APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001051-90.2019.4.03.6105
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: SYNGENTA PROTECAO DE CULTIVOS LTDA
Advogado do(a) APELADO: MARIA HELENA TAVARES DE PINHO TINOCO SOARES - SP112499-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001051-90.2019.4.03.6105 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SYNGENTA PROTECAO DE CULTIVOS LTDA Advogado do(a) APELADO: MARIA HELENA TAVARES DE PINHO TINOCO SOARES - SP112499-A OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Remessa oficial e apelação interposta pela União contra decisão que, em sede de mandado de segurança, concedeu a ordem para: a) determinar a não inclusão das despesas de frete e seguro na base de cálculo do imposto de importação; b) reconhecer o direito à restituição administrativa ou compensação dos valores indevidamente recolhidos com os tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, desde o quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação (Id 155915347 e 155915360). Opostos embargos de declaração (Id 155915364), foram rejeitados (Id 155915365). Aduz (Id 155915376) que: a) o decisum está fundamentado na ilegalidade do §3º do artigo 4º da Instrução Normativa SRF n.º 327/2003, que, no entanto, não trata de seguro e frete internacionais, mas da inclusão das despesas de capatazia no cálculo do valor aduaneiro; b) a inclusão das despesas de seguro e frete internacional no cálculo do valor aduaneiro está prevista no artigo 77 do Decreto n.º 6.759/09 (Regulamento Aduaneiro), em consonância com o Acordo sobre Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994 (AVA-GATT), aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30/1994 e promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994. Em contrarrazões (Id 155915383), a apelada requer o desprovimento do recurso. O parecer ministerial é no sentido de que seja dado prosseguimento ao feito (Id 156639277). É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001051-90.2019.4.03.6105 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SYNGENTA PROTECAO DE CULTIVOS LTDA Advogado do(a) APELADO: MARIA HELENA TAVARES DE PINHO TINOCO SOARES - SP112499-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I – Dos fatos Mandado de Segurança impetrado por Syngenta Proteção de Cultivos Ltda. contra ato praticado pelo Inspetor-Chefe da Alfândega da Receita Federal do Brasil do Aeroporto Internacional de Viracopos/SP, com vista à declaração de ilegalidade da inclusão das despesas de frete e seguro na base de cálculo do imposto de importação, na forma do artigo 4º, § 3°, da Instrução Normativa SRF n.º 327/03, bem como do direito ao ressarcimento dos valores pagos a esse título nos últimos cinco anos. II – Do valor aduaneiro e dos custos de frete e seguro Para melhor compreensão da controvérsia, torna-se necessária uma breve digressão legislativa sobre o tema. O Decreto-Lei n.º 37/66, que ostenta status de lei complementar quanto à definição da base de cálculo do imposto de importação, assim determinou em seu artigo 2º, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 2.472/88: Art. 2º - A base de cálculo do imposto é: I - quando a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria, expressa na unidade de medida indicada na tarifa; II - quando a alíquota for "ad valorem", o valor aduaneiro apurado segundo as normas do art. 7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT [destaquei] O Acordo Sobre a Implementação do Artigo VII do GATT/1994, dispôs nos artigos 1º, item 1 e 8º, item 2, quais os elementos podem ser escolhidos pelos membros da Organização Mundial do Comércio – OMC na composição do valor aduaneiro: Artigo 1º 1. O valor aduaneiro de mercadorias importadas será o valor de transação, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias em uma venda para exportação para o país de importação, ajustado de acordo com as disposições do Artigo 8, desde que: (...) Artigo 8º (...) 2. Ao elaborar sua legislação, cada Membro deverá prever a inclusão ou a exclusão, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos: (a) - o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; (b) - os gastos relativos ao carregamento descarregamento e manuseio associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e (c) - o custo do seguro [destaquei] No Brasil, a Ata Final que incorporou os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, que contém o AVA - GATT, foi aprovada pelo Decreto Legislativo n° 30/94 e promulgada pelo Decreto Executivo nº 1.355/94, com status de lei ordinária, na forma do artigo 98 do Código Tributário Nacional. Posteriormente, o Decreto n. º 2.498/98, estabeleceu em seu artigo 17 sobre a composição do valor aduaneiro, verbis: Art. 17. No valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado, serão incluídos (parágrafo 2 do artigo 8 do Acordo de Valoração Aduaneira): I - o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; II - os gastos relativos a carga, descarga e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e III - o custo do seguro nas operações referidas nos incisos I e II. [destaquei] No mesmo sentido, seguiu-se a edição do Decreto n.º 6.759/09 (Regulamento Aduaneiro), que assim definiu em seu artigo 77: Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado: I - o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro; II - os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e III- o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II; Coube, ainda, ao artigo 79 do referido decreto fixar quais despesas restariam excluídas da composição do valor aduaneiro, em consonância com o disposto no item 03 da nota ao artigo 1º do Anexo I do AVA-GATT: Art. 79. Não integram o valor aduaneiro, segundo o método do valor de transação, desde que estejam destacados do preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, na respectiva documentação comprobatória (Acordo de Valoração Aduaneira, Artigo 8, parágrafo 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994): (...) II - os custos de transporte e seguro, bem como os gastos associados ao transporte, incorridos no território aduaneiro, a partir dos locais referidos no inciso I do art. 77. Nota ao artigo 01 - Anexo I do AVA 3. O valor aduaneiro não incluirá os seguintes encargos ou custos, desde que estes sejam destacados do preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas: (a) encargos relativos à construção, instalação, montagem, manutenção ou assistência técnica executados após a importação, relacionados com as mercadorias importadas, tais como instalações, máquinas ou equipamentos industriais; (b) o custo de transporte após a importação; (c) direitos aduaneiros e impostos incidentes no país de importação. [destaquei] Da análise da legislação referente ao conceito de valor aduaneiro observa-se que não há qualquer ilegalidade na inclusão dos valores referentes ao frete internacional e ao seguro na base de cálculo do imposto de importação. Assim, resta afastada a alegação de violação ao princípio da legalidade (artigo 150, inciso I, da CF). Nesse sentido, confira-se: À legislação tributária, aí incluídos tratados internacionais, decretos e instruções normativas e portarias, cabe o preenchimento desse conceito aberto. O preenchimento de conceitos abertos por normas heterônomas não encontra óbice no princípio da legalidade, especialmente quando à lei complementar foi reservada a disciplina das normais gerais a respeito da base de cálculo dos tributos. Assim, esse conceito aberto é preenchido justamente pelo Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT, promulgado pelo Decreto nº 92.930/86, por expressa determinação do art. 2º, II do Decreto-Lei nº 37/1966, recepcionado pela CF/1988 com status de lei ordinária, verbis: [...] Observa-se, pois, que o Brasil previu a inclusão das despesas com frete internacional e com seguro no valor aduaneiro através do Decreto 92.930/86, que possui status de lei por incorporar tratado internacional no ordenamento jurídico brasileiro. Assim é que, especificamente quanto à inclusão desses elementos, o Decreto 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro) e a IN 327/2003 somente dispuseram sobre algo que já estava previsto em lei: [...] Da leitura dos dispositivos acima transcritos, verifica-se que não há se falar em inconstitucionalidade ou ilegalidade da inclusão das despesas de frete internacional e seguro no valor aduaneiro da mercadoria, pois observados os limites impostos pela Constituição Federal, pelo AVA-GATT e pelo Decreto 6.759/2009. [...] Ex positis, nego seguimento ao recurso (alínea c do inciso V do art. 13 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). (STF, RE 1357310/SC, Rel. Min. Luiz Fux, j. 03.12.21, destaquei). MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. FRETE E SEGURO INTERNACIONAL. POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO NO VALOR ADUANEIRO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. O art. 146, III, “a”, da Constituição Federal preconiza que cabe à lei complementar estabelecer normas gerais sobre base de cálculo dos impostos. Neste passo, o art. 20, II, do Código Tributário Nacional, recepcionado com status de lei complementar, estabelece conceito aberto de base de cálculo do Imposto de Importação, o qual é preenchido pelo artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT, por expressa determinação do art. 2º, II, do Decreto-lei nº 37/66, com a redação dada pelo Decreto-lei nº 2.472/88. 2. Note-se que o Acordo sobre a Implementação do artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 92.930/86, recepcionado com status de lei ordinária, bem assim que o Decreto nº 1.355/94 internalizou no país a Ata Final que Incorpora os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT. 3. Cumpre observar que os tratados e as convenções internacionais podem revogar ou modificar a legislação tributária interna, nos termos do art. 98 do Código Tributário Nacional. 4. O art. 8º, item 2, do AVA-GATT prevê expressamente a possibilidade de o valor aduaneiro incluir: o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou local da importação (frete); os gastos relativos ao carregamento, descarregamento e manuseio do transporte das mercadorias até o porto ou local da importação; e o custo do seguro. 5. Não há, portanto, qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade na inclusão das despesas com frete e seguro internacional no conceito de valor aduaneiro. Precedentes desta Corte. 6. Apelação não provida. (TRF 3ª Região, Terceira Turma, AC 5006657-05.2019.4.03.6104, Rel. Des. Fed. Nery Junior, j. 13.07.2021, destaquei). IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. IPI. COFINS-IMPORTAÇÃO. PIS-IMPORTAÇÃO. VALOR ADUANEIRO. DESPESAS COM FRETE E SEGURO INTERNACIONAL. É legítima a inclusão das despesas de frete e de seguro internacional no valor aduaneiro da mercadoria, base de cálculo do imposto de importação, do IPI, do PIS-importação e da COFINS-importação. (TRF 4ª Região, Segunda Turma, AC 5012642-20.2019.4.04.7205, Rel. Des. Rômulo Pizzolatti, j. 17.08.2021, destaquei). Assim, reconhecida a legalidade da exigência, resta prejudicada, a análise das questões referentes ao direito à compensação. Por fim, as questões relativas aos artigos 146, inciso III, alínea “a”, e 153, § 1º, da CF, 21 e 97 do CTN, 75, 76,78,79 542, 543, 545 e 571 do Decreto n° 6.759/09, 1º ao 4º do Decreto n° 92.930/86, 1º e 2º do Decreto n° 6.870/2009, 5º, letra “b”, 6º e 7º, da Decisão n.º 13/07, parágrafo 3°, da Nota ao artigo 1, do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII, do Acordo Geral de Tarifas e Comércio 1994 e o comentário 9.1 do Comitê de Valoração Aduaneira (OMC) não interferem nesse entendimento pelos motivos já indicados. Ante o exposto, dou provimento à remessa oficial e à apelação para reformar a sentença e denegar a ordem. Sem honorários, na forma do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09. Custas ex vi legis. É como voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. VALOR ADUANEIRO. DESPESAS DE FRETE E SEGURO. IN SRF N.º 327/03. LEGALIDADE. REEXAME E RECURSO PROVIDOS.
- O Acordo Sobre a Implementação do Artigo VII do GATT/1994, dispôs nos artigos 1º, item 1 e 8º, item 2, quais os elementos poderiam ser escolhidos pelos membros da Organização Mundial do Comércio – OMC na composição do valor aduaneiro.
- No Brasil, a Ata Final que incorporou os Resultados da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, que contém o AVA -GATT, foi aprovado pelo Decreto Legislativo n° 30/94 e promulgado pelo Decreto Executivo nº 1.355/94, com status de lei ordinária, na forma do artigo 98 do Código Tributário Nacional. Posteriormente, o Decreto n. º 2.498/98, indicou em seu artigo 17 sobre a composição do valor aduaneiro. No mesmo sentido, seguiu-se a edição do Decreto n.º 6.759/09 (Regulamento Aduaneiro), que definiu em seu artigo 77 que integram o valor aduaneiro o custo de transporte de mercadoria importada e o custo do seguro.
- Da análise da legislação referente ao conceito de valoração aduaneira observa-se que não há qualquer ilegalidade na inclusão dos valores referentes ao frete internacional e ao seguro na base de cálculo do imposto de importação. Precedentes.
- Remessa oficial e apelação providas.