APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002358-36.2016.4.03.6117
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: JOSAFA JOSE CORREIA, DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES
Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A
APELADO: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES, JOSAFA JOSE CORREIA
Advogados do(a) APELADO: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002358-36.2016.4.03.6117 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: JOSAFA JOSE CORREIA, DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A Advogados do(a) APELADO: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelações à sentença que condenou a ré ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 21.400,00, por danos morais no valor de R$ 15.000,00, e danos estéticos no valor de R$ 5.000,00, com incidência de juros desde a data do evento danoso e atualizados desde a data da sentença, indeferindo o pedido de lucros cessantes. Fixada verba honorária de R$ 4.000,00, devida pela ré, e de R$ 8.000,00, devida pelo autor, suspensa a execução nos termos do artigo 98, § 3º, CPC. O DNIT sustentou, em suma, que: (1) deve ser afastada a responsabilidade objetiva, pois não se trata de ação do Estado, mas omissão presumida, sendo necessário provar, além do nexo causal, a culpa da Administração no advento do evento danoso; (2) o trecho do acidente estava concedido a empresa privada, tendo como objeto a prestação de serviços de manutenção, sendo dela a responsabilidade por danos causados a terceiros, não se podendo imputar ao DNIT omissão pela conservação da rodovia; (3) devido às condições da rodovia no momento, cabia ao condutor dirigir com cuidado e velocidade adequados, tendo havido culpa exclusiva ou concorrente da vítima; (4) o veículo foi adquirido com cláusula de alienação fiduciária e foi expedido mandado de busca e apreensão do veículo, não se consolidando a propriedade na pessoa do autor, e não há prova de que tenha dispendido recursos no conserto, sendo indevida a indenização sem perda patrimonial; (5) as despesas com guincho e transporte referem-se ao caminhão e também à carreta alugada, que possuía cobertura securitária, sendo necessário apurar informações do contrato de seguro e do recibo da indenização paga, para abatimento do valor eventualmente já pago; (6) a indenização por danos morais deve ser excluída ou reduzida, de acordo com a razoabilidade e proporcionalidade; (7) é indevida a condenação por danos estéticos, pois estes já foram inclusos na indenização por danos morais, que resultam da mesma causa; e (8) os honorários advocatícios devem ser fixados em no máximo 10% da condenação. Apelou o autor, alegando que: (1) é indevida a fixação de danos materiais em 50% do prejuízo total, pois era o único proprietário do veículo, além de ter suportado as despesas com guincho e transporte; (2) a ação de busca e apreensão foi convertida em execução, não havendo interesse da credora na recuperação do veículo, de modo que o processo em nada interfere na demanda, não podendo ser utilizada como fundamento para diminuir a fixação da indenização; (3) é devido o pagamento de lucros cessantes, pois comprovado que o autor auferia renda com transporte de cargas; (4) a indenização por danos estéticos deve ser majorada para R$ 10.000,00; e (5) pelo provimento do recurso, os honorários advocatícios devem ser fixados exclusivamente em favor do autor. Houve contrarrazões do autor. É o relatório.
APELADO: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES, JOSAFA JOSE CORREIA
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002358-36.2016.4.03.6117 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: JOSAFA JOSE CORREIA, DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES Advogados do(a) APELANTE: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A Advogados do(a) APELADO: FRANCIELE ADAO CORREIA - SP365227-A, MIGUEL CHAIM - SP10236-A V O T O Senhores Desembargadores, sendo o DNIT o órgão legalmente incumbido da tarefa de administrar rodovias federais, tem dever jurídico, sem dúvida alguma, de garantir a segurança e trafegabilidade das respectivas vias, afastando, assim, a ilegitimidade passiva alegada, sendo concernente ao mérito a discussão em torno de eventual ruptura da relação de causalidade, por conduta eventualmente imputável ao próprio motorista. Tampouco prospera imputar responsabilidade à empresa privada. Para além de a delegação de atividades à iniciativa privada não inibir a responsabilidade objetiva estatal (já que a escolha e contratação de terceiro para exercício de munus próprio configura, igualmente, risco e ônus imputáveis à Administração), o contrato acostado sequer se refere à administração e fiscalização da rodovia, mas sim à prestação de serviços de manutenção, sob orientação do próprio DNIT, de modo que eventual direito regressivo deve ser discutido em ação própria. Neste sentido: AI 5023571-94.2017.4.03.0000, Rel. Des. Fed. MONICA NOBRE, e - DJF3 Judicial 1 28/11/2019: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. DNIT. DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE DENUNCIAÇÃO DA LIDE À EMPRESA RESPONSÁVEL PELA MANUTENÇÃO DA RODOVIA. DENUNCIAÇÃO NÃO OBRIGATÓRIA. AGRAVO IMPROVIDO. - Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes - DNIT em face da decisão que indeferiu pedido de denunciação da lide à empresa responsável pela manutenção da rodovia. - A discussão envolve a responsabilidade objetiva do agravante, nos termos do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, de modo que a inclusão da empresa responsável pela manutenção da rodovia implicaria na admissão de novo fundamento, qual seja, o da responsabilidade subjetiva da empresa, não constante da lide originária. - Em se tratando de caso em que se discute a responsabilidade civil objetiva do Estado, a denunciação da lide não é obrigatória e, portanto, o agravante poderá pleitear o ressarcimento de eventuais prejuízos em ação autônoma regressiva, ocasião em que poderá discutir a suposta conduta dolosa ou culposa por parte da empresa contratada. Precedente do STJ. - Agravo de instrumento improvido." AI 0005592-78.2015.4.03.0000, Rel. Des. Fed. DIVA MALERBI, e-DJF3 Judicial 1 16/08/2019: "PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO EM RODOVIA. INVIABILIDADE. RESPONSABILIDADE DISTINTA. AÇÃO REGRESSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, inclusive quanto aos pontos impugnados no presente recurso. 2. A questão vertida nos autos cinge-se à possibilidade de denunciação da lide pelo Departamento Nacional de Infra Estrutura de Transportes - DNIT à empresa responsável pela restauração e manutenção de trecho da rodovia em que ocorreu acidente automobilístico por conta de desnível no acostamento e ausência de sinalização. 3. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido da inviabilidade da denunciação da lide na hipótese em que se objetiva discutir responsabilidade de natureza distinta daquela que é discutida na ação originária calcada no art. 37, § 6º, da CF/88, envolvendo o autor e o réu-denunciante, cuja abordagem prejudicaria o regular andamento da ação indenizatória proposta pelo autor em face do réu e ante a possibilidade de ajuizamento posterior de eventual ação regressiva. Precedentes. 4. Ressalte-se que o E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que não cabe a denunciação quando se pretende, pura e simplesmente, transferir responsabilidades pelo evento danoso, mesmo tendo em vista o previsto no art. 70, III, do CPC/1973. Precedentes. 5. Na hipótese dos autos, observa-se que o autor ajuizou a ação originária em face do DNIT e da UNIÃO FEDERAL visando reparação por acidente automobilístico com fundamento no artigo 37, §6º, da Constituição Federal. 6. Da leitura do contrato de empreitada para a restauração e manutenção de trecho da Rodovia BR-163/MS (fls. 114/118), constata-se não haver cláusula que obrigue a empresa contratada, ora agravante, a ressarcir o Departamento Nacional de Infra Estrutura de Transportes-DNIT no caso de eventuais acidentes de trânsito que possam ocorrer na Rodovia sob sua restauração e manutenção. 7. De fato, tal contrato não transfere a ora agravante a responsabilidade pela fiscalização da rodovia, trata-se apenas de um contrato de execução de obras de restauração e manutenção sobre a efetiva fiscalização e orientação do próprio DNIT, cabendo a este, na hipótese de condenação no dever de indenizar, exercer o seu direito de regresso, por meio de ação própria, se assim entender. 8. Inadmissível, in casu, a denunciação da lide com fundamento no art. 70, III, do Código de Processo Civil, pelo que merece ser reformada a r. decisão agravada. 9. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida. 10. Agravo interno desprovido." No mérito, resta consolidada a jurisprudência no sentido de que a reparação civil fundada em danos decorrentes de acidente de trânsito em rodovia exige demonstração de conduta estatal, por ação ou omissão, e relação de causalidade com o dano apurado. A doutrina e jurisprudência não são unânimes no trato da natureza da responsabilidade do Estado em caso de omissão. Embora assente ser objetiva a responsabilidade estatal por ato comissivo, relevante divergência tem sido levantada quando se trata de ato omissivo, para a qual exigida comprovação de dolo ou culpa, elementos atrelados à responsabilidade subjetiva. A exemplo, na doutrina pátria: “Quando o dano foi possível em decorrência de uma ‘omissão’ do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade ‘subjetiva’. Com efeito, se o estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se ‘descumpriu o dever legal’ que lhe impunha obstar ao evento lesivo. (...) Sua omissão ou deficiência haveria sido ‘condição’ do dano, não ‘causa’. (...) É razoável e impositivo que o Estado responsa pelos danos que causou. Mas só é razoável e impositivo que responda pelos danos que não causou quando estiver ‘de direito obrigado a impedi-los’. (.,.) Ao contrário do que se passa com a responsabilidade do Estado por comportamentos comissivos.” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 1.021-24) "Também se debateu vivamente acerca da responsabilidade pelos atos omissivos do Estado. Alegou-se que por estes deveria responder a Administração com base na teoria subjetiva. Entretanto, a Constituição não estabeleceu qualquer restrição ao âmbito de abrangência do art. 37, §6º, tampouco o art. 43 do Código Civil, daí decorrendo a natureza objetiva da responsabilidade estatal por omissão. Atualmente, ainda, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento no sentido de que ‘as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, §6º, da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por atos omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público.” (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Atualizado por Gustavo Tepedino. 12.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 181) Da mesma sorte, nota-se similar contraste em âmbito jurisprudencial: ARE 1.249.452 AgR, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe 15/06/2021: "AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ART. 37, § 6º, DA CF. NEXO DE CAUSALIDADE. COMPROVAÇÃO NA ORIGEM. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CONDUTA LÍCITA. IRRELEVÂNCIA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 279 DO STF. PRECEDENTES. TEMA 810 DA REPERCUSSÃO GERAL. INAPLICABILIDADE. 1. Inaplicável, na hipótese, o Tema 810 da repercussão geral, visto que não foi debatido em sede de apelação o índice de correção monetária (TR). Razões do apelo extremo dissociadas do acórdão recorrido. Súmula 284 do STF. 2. A responsabilidade objetiva se aplica às pessoas jurídicas de direito público pelos atos comissivos e omissivos, independentemente da licitude ou não do comportamento do agente público, nos termos do art. 37, § 6º, do Texto Constitucional. Precedentes. 3. O Tribunal de origem assentou a responsabilidade do Recorrente a partir da análise do contexto probatório dos autos, concluindo pela ocorrência do dano e pela presença do nexo de causalidade. Assim, eventual divergência de tal entendimento demandaria o reexame de fatos e provas da causa, providência inviável nos termos da Súmula 279 do STF. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, em virtude da sucumbência recíproca reconhecida na instância de origem." AgInt no REsp 1.632.985, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES, DJe 19/11/2019: "ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DA AUTARQUIA FEDERAL. VÍTIMA DE ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. OMISSÃO DA AUTARQUIA FEDERAL EM FISCALIZAR ANIMAIS NA RODOVIA. MORTE DA VÍTIMA POR ANIMAL NA PISTA DE ROLAMENTO EM RODOVIA FEDERAL. FATO INCONTROVERSO. VALORAÇÃO DOS CRITÉRIOS JURÍDICOS CONCERNENTES À UTILIZAÇÃO DA PROVA E À FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO. DEVER DE VIGILÂNCIA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA CARACTERIZADA. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. INOVAÇÃO RECURSAL. AGRAVO INTERNO DA AUTARQUIA FEDERAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O Tribunal de origem, em sede de Apelação e Reexame Necessário, afastou a responsabilidade civil do DNIT por entender que seria impossível tal Entidade o controle extensivo de toda rodovia. 2. Todavia, com efeito ficou reconhecido que o acidente ocorreu em Rodovia Federal, em razão da presença de animal transitando na pista, situação que denotaria negligência na manutenção e fiscalização pelo DNIT, além de não haver nos autos quaisquer indícios de culpa exclusiva da vítima e de força maior. 3. Não há que se falar no afastamento da Responsabilidade Civil do Ente Estatal, isso porque é dever do Estado promover vigilância ostensiva e adequada, proporcionando segurança possível àqueles que trafegam pela rodovia. Trata-se, desse modo, de valoração dos critérios jurídicos concernentes à utilização da prova e à formação da convicção, e não de reexame do contexto fático-probatório dos autos. 4. Assim, há conduta omissiva e culposa do Ente Público, caracterizada pela negligência, apta a responsabilizar o DNIT, nos termos do que preceitua a teoria da Responsabilidade Civil do Estado, por omissão (AgInt no AgInt no REsp. 1.631.507/CE, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe 28.8.2018; e REsp. 1.198.534/RS, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 20.8.2010). 5. Com relação à redução do valor arbitrado a título de indenização, é certo que tal tema sequer foi mencionado nas razões das Contrarrazões do Recurso Especial, e somente foi suscitado em sede de Agravo Interno, o que caracteriza inovação recursal, vedada diante da preclusão consumativa. 6. Agravo Interno da Autarquia Federal a que se nega provimento." De fato, a responsabilidade do DNIT envolve não responsabilidade apenas objetiva, mas subjetiva, por culpa, considerada a negligência no dever que tem de conservação da rodovia, permitindo que veículos trafeguem em pista com existência de buracos passíveis de causar acidentes. Tratando-se de conduta omissiva, prestigia-se a jurisprudência que entende que a responsabilização estatal é subjetiva, ou seja, sendo necessária a demonstração de dolo ou culpa, que se encontram presentes na espécie. A propósito da violação de dever legal, dispõe o artigo 82, I e IV da Lei 10.233/2001 que "são atribuições do DNIT, em sua esfera de atuação [...] estabelecer padrões, normas e especificações técnicas para os programas de segurança operacional, sinalização, manutenção ou conservação, restauração ou reposição de vias, terminais e instalações [...] administrar, diretamente ou por meio de convênios de delegação ou cooperação, os programas de operação, manutenção, conservação, restauração e reposição de rodovia". Destarte, a existência de buraco na pista configura omissão relevante e grave no cumprimento de dever imposto legalmente, havendo, assim, conduta negligente a demonstrar culpa da requerida, necessária e suficiente para a imputação de responsabilidade civil. Para atestar a relação de causalidade entre conduta estatal e dano sofrido pelo autor, o Boletim de Acidente de Trânsito (ID 101962330, f. 43/50) indica o estado da pista de rolamento como "ruim" e aponta que o acidente ocorreu no km 24 da rodovia BR-410, mesmo local em que ocorreram vários outros acidentes (ID 101962330, f. 56), apontado negligência do DNIT em promover os devidos reparos. Não se pode admitir, todavia, o argumento da ré de que era sabido o estado ruim de conservação da estrada, de modo a conferir ao usuário a responsabilidade por eventual acidente naquele trecho. O prévio conhecimento da vítima a respeito da condição da faixa de rolamento não é fundamento apto a eximir a responsabilidade da parte ré quanto à manutenção da via. Por outro lado, não há nos autos qualquer indicativo de que houve condução perigosa ou em desacordo às normas de segurança, sendo indevido imputar ao próprio motorista, sem a devida prova, a responsabilidade por acidentes ocorridos em rodovias mal conservadas e sem a devida sinalização, em detrimento das obrigações legais da ré. Não cabe cogitar, pois, de excludente ou minorante de culpa na conduta estatal. Deixar de conservar e sinalizar corretamente vias públicas revela, sem dúvida, mais do que apenas possível relação objetiva de causa e efeito, mas, de fato, inexoravelmente leva ao reconhecimento inequívoco de conduta subjetivamente culposa, por falta de cuidado e de zelo com o patrimônio público e com o direito dos usuários de tais vias, capaz de produzir lesão a bem jurídico na perspectiva mais elementar de previsibilidade quanto ao que normalmente ocorreria em circunstâncias que tais. A respeito da indenização pleiteada, despesas com guincho e transporte não são prejudicadas por contrato de financiamento com alienação fiduciária, pois unicamente o autor suportou tais gastos, conforme recibos apresentados (ID 101962331, f. 24/7), e não o sócio com quem adquirira o veículo. Quanto aos dispêndios com a carreta tracionada, que possuía cobertura de seguro, a demonstração constante dos autos é de que a proprietária do bem arcou com os custos da franquia para conserto (e, condizentemente, não houve pedido de indenização neste tocante), e não quanto aos gastos respectivos de guincho e transporte (ID's 101962331, f. 24/7, e 101963383, f. 04 e seguintes). Ausente prova de que houve ressarcimento ao autor por tais dispêndios, é devido o ressarcimento pelo valor total referente ao destombamento e transporte do caminhão e da carreta. Todavia, quanto aos valores para conserto do veículo pelos danos decorrentes do acidente, não são devidos ao autor, pois este não é o efetivo proprietário do caminhão trator, que se encontra gravado com cláusula de alienação fiduciária. Havendo inadimplência do autor, opera-se cláusula resolutiva, consolidando-se a propriedade do veículo ao credor fiduciário. Ainda que tenha havido conversão da ação de busca e apreensão em execução de título extrajudicial, conforme dito pelo autor (ID 101963390, f. 43/7), tal fato não gera renúncia do credor à garantia, vez que não verificadas as hipóteses do artigo 1.436, §1º, do Código Civil, c/c artigo 66-B, § 5º, da Lei 4.728/1965. Não sendo o autor proprietário do veículo objeto do acidente e, caracterizada inadimplência na ocasião, não se verifica dano patrimonial indenizável. Foi preciso o Juízo a quo, portanto, ao valorar o dano material emergente, nesta situação, a partir da parcela do valor do bem que já havia sido efetivamente paga pelo autor à época do acidente, aduzida dos custos de guincho e transporte do veículo inicialmente a pátio de guarda próximo e, posteriormente, ao domicílio do requerente. Do mesmo modo, no tocante aos lucros cessantes, foi correta a sentença ao indeferir o pedido, pois o veículo com o qual o autor realizava transportes não era de sua propriedade, podendo ser alvo de busca e apreensão pelo credor fiduciário a qualquer momento, não sendo possível assumir que continuaria em uso pelo requerente. Ademais, o autor não sofreu lesões com incapacitação laborativa, conforme atestou o perito judicial (ID 101963388, f. 26). No tocante aos danos morais, é inegável que o acidente viário, que tornou necessário socorro médico, é fato causador de sofrimento psíquico e moral indenizável. Todavia, o valor fixado de R$ 15.000,00 revela-se excessivo, pois não ocorreu lesão grave ou incapacitante. Ademais, sendo o autor motorista profissional, o tempo gasto e o transtorno suportado pela necessidade de providenciar guincho e transporte do caminhão e carreta são considerados ocorrências previsíveis, ainda que não frequentes, de modo que se autoriza redução do valor devido a título de danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais). Em relação aos danos estéticos, revela-se adequado o valor fixado pela sentença, pois, conforme atestou o perito, não houve dano estético considerável (ID 101963388, f. 26), o que é corroborado pelo relato do autor de que a lesão quase não é notada por pessoas, não tendo sofrido constrangimentos (ID's 126645227 e 126645228). Assim, o valor de R$ 5.000,00 é suficiente a indenizar o prejuízo à face e à imagem do autor, sendo indevida neste ponto a reforma da sentença. Registre-se, em arremate, que é possível a cumulação de indenizações por dano moral e estético, conforme entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 387/STJ). Quanto aos honorários advocatícios, com reforma parcial da sentença, cabe novo arbitramento, em substituição ao fixado pela sentença, considerado o trabalho adicional em grau recursal e os critérios dos artigos 85, §§ 2º a 6º e 11, e 86, CPC, especialmente grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa e tempo exigido de atuação nesta fase do processo. Neste sentido, considerada a sucumbência recíproca em proporções distintas do pedido inicial, fixa-se verba honorária em 10% (dez por cento) do valor da condenação devida pela ré (o que significa redução da fixação em sentença, dada a minoração da reparação devida a título de dano moral, nos termos acima), e em 15% (quinze por cento) sobre a diferença entre o valor da causa e o da condenação, devidos pelo autor, já considerados os honorários recursais decorrentes do desprovimento do apelo interposto, suspensa a execução pela concessão dos benefícios da justiça gratuita. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do DNIT e nego provimento à apelação do autor, nos termos supracitados. É como voto.
APELADO: DNIT-DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES, JOSAFA JOSE CORREIA
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DNIT. ACIDENTE EM RODOVIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS.
1. Sendo o DNIT o órgão legalmente incumbido da tarefa de administrar rodovias federais, tem dever jurídico de garantir a segurança e trafegabilidade das respectivas vias, afastando, assim, a ilegitimidade passiva, sendo concernente ao mérito a discussão em torno de eventual ruptura da relação de causalidade, por conduta eventualmente imputável ao próprio motorista.
2. Tampouco prospera imputar responsabilidade à empresa privada. Para além de a delegação de atividades à iniciativa privada não inibir a responsabilidade objetiva estatal (já que a escolha e contratação de terceiro para exercício de munus próprio configura, igualmente, risco e ônus imputáveis à Administração), o contrato acostado sequer se refere à administração e fiscalização da rodovia, mas sim à prestação de serviços de manutenção, sob orientação do próprio DNIT, de modo que eventual direito regressivo deve ser discutido em ação própria.
3. No mérito, resta consolidada a jurisprudência no sentido de que a reparação civil fundada em danos decorrentes de acidente de trânsito em rodovia exige demonstração de conduta estatal, por ação ou omissão, e relação de causalidade com o dano apurado. A doutrina e jurisprudência não são unânimes no trato da natureza da responsabilidade do Estado em caso de omissão. Embora assente ser objetiva a responsabilidade estatal por ato comissivo, relevante divergência tem sido levantada quando se trata de ato omissivo, para a qual exigida comprovação de dolo ou culpa, elementos atrelados à responsabilidade subjetiva.
4. De fato, a responsabilidade do DNIT envolve não responsabilidade apenas objetiva, mas subjetiva, por culpa, considerada a negligência no dever que tem de conservação da rodovia, permitindo que veículos trafeguem em pista com existência de buracos passíveis de causar acidentes. Tratando-se de conduta omissiva, prestigia-se a jurisprudência que entende que a responsabilização estatal é subjetiva, ou seja, sendo necessária a demonstração de dolo ou culpa, que se encontram presentes na espécie. A existência de buraco na pista configura omissão relevante e grave no cumprimento de dever fixado legalmente, havendo conduta negligente com demonstração de culpa da requerida, necessária e suficiente para ensejar responsabilidade civil.
5. Para atestar a relação de causalidade entre conduta estatal e dano sofrido pelo autor, o Boletim de Acidente de Trânsito indica o estado da pista de rolamento como "ruim" e aponta que o acidente ocorreu no km 24 da rodovia BR-410, mesmo local em que ocorreram vários outros acidentes, demonstrando a negligência do DNIT em promover os devidos reparos. Não se pode admitir, todavia, o argumento da ré de que era sabido o estado ruim de conservação da estrada, cabendo ao condutor a responsabilidade por eventual acidente naquele trecho. O prévio conhecimento da vítima a respeito da condição da faixa de rolamento não é fundamento apto a eximir a responsabilidade da parte ré quanto à manutenção da via. Por outro lado, não há nos autos qualquer indicativo de que houve condução perigosa ou em desacordo às normas de segurança, sendo indevido imputar ao próprio motorista, sem a devida prova, a responsabilidade por acidentes ocorridos em rodovias mal conservadas e sem a devida sinalização, em detrimento das obrigações legais da ré. Não cabe cogitar, portanto, de excludente ou minorante de culpa na conduta estatal. Deixar de conservar e sinalizar corretamente as vias públicas revela mais do que apenas possível relação objetiva de causa e efeito, mas, de fato, inexoravelmente leva ao reconhecimento inequívoco de conduta subjetivamente culposa, por falta de cuidado e de zelo com o patrimônio público e com o direito dos usuários de tais vias, capaz de produzir lesão a bem jurídico na perspectiva mais elementar de previsibilidade quanto ao que normalmente ocorreria em circunstâncias que tais.
6. A respeito da indenização pleiteada, despesas com guincho e transporte não são afetadas pelo contrato de financiamento com alienação fiduciária, pois unicamente o autor suportou os dispêndios, conforme recibos, e não o sócio respectivo. Quanto aos dispêndios com a carreta tracionada, que possuía cobertura de seguro, a demonstração constante dos autos é de que a proprietária do bem arcou com os custos da franquia para conserto (e, condizentemente, não houve pedido de indenização neste tocante), e não quanto aos gastos respectivos de guincho e transporte. Ausente prova de que houve ressarcimento ao autor por tais dispêndios, é devido o ressarcimento pelo valor total referente ao destombamento e transporte do caminhão e da carreta.
7. Todavia, quanto aos valores pleiteados para conserto do veículo pelos danos decorrentes do acidente, não são devidos ao autor, pois este não é o efetivo proprietário do caminhão trator, que se encontra gravado com cláusula de alienação fiduciária. Havendo inadimplência do autor, opera-se cláusula resolutiva, consolidando-se a propriedade do veículo ao credor fiduciário. Ainda que tenha havido conversão da ação de busca e apreensão em execução de título extrajudicial, conforme relatado pelo autor, tal fato não importa renúncia do credor à garantia, vez que não verificadas as hipóteses do artigo 1.436, §1º, do Código Civil, c/c artigo 66-B, § 5º, da Lei 4.728/1965. Não sendo o autor proprietário do veículo sinistrado, visto que caracterizada a inadimplência no momento do acidente, não se verifica dano patrimonial indenizável. Foi preciso o Juízo a quo, portanto, ao valorar o dano material emergente, nesta situação, a partir da parcela do valor do bem que já havia sido efetivamente paga pelo autor à época do acidente, aduzida dos custos de guincho e transporte do veículo inicialmente a pátio de guarda próximo e, posteriormente, ao domicílio do requerente.
8. Do mesmo modo, no tocante aos lucros cessantes, foi correta a sentença ao indeferir o pedido, pois o veículo com o qual o autor realizava transportes não era de sua propriedade, podendo ser alvo de busca e apreensão pelo credor fiduciário a qualquer momento, não sendo possível assumir que continuaria em uso pelo requerente. Ademais, o autor não sofreu lesões que acarretassem incapacidade laborativa, conforme atestado pelo perito judicial.
9. No tocante aos danos morais, é inegável que acidente viário, em que houve necessidade de socorro médico, é fato causador de sofrimento psíquico e moral indenizável. Todavia, o valor fixado de R$ 15.000,00 revela-se excessivo, pois não ocorreu lesão grave ou incapacitante. Ademais, sendo o autor motorista profissional, o tempo gasto e o transtorno suportado pela necessidade de providenciar guincho e transporte do caminhão e carreta são considerados ocorrências previsíveis, ainda que não frequentes, de modo que cabe a redução do valor devido a título de danos morais a R$ 10.000,00.
10. Em relação aos danos estéticos, revela-se adequado o valor fixado pela sentença, pois, conforme atestado pelo perito, não houve dano estético considerável, o que é corroborado pelo relato do autor de que a lesão quase não é notada pelas pessoas, não tendo sofrido constrangimentos. Assim, o valor de R$ 5.000,00 é suficiente a indenizar o prejuízo à face e à imagem do autor, sendo indevida neste ponto a reforma da sentença.
11. Possível a cumulação de indenizações por dano moral e estético, conforme entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 387/STJ).
12. Havendo reforma parcial, fixa-se verba honorária em observância ao comando e critérios do artigos 85, §§ 2º a 6º e 11, e 86, do Código de Processo Civil.
13. Apelação da ré parcialmente provida. Apelação do autor desprovida.