Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008153-60.2010.4.03.6302

RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: BENEDITO PEDRO

Advogado do(a) RECORRIDO: HILARIO BOCCHI JUNIOR - SP90916-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95. 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0008153-60.2010.4.03.6302

RELATOR: 9º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECORRIDO: BENEDITO PEDRO

Advogado do(a) RECORRIDO: HILARIO BOCCHI JUNIOR - SP90916-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OCORRÊNCIA DE ERRO MATERIAL. NOVO JULGAMENTO. EMBARGOS DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS. VÍCIO SANADO. EFEITOS INFRINGENTES. RECONHECIMENTO DE TEMPO ADICIONAL DE ATIVIDADE ESPECIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO.

 

1. Trata-se de embargos de declaração interpostos pela parte autora. Sustenta a ocorrência de erro material na decisão embargada a respeito de análise de trabalho exercido sob condições especiais.

 

2. Nos termos do artigo 48, da Lei 9.099/1995, aplicada subsidiariamente ao rito dos Juizados Especiais Federais, caberão embargos de declaração quando, na sentença ou acórdão, houver obscuridade, contradição, omissão ou dúvida, podendo ser corrigido de ofício os erros materiais, nos termos do art. 1.022, III, do CPC/2015.

 

3. Verifico que de fato houve erro material no acórdão originário..

 

3.1. Ante o exposto, acolho os embargos de declaração da parte autora para anular o acórdão embargado e passo a proferir novo julgamento, conforme segue.

 

4. Ação proposta para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. O pedido foi julgado procedente em parte.

 

5. Recurso da parte autora em que pleiteia o reconhecimento adicional de períodos de atividade especial por exposição a agentes nocivos e em empresas de agropecuária. Apresentar tal alegação no presente momento constitui manobra conhecida como “nulidade de algibeira”, segundo a qual a parte propositalmente aguarda decisão desfavorável para alegar uma nulidade que já conhecia de antemão (REsp 1372802, 3ª Turma do STJ).

 

6. Inicialmente, afasto a alegação de cerceamento de defesa, uma vez que em suas manifestações sobre o laudo pericial a parte não apontou qualquer vício no documento técnico (arquivo 213).

 

7. Cabe esclarecer que com o advento do formulário PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), disciplinado desde a IN nº. 90-INSS/DC, de 16/06/1993, que foi revogada pela IN nº. 95-INSS/DC, de 07/10/2003, que por sua vez cedeu vigência à IN nº. 118-INSS/DC, de 14/04/2005 não mais se exigiu a apresentação junto ao INSS do Laudo Técnico concernente às atividades nocivas à saúde dos trabalhadores para comprovação de tempo especial, muito embora este não tenha sido abolido pela legislação e deva ser apresentado pelas empresas quando assim determinar a autoridade pública da Previdência Social.

 

8. A propósito dos períodos sujeitos a condições especiais, o § 3º do art. 57 da Lei nº 8.213, em sua redação original, dispunha: “O tempo de serviço exercido alternativamente em atividade comum e em atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, para e feito de qualquer benefício”. E o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 611, de 21.7.1992, esclarecia: “Art. 292. Para efeito de concessão das aposentadorias especiais serão considerados os Anexos I e II do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, até que seja promulgada a lei que disporá sobre as atividades prejudiciais à saúde e à integridade física”.

 

9. A Lei 9.032, de 28/4/1995, deu nova redação ao dispositivo, nesses termos: “A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Nacional-INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado”. E acrescentou a norma do § 4º: ”O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício”.

 

10. Assim, a Lei 9.032/95 passou a exigir a comprovação da exposição a agentes nocivos. Todavia, tal comprovação é de ser exigida apenas para os períodos posteriores a 28/04/1995, data da publicação da referida lei. Até aquela data, basta a comprovação do exercício da atividade considerada especial pela legislação. Nesse sentido: “Até o advento da Lei 9.032/95, em 29-04-95, era possível o reconhecimento do tempo de serviço especial, com base na categoria profissional do trabalhador. A partir desta norma, a comprovação da atividade especial é feita por intermédio dos formulários SB-40 e DSS-8030, até a edição do Decreto 2.172 de 05-03-97, que regulamentou a MP 1523/96 (convertido na Lei nº 9.528/97), que passou a exigir o laudo técnico (STJ, AGRESP 493.458-RS, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 23/6/2003)”.

 

11. Conforme entendimento firmado recentemente pela TNU (Tema 174), “a partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01 da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, vedada a medição pontual, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada e a respectiva norma”.

 

11.1. Em complementação, definiu-se que “em caso de omissão ou dúvida quanto à indicação da metodologia empregada para aferição da exposição nociva ao agente ruído, o PPP não deve ser admitido como prova da especialidade, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na medição, bem como a respectiva norma”.

 

12. Há possibilidade de conversão do tempo de serviço a qualquer momento, conforme Súmula 50 da TNU, vazada nos seguintes termos: “é possível a conversão do tempo de serviço especial em comum do trabalho prestado em qualquer período”.

 

13. A TNU tem admitido a chamada “conversão inversa”, de tempo especial em comum, para vínculos laboratícios ocorridos entre 1/1/1981 e 28/4/1995, porém apenas para casos com requerimento administrativo anterior à promulgação da Lei 9.032/1995.

 

14. Os períodos de tempo especial suscetíveis de conversão para comum são regulados, nos termos da IN/INSS 78, de 16/07/2002 e IN nº. 118-INSS/DC, de 14/04/2005 (data a partir da qual não mais se exigiu a apresentação junto ao INSS do Laudo Técnico, mas apenas PPP), a saber:

1) até 28/04/1995 - Decreto nº 53.831/64, anexos I e II do RBPS aprovado pelo Decreto nº 83.080/79, dispensada apresentação de Laudo Técnico, exceto para ruído (nível de pressão sonora elevada = acima de 80 decibéis);

2) de 29/04/1995 a 05/03/1997 - anexo I do Decreto nº 83.080/79 e código “1.0.0” do anexo ao Decreto nº 53.831/64, com apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando for ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 80 decibéis);

3) de 06/03/1997 a 18/11/2003 - anexo IV do Decreto nº 2.172/97, substituído pelo Decreto nº 3.048/99, exigida apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 90 decibéis).

4) a partir de 19/11/2003 - art. 2º do Decreto nº 4.882 de 18/11/2003, exigida a apresentação de Laudo Técnico em qualquer hipótese (quando ruído: nível de pressão sonora elevado = acima de 85 decibéis).

 

15. O uso de EPI, ainda que amenize ou mesmo elimine a insalubridade no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado, consoante expresso na Súmula 9 da TNU, in verbis: “o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado”.

 

15.1. O Colendo STF, em repercussão geral reconhecida recentemente sobre o assunto (ARE 664335/SC), decidiu no mesmo sentido.

 

15.2. Cabe observar que o uso de EPI eficaz apenas tem o condão de afastar a exposição a agentes nocivos a partir de 3/12/1998, data da publicação da MP 1.729, posteriormente convertida na Lei 9.732/1998.

 

16. Acerca do reconhecimento de período de labor rural como atividade especial, no julgamento do PUIL 452 a jurisprudência do STJ uniformizou o entendimento de que o Decreto 53.831/1964, no seu item 2.2.1, considera como insalubres somente os serviços profissionais desempenhados na agropecuária, não se enquadrando como tal a atividade exercida apenas na lavoura. Ou seja, para o reconhecimento de atividade rural como especial, faz-se necessária a comprovação da exposição a agentes nocivos.

 

16.1. Na demanda em análise, houve a elaboração de perícia judicial, uma vez que a parte comprovou ter devidamente diligenciado com seus empregadores para a obtenção dos perfis profissiográficos previdenciários referentes aos seus vínculos empregatícios, porém não obteve sucesso. O documento, juntado aos autos em 24/5/2016, informa que nos períodos em que a parte exerceu atividade rural nas funções de corte de cana, tratorista e motorista, quais sejam, de 2/5/1974 a 30/10/1974, 04/11/1974 a 15/04/1975, 05/05/1975 a 31/10/1975, 03/11/1975 a 15/04/1976, 05/05/1976 a 30/11/1976, 01/12/1976 a 31/03/1977, 18/04/1977 a 30/11/1977, 16/05/1980 a 31/10/1980 e 03/11/1980 a 31/03/1981, não reconhecidos em sentença, a parte esteve exposta a ruído em intensidade superior ao nível de tolerância da época (80 decibéis).

 

16.2. Os períodos de 01/11/1997 a 28/10/98, 12/06/1999 a 16/01/2001 e 02/04/2001 a 03/12/2003 também foram objeto de perícia técnica judicial, juntada aos autos em 22/5/2019. A parte também comprovou ter diligenciado junto às empresas para a obtenção da documentação. Segundo o perito, em referidos vínculos, nos quais exerceu a função de motorista, a parte esteve exposta a ruído de 90,5 decibéis, medido por nível de exposição normalizada (NEN), em conformidade com o Anexo 1 da NR 15.

 

16.3. Com efeito, os períodos mencionados nos dois itens acima devem ser reconhecidos como especiais.

 

17. Nos termos do laudo contábil juntado aos autos em 15/9/2021, com o reconhecimento como especiais e a conversão de tais períodos em tempo comum, a parte preenche os requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desde o dia 25/8/2011, mediante reafirmação da DER.

 

16. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte autora, para reconhecer como especiais os períodos de 2/5/1974 a 30/10/1974, 04/11/1974 a 15/04/1975, 05/05/1975 a 31/10/1975, 03/11/1975 a 15/04/1976, 05/05/1976 a 30/11/1976, 01/12/1976 a 31/03/1977, 18/04/1977 a 30/11/1977, 16/05/1980 a 31/10/1980, 03/11/1980 a 31/03/1981, 01/11/1997 a 28/10/98, 12/06/1999 a 16/01/2001 e 02/04/2001 a 03/12/2003, e conceder-lhe aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER reafirmada (25/8/2011).

 

17. Ressalvado meu entendimento pessoal, prevaleceu nesta Turma que o valor da causa, para fins de definição da competência dos Juizados Especiais Federais, deve corresponder, na data do ajuizamento da demanda, à soma das parcelas vencidas e das doze parcelas vincendas, devendo ser facultada à parte autora a possibilidade de renúncia ao excedente. 

 

18. A elaboração dos cálculos ficará a cargo de quem o Juízo de origem determinar segundo a legislação vigente à época da execução e os valores devidos a título de atrasados deverão ser pagos, após o trânsito em julgado, descontados os valores pagos administrativamente e observado o lustro prescricional do artigo 103, parágrafo único da Lei 8.213/1991.

 

18.1. Desde logo consigno que não há qualquer ilegalidade na eventual determinação de elaboração dos cálculos pelo réu. Isto porque, em se tratando de obrigação de fazer, a aferição do quantum devido pela autarquia ré em nada influenciará na prestação jurisdicional que ora decide o mérito desta demanda. Por outro lado, não se pode ignorar o dado da realidade de que o Instituto Previdenciário possui aparelhamento e recursos técnicos muito mais adequados à realização dos cálculos necessários ao cumprimento desta condenação judicial, tendo em vista sua atribuição ordinária de proceder à manutenção de todos os benefícios previdenciários e assistenciais e respectivos banco de dados, disponíveis no sistema informatizado, bem como aplicar as revisões e reajustamentos devidos. A realização dos cálculos pelo setor responsável do Poder Judiciário, compreensivelmente mais reduzido, certamente comprometeria a celeridade da prestação jurisdicional, além de implicar dispêndio muito maior de recursos humanos e econômicos.

 

19. Com relação à atualização monetária e juros de mora, devem ser aplicados os critérios regulados no vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal (Resolução 658/2020 do CJF), cujos critérios estão de acordo com o julgamento do STF no RE 870947.

 

20. Por fim, é certo que o acórdão que contenha os parâmetros para a elaboração dos cálculos de liquidação atende ao disposto no artigo 38, parágrafo único, da Lei 9.099/1995, nos termos do Enunciado 32, do FONAJEF e da Súmula 318, do Superior Tribunal de Justiça.

 

21. Antecipada a tutela para implementação imediata do benefício haja vista preenchidos os requisitos da verossimilhança das alegações conforme acima afirmado, bem como o risco de dano em virtude do caráter alimentar da verba.

 

21.1. Oficie-se, com urgência, ao INSS para cumprimento da presente decisão, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, implantando o benefício objeto desta demanda.

 

21.2. Caso ocorra descumprimento injustificado, caberá ao Juízo da execução fixar as medidas que entenda cabíveis.

 

22. No que toca aos honorários de advogado, como a Lei 9.099/1995 é norma especial (que derroga a norma geral do CPC/2015, segundo o princípio lex specialis derogat generali), deixo de condenar quaisquer das partes a esse título, com fulcro no artigo 55 da Lei em comento c/c artigo 1° da Lei 10.259/2001, em face de não haver recorrente integralmente vencido.

 

É como voto.

 

São Paulo, 8 de junho de 2022 (data do julgamento).

 

JUIZ FEDERAL RELATOR

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OCORRÊNCIA DE ERRO MATERIAL. NOVO JULGAMENTO. EMBARGOS DA PARTE AUTORA ACOLHIDOS. VÍCIO SANADO. EFEITOS INFRINGENTES. RECONHECIMENTO DE TEMPO ADICIONAL DE ATIVIDADE ESPECIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, acolheu os embargos de declaração da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.