REVISÃO CRIMINAL (428) Nº 5015270-90.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO
REQUERENTE: HUANG WEIQIN, WU YANJIAN
Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520
Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520
REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
REVISÃO CRIMINAL (428) Nº 5015270-90.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO REQUERENTE: HUANG WEIQIN, WU YANJIAN Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520 REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de revisão criminal ajuizada por HUANG WEIQIN e WU YANJIAN em face do acórdão proferido pela Quinta Turma deste Tribunal (ID 89111645, pp. 5/20, ID 89111647, pp. 1/16 e ID 89111648, pp. 1/2), nos autos nº 0001691-51.2014.4.03.6107/SP, que, por maioria, deu parcial provimento à apelação da defesa para reduzir a pena definitiva de cada réu para 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, e substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, pela prática do crime previsto no art. 149, caput, do Código Penal. Foram opostos embargos infringentes em face do acórdão não unânime e a Quarta Seção deste Tribunal, por maioria, negou-lhes provimento (ID 89111650, pp. 12/23, ID 89111651, pp. 1/12, ID 89111652, pp. 1/13 e ID 89111654, pp. 1/3). O acórdão transitou em julgado em 07.08.2018 (ID 89111657, p. 11). A defesa dos requerentes (ID 70107514) fundamenta o pedido revisional no art. 621, I, do Código de Processo Penal. Sustenta que não ficou comprovado o dolo dos requerentes em submeter a empregada Huang Huiqing (“Tim”) a condições degradantes de trabalho, pois eles próprios estavam sujeitos a situação equivalente de moradia precária. Argumenta que a suposta vítima confirmou que recebia salário de R$ 1.000,00 (mil reais), o que não pode ser considerado irrisório, e que suas declarações em juízo não foram consideradas como prova de inocência dos requerentes. Em razão disso, a defesa pede a procedência do pedido para que, em revisão, os requerentes sejam absolvidos das imputações, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, requer a desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 203, caput, do Código Penal, fixando-se a pena no mínimo legal ou, caso mantida a condenação pelo art. 149, caput, que a pena seja reduzida para o mínimo legal. A Procuradoria Regional da República opinou pelo não conhecimento da revisão e, caso conhecida, pela sua improcedência (ID 89851071). Ao examinar os autos para elaboração de relatório e voto, verifiquei ter participado do julgamento dos embargos infringentes opostos pelos ora requerentes. Em razão disso, declarei-me impedido para atuar como relator da revisão criminal, nos termos do art. 625, caput, do Código de Processo Penal, e do art. 223, caput, do Regimento Interno (ID 122287907). Considerando que todos os Desembargadores Federais integrantes da Quarta Seção também se declararam impedidos para relatar esta revisão criminal, por terem participado ou do julgamento da apelação, ou dos embargos infringentes, a UFOR submeteu a questão à Vice-Presidência do Tribunal (ID 201562907). Tendo em vista a possibilidade de aplicação do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça aos casos omissos do Regimento Interno deste Tribunal e levando em consideração a jurisprudência do STJ, foi determinada a redistribuição do feito a um dos integrantes da Quarta Seção, com exclusão dos relatores da apelação criminal e dos embargos infringentes (ID 237385076). Em razão dessa decisão, o feito foi redistribuído à minha relatoria. É o relatório. À revisão.
Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520
REVISÃO CRIMINAL (428) Nº 5015270-90.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO REQUERENTE: HUANG WEIQIN, WU YANJIAN Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520 REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): A revisão criminal é ação de natureza constitutiva que tem por escopo rescindir coisa julgada em matéria criminal, nas estritas hipóteses elencadas no art. 621 do Código de Processo Penal (CPP): i) sentença condenatória contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; ii) sentença condenatória fundamentada em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; iii) descoberta de novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena, após a sentença. Não é recurso para reexame de provas ou manifestação de inconformismo quanto à condenação. A subsunção ou não da situação dos autos às hipóteses previstas no art. 621 do Código de Processo Penal não representa condição preliminar para o conhecimento da revisão, mas seu mérito. Sobre isso, esta Seção já firmou posicionamento: PROCESSUAL PENAL. PENAL. REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE ENTORPCENTES. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO TRANSNACIONAL DE ENTORPECENTES. PEDIDO DE REVISÃO CRIMINAL INTEGRALMENTE CONHECIDO. (...) 1- Revisão criminal que se conhece integralmente, a despeito do pedido formulado pela Procuradoria Regional da República em seu parecer. Ainda que o cabimento do pedido de revisão criminal se dê apenas nas hipóteses taxativamente elencadas no artigo 621, incisos I, II, e III, do Código de Processo Penal, a efetiva ocorrência de cada uma dessas hipóteses implica, necessariamente, o exame do mérito do pedido revisional. Precedentes. (TRF3, Quarta Seção, RvC 987/MS, Proc. nº 0014436-85.2013.4.03.0000, v.u., Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 19.03.2015, DJe 27.03.2015) No mesmo sentido: RvC 0008805-63.2013.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Nino Toldo, j. 16.04.2015, DJe 24.04.2015; RvC 0004069-56.2014.4.03.6114, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 19.02.2015, DJe 25.02.2015; RvC 0012560-95.2013.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Cecília Mello, j. 18.12.2014, DJe 30.01.2015; e RvC 0022750-83.2014.4.03.0000, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, j. 18.12.2014, DJe 27.01.2015. Dito isso, conheço da revisão criminal e passo ao exame do pedido revisional. Os requerentes baseiam seu pedido no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal (sentença condenatória contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos), ao argumento de que a condenação é manifestamente contrária à prova oral produzida na instrução, que evidenciou a insuficiência de prova de autoria e a inexistência de dolo. A despeito dessa argumentação, não há base para a revisão do conjunto probatório que fundamentou a sentença condenatória e o acórdão que a manteve, os quais não são contrários ao texto expresso da lei ou à prova dos autos. Com relação às provas de autoria e do dolo, observa-se que a prova pericial e a testemunhal são suficiente para mostrar que HUANG WEIQIN (“Mário”) e WU YANJIAN (“Ana”), na qualidade de proprietários da loja em que a empregada Huang Huiqing (“Tim”) trabalhava e morava, submeteram-na a condição análoga à de escravo, pagando-lhe valor irrisório a título de salário e oferecendo-lhe, como moradia, os fundos da loja, local onde as condições de alojamento e higiene eram insalubres e degradantes. Os depoimentos da agente da Polícia Federal que cumpriu o mandado de busca domiciliar na loja dos acusados, do intérprete da vítima e das demais funcionárias do estabelecimento comercial foram coerentes e harmônicos quanto aos fatos, confirmando que as condições de moradia de Huang (“Tim”) nos fundos da loja dos requerentes eram péssimas; que ela não tinha registro em CTPS; que os acusados mantinham seu passaporte retido e que não havia qualquer comprovante de pagamento da quantia de R$ 1.000,00 (mil reais) a título de salário, o que configura a prática do crime previsto no art. 149, caput, do Código Penal. Nesse sentido, destaco o seguinte trechos do voto condutor do acórdão (ID 89111647, pp. 13/14): Concordo com o E. Relator que não há provas suficientes nos autos de que havia restrição à liberdade de locomoção da vítima Tim, ela, inclusive, tinha liberdade de se comunicar com o mundo exterior por meios eletrônicos como celular e internet, e a própria Tim afirmou que não era restringida sua liberdade de ir e vir, e quanto ao seu passaporte retido pelos patrões, afirmou que pediu a eles que o guardassem, pois tinha medo de perdê-lo (mídia à fl. 285). Entretanto, o tipo penal do art. 149 do Código Penal não depende para sua configuração de que haja restrição à liberdade de locomoção do trabalhador. O laudo pericial do local em que a vítima Tim residia concluiu que ela vivia em ambiente sem condições mínimas de salubridade e higiene, ou seja, em condições degradantes e indignas ao ser humano, sendo encontrado no local um rato morto próximo aos sanitários, e os fundos do imóvel em que Tim morava e se recolhia à noite após um dia exaustivo de trabalho servia como seu dormitório, depósito de mercadorias e alimentos, e havia utensílios de cozinha no chão, sendo que dormia em um colchonete sem lençóis em péssimas condições de conservação sobre um pedaço de papelão no chão, bem como não havia no depósito em que dormia qualquer abertura para ventilação, exposta a um calor insuportável porque não existe forração e o telhado é constituído de folha de zinco. Além disso, não havia no local nenhuma cama, armário, cadeira, mesa ou eletrodomésticos para utilização durante descanso ou refeições. E o sanitário mais próximo está localizado no pavimento inferior, fora da área de depósito (laudo às fls. 213/224 e fotos de fls. 218/221). Todos os funcionários da loja tinham registro em carteira de trabalho, sendo a vítima Tim a única que não possuía registro na carteira de trabalho. Os réus alegaram que não a registraram por ela ser chinesa, o que dificultava a retirada de documentos (mídia à fl. 278). Ora, como bem ponderado pela Procuradoria Regional da República em seu parecer à fl. 455, os réus também são chineses e possuem situação regular no Brasil, tendo conhecimento suficiente para a regularização da situação de Tim em território nacional. Os réus afirmaram que pagavam à vítima o salário de R$ 1.000,00 (mil reais), sendo que Ana afirmou que era entregue a Tim somente R$ 200,00 (duzentos reais), e guardavam o restante no banco, a pedido da funcionária, para depois ela enviar a quantia acumulada aos pais dela para pagar uma dívida. Porém, não há nenhuma prova nos autos desses pagamentos, nem declinaram a suposta conta bancária em que depositavam mensalmente os restantes R$ 800,00 (oitocentos reais), referente ao salário da funcionária. Não sendo crível que os acusados não tivessem nenhum controle da quantia devida à funcionária, tampouco souberam informar quanto era enviado à China aos pais de Tim quando essa solicitava. As demais funcionárias da loja, ouvidas em juízo, foram unânimes em afirmar que nunca viram Tim receber o salário (mídia à fl. 278). Registro que eventual consentimento da vítima às péssimas condições de moradia a que era submetida ou o fato de estarem os requerentes sujeitos às mesmas condições não afastam a figura típica nem o dolo, pois a dignidade humana é indisponível e a vítima vivia em situação de vulnerabilidade social. A jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica no sentido de que a configuração do crime de redução a condição análoga à de escravo prescinde de restrição direta à liberdade de locomoção do trabalhador. Nesse sentido: RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. ART. 149 DO CÓDIGO PENAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. RESTRIÇÃO À LIBERDADE DO TRABALHADOR NÃO É CONDIÇÃO ÚNICA DE SUBSUNÇÃO TÍPICA. TRATAMENTO SUBUMANO AO TRABALHADOR. CONDIÇÕES DEGRADANTES DE TRABALHO. FATO TÍPICO. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA QUE SE IMPÕE. 1. O artigo 149 do Código Penal dispõe que configura crime a conduta de "reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto". 2. O crime de redução a condição análoga à de escravo pode ocorrer independentemente da restrição à liberdade de locomoção do trabalhador, uma vez que esta é apenas uma das formas de cometimento do delito, mas não é a única. O referido tipo penal prevê outras condutas que podem ofender o bem juridicamente tutelado, isto é, a liberdade de o indivíduo ir, vir e se autodeterminar, dentre elas submeter o sujeito passivo do delito a condições degradantes de trabalho. Precedentes do STJ e STF. 3. A peça ministerial, baseada em Relatório do Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do Trabalho - operação conjunta realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal -, descreve detalhadamente conduta que, em tese, se amolda, ao crime de redução a condição análoga à de escravo e é possível de ser imputada ao acusado. De igual forma, há um termo de Ajustamento de Conduta e depoimentos testemunhais. Nesta fase, não se exige prova cabal dos fatos delitivos, sendo suficientes para a deflagração da persecutio criminis os elementos aqui constantes. 4. A revaloração das premissas fáticas adotadas pelo próprio acórdão impugnado imputa um provável cenário desumano e degradante de trabalho e possível conduta abusiva por parte do recorrido (alojamentos precários, ausência de instalações sanitárias; não fornecimento de equipamento de proteção individual; falta de local adequado para refeições; falta de água potável, jornada de trabalho exaustiva, sistema de servidão por dívidas, retenção de salários, contratação de adolescente, etc.), descrevendo situação apta, em princípio, ao enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal. Precedentes do STF e do STJ. 5. Recurso especial provido, para, afastada a atipicidade da conduta, receber a denúncia e determinar o prosseguimento da ação penal intentada. (STJ, REsp, 1.223.781/MA, Quinta Turma, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 23.08.2016, DJe 29.08.2016) Para a configuração desse crime, a restrição à liberdade de locomoção do trabalhador não é imprescindível e não há necessidade de demonstração de ocorrência de violência física. Reduzir alguém à condição similar à de escravo significa impor determinadas circunstâncias de trabalho taxativamente descritas no tipo penal, que consistem em (i) submeter alguém a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva; (ii) sujeitá-lo a condições degradantes de trabalho ou (iii) restringir sua liberdade de locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. São situações alternativas, não cumulativas. Quanto à alegação de que HUANG e WU pagavam R$ 1.000,00 (mil reais) para "Tim", a título de salário, sendo que guardavam a maior parte dessa quantia a pedido da própria funcionária, para remessa ao seu país de origem, os requerentes não comprovaram tais alegações. A propósito, transcrevo a seguinte passagem do voto proferido nos embargos infringentes (ID 89111652, p. 8): Nem se alegue que o pagamento em tal patamar se deu em decorrência de pleito formulado pela própria vítima, para que o restante do seu salário (que, segundo o alegado pelos acusados, totalizava R$ 1.000,00 – um mil reais) fosse enviado aos seus pais na China. Ressalto inexistir nos autos qualquer elemento probatório que demonstre o depósito dos restantes R$ 800,00 (oitocentos reais) ou R$ 900,00 (novecentos reais) em conta bancária, tampouco que tais valores foram enviados à China aos pais de Tim por qualquer outro meio. Frise-se que, caso os depósitos ocorressem regularmente (como alegam os réus), não seria dificultoso à defesa comprovar a existência de, pelo menos, uma dessas supostas transações. No entanto, nada nesse sentido foi trazido aos autos. Ao contrário, o que existem são afirmações controversas prestadas pelos réus e pela própria vítima que, ao que tudo indica, em seu depoimento judicial buscou proteger os antigos empregadores. Diante do exposto, o conjunto probatório era mais do que suficiente para a condenação dos requerentes pela prática do crime de redução a condição análoga à de escravo, de modo que eles não foram condenados contra a evidência dos autos. O pedido de revisão do julgado para desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 203 do Código Penal também não procede, pois configurou-se a sujeição da vítima a condições desumanas e degradantes de trabalho, o que é bem mais grave e não se confunde com a conduta de frustrar direito trabalhista, mediante fraude ou violência. Por fim, também não há fundamento para a revisão das penas aplicadas. Os critérios utilizados na sentença condenatória (e reexaminados pelo acórdão) para a fixação da pena-base encontram respaldo no art. 59 do Código Penal e na jurisprudência, não cabendo revisão para a sua redução ao mínimo legal. Na verdade, o que se constata da leitura da petição inicial é um inconformismo quanto à condenação e a dosimetria da pena, pretendendo os requerentes fazer do pedido revisional uma forma inadequada de recurso para obter um novo julgamento, porém com os mesmos elementos probatórios lá contidos e devidamente examinados pela Turma. Posto isso, JULGO IMPROCEDENTE o pedido. É o voto.
Advogado do(a) REQUERENTE: FELIPE QUEIROZ GOMES - SP392520
E M E N T A
PENAL. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. CONTRARIEDADE AO TEXTO DA LEI OU À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. REEXAME DAS PROVAS QUE EMBASARAM A CONDENAÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. PEDIDO IMPROCEDENTE.
1. A subsunção ou não da situação dos autos às hipóteses previstas no art. 621 do Código de Processo Penal não representa condição preliminar para o conhecimento da revisão, mas seu mérito. Revisão criminal conhecida.
2. Não há base para a revisão do conjunto probatório que fundamentou a sentença condenatória e o acórdão que a manteve, os quais não são contrários ao texto expresso da lei ou à prova dos autos.
3. A jurisprudência dos tribunais superiores é pacífica no sentido de que a configuração do crime de redução a condição análoga à de escravo prescinde de restrição direta à liberdade de locomoção do trabalhador. Para a configuração desse crime, a restrição à liberdade de locomoção do trabalhador não é imprescindível e não há necessidade de demonstração de ocorrência de violência física.
4. Reduzir alguém à condição similar à de escravo significa impor determinadas circunstâncias de trabalho taxativamente descritas no tipo penal, que consistem em (i) submeter alguém a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva; (ii) sujeitá-lo a condições degradantes de trabalho ou (iii) restringir sua liberdade de locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. São situações alternativas, não cumulativas.
5. O pedido de revisão do julgado para desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 203 do Código Penal também não procede, pois configurou-se a sujeição da vítima a condições desumanas e degradantes de trabalho, o que é bem mais grave e não se confunde com a conduta de frustrar direito trabalhista, mediante fraude ou violência.
6. Os critérios utilizados na sentença condenatória (e reexaminados pelo acórdão) para a fixação da pena-base encontram respaldo no art. 59 do Código Penal e na jurisprudência, não cabendo revisão para a sua redução ao mínimo legal.
7. O que se constata da leitura da petição inicial é um inconformismo quanto à condenação e a dosimetria da pena, pretendendo os requerentes fazer do pedido revisional uma forma inadequada de recurso para obter um novo julgamento, porém com os mesmos elementos probatórios lá contidos e devidamente examinados pela Turma.
8. Revisão criminal julgada improcedente.