APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001598-17.2011.4.03.6100
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA], EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A.
Advogados do(a) APELANTE: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELANTE: OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A, LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A
APELADO: EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA]
Advogado do(a) APELADO: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELADO: LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A, OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A
Advogados do(a) APELADO: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001598-17.2011.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA], BANDEIRANTE ENERGIA S/A, ODEBRECHT AMBIENTAL S.A. Advogados do(a) APELANTE: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A APELADO: BANDEIRANTE ENERGIA S/A, ODEBRECHT AMBIENTAL S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA] Advogado do(a) APELADO: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação cominatória, com pedido de tutela antecipada, ajuizada por Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, em 2 de fevereiro de 2011, em face de Bandeirante Energia S.A. e Foz do Brasil – Organização Odebrecht, com o escopo de obter provimento jurisdicional que determine a cessação de coleta, entrega e distribuição de documentos qualificados como carta, quer por meios próprios, quer por empresas contratadas, rescindindo-se contrato celebrado para esse fim, bem como o pagamento de indenização por danos materiais. Foi atribuído à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Com a inicial, acostou documentos. Indeferida a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada. Citadas, as corrés Bandeirante Energia S.A. e Foz do Brasil – Organização Odebrecht apresentaram contestação. Houve réplica. Foi proferida sentença de extinção do feito, sem resolução de mérito, em relação à corré Foz do Brasil – Organização Odebrecht, com fulcro no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, por ilegitimidade passiva ad causam, e julgados improcedentes os pedidos, em relação à corré Bandeirante Energia S.A.. A autora foi condenada ao pagamento de honorários de sucumbência fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), para cada uma das rés, nos termos do artigo 85, §8º, do mesmo diploma processual civil. Opostos embargos de declaração pela ECT, os quais foram rejeitados. Irresignada, apelou a corré Bandeirante Energia S.A., tempestivamente, pugnando pela reforma parcial da r. sentença, no que tange à fixação da verba honorária. Defendeu, em síntese, que os honorários de sucumbência devem ser calculados com base no proveito econômico, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. Apelou também a autora, tempestivamente, pugnando pela reforma da r. sentença. Sustentou, em suma, o enquadramento de “contas/faturas de energia” no conceito de “carta”, bem como a violação ao privilégio postal. Com contrarrazões de Bandeirante Energia S.A., vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELANTE: OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A, LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A
Advogados do(a) APELADO: LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A, OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A
Advogados do(a) APELADO: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001598-17.2011.4.03.6100 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA], EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A. Advogados do(a) APELANTE: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A Advogado do(a) APELADO: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A V O T O - V I S T A Senhores Desembargadores, tendo ouvido atentamente a sustentação oral, o voto do relator e os esclarecimentos de fato do patrono da concessionária apelada, solicitei vista dos autos para melhor exame da lide. Com efeito, conforme relembrado nos debates na sessão em que iniciado o julgamento deste feito, a Corte possui jurisprudência pacífica no sentido de que, em se tratando de faturamento de serviços de água, luz e esgoto in loco, não viola o monopólio do serviço postal em favor da União, conforme assentado no julgamento da ADPF 46, a atividade do leiturista que, munido de equipamento apropriado, faz medição do consumo e, simultaneamente, imprime fatura e a entrega, de imediato, ao consumidor. O raciocínio que norteou tal entendimento, de início, era fundado na percepção de que seria ilógico que, com a fatura em mãos, o representante da prestadora do serviço de água ou luz, em vez de entregá-la diretamente ao destinatário, fosse obrigado a remetê-la posteriormente, via correio (v.g., AI 0042054-78.2008.4.03.0000, DJ 20/07/2009). A premissa foi bem sintetizada posteriormente perante a 2ª Seção desta Corte, no sentido de que, a rigor, o que se verifica em tais situações é a inexistência de serviço postal, daí porque não há violação ao monopólio federal (grifos nossos): EI 0007003-63.2004.4.03.6105, Rel. p/ Acórdão Des. Fed. NERY JUNIOR, e-DJF309/03/2016: CONSTITUCIONAL. EMBARGOS INFRINGENTES. SERVIÇO POSTAL. MONOPÓLIO DA UNIÃO. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. ENTREGA DE CONTA DE ENERGIA ELÉTRICA AGREGADA AO SERVIÇO DE LEITURA DE MEDIDORES LEITURA. NÃO CONFIGURA SERVIÇO POSTAL. PARCIAL PROVIMENTO AOS INFRINGENTES. 1. O E. Supremo Tribunal Federal, em julgado posterior à ADPF 46, firmou entendimento no sentido de que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT possui exclusividade para a prestação do serviço postal. 2. Serviço postal constitui o recebimento, expedição, transporte e entrega de objetos de correspondência, valores e encomendas, conforme definido em regulamento, envolvendo o envio de documentos (cartas, faturas) entre um remetente e um destinatário. 3. Quando a entrega das contas de energia elétrica é agregada ao serviço de leitura de medidores, em casos que tais, não há que se exigir a intermediação das atividades da empresa-embargante-ECT, não porque ela, ECT, não tenha o monopólio do serviço postal, nem porque o "boleto de pagamento" de conta de luz não se enquadraria no conceito jurídico de carta (resposta que é afirmativa, conforme precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores), mas porque não há o serviço postal a ser prestado. 4.Parcial provimento aos infringentes. Constou do voto vencedor, à ocasião: “Ora, fere as comezinhas lições de lógica exigir que a empresa-embargada-CPFL contrate a ECT para a entrega dos boletos de pagamento de conta de luz, quando estes são emitidos no próprio ato da leitura do consumo de energia. Pensar de modo contrário, data vênia, seria exigir que a CPFL contratasse uma empresa "X" para se deslocar até a residência do consumidor para fazer a leitura dos medidores de energia; esta empresa, então, ao invés de já imprimir a fatura do contribuinte e entregá-la ao contribuinte, voltaria a sua sede para então imprimir a mesma fatura, que, ao depois, seria postada pela ECT para ser entregue - "voltar" à casa do consumidor. Como dito, em casos que tais, no meu sentir, não há serviço postal envolvido.” Contudo, o caso ora em análise, à ocasião em que iniciado o julgamento, transpareceu contornos parcialmente distintos daqueles em que comumente examinada a matéria neste Tribunal. De fato, havia indicação de que, na espécie, nem todas as comunicações efetuadas aos consumidores eram realizadas pelo sistema on site, sendo a demonstração desta circunstância ponto objeto de controvérsia nos autos. Realmente, conforme apontou a ECT, em réplica (ID 77532055, f. 22): “Contudo, Nobre Magistrada, embora os CORREIOS considerem que o serviço “OnSite” também faça parte do seu monopólio postal, uma vez que há o elemento “entrega”, previsto no artigo 9º da Lei Postal, bem como pelo fato da fatura encontrar-se caracterizada como “carta”, a questão debatida nos autos se trata do tradicional serviço de transporte e entrega de correspondência, conforme se vislumbra dos documentos de fls. 62/66 e não o “OnSite”. Igualmente, na apelação, em posicionamento já temperado pela consolidação da jurisprudência referida mais acima (ID 77532063, f. 26. grifos no original): "Ao fundamentar a r. sentença, valeu-se então o MM. Juízo a quo de fundamentação equivocada, dissonante do caso que analisava e que além disso ainda desautoriza a decisão final. O julgado invocado sustenta a legalidade da entrega de consta de energia elétrica agregada simultaneamente ao serviço de leitura de medidores, que não é o caso trazido aos autos, e ao mesmo tempo deixa esclarecido expressamente, de maneira clara e indubitável, que o recebimento, expedição transporte e entrega de faturas entre um remetente e um destinatário constitui, sim, serviço postal de exclusividade da ECT. E reforça que “boleto de pagamento” de conta de luz se enquadra no conceito jurídico de carta, conforme precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores. (...) Ou seja, apenas a chamada “entrega simultânea” seria, à luz da fundamentação invocada na r. sentença, legal. A entrega por terceiros, nas demais situações, e que também foi objeto dos pedidos feitos na ação, é ilegal." Por outro lado, a empresa privada apelada invocou o artigo 25, § 1º, da Lei de Concessões para sustentar a existência de revogação parcial (derrogação) do monopólio fiscal da União, por lei posterior e específica, no tocante a atividades acessórias praticadas pelas concessionárias. Trata-se, igualmente, de ponto cujo exame não foi, historicamente, objeto da jurisprudência temática construída na última década. Delineado o panorama da controvérsia, o estudo das peças recursais evidenciou que a apreciação de tais questões condiciona-se, no caso, ao deslinde de preliminar invocada pela apelada, no sentido de que a ECT estaria modificando o pedido inicial em grau recursal. Para aferição do suscitado cumpre, por clareza, a transcrição do provimento jurisdicional requerido inicialmente e, em seguida, o formulado em apelação (ID 77532041, f. 06 e ID 77532064, f. 04): Inicial "2. a concessão dos efeitos da TUTELA ANTECIPADA, inaudita altera parte, com a determinação judicial de que a segunda corré (Foz do Brasil), cesse, imediatamente, a coleta entrega e distribuição de documentos qualificados como carta, e se abstenha de efetuar qualquer atividade que tenha por fim a prestação de serviços postais, que são exercidos exclusivamente pela ECT, em caráter de monopólio (exclusividade postal), e a primeira corré (Bandeirante Energia S.A. (rescinda o contrato com a outra corré para a prestação de tais serviços, conforme fundamentos apresentados, sob pena de aplicação de multa diária ( § 4º do artigo 461 do CPC): 3. a PROCEDÊNCIA TOTAL DOS PEDIDOS, confirmando-se e tornando-se definitiva a tutela antecipada, para que seja determinada que a segunda corré cesse, imediatamente, a coleta entrega e distribuição de documentos qualificados como carta, quer por meios próprios, quer por empresas contratadas, uma vez que tais atividades são exercidos exclusivamente pela ECT, em caráter de exclusividade postal; e, consequentemente, a primeira corré rescinda o contrato celebrado com a segunda corré;” Apelação “Ante o exposto, a ECT requer a esse e. Tribunal o acolhimento e PROVIMENTO do presente recurso, com a reforma da r. sentença, proferindo nova decisão pela PROCEDÊNCIA do pedido de proibição de entrega de objetos definidos como cartas por meio de terceiros que não a ECT, nos termos do quanto postulado na inicial, de acordo com as circunstâncias do caso.” A concessionária apelada sustentou que, na exordial, o pedido deduzido contra si foi apenas de rescindir o suposto contrato firmado com a segunda corré (Foz do Brasil), e não de cessar imediatamente coleta e entrega de documentos qualificados como carta, por si ou por terceiros, pleito que haveria sido direcionado exclusivamente, justamente, à Foz do Brasil. Como se observa, a alegação é frágil. Com efeito, o pedido inicial, conquanto certo, é interpretado segundo a boa-fé e conforme o conjunto da postulação, como dispõe o artigo 322 do CPC (e nem se alegue retroação do CPC/2015 neste ponto, pois, além de se tratar de norma interpretativa, de qualquer forma tem aplicação imediata e assegurada para os atos posteriores do feito em curso, nos termos do artigo 14 da lei processual): “Art. 322. O pedido deve ser certo. § 1º Compreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios. § 2º A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé.” Sob tais balizas, tem-se claro da postulação que o pleito da ECT objetiva cessação de todas as atividades que, em seu entender, violariam o monopólio postal. Dentre outros trechos da peça inaugural (grifos nossos): “Verifica-se então que as faturas mensais de consumo de energia elétrica estão incluídas no conceito legal de carta e, assim, a entrega das mesmas constitui serviço postal, cuja prestação só pode ser realizada pela ECT, porque são atinentes à exclusividade postal, constitucionalmente consagrada (art. 21, X da lei Maior) e estando, portanto, abrangidos pela Lei nº 6.538/1978, recepcionada pela Constituição, especialmente no que toca ao artigo 7º e 9º da referida norma. (...) Deste modo, estão amplamente demonstrados os requisitos que autoriza a concessão da tutela antecipada, inaudita altera parte, consoante o disposto nos artigos 273 e 461, § 3º, do Código de Processo Civil, no sentido de que a ré e/ou a empresa por ela contratada cesse, imediatamente, a coleta, entrega e distribuição de documentos qualificados como carta, e se abstenha de efetuar qualquer atividade que tenha por fim a prestação de serviços postais, que são exercidos exclusivamente pela ECT, em caráter de ‘monopólio’.” Em verdade, a irresignação da apelada deriva de singela má-redação do pedido de provimento jurisdicional final: há evidente erro material no item “3.”, supra transcrito, ao demandar que a “segunda corré” (em tese, a Foz do Brasil) cessasse a distribuição de cartas “por meio próprios ou por empresas contratadas”. Ora, a Foz do Brasil é a empresa descrita na inicial como contratada, e a Bandeirante Energia como a que deveria se abster de violar o monopólio postal por qualquer meio. Trata-se, singelamente, de equívoco de indicação (o correto seria “a primeira corré”), que não motiva qualquer dúvida na compreensão dos contornos e objetivos da ação. Por consequência, não se evidencia ampliação do pedido inicial em sede recursal que, ao contrário, restringiu-se, passando a impugnar apenas “entrega de objetos definidos como cartas por meio de terceiros que não a ECT”. Improcedente a preliminar, impõe-se o exame do mérito que justificou o pedido de vista, conforme descrito de início. Primeiramente, é preciso assentar que, em linha de princípio, a remessa à distância de fatura de serviço ou comunicação de interesse específico do destinatário por meio diverso dos serviços prestados pela ECT caracterizaria violação ao monopólio fiscal da União. Tal conclusão transparece da ementa dos EI 0007003-63.2004.4.03.6105, transcrita acima (“Quando a entrega das contas de energia elétrica é agregada ao serviço de leitura de medidores, em casos que tais, não há que se exigir a intermediação das atividades da empresa-embargante-ECT, não porque ela, ECT, não tenha o monopólio do serviço postal, nem porque o "boleto de pagamento" de conta de luz não se enquadraria no conceito jurídico de carta (resposta que é afirmativa, conforme precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores), mas porque não há o serviço postal a ser prestado”) e, no mais, já foi sustentada como razão de decidir direta pelos colegiados fracionários da 2ª Seção desta Corte (grifos nossos): ApCiv 0002682-57.2010.4.03.6110, Rel. Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, e-DJF3 07/12/2016: “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ECT. PRIVILÉGIO POSTAL. LEI Nº 6.538/78. SERVIÇO POSTAL. ENTREGA DE FATURA DE COBRANÇA DE CONTAS DE ÁGUA E ESGOTO. MEDIÇÃO IMEDIATA. PREGÃO. POSSIBILIDADE. SEGUNDAS VIAS DE CONTA. DOCUMENTOS AVULSOS. COMUNICADOS. FOLHETOS. VIOLAÇÃO AO PRIVILÉGIO. DANO MATERIAL. NÃO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPRIOCA. 1. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), Empresa Pública Federal, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 509, de 20/03/1969, para exercer com exclusividade, a prestação de serviços postais, em todo o território brasileiro, cuja competência foi constitucionalmente outorgada à União Federal (art. 21, X). 2. A Lei n.º 6.538/78, que dispõe sobre os serviços postais, conceituou os objetos de correspondência a serem entregues mediante a prestação desse serviço. 3. Por sua vez, o regulamento aprovado pelo Decreto n.º 83.858/79, em seu art. 17, estabelecia as hipóteses de exclusão do regime de monopólio das atividades postais, cabendo destacar a alínea "n", nos seguintes termos: o transporte e a entrega de aviso de cobrança relativo ao consumo de água, de energia elétrica, ou de gás, quando realizados pelo concessionário do respectivo serviço público. 4. Ainda acerca do tema, o Plenário do STF, em sessão do dia 05/08/09, ao julgar improcedente a ADPF n.º 46/DF, declarou que a Lei n.º 6.538/78, que trata do monopólio dos Correios, foi recepcionada e está de acordo com a Constituição da República. 5. Na mesma oportunidade, o Pretório Excelso deu interpretação conforme ao art. 42, da Lei n.º 6.538/78, para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no art. 9º, do referido diploma legal. 6. A discussão envolveu debate sobre o que seria considerado "carta" para os fins do art. 9º, da Lei n.º 6.538/78, tendo ficado assentado que o conceito abarca as correspondências, com ou sem envoltório, sob a forma de comunicação escrita, de natureza administrativa, social, comercial, ou qualquer outra, que contenha informação de interesse específico do destinatário (art. 47, da Lei n.º 6.538/78), incluindo, portanto, cartas pessoais, contas de serviços públicos, boletos de cartões de crédito, sendo certo que tanto estas como os cartões-postais e as correspondências agrupadas (malotes) só poderão ser transportados pelos Correios, enquanto os demais tipos de correspondências, como jornais e revistas, e demais encomendas estão excluídas do monopólio da União, previsto no art. 21, inciso X, do Texto Maior. 7. Não obstante, no caso vertente, trata-se de contratação de empresa para a prestação de serviços de leitura informatizada de hidrômetros com microcoletor de dados portátil, entrega de contas normais não envelopadas, entrega de outros documentos (espelho de conta, segunda via de conta unificada e folheto não endereçado) e vistoria cadastral, avulsa, para os municípios operados pela unidade de negócio alto Paranapanema-RA (fls.102). 8. No termo de referência os conceitos são explicitados nas fls. 138/140. 9. Ora, na hipótese de leitura do hidrômetro com impressão e entrega simultâneas de contas ao consumidor, inexiste o alegado monopólio, não sendo possível o enquadramento da atividade como serviço postal. 10. No entanto, para os casos relativos à entrega de segunda via da conta, segunda via de conta unificada, folhetos, documentos avulsos e comunicados (conforme conceitos de fl. 139), há efetiva violação do monopólio postal da apelada, poisos referidos apontamentos se inserem no conceito de carta, devendo, nestes tópicos, ser reconhecida a nulidade do pregão Sabesp online n.º 03.053/10. 12. Por fim, afasto a condenação ao pagamento de indenização por danos materiais, visto que estes não foram devidamente comprovados. 13. Ainda que a ECT alegue que sofreu prejuízos patrimoniais, decorrentes da violação ao seu monopólio postal, é necessário ressaltar que o serviço, mesmo que de forma indevida, foi realizado pela empresa corré. Assim, a ECT deixou de auferir renda, mas também deixou de prestar o serviço, razão pela qual o pagamento de indenização por danos materiais configuraria enriquecimento ilícito. 14. Dessa maneira, reformo parcialmente a r. sentença, para determinar que a contratação de empresa somente para prestação de serviços de leitura de hidrômetros, com emissão e entrega simultâneas de faturas de consumo de água e/ou esgoto, por meio de licitação, não constitui ofensa ao monopólio do serviço postal, ou mais tecnicamente, ao privilégio da exclusividade da ECT para a prestação do aludido serviço público. Ademais, afasto a indenização em danos materiais, não efetivamente experimentados. 15. Em razão de serem a autora e as rés parcialmente vencedoras e vencidas, de rigor o reconhecimento da sucumbência recíproca. 16. Apelação parcialmente provida.” Insta notar, neste tocante, em atenção à suscitação respectiva pelo patrono da concessionária apelada, na sessão de julgamento, que o ARE 649.379 (com repercussão geral, atualmente em sede de embargos de declaração), no que tomou por premissa a afirmação de que o julgamento da ADPF 46 excluiu boletos e faturas de serviço do monopólio postal da União, partiu de premissa fática equivocada. Em verdade, bem ao contrário, na ocasião, a concepção do Ministro Ayres Britto de que tais documentos estavam incluídos no “privilégio federal” foi o que definiu o julgamento da arguição. Neste sentido, consta da atermação dos debates (grifos nossos): O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO — O pedido é exatamente este: reduzir o conteúdo do objeto normativo a carta em sentido eu diria até antiquado. O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO — Perfeito. Assentei o regime juspublicístico do serviço e não o jusprivatístico, na linha do veto do Ministro Eros Grau. Eu nem sabia que na prática isso já estava excluído. Exclui, come efetivamente excluo, do âmbito material de incidência desta expressão “serviço postal”, os impressos, a partir do voto de Vossa Excelência, proferido anteontem, e contemplo aquela minha primeira preocupação: também afasto do âmbito de incidência as encomendas, ou seja, os volumes entregues para destinação a terceiros. Então, excluiria exclusivamente do meu voto ou do âmbito de incidência material dessa expressão constitucional “serviço postal" tão só os impressos e as encomendas. O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) — Portanto, boletos, contas, Vossa Excelência deixaria no conceito de cartas? O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - Deixaria. O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) — Na verdade, então, temos maioria no sentido da improcedência. (...) O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - O meu conceito de carta não é reducionista. Pelo contrário, é ampliado. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Amplia. Portanto, julga quase totalmente improcedente. O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - Isso. Perfeito! A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - E recepcionada a norma. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO — Exatamente. E, portanto, recebida a norma. (...) O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Noutras palavras, se bem entendi o voto do Ministro, coincide exatamente com a legislação que está em vigor. (...) O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) — Senhores Ministros, vamos definir. Eu queria relembrar que ontem eu julgava parcialmente procedente a arguição e aí eu fixava a interpretação de que a prestação exclusiva pela União da atividade postal limitava-se ao conceito de carta, cartão postal e correspondência agrupada, nos termos do artigo 9º. Aí, então, fazia a exclusão, não abarcando a distribuição de boletos — e dizia boletos bancários. contas de água, telefone e luz. Portanto, excluía do conceito de carta e nisso fui acompanhado pelo Ministro Ricardo Lewandowski e Ministro Celso de Mello. Eu entendia que estava também acompanhando o Ministro Carlos Britto, mas Sua Excelência agora esclareceu que o seu entendimento em relação ao artigo 47 é outro. Por isso estou dizendo: temos cinco votos no sentido da improcedência e a esses votos se soma o voto do Ministro Carlos Britto. O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO — Perfeito. (...)” A tira de julgamento elucida o ponto, igualmente (grifos nossos): “Após o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio (relator), que julgava procedente a argüição de descumprimento de preceito fundamental, e do voto do Senhor Ministro Eros Grau, divergindo, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pela argüente, o Dr. Luís Roberto Barroso; pelos amici curiae, Sindicato Nacional das Empresas de Encomendas Expressas, a Dra. Emília Soares de Souza, e Associação Brasileira de Empresas de Transporte Internacional-ABRAEC, o Dr. Arnaldo Malheiros Filho; pela argüida, a Dra. Maria de Fátima Morais Seleme; pela Advocacia-Geral da União, o Dr. Álvaro Augusto Ribeiro Costa e, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Cláudio Lemos Fonteles, Procurador-Geral da República. Plenário, 15.06.2005. Decisão: Renovado o pedido de vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, justificadamente, nos termos do § 1º do artigo 1º da Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 24.08.2005. Decisão: Após o voto do senhor Ministro Marco Aurélio (Relator), que julgava procedente a ação; dos votos dos Senhores Ministros Joaquim Barbosa, Eros Grau e Cezar Peluso, que a julgavam totalmente improcedente; votou o Senhor Ministro Carlos Britto, julgando-a procedente, em parte, para excluir do conceito de serviço postal as encomendas. Em seguida, votou o Senhor Ministro Gilmar Mendes, que julgava parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 42, 43, 44 e 45 da Lei nº 6.538, de 22 de junho de 1978, pediu vista dos autos a Senhora Ministra Ellen Gracie. Presidência do Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 17.11.2005. Decisão: Renovado o pedido de vista da Senhora Ministra Ellen Gracie, justificadamente, nos termos do § 1º do artigo 1º da Resolução nº 278, de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Nelson Jobim. Plenário, 14.12.2005. Decisão: Colhido o voto-vista da Senhora Ministra Ellen Gracie, no sentido de julgar improcedente a ação, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Menezes Direito. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 12.06.2008. Decisão: Preliminarmente, o Tribunal rejeitou o pedido de adiamento. Após, votou o Senhor Ministro Gilmar Mendes, Presidente, reajustando seu voto para julgar parcialmente procedente a argüição, fixando a interpretação de que a prestação exclusiva pela União da atividade postal limita-se ao conceito de carta, cartão-postal e correspondência-agrupada, nos termos do artigo 9º da Lei 6.538/78, não abarcando a distribuição de boletos (boletos bancários, contas de água, telefone, luz), jornais, livros, periódicos ou outros tipos de encomendas ou impressos, e julgando procedente a argüição quanto ao artigo 42 da referida lei, no que foi acompanhado pelos Senhores Ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Em seguida, também reajustou o voto o Senhor Ministro Carlos Britto, para excluir do conceito de serviço postal, além das encomendas, a entrega de impressos, como jornais revistas e outros periódicos, mantendo o julgamento pela procedência parcial da ação. Em seguida, após o voto da Senhora Ministra Cármen Lúcia, julgando-a improcedente, a proclamação da decisão ficou suspensa para a próxima sessão. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Cezar Peluso, que proferira voto em assentada anterior, e o Senhor Ministro Menezes Direito, que declarou suspeição. Plenário, 03.08.2009. Decisão: O Tribunal, por maioria, considerando que o voto do Senhor Ministro Carlos Britto mais se aproxima do entendimento da divergência inaugurada pelo Senhor Ministro Eros Grau, julgou improcedente a argüição de descumprimento de preceito fundamental, vencidos o Senhor Ministro Marco Aurélio, que a julgava procedente, e os Senhores Ministros Gilmar Mendes (Presidente), Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que a julgavam parcialmente procedente. O Tribunal, ainda, deu interpretação conforme ao artigo 42 da Lei nº 6.538/78 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º do referido diploma legal. Redigirá o acórdão o Senhor Ministro Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Menezes Direito. Plenário, 05.08.2009." Como se vê, a exclusão, do monopólio postal para “a distribuição de boletos (boletos bancários, contas de água, telefone, luz)” corresponde à tese do Ministro Gilmar Mendes, que entendia parcialmente procedente a arguição, posição que, como se vê, restou vencida. Esta circunstância, aliás, já havia sido reconhecida pelo próprio Supremo Tribunal Federal (grifos nossos): RE 594.908, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, monocrática, DJe 03/09/2009: "DECISÃO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. SERVIÇO POSTAL. ENTREGA DE CONTAS DE ÁGUA, ESGOTO E SERVIÇOS. REGIME DE PRESTAÇÃO EXCLUSIVAMENTE ESTATAL DA ATIVIDADE PELA EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 46. ACÓRDÃO RECORRIDO EM DESARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE SUPREMO TRIBUNAL. RECURSO PROVIDO. (...) 4. Razão jurídica assiste à Recorrente. Ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 46, este Supremo Tribunal manteve, por maioria de votos, a exclusividade da Empresa Brasileira de correios e Telégrafos - ECT para entrega de cartas (incluída a distribuição de boletos), pois, por se tratar de prestação de serviço público, considerou recepcionado pela Constituição da República o art. 47 da Lei n. 6.538/78 e entendeu que estavam excluídos do conceito de serviço postal apenas as encomendas e os impressos, nos termos do voto divergente do Ministro Eros Grau, que foi designado Redator para o acórdão. (...) O acórdão recorrido divergiu daquela orientação deste Supremo Tribunal, em contrariedade ao direito da ora Recorrente. 5. Pelo exposto, dou provimento ao recurso extraordinário (art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil e art. 21, § 2º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).” Igualmente, tal percepção já havia sido assimilada por esta Turma, em múltiplos julgados. Dentre outros: ApCiv 0009051-78.2007.4.03.6108, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, e-DJF3 26/12/2019; ApCiv 0007792-88.2006.4.03.6106, Rel. Des. Fed. ANTONIO CEDENHO, e-DJF3 29/07/2016; AI 0005745-82.2013.4.03.0000, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 09/08/2013. De mais a mais, como se sabe, diversamente do caso do ARE 649.379, que tratou lateralmente a questão, há repercussão geral reconhecida especificamente para discussão sobre “possibilidade de os entes federativos, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem diretamente suas guias ou boletos de cobranças aos contribuintes ou consumidores” (RE 667.958, Tema 527), ocasião em que, em caráter definitivo, deve ser assentado entendimento pretoriano para casos que tais. Assim, é prudente que se considere o mérito respectivo como de apreciação ainda pendente na Corte Suprema, sendo pertinente, portanto, o prosseguimento dos demais pontos controversos da causa ora em julgamento. Neste passo, tem-se que a alegação de derrogação do monopólio postal face às concessionárias de serviço público é improcedente. Bem observado, o § 1º do artigo 25 da Lei 8.897/1995 não respalda a conclusão deduzida. Este o teor do dispositivo (grifos nossos): “Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade. § 1o Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere este artigo, a concessionária poderá contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido, bem como a implementação de projetos associados. § 2o Os contratos celebrados entre a concessionária e os terceiros a que se refere o parágrafo anterior reger-se-ão pelo direito privado, não se estabelecendo qualquer relação jurídica entre os terceiros e o poder concedente. § 3o A execução das atividades contratadas com terceiros pressupõe o cumprimento das normas regulamentares da modalidade do serviço concedido.” De plano, o que a norma invocada dispõe é que a concessionária pode contratar terceiros para desenvolvimento de atividades, inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido. Todavia, disto não se deriva que não há necessidade de observar monopólio legal para prestação de dito serviço, caso exista e, ao oposto, reforça esta necessidade o § 3º acima, em que pese omitido do arrazoado do patrono da concessionária apelada, na sessão de julgamento. De fato, tanto como qualquer outro, a ECT é terceira na relação entre concessionária e usuário do serviço concedido. Assim, é perfeitamente possível harmonizar regras em questão para conceber que a concessionária pode delegar serviços acessórios, porém, em se tratando de remessa de carta, deve obedecer ao monopólio instituído em favor da União. É lição hermenêutica basilar que revogação tácita não se presume, sendo exigível que haja impossibilidade absoluta de aplicação da regra posterior com observância da anterior, o que não é o caso. Assim, não há como supor abstratamente, sem qualquer inferência legal, que a redação do artigo 25, § 1º, da Lei de Concessões, positivou menos do que o desejado. Tanto assim que, posteriormente, já houve iniciativa efetiva de revogação do monopólio postal para atividades de faturamento de consumo de serviços de água e esgoto, o que foi obstado por veto presidencial. Constou, a propósito, da mensagem de veto parcial à Lei 11.445/2007 (grifos nossos): " O Ministério das Comunicações opinou pelo veto ao seguinte dispositivo: § 1o do art. 3º “Art. 3o ............................................................ ............................................................ § 1o As atividades de medição, leitura e entrega de contas e outros documentos relacionados à prestação dos serviços públicos de saneamento básico, efetuadas direta ou indiretamente pelos seus prestadores, não constituem serviços postais. ............................................................ ” Razões do veto “O dispositivo em comento se mostra altamente prejudicial às atividades dos Correios, uma vez que terá implicações diretas no atual nível de faturamento, vedando sua participação no segmento de mercado de entrega de contas de concessionárias de serviços públicos. A sanção do referido dispositivo implicará, de imediato, a perda de receita na ordem de R$ 56 milhões/ano, que corresponde ao faturamento dos atuais contratos de leitura e entrega de faturas de concessionárias de água e esgoto. Outrossim, a medida terá reflexos motivadores para ações idênticas por parte dos demais segmentos de concessionárias de serviços públicos, como, por exemplo, empresas de luz, telefonia e gás, o que, na hipótese de dispositivo legal semelhante, elevará substancialmente a perda de receita.” O que seria possível discutir, eventualmente, é a possibilidade de empresa pública ou privada prestadora de serviço público de competência federal (por concessão ou qualquer outro arranjo institucional) violar o monopólio da própria União que, lembre-se, é instituído a favor desta, não da ECT, que atua como instrumentalizadora. Esta controvérsia, não suscitada em tais termos nestes autos, deve ser, por igual, pacificada no RE 667.958, já referido. Superada tal alegação, tem-se que, considerando a matéria devolvida pela apelação (como já se assentou, de menor escopo que o pedido inicial), a solução da causa depende da aferição de duas circunstâncias: i) existência de entrega de documentos objeto de monopólio postal fora do sistema de faturamento on site; e ii) que esta atividade seja realizada por terceiro, pois a apelação devolveu à Corte apenas esta hipótese. Para que se tenha clareza, não se afirma que, no caso em que o próprio remetente expede, transporta e entrega objeto enquadrado legalmente como carta, cartão-postal ou correspondência-agrupada, esteja intocado e preservado o monopólio estatal do serviço postal sem risco de vulneração da garantia constitucional, como se aventou da tribuna, pois esta questão não é objeto do recurso sob exame para exigir abordagem nesta oportunidade. Saliente-se, neste sentido, que julgamento a este respeito redundaria em provimento ultra petita, de modo que as razões de apelação da ECT são claras em exclusivamente focar o cenário da entrega de faturas e assemelhados por terceiros como violação de serviço postal a ser apreciada (ID 77532063, f. 18, até ID 77532064, f. 04, grifos nossos): "Vê-se, assim, que o conceito de "carta" não ´reducionista, ao contrário do quanto defendido na r. sentença, e que a entrega de objetos definidos como "cartas", para que seja realizada por meio de terceiros, somente poderá ser realizada a partir da ECT, por meio de serviço público postal prestado exclusivamente. (...) Trata-se, pois, de uma violação ao privilégio postal da ECT, porquanto a licitação e contratação de terceiros para a prestação de serviços considerados como serviços postais exclusivos maculam a legislação, bem assim o entendimento jurisprudencial assente sobre a questão, lesando, por conseguinte, os cofres da ECT e, pois, todo o serviço postal, que somente logra a sua prestação exclusiva de modo adequado e a preços módicos em razão do privilégio que foi garantido a esta Empresa Pública. (...) Ou seja, apenas a chamada "entrega simultânea" seria, à luz da fundamentação invocada na r. sentença, legal. A entrega por terceiros, nas demais situações, e que também objeto dos pedidos feitos na ação, é ilegal. (...) Logo, e ao contrário da conclusão a que se chegou na r. sentença, o conceito de "carta" para fins de garantia da constitucional exclusividade postal é amplo e contempla o envio de "contas/faturas de energia". São objetos de correspondência, sob forma de comunicação escrita, contendo informações de interesse específico do destinatário e que portanto só podem ser entregues, quando realizada por terceiros, por meio da ECT. (....)" Na espécie, há prova de que a apelada, à época do ajuizamento, não fazia emissão de documentos exclusivamente no sistema on site. Com efeito, reprografias de ID 77532041, f. 21/25 (destacadamente a de f. 25) denotam, com clareza, fatura autoenvelopada, com datas distintas de emissão e apresentação do documento (fato registrado no próprio instrumento) e fecho serrilhado lateral, típico de comunicação postal, de modo que tais objetos em nada se assemelham a boletos de consumo impressos concomitantemente à leitura pelo aparelho medidor, em serviço domiciliar integrado. Todavia, nos limites da devolução e para o que importa na solução do caso concreto, não consta dos autos qualquer demonstração, sequer indiciária, de que a entrega de tais comunicações era efetuada por intermediário. A única relação com terceiro suscitada nos autos (com a empresa Foz do Brasil) restou cabalmente refutada durante a instrução processual na origem, de modo que o capítulo da sentença que excluiu tal corré da lide, por ilegitimidade passiva, sequer foi objeto de recurso. Neste cenário, não se revela cabível provimento jurisdicional em tese sobre alegações em relação às quais não se tem a mínima comprovação de lastro fático, mesmo que se afigurem prováveis, como no caso. Note-se que não se está diante de situações em que a contratação de terceiro é fato público e incontroverso, realizado em regime licitatório (por ex. ApCiv 0020552-48.2010.4.03.6100, Rel. Juiz Conv. SILVA NETO, e-DJF3 17/04/2015). Assim, entender procedente pretensão cominatória de conduta que sequer é possível ter certeza que ocorreu, além de fugir à lógica causal e postulados básicos de ampla defesa, relegaria à fase de liquidação do julgado a demonstração do próprio fato constitutivo do direito vindicado, em manifesta distorção do sistema processual. Desta feita, em exame exauriente, a meu sentir o pedido inicial é, afinal, improcedente, ainda que por fundamentos diversos daqueles focados pelo relator e pela própria concessionária apelada. Isto posto, divirjo no tocante à apreciação do apelo da empresa ré, centrado na discussão de verba honorária, cujo interesse processual subsiste em função da improcedência do recurso da ECT. Com efeito, é certo, como constou do voto do relator, que o valor dado à causa pela ECT (R$ 1.000,00) é insignificante. Contudo, assim também o é a verba honorária arbitrada na origem em R$ 1.000,00 para cada ré. Trata-se de feito ajuizado ainda em 2011, de longa tramitação e múltiplas intervenções dos patronos das rés (notoriamente, da concessionária de serviço público). Por outro lado, inclusive com base na fundamentação que repeliu o apelo da ECT, descabe que após o julgamento seja iniciada ampla dilação probatória de fatos meritoriamente relevantes, para estimar suposto proveito econômico da ré apelante, decorrente do julgamento realizado que, ao limite, seria apenas indireto, por teorética poupança de custos de contratação da empresa pública autora, circunstância que por si já desautoriza a pretensão. Assim, com base no § 8º do artigo 85 do CPC, que expressamente autoriza juízo sucumbencial equitativo em situações como a presente, e segundo parâmetros delimitados pelo § 2º, do mesmo artigo, destacadamente o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o serviço, fixa-se verba honorária, em relação ao processamento na origem, em R$ 20.000,00, a ser repartido à proporção de R$ 15.000,00 para a EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A. (denominação atual da concessionária apelante) e R$ 5.000,00 para a ODEBRECHT AMBIENTAL S.A. (denominação presente da Foz do Brasil). Adicionalmente, considerando que a sentença foi prolatada em 27/09/2017 (ID 77532060, f. 19), é exigível ainda, o arbitramento de honorários recursais (cf. AgInt no REsp 1.908.125, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 01/07/2021). Neste tocante, pelas mesmas balizas acima, e com lastro no § 11 do artigo 85 do CPC, majora-se a verba sucumbencial devida pela ECT em R$ 10.000,00, a ser distribuída entre as rés à mesma proporção fixada para os honorários originários. Ante o exposto, acompanho o relator, mas pela conclusão, para negar provimento à apelação da ECT e dele divirjo para dar parcial provimento ao apelo da ré recorrente. É como voto.
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELANTE: OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A, LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A
APELADO: EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA]
Advogados do(a) APELADO: LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A, OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A
Advogados do(a) APELADO: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001598-17.2011.4.03.6100
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA], EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A.
Advogados do(a) APELANTE: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELANTE: OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A, LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A
APELADO: EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., ODEBRECHT AMBIENTAL S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA]
Advogado do(a) APELADO: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em apertada síntese, para o deslinde da controvérsia posta nos autos, busca-se saber se o monopólio do serviço postal, atribuído à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, engloba a postagem de contas/faturas de energia elétrica.
É sabido que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF 46, estabeleceu que a prestação exclusiva do serviço postal pela União Federal restringe-se às atividades descritas no art. 9º da Lei 6.538/78, isto é, aquelas relacionadas ao recebimento, transporte e entrega de carta, cartão-postal e correspondência agrupada. Verbis:
ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. EMPRESA PÚBLICA DE CORREIOS E TELEGRÁFOS. PRIVILÉGIO DE ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIAS. SERVIÇO POSTAL. CONTROVÉRSIA REFERENTE À LEI FEDERAL 6.538, DE 22 DE JUNHO DE 1978. ATO NORMATIVO QUE REGULA DIREITOS E OBRIGAÇÕES CONCERNENTES AO SERVIÇO POSTAL. PREVISÃO DE SANÇÕES NAS HIPÓTESES DE VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL. COMPATIBILIDADE COM O SISTEMA CONSTITUCIONAL VIGENTE. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 1º, INCISO IV; 5º, INCISO XIII, 170, CAPUT, INCISO IV E PARÁGRAFO ÚNICO, E 173 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA E LIVRE INICIATIVA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. ARGUIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO CONFERIDA AO ARTIGO 42 DA LEI N. 6.538, QUE ESTABELECE SANÇÃO, SE CONFIGURADA A VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL DA UNIÃO. APLICAÇÃO ÀS ATIVIDADES POSTAIS DESCRITAS NO ARTIGO 9º, DA LEI.
1. O serviço postal --- conjunto de atividades que torna possível o envio de correspondência, ou objeto postal, de um remetente para endereço final e determinado --- não consubstancia atividade econômica em sentido estrito. Serviço postal é serviço público.
2. A atividade econômica em sentido amplo é gênero que compreende duas espécies, o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. Monopólio é de atividade econômica em sentido estrito, empreendida por agentes econômicos privados. A exclusividade da prestação dos serviços públicos é expressão de uma situação de privilégio. Monopólio e privilégio são distintos entre si; não se os deve confundir no âmbito da linguagem jurídica, qual ocorre no vocabulário vulgar.
3. A Constituição do Brasil confere à União, em caráter exclusivo, a exploração do serviço postal e o correio aéreo nacional [artigo 20, inciso X].
4. O serviço postal é prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, empresa pública, entidade da Administração Indireta da União, criada pelo decreto-lei n. 509, de 10 de março de 1.969.
5. É imprescindível distinguirmos o regime de privilégio, que diz com a prestação dos serviços públicos, do regime de monopólio sob o qual, algumas vezes, a exploração de atividade econômica em sentido estrito é empreendida pelo Estado.
6. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos deve atuar em regime de exclusividade na prestação dos serviços que lhe incumbem em situação de privilégio, o privilégio postal.
7. Os regimes jurídicos sob os quais em regra são prestados os serviços públicos importam em que essa atividade seja desenvolvida sob privilégio, inclusive, em regra, o da exclusividade.
8. Argüição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente por maioria. O Tribunal deu interpretação conforme à Constituição ao artigo 42 da Lei n. 6.538 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º desse ato normativo.
(ADPF 46, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2009, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-01 PP-00020 RTJ VOL-00223-01 PP-00011)
Com efeito, mais recentemente, no julgamento do ARE 648.379/RJ, a Suprema Corte fixou a tese de que os Estados/Distrito Federal têm competência legislativa para estabelecer regras de postagem de boletos referentes a pagamento de serviços prestados por empresas públicas e privadas. Verbis:
CONSTITUCIONAL. FEDERALISMO E RESPEITO ÀS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA. NORMAS RELATIVAS À POSTAGEM DE BOLETOS DE COBRANÇA, REFERENTES A SERVIÇOS PRESTADOS POR EMPRESAS PÚBLICAS E PRIVADAS. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA ESTADUAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO.
1. As regras de distribuição de competências legislativas são alicerces do federalismo e consagram a fórmula de divisão de centros de poder em um Estado de Direito. A análise das competências concorrentes (CF, art. 24) deverá priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades, de modo a assegurar o imprescindível equilíbrio federativo, em consonância com a competência legislativa remanescente prevista no § 1º do artigo 25 da Constituição Federal. Princípio da predominância do interesse.
2. O art. 1º, § 1º, da Lei Estadual 5.190/2008, do Rio de Janeiro, determina que as datas de vencimento e de postagem de boletos, referentes a pagamento de serviços prestados por empresas públicas e privadas, deverão ser impressas na parte externa da correspondência de cobrança.
3. Discute-se, neste recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, se a referida lei é inconstitucional, por invadir a competência privativa da União para legislar sobre serviços postais (Constituição, art. 22, V).
4. No julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 46 (Plenário, Min. EROS GRAU, DJ de 26/2/2010), estabeleceu-se que a prestação exclusiva de serviço postal pela União, nos termos do art. 9º da Lei 6538/1978, não engloba a distribuição de boletos bancários, de contas telefônicas, de luz e água, de encomendas, v.g., livros e jornais, pois a atividade desenvolvida pelo ente central restringe-se ao conceito de carta, cartão-postal e correspondência agrupada.
5. Assim, o âmbito da competência legislativa privativa da União, estipulada no art. 22, V, da CARTA MAGNA, circunscreve-se à regulação do serviço postal prestado pela União, de modo exclusivo (art. 21, X, da CF/1988).
6. A CONSTITUIÇÃO brasileira adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e o Distrito Federal especificá-las, por meio de suas respectivas leis. É a chamada competência suplementar dos Estados-Membros e do Distrito Federal (CF, art. 24, § 2º).
7. Nessa perspectiva, a jurisprudência do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL vem atribuindo maior ênfase na competência legislativa concorrente dos Estados, quando o assunto girar em torno das relações de consumo. Igualmente, esta SUPREMA CORTE já declarou a constitucionalidade de diversas normas estaduais em hipóteses análogas, reconhecendo a competência dos Estados-membros para dispor sobre o direito de informação dos consumidores, no exercício de sua competência concorrente.
8. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. Tema 491, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “Os Estados-Membros e o Distrito Federal têm competência legislativa para estabelecer regras de postagem de boletos referentes a pagamento de serviços prestados por empresas públicas e privadas.
(ARE 649379, Relator(a): GILMAR MENDES, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 16/11/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-007 DIVULG 15-01-2021 PUBLIC 18-01-2021)
Conforme destacado, ressalta-se que constou expressamente da ementa do acórdão supracitado “(...) estabeleceu-se que a prestação exclusiva de serviço postal pela União, nos termos do art. 9º da Lei 6538/1978, não engloba a distribuição de boletos bancários, de contas telefônicas, de luz e água, de encomendas, v.g., livros e jornais, pois a atividade desenvolvida pelo ente central restringe-se ao conceito de carta, cartão-postal e correspondência agrupada. ”
Não obstante, insurge-se o Exmo. Des. Fed. Carlos Muta afirmando que no julgamento do ARE 648.379/RJ houve interpretação equivocada, pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, acerca das premissas estabelecidas por ocasião da solução da ADPF 46. Insiste, portanto, que a postagem de boletos/faturas se insere dentre as atividades a serem exploradas, em regime de exclusividade, pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT.
Peço vênia para divergir do voto-vista apresentado, acompanhando o posicionamento do Exmo. Relator.
Pois bem, depreende-se do julgamento do ARE 648.379/RJ que a competência privativa da União Federal para legislar sobre serviço postal (art. 22, V, CF/88) evidentemente correlaciona-se à sua competência exclusiva administrativa para manter o serviço postal (art. 21, X, CF/88). Isto é, dentro da abrangência do conceito de serviço postal, somente há competência legislativa privativa em torno das atividades que se submetem a regime de monopólio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT.
Isto posto, ao assentar-se que o estabelecimento de regras sobre postagem de boletos/contas de serviços prestados por empresas públicas e privadas não está limitado pela norma do art. 22, V, CF/88, há expresso afastamento do significado de boletos/contas do alcance do conceito de carta, o que constitui a verdadeira ratio decidendi do enunciado firmado, de observância obrigatória.
Sobre este aspecto, é desnecessário perquirir qual a verdadeira abrangência da fundamentação não nuclear delineada na apreciação da ADPF 46, uma vez que a tese elaborada no julgamento do ARE 648.379/RJ, analisada sob o rito da repercussão geral, possui, por si só, vinculação argumentativa própria de precedente com força normativa, conforme a doutrina do stare decisis adotada pelo atual Código de Processo Civil.
Ademais, acrescenta-se que nada impede que eventual assunto, abordado como obter dictum no exame de determinada causa, seja posteriormente debatido como questão principal de outra, e se transforme na ratio decidendi de um outro precedente, ou mesmo que haja superação de orientação anteriormente adotada.
Por fim, é certo que se a tese padece de obscuridade, ela será eventualmente decidida pelo Supremo Tribunal Federal nos embargos de declaração já opostos e ainda pendente de julgamento, no âmbito do ARE 648.379/RJ, impondo-se, até o momento o entendimento já fixado, independentemente de trânsito em julgado.
Discorda-se, portanto, de que tenha ocorrido interpretação equivocada.
Quanto à verba honorária, conclui-se pela irrisoriedade do valor de R$ 1.000,00, arbitrado em primeira instância. Em apreciação equitativa, nos termos do art. 85, §8º, do atual Código de Processo Civil, reputa-se adequada a condenação da parte autora ao pagamento de R$ 20.000,00 a título de honorários advocatícios, a ser igualmente repartido entre as rés.
Tratando-se de novo arbitramento, considera-se indevida a fixação de honorários recursais.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação de Bandeirante Energia S.A., somente para readequação de verba honorária e nego provimento à apelação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT
É o voto.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001598-17.2011.4.03.6100
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA], BANDEIRANTE ENERGIA S/A, ODEBRECHT AMBIENTAL S.A.
Advogados do(a) APELANTE: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
Advogado do(a) APELANTE: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELANTE: OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A, LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A
APELADO: BANDEIRANTE ENERGIA S/A, ODEBRECHT AMBIENTAL S.A., EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS [AC CENTRAL DE BRASILIA]
Advogado do(a) APELADO: ANDRE SERRAO BORGES DE SAMPAIO - SP203844-A
Advogados do(a) APELADO: LUIZ FERNANDO CASAGRANDE PEREIRA - PR22076-A, FERNANDO CEZAR VERNALHA GUIMARAES - PR20738-A, OTAVIO TENORIO DE ASSIS - SP95725-A
Advogados do(a) APELADO: GLORIETE APARECIDA CARDOSO - SP78566-A, SONIA REGINA GARCIA FIGUEIREDO JIMENEZ - SP235213-A, MAURY IZIDORO - SP135372-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A questão que ora se impõe cinge-se em saber se, na hipótese vertente, houve violação ao chamado "monopólio postal".
À luz do artigo 21, inciso X, da Constituição da República, compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional.
O Decreto-lei nº 509/69 transformou o Departamento dos Correios e Telégrafos - DCT em empresa pública, vinculada ao Ministério das Comunicações, com a denominação de Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT (art. 1º, caput), para executar e controlar, em regime de monopólio, os serviços postais em todo o território nacional (art. 2º, inc. I).
Com o julgamento da ADPF nº 46/DF, o e. Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento acerca da constitucionalidade da exploração das atividades postais pela União Federal, em regime de monopólio, executado através da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, nos seguintes termos:
EMENTA: ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. EMPRESA PÚBLICA DE CORREIOS E TELEGRÁFOS. PRIVILÉGIO DE ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIAS. SERVIÇO POSTAL. CONTROVÉRSIA REFERENTE À LEI FEDERAL 6.538, DE 22 DE JUNHO DE 1978. ATO NORMATIVO QUE REGULA DIREITOS E OBRIGAÇÕES CONCERNENTES AO SERVIÇO POSTAL. PREVISÃO DE SANÇÕES NAS HIPÓTESES DE VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL. COMPATIBILIDADE COM O SISTEMA CONSTITUCIONAL VIGENTE. ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 1º, INCISO IV; 5º, INCISO XIII, 170, CAPUT, INCISO IV E PARÁGRAFO ÚNICO, E 173 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA E LIVRE INICIATIVA. NÃO-CARACTERIZAÇÃO. ARGUIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO CONFERIDA AO ARTIGO 42 DA LEI N. 6.538, QUE ESTABELECE SANÇÃO, SE CONFIGURADA A VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL DA UNIÃO. APLICAÇÃO ÀS ATIVIDADES POSTAIS DESCRITAS NO ARTIGO 9º, DA LEI.
1. O serviço postal --- conjunto de atividades que torna possível o envio de correspondência, ou objeto postal, de um remetente para endereço final e determinado --- não consubstancia atividade econômica em sentido estrito. Serviço postal é serviço público.
2. A atividade econômica em sentido amplo é gênero que compreende duas espécies, o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. Monopólio é de atividade econômica em sentido estrito, empreendida por agentes econômicos privados. A exclusividade da prestação dos serviços públicos é expressão de uma situação de privilégio. Monopólio e privilégio são distintos entre si; não se os deve confundir no âmbito da linguagem jurídica, qual ocorre no vocabulário vulgar.
3. A Constituição do Brasil confere à União, em caráter exclusivo, a exploração do serviço postal e o correio aéreo nacional [artigo 20, inciso X].
4. O serviço postal é prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, empresa pública, entidade da Administração Indireta da União, criada pelo decreto-lei n. 509, de 10 de março de 1.969.
5. É imprescindível distinguirmos o regime de privilégio, que diz com a prestação dos serviços públicos, do regime de monopólio sob o qual, algumas vezes, a exploração de atividade econômica em sentido estrito é empreendida pelo Estado.
6. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos deve atuar em regime de exclusividade na prestação dos serviços que lhe incumbem em situação de privilégio, o privilégio postal.
7. Os regimes jurídicos sob os quais em regra são prestados os serviços públicos importam em que essa atividade seja desenvolvida sob privilégio, inclusive, em regra, o da exclusividade.
8. Argüição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente por maioria. O Tribunal deu interpretação conforme à Constituição ao artigo 42 da Lei n. 6.538 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º desse ato normativo.
(ADPF 46, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2009, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-01 PP-00020 RTJ VOL-00223-01 PP-00011)
Note-se que, no referido julgamento, o Pretório Excelso declarou que a Lei nº 6.538/78, que dispõe sobre os serviços postais, foi recepcionada e está de acordo com a Constituição da República, bem assim restringiu a aplicação de seu artigo 42 às atividades postais descritas no artigo 9º, do mesmo diploma legal.
Consoante a dicção dos incisos I e II, do artigo 9º, da Lei nº 6.538/78, são exploradas pela União, em regime de monopólio, o recebimento, transporte e entrega, no território nacional, e a expedição, para o exterior, de carta, cartão postal e correspondência agrupada, assim definidos no artigo 47 da mencionada norma:
CARTA - objeto de correspondência, com ou sem envoltório, sob a forma de comunicação escrita, de natureza administrativa, social, comercial, ou qualquer outra, que contenha informação de interesse específico do destinatário.
CARTÃO-POSTAL - objeto de correspondência, de material consistente, sem envoltório, contendo mensagem e endereço.
CORRESPONDÊNCIA AGRUPADA - reunião, em volume, de objetos da mesma ou de diversas naturezas, quando, pelo menos um deles, for sujeito ao monopólio postal, remetidos a pessoas jurídicas de direito público ou privado e/ou suas agências, filiais ou representantes.
Neste passo, por se tratarem de comunicações escritas de natureza comercial cuja informação sobre o valor cobrado é de interesse específico do contribuinte destinatário, as contas/faturas de consumo de energia elétrica, água, esgoto e outros serviços subsomem-se ao conceito legal de carta.
Todavia, na espécie, não se verifica ofensa à exclusividade postal da União, exercida pela ECT, porquanto à entrega da conta de energia elétrica é agregado o serviço de leitura de medidores, não sendo possível, pois, o enquadramento de tal atividade complexa como serviço postal.
Ressalte-se que o entendimento sedimentado nesta Corte Regional é no sentido de que a leitura informatizada, emissão e entrega simultânea da fatura de energia elétrica ao consumidor, quer por meios próprios, quer por empresas contratadas, não viola o chamado “monopólio postal”. Confira-se:
ADMINISTRATIVO. SERVIÇO POSTAL. MONOPÓLIO POSTAL. ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIAS POR MEIO DE EMPRESA TERCEIRIZADA. VIOLAÇÃO AO MONOPÓLIO POSTAL DA UNIÃO. ARTIGOS 21, INCISO X, DA CONSTITUIÇÃO. CONCEITO DE CARTA. LEITURA INFORMATIZADA DE DADOS E FATURAMENTO NO LOCAL DA UNIDADE CONSUMIDORA. ENTREGA CONCOMITANTE DE CONTAS/FATURA DE CONSUMO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO MONOPÓLIO POSTAL DA UNIÃO. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. A questão discutida nos autos refere-se ao alcance do regime de monopólio da ECT na prestação do serviço público postal, ou seja, a possibilidade, ou não, da entrega de cartas, bem assim consideradas as contas de água, luz, telefone, gás, boletos bancários, boletos de cobrança, cartões de crédito, talões de cheque, faturas e guias e carnes de imposto.
2. Encontra-se consolidada a jurisprudência no sentido da constitucionalidade da exploração, pela União Federal, em regime de monopólio, das atividades postais (artigo 9°, I, da Lei 6.538/78), executado através da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, a partir do julgamento da ADPF 46.
3. No que se refere aos títulos de crédito, boletos bancários e congêneres, há jurisprudência pacífica no sentido de que os títulos de crédito subsumem–se ao conceito legal de carta, estando sujeitos, assim, ao regime de monopólio da ECT.
4. Especificamente em relação à entrega de contas de consumo de água, esgoto e serviços, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal se firmou no sentido de que se subsume ao conceito legal de carta, estando sujeita ao regime de monopólio da ECT.
5. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento sob o rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, firmou entendimento de que não viola o monopólio postal conferido à ECT a entrega diretamente aos contribuintes, por agente de empresas concessionária de serviço público de distribuição de água e esgoto, de energia elétrica, ou, ainda, de carnês de cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), por agentes municipais, tendo em vista que tais ações não se inserem no conceito de serviço postal de que trata o art. 9º da Lei nº 6.538/78.
6. Ocorre que o caso discutido nos autos trata de hipótese diversa, qual seja, a possibilidade da empresa Logistech, contratada pelas concessionárias de serviços públicos, para efetuar a leitura informatizada, com a emissão e entrega simultânea de faturas dos serviços.
7. Embora no julgamento do RE 667.958, o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido a existência de repercussão geral da questão relativa à possibilidade, ou não, de os entes federados, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem guias de arrecadação tributária ou boletos de cobrança aos contribuintes ou consumidores sem o intermédio dos correios, não houve a determinação de suspensão dos processos.
8. De fato, não se vislumbra, em princípio, ofensa ao monopólio postal a contratação de empresa no caso de atividade complexa destinado à leitura eletrônica com emissão e entrega simultânea de conta de consumo. A jurisprudência passou a concluir que no caso de leitura de hidrômetros com aparelho técnico adequado, que simultaneamente reúne as etapas de medição, emissão e entrega das faturas, não ocorre violação à exclusividade do serviço postal. Precedentes.
9. Ademais, não seria razoável exigir que após a leitura informatizada, faturamento e emissão das contas de consumo, houvesse a obrigatoriedade de enviar referidas contas para a ECT fazer a postagem, diante da possibilidade de deixar os documentos com o usuário final já no ato de sua emissão.
10. Apelações parcialmente providas, apenas para autorizar a entrega concomitante de contas/faturas de consumo no caso de leitura informatizada de dados, faturamento e impressão no local da unidade consumidora. Sucumbência recíproca. (destaquei)
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0031600-14.2004.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/12/2019)
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ECT. MONOPÓLIO DOS SERVIÇOS POSTAIS. SERVIÇO SIMULTÂNEO DE LEITURA, IMPRESSÃO E ENTREGA DE FATURA. OFENSA AO MONOPÓLIO DE SERVIÇO POSTAL PRESTADO PELA ECT. INOCORRÊNCIA.
1. O Plenário do colendo Supremo Tribunal Federal, na sessão do dia 05.08.2009, ao julgar improcedente a ADPF sob n.º 46/DF, declarou que a Lei n.º 6.538/78, que trata do privilégio da entrega de correspondências pelos Correios, foi recepcionada e está de acordo com a Constituição Federal. Na mesma oportunidade, o Pretório Excelso deu interpretação ao artigo 42 da Lei nº 6.538/78 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º do referido Diploma Legal.
2. No caso em tela trata-se de leitura de dados e simultânea emissão e entrega das faturas. Não apenas o serviço foi realizado diretamente pela empresa como não envolveu qualquer utilização de serviço de entrega.
3. Inocorrente infração ao monopólio do serviço postal reservado à ECT. Precedentes desta Corte.
4. Agravo Retido improvido.
5. Apelo improvido.
(TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1741241 - 0019748-80.2010.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA, julgado em 19/04/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2017)
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ECT. PRIVILÉGIO POSTAL. LEI Nº 6.538/78. SERVIÇO POSTAL. ENTREGA DE FATURA DE COBRANÇA DE CONTAS DE ÁGUA E ESGOTO. MEDIÇÃO IMEDIATA. PREGÃO. POSSIBILIDADE. SEGUNDAS VIAS DE CONTA. DOCUMENTOS AVULSOS. COMUNICADOS. FOLHETOS. VIOLAÇÃO AO PRIVILÉGIO. DANO MATERIAL. NÃO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPRIOCA.
1. A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), Empresa Pública Federal, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 509, de 20/03/1969, para exercer com exclusividade, a prestação de serviços postais, em todo o território brasileiro, cuja competência foi constitucionalmente outorgada à União Federal (art. 21, X).
2. A Lei n.º 6.538/78, que dispõe sobre os serviços postais, conceituou os objetos de correspondência a serem entregues mediante a prestação desse serviço.
3. Por sua vez, o regulamento aprovado pelo Decreto n.º 83.858/79, em seu art. 17, estabelecia as hipóteses de exclusão do regime de monopólio das atividades postais, cabendo destacar a alínea "n", nos seguintes termos: o transporte e a entrega de aviso de cobrança relativo ao consumo de água, de energia elétrica, ou de gás, quando realizados pelo concessionário do respectivo serviço público.
4. Ainda acerca do tema, o Plenário do STF, em sessão do dia 05/08/09, ao julgar improcedente a ADPF n.º 46/DF, declarou que a Lei n.º 6.538/78, que trata do monopólio dos Correios, foi recepcionada e está de acordo com a Constituição da República.
5. Na mesma oportunidade, o Pretório Excelso deu interpretação conforme ao art. 42, da Lei n.º 6.538/78, para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no art. 9º, do referido diploma legal.
6. A discussão envolveu debate sobre o que seria considerado "carta" para os fins do art. 9º, da Lei n.º 6.538/78, tendo ficado assentado que o conceito abarca as correspondências, com ou sem envoltório, sob a forma de comunicação escrita, de natureza administrativa, social, comercial, ou qualquer outra, que contenha informação de interesse específico do destinatário (art. 47, da Lei n.º 6.538/78), incluindo, portanto, cartas pessoais, contas de serviços públicos, boletos de cartões de crédito, sendo certo que tanto estas como os cartões-postais e as correspondências agrupadas (malotes) só poderão ser transportados pelos Correios, enquanto os demais tipos de correspondências, como jornais e revistas, e demais encomendas estão excluídas do monopólio da União, previsto no art. 21, inciso X, do Texto Maior.
7. Não obstante, no caso vertente, trata-se de contratação de empresa para a prestação de serviços de leitura informatizada de hidrômetros com microcoletor de dados portátil, entrega de contas normais não envelopadas, entrega de outros documentos (espelho de conta, segunda via de conta unificada e folheto não endereçado) e vistoria cadastral, avulsa, para os municípios operados pela unidade de negócio alto Paranapanema-RA (fls.102).
8. No termo de referência os conceitos são explicitados nas fls. 138/140.
9. Ora, na hipótese de leitura do hidrômetro com impressão e entrega simultâneas de contas ao consumidor, inexiste o alegado monopólio, não sendo possível o enquadramento da atividade como serviço postal.
10. No entanto, para os casos relativos à entrega de segunda via da conta, segunda via de conta unificada, folhetos, documentos avulsos e comunicados (conforme conceitos de fl. 139), há efetiva violação do monopólio postal da apelada, pois os referidos apontamentos se inserem no conceito de carta, devendo, nestes tópicos, ser reconhecida a nulidade do pregão Sabesp online n.º 03.053/10.
12. Por fim, afasto a condenação ao pagamento de indenização por danos materiais, visto que estes não foram devidamente comprovados.
13. Ainda que a ECT alegue que sofreu prejuízos patrimoniais, decorrentes da violação ao seu monopólio postal, é necessário ressaltar que o serviço, mesmo que de forma indevida, foi realizado pela empresa corré. Assim, a ECT deixou de auferir renda, mas também deixou de prestar o serviço, razão pela qual o pagamento de indenização por danos materiais configuraria enriquecimento ilícito.
14. Dessa maneira, reformo parcialmente a r. sentença, para determinar que a contratação de empresa somente para prestação de serviços de leitura de hidrômetros, com emissão e entrega simultâneas de faturas de consumo de água e/ou esgoto, por meio de licitação, não constitui ofensa ao monopólio do serviço postal, ou mais tecnicamente, ao privilégio da exclusividade da ECT para a prestação do aludido serviço público. Ademais, afasto a indenização em danos materiais, não efetivamente experimentados.
15. Em razão de serem a autora e as rés parcialmente vencedoras e vencidas, de rigor o reconhecimento da sucumbência recíproca.
16. Apelação parcialmente provida. (destaquei)
(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1712324 - 0002682-57.2010.4.03.6110, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 24/11/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2016)
No que concerne à verba honorária impende registrar que o Código de Processo Civil estabelece os critérios para sua fixação, dispondo em seu artigo 85, §§ 2º e 8º, in verbis:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(...)
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I - o grau de zelo do profissional;
II - o lugar de prestação do serviço;
III - a natureza e a importância da causa;
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
(...)
§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.
Da leitura do dispositivo supracitado, verifica-se que em momento algum previu o legislador que a base de cálculo dos honorários de sucumbência seria o eventual proveito econômico perseguido pela parte autora, caso a ação fosse julgada improcedente.
No caso em comento, o valor atribuído à causa na petição inicial (R$ 1.000,00) é irrisório, sendo, portanto, de rigor a aplicação da regra excepcional do §8º, de fixação por equidade.
Mantidos, pois, os honorários de sucumbência como consignado na r. sentença, em R$ 1.000,00 (mil reais) para cada uma das rés, suportados pela autora, porquanto arbitrados de acordo com os preceitos que regem o tema.
Ante o exposto, nego provimento às apelações, nos termos da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ECT. ALEGAÇÃO DE MODIFICAÇÃO DO PEDIDO INICIAL EM GRAU RECURSAL. INOCORRÊNCIA. DERROGAÇÃO DO MONOPÓLIO POSTAL IMPROCEDÊNCIA. EMISSÃO DE DOCUMENTOS EXCLUSIVAMENTE NO SISTEMA ON SITE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE AS COMUNICAÇÕES ERAM EFETUADAS POR INTERMEDIÁRIOS.
1. Inicialmente, rejeitada a alegação de que a ECT estaria modificando o pedido inicial em grau recursal, pois, em verdade, a irresignação da apelada deriva de singela má-redação do pedido de provimento jurisdicional final: há evidente erro material no item “3.”, supratranscrito, ao demandar que a “segunda corré” (em tese, a Foz do Brasil) cessasse a distribuição de cartas “por meio próprios ou por empresas contratadas”. Ora, a Foz do Brasil é a empresa descrita na inicial como contratada, e a Bandeirante Energia como a que deveria se abster de violar o monopólio postal por qualquer meio. Trata-se, singelamente, de equívoco de indicação (o correto seria “a primeira corré”), que não motiva qualquer dúvida na compreensão dos contornos e objetivos da ação. Por consequência, não se evidencia ampliação do pedido inicial em sede recursal que, ao contrário, restringiu-se, passando a impugnar apenas “entrega de objetos definidos como cartas por meio de terceiros que não a ECT”.
2. No mérito, primeiramente, é preciso assentar que, em linha de princípio, a remessa à distância de fatura de serviço ou comunicação de interesse específico do destinatário por meio diverso dos serviços prestados pela ECT caracterizaria violação ao monopólio fiscal da União. Tal conclusão transparece da ementa dos EI 0007003-63.2004.4.03.6105, transcrita acima (“Quando a entrega das contas de energia elétrica é agregada ao serviço de leitura de medidores, em casos que tais, não há que se exigir a intermediação das atividades da empresa-embargante-ECT, não porque ela, ECT, não tenha o monopólio do serviço postal, nem porque o "boleto de pagamento" de conta de luz não se enquadraria no conceito jurídico de carta (resposta que é afirmativa, conforme precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores), mas porque não há o serviço postal a ser prestado”) e, no mais, já foi sustentada como razão de decidir direta pelos colegiados fracionários da 2ª Seção desta Corte (v.g.: ApCiv 0002682-57.2010.4.03.6110, Rel. Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, e-DJF3 07/12/2016).
3. Insta notar, neste tocante, em atenção à suscitação respectiva pelo patrono da concessionária apelada, na sessão de julgamento, que o ARE 649.379 (com repercussão geral, atualmente em sede de embargos de declaração), no que tomou por premissa a afirmação de que o julgamento da ADPF 46 excluiu boletos e faturas de serviço do monopólio postal da União, partiu de premissa fática equivocada. Em verdade, bem ao contrário, na ocasião, a concepção do Ministro Ayres Britto de que tais documentos estavam incluídos no “privilégio federal” foi o que definiu o julgamento da arguição.
4. De mais a mais, como se sabe, diversamente do caso do ARE 649.379, que tratou lateralmente a questão, há repercussão geral reconhecida especificamente para discussão sobre “possibilidade de os entes federativos, empresas e entidades públicas ou privadas entregarem diretamente suas guias ou boletos de cobranças aos contribuintes ou consumidores” (RE 667.958, Tema 527), ocasião em que, em caráter definitivo, deve ser assentado entendimento pretoriano para casos que tais. Assim, é prudente que se considere o mérito respectivo como de apreciação ainda pendente na Corte Suprema, sendo pertinente, portanto, o prosseguimento dos demais pontos controversos da causa ora em julgamento. Neste passo, tem-se que a alegação de derrogação do monopólio postal face às concessionárias de serviço público é improcedente. Bem observado, o § 1º do artigo 25 da Lei 8.897/1995 não respalda a conclusão deduzida.
5. De plano, o que a norma invocada dispõe é que a concessionária pode contratar terceiros para desenvolvimento de atividades, inerentes, acessórias ou complementares ao serviço concedido. Todavia, disto não se deriva que não há necessidade de observar monopólio legal para prestação de dito serviço, caso exista e, ao oposto, reforça esta necessidade o § 3º acima, em que pese omitido do arrazoado do patrono da concessionária apelada, na sessão de julgamento. De fato, tanto como qualquer outro, a ECT é terceira na relação entre concessionária e usuário do serviço concedido. Assim, é perfeitamente possível harmonizar regras em questão para conceber que a concessionária pode delegar serviços acessórios, porém, em se tratando de remessa de carta, deve obedecer ao monopólio instituído em favor da União. É lição hermenêutica basilar que revogação tácita não se presume, sendo exigível que haja impossibilidade absoluta de aplicação da regra posterior com observância da anterior, o que não é o caso. Assim, não há como supor abstratamente, sem qualquer inferência legal, que a redação do artigo 25, § 1º, da Lei de Concessões, positivou menos do que o desejado. Tanto assim que, posteriormente, já houve iniciativa efetiva de revogação do monopólio postal para atividades de faturamento de consumo de serviços de água e esgoto, o que foi obstado por veto presidencial (artigo 3º, § 1º, da Lei 11.445/2007).
6. Superada tal alegação, tem-se que, considerando a matéria devolvida pela apelação (como já se assentou, de menor escopo que o pedido inicial), a solução da causa depende da aferição de duas circunstâncias: i) existência de entrega de documentos objeto de monopólio postal fora do sistema de faturamento on site; e ii) que esta atividade seja realizada por terceiro, pois a apelação devolveu à Corte apenas esta hipótese. Para que se tenha clareza, não se afirma que, no caso em que o próprio remetente expede, transporta e entrega objeto enquadrado legalmente como carta, cartão-postal ou correspondência-agrupada, esteja intocado e preservado o monopólio estatal do serviço postal sem risco de vulneração da garantia constitucional, como se aventou da tribuna, pois esta questão não é objeto do recurso sob exame para exigir abordagem nesta oportunidade. Saliente-se, neste sentido, que julgamento a este respeito redundaria em provimento ultra petita, de modo que as razões de apelação da ECT são claras em exclusivamente focar o cenário da entrega de faturas e assemelhados por terceiros como violação de serviço postal a ser apreciada
7. Na espécie, há prova de que a apelada, à época do ajuizamento, não fazia emissão de documentos exclusivamente no sistema on site. Com efeito, reprografias de ID 77532041, denotam, com clareza, fatura auto envelopada, com datas distintas de emissão e apresentação do documento (fato registrado no próprio instrumento) e fecho serrilhado lateral, típico de comunicação postal, de modo que tais objetos em nada se assemelham a boletos de consumo impressos concomitantemente à leitura pelo aparelho medidor, em serviço domiciliar integrado. Todavia, nos limites da devolução e para o que importa na solução do caso concreto, não consta dos autos qualquer demonstração, sequer indiciária, de que a entrega de tais comunicações era efetuada por intermediário. A única relação com terceiro suscitada nos autos (com a empresa Foz do Brasil) restou cabalmente refutada durante a instrução processual na origem, de modo que o capítulo da sentença que excluiu tal corré da lide, por ilegitimidade passiva, sequer foi objeto de recurso. Neste cenário, não se revela cabível provimento jurisdicional em tese sobre alegações em relação às quais não se tem a mínima comprovação de lastro fático, mesmo que se afigurem prováveis, como no caso. Note-se que não se está diante de situações em que a contratação de terceiro é fato público e incontroverso, realizado em regime licitatório (por ex. ApCiv 0020552-48.2010.4.03.6100, Rel. Juiz Conv. SILVA NETO, e-DJF3 17/04/2015). Assim, entender procedente pretensão cominatória de conduta que sequer é possível ter certeza que ocorreu, além de fugir à lógica causal e postulados básicos de ampla defesa, relegaria à fase de liquidação do julgado a demonstração do próprio fato constitutivo do direito vindicado, em manifesta distorção do sistema processual.
8. No tocante ao apelo da empresa ré, centrado na discussão de verba honorária, cujo interesse processual subsiste em função da improcedência do recurso da ECT, verifica-se que tanto o valor dado à causa pela ECT (R$ 1.000,00), quanto a verba honorária arbitrada na origem em R$ 1.000,00, para cada ré, são insignificantes, considerando que o feito foi ajuizado ainda em 2011, de longa tramitação e múltiplas intervenções dos patronos das rés (notoriamente, da concessionária de serviço público). Assim, com base no § 8º do artigo 85 do CPC, que expressamente autoriza juízo sucumbencial equitativo em situações como a presente, e segundo parâmetros delimitados pelo § 2º, do mesmo artigo, destacadamente o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o serviço, fixa-se verba honorária, em relação ao processamento na origem, em R$ 20.000,00, a ser repartido à proporção de R$ 15.000,00 para a EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A. (denominação atual da concessionária apelante) e R$ 5.000,00 para a ODEBRECHT AMBIENTAL S.A. (denominação presente da Foz do Brasil).
9. Adicionalmente, considerando que a sentença foi prolatada em 27/09/2017, é exigível ainda, o arbitramento de honorários recursais (cf. AgInt no REsp 1.908.125, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 01/07/2021). Neste tocante, pelas mesmas balizas acima, e com lastro no § 11 do artigo 85 do CPC, majora-se a verba sucumbencial devida pela ECT em R$ 10.000,00, a ser distribuída entre as rés à mesma proporção fixada para os honorários originários.
10. Apelação da ECT desprovida, e apelação da ré provida em parte.