir, em tal hipótese, o princípio da continuidade normativo-típica, consagrado na jurisprudência tanto do C. Superior Tribunal de Justiça como desta E. Corte Regional. - Para que a persecução penal possa ser instaurada e também para que possa ter continuidade no decorrer de um processo-crime, faz-se necessária a presença de justa causa para a Ação Penal consistente em elementos que evidenciem a materialidade delitiva, bem como indícios de quem seria o autor do ilícito penal. Trata-se de aspecto que visa evitar a instauração de relação processual que, por si só, já possui o condão de macular a dignidade da pessoa e, desta feita, para evitar tal ofensa, imperiosa a presença de um mínimo lastro probatório a possibilitar a legítima atuação estatal. Dentro desse contexto, dispõe o art. 395, III, do Código de Processo Penal, que a denúncia ou a queixa será rejeitada quando faltar justa causa para o exercício da Ação Penal, o que se corporifica pela ausência de substrato probatório mínimo no sentido de comprovar a materialidade delitiva e a autoria da infração penal. - A jurisprudência atual do C. Supremo Tribunal Federal tem analisado a justa causa, dividindo-a em 03 aspectos que necessariamente devem concorrer no caso concreto para que seja válida a existência de processo penal em trâmite contra determinado acusado: (i) tipicidade, (ii) punibilidade e (iii) viabilidade. Nesse diapasão, a justa causa exigiria, para o recebimento da inicial acusatória, para a instauração de relação processual e para o processamento propriamente dito da Ação Penal, a adequação da conduta a um dado tipo penal, conduta esta que deve ser punível (vale dizer, não deve haver qualquer causa extintiva da punibilidade do agente) e deve haver um mínimo probatório a indicar quem seria o autor do fato típico. - Retornando ao caso concreto, verifica-se o pleno implemento dos requisitos firmados pelo C. Supremo Tribunal Federal que demonstram a viabilidade da persecução penal subjacente (Feito nº 0000617-22.2015.403.6108), uma vez que se nota a tipicidade (potencial) dos fatos imputados ao impetrante/paciente, a não ocorrência de extinção de sua punibilidade (portanto, tais fatos, em tese, continuam sendo puníveis) e, por fim, a presença de um arcabouço probatório mínimo a referendar a conclusão ministerial atinente à demonstração de materialidade e de indícios de autoria necessárias à deflagração da persecução penal. - Dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal serem requisitos da inicial acusatória (seja ela denúncia, em sede de ação penal pública, seja ela queixa-crime, em sede de ação penal privada) a exposição do fato criminoso (o que inclui a descrição de todas as circunstâncias pertinentes), a qualificação do acusado (ou dos acusados) ou os esclarecimentos pelos quais se faça possível identificá-lo(s), a classificação do crime e o rol de testemunhas (quando tal prova se fizer necessária). A jurisprudência de nossos C. Tribunais Superiores se mostra pacífica no sentido de que, tendo os ditames insculpidos no art. 41 do Código de Processo Penal sido respeitados pela denúncia ou pela queixa, impossível o reconhecimento da inépcia. - Aferindo a denúncia apresentada em 1º grau de jurisdição, depreende-se que o órgão acusatório implementou todos os requisitos elencados no art. 41 do Código de Processo Penal tendo em vista que descreveu pormenorizadamente os fatos que entendeu por bem imputar ao impetrante/paciente, o qualificou, classificou juridicamente os crimes que acreditou terem sido executados e arrolou testemunhas que poderiam comprovar aquelas alegações. - Denegada a ordem de Habeas Corpus. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, HCCrim - HABEAS CORPUS CRIMINAL - 5009047-53.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, julgado em 14/06/2021, DJEN DATA: 18/06/2021). Dessa forma, ressalto a necessidade do prosseguimento do feito. Diante do exposto, não demonstrada flagrante ilegalidade ou constrangimento ilegal a que estejam submetidos os pacientes, DENEGO A ORDEM HABES CORPUS. É o voto.
IMPETRANTE: LARISSA PALERMO FRADE, FABIO NASCIMENTO RUIZ, JONATHAN ARIEL RAICHER
Advogados do(a) PACIENTE: JONATHAN ARIEL RAICHER - SP305332-A, LARISSA PALERMO FRADE - SP306293, FABIO NASCIMENTO RUIZ - SP359742-A
E M E N T A
HABEAS CORPUS. CRIMES DA LEI DE LICITAÇÕES. ARTS. 90 E 96, I DA LEI 8.666/93. SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.133/21. REVOGAÇÃO DOS CRIMES DA LEI 8.666/93. NÃO OCORRÊNCIA DE ‘ABOLITIO CRIMINIS’ NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.
1. Os pacientes foram denunciados pela prática de crimes dos arts. 90 e 96, inciso I da lei 8.666/93 c/c art. 29 do CP.
2. Com a superveniência da edição da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, as Seções III (Dos Crimes e das Penas) e IV (Do Processo e do Procedimento Judicial) do Capítulo IV (Das Sanções Administrativas e da Tutela Judicial) da Lei nº 8.666/1993 foram expressamente revogadas na data de sua publicação, sendo que o art. 193 da Lei nº 14.133/2021 dispõe que: Revogam-se: I – os arts. 89 a 108 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, na data de publicação desta Lei.
3. Ao mesmo tempo o art. 178 da Lei nº 14.133/2021 fez incorporar o “CAPÍTULO II-B – DOS CRIMES EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS” (arts. 337-E a 337-P) no Título XI da Parte Especial do Código Penal, prevendo, dentre os novos tipos penais, exatamente o delito de “contratação direta ilegal” (art. 337-E).
4. A revogação dos crimes da Lei 8.666/93 não significa, contudo, que, necessariamente, tenha ocorrido “abolitio criminis”.
5. Ao cotejarmos o art. 337-F e o artigo 337-L com os arts. 90 e 96 da Lei 8.666/93, verifica-se uma continuidade normativo-típica, pois o caráter criminoso do fato foi mantido, mas apenas em outro dispositivo penal.
6. Também não se pode falar em supressão da hipótese descrita no inciso I do art. 96, da Lei 8.666/93, (elevando arbitrariamente os preços). O novel art. 337-L, em seu inciso V, previu uma fórmula genérica, impondo o uso da interpretação analógica que abrange a elevação arbitrária de preços como um meio fraudulento que torne a licitação mais onerosa para a Administração Pública.
7. Há a superveniência de novatio legis in pejus, uma vez que as penas cominadas foram agravadas com a nova lei, pois o preceito secundário dos arts. 90 e 96 eram mais benéficos aos pacientes, já que previam pena de detenção, em oposição à pena de reclusão agora cominada.
8. Não é possível acolher a alegação de que a conduta imputada aos pacientes seria atípica.
9. Ordem denegada.