APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013232-07.2020.4.03.6100
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: INTERBELLE COMERCIO DE PRODUTOS DE BELEZA LTDA
Advogado do(a) APELANTE: CARLOS ALBERTO HAUER DE OLIVEIRA - PR21295-A
APELADO: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA
Advogados do(a) APELADO: IVO CAPELLO JUNIOR - SP152055-A, RENATA MOURA SOARES DE AZEVEDO - SP164338-A
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013232-07.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: INTERBELLE COMERCIO DE PRODUTOS DE BELEZA LTDA Advogado do(a) APELANTE: CARLOS ALBERTO HAUER DE OLIVEIRA - PR21295-A Advogados do(a) APELADO: IVO CAPELLO JUNIOR - SP152055-A, RENATA MOURA SOARES DE AZEVEDO - SP164338-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação à sentença de improcedência de ação ajuizada para garantir “direito de gozar de todos benefícios concedidos no Ofício Circular nº SBSP-OFC-2020/00012, no Ofício Circular nº SEDE-OFC-2020/00196, no Ofício Circular nº SEDE-OFC-2020/00029, e no Ofício Circular nº SEDE-OFC-2020/00038, incluindo os descontos e diferimentos de prazos de pagamento das parcelas vencidas nos meses de abril, maio, junho, julho e agosto/20, bem como de gozar de outros benefícios que venham a ser futuramente concedidos aos demais concessionários para atenuar os efeitos da pandemia de COVID-19”, fixada verba honorária de 10% do valor da causa. Alegou-se que: (1) firmou com a INFRAERO contrato de concessão de uso de área do Aeroporto de Congonhas, no período de 01/06/2016 a 31/05/2021, sendo sensivelmente afetada pela pandemia de Covid-19; (2) houve desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, reconhecido pela própria empresa estatal, que expediu o Ofício Circular SBSP-OFC-2020/00012, e outros sucessivamente editados, que diferiram pagamento de boletos vencidos a partir de abril/2020, concedeu descontos e outros diferimentos quanto a competências posteriores; (3) o equilíbrio econômico-financeiro não pode ser obstado por perda de prazo para entrega de documentos e, mesmo que fosse, ocorreu apenas em relação ao mês de abril, impedindo a perenização da negativa dos descontos em relação aos meses posteriores; (4) a sentença é nula, por cerceamento na produção da prova pericial para comprovação da inexistência de inadimplência da apelante; (5) o equilíbrio econômico-financeiro é garantia constitucional, conforme artigo 37, XXI, da CF/1988, sendo ainda previsto na legislação infraconstitucional (artigos 57, § 1°, 58, § 2º, 65, inciso II, alínea "d", da Lei 8.666/1993; e (6) não se encontra inadimplente, pois o “valor que estaria em aberto já foi pago e sequer era exigível, pois teve vencimento adiado pela própria INFRAERO para novembro/2020”. Houve contrarrazões. Foi deferida tutela de urgência para o depósito judicial do valor integral em cobrança para suspender a exigibilidade do crédito, obstar inscrição em cadastro de inadimplentes e execução da garantia atrelada ao contrato administrativo. É o relatório.
APELADO: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013232-07.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: INTERBELLE COMERCIO DE PRODUTOS DE BELEZA LTDA Advogado do(a) APELANTE: CARLOS ALBERTO HAUER DE OLIVEIRA - PR21295-A Advogados do(a) APELADO: IVO CAPELLO JUNIOR - SP152055-A, RENATA MOURA SOARES DE AZEVEDO - SP164338-A V O T O Senhores Desembargadores, inexistente nulidade no julgamento, por cerceamento de defesa no indeferimento de prova pericial, pois motivada a decisão judicial, à luz do artigo 5º, LIV e LV, da CF, cabendo ao Juízo avaliar tanto a utilidade como a pertinência da diligência para a solução do caso concreto, nos termos do artigo 464, §1º, CPC. A discussão dos autos é meramente de direito com exame de documentos juntados pelas partes, suficientes à solução da espécie. Rejeita-se a preliminar. No mérito, verifica-se que a INFRAERO expediu ofícios circulares sucessivos com objetivo de minimizar as consequências dos severos efeitos econômicos que atingiram o setor aeronáutico, abrangendo concessionárias de espaços comerciais nos aeroportos, caso da apelante. Destarte, expediu-se, de início, o Ofício Circular SBSP-OFC-2020/00012, e depois os Ofícios Circulares SEDE-OFC-2020/00196, SEDEOFC-2020/00029, e SEDE-OFC-2020/00038, veiculando, gradualmente, a cada comunicação, reduções de valores devidos pelas concessionárias. Assim, inicialmente houve diferimento de pagamentos a partir da competência março/2020, com vencimento em abril/2020, bem como redução de 50% no valor da garantia mínima do boleto com vencimento em 10/05/2020 (competência abril), com a prorrogação do vencimento deste para 10/10/2020. Para as competências de maio a julho, houve redução de 50% do valor do boleto, e diferimento do pagamento em 05 meses. As concessionárias interessadas em aderir a tais medidas de mitigação deveriam manifestar interesse, inicialmente, até 30/03/2020, provando estarem adimplentes com as obrigações contratuais (ID 157163543, f. 1). No caso dos autos, porém, conforme documentos juntados, a autora sucessivamente deixou de atender os requisitos para adesão a cada prorrogação de benefício. Com efeito, em primeiro momento, questionada a INFRAERO pela apelante, a entidade assim se manifestou (ID 157163544, f. 2): “Informo que não houve a possibilidade de dar andamento ao processo de aditamento do contrato, para tratativas da competência 05/2020, uma vez que a documentação solicitada não foi encaminhada. O prazo venceu e não temos mais como realizar. Desta forma, neste momento, podemos somente aditar o contrato no que se refere à competência 06/2020, que vencerá em 10/07/2020, desde que essa empresa encaminhe a documentação e não haja pendências financeiras perante a Infraero, até amanhã, pois o prazo para as tratativas é quinta feira, 11/06/2020. Segue o Oficio circular sobre a prorrogação das medidas para o boleto que vencerá em 10/07/2020.” Há, ainda, outros e-mails de semelhante conteúdo, que demonstram que a autora não atentou aos prazos fixados (v.g.: ID 157163544, f. 13). Como se observa, as medidas de mitigação foram adotadas no curso do vencimento das obrigações, negociando-se cada competência e respectivo vencimento, cabendo apenas à autora aderir, em prazo prefixado, mediante comprovação da adimplência quanto às obrigações anteriores. Assim, não se sustenta a assertiva de que, com a perda do prazo inicial, houve negativa de concessão dos benefícios quanto as competências posteriores, visto que, conforme o teor do e-mail acima mencionado, estava em curso o prazo para adesão em relação às competências posteriores, sendo, de qualquer forma, exigida adimplência como condição para adesão. Contudo, a apelante encontrava-se inadimplente, o que gerou descumprimento do requisito específico para adesão ao acordo ofertado pela INFRAERO. A respeito, confira-se o que observou a sentença: “Ocorre que os relatórios de débitos constantes dos ID’s 35792418 e 35792426, bem assim a mensagem eletrônica constante do ID 35792429 comprovam que a autora não detinha a condição de adimplente perante a INFRAERO. Ademais, resta claro que a parte autora não examinou o conteúdo dos ofícios em tempo hábil para aderir às benesses oferecidas, o que se denota da leitura das mensagens eletrônicas trocadas a partir de 16 de abril de 2020 (ID 35792431, fl. 03). Por fim, o ID 35792447, dentre outros, comprovam a existência de pendencias financeiras ainda em junho de 2020.” De fato, a própria apelante (ID 157163550, f. 1), bem como a INFRAERO (ID 157165457, f. 1/2) trouxeram aos autos relatórios em que discriminados valores devidos em atraso pela apelante, o que foi, inclusive, objeto de depósito judicial oferecido pela autora em sede de tutela de urgência. Ademais, nos e-mails trocados entre as partes a INFRAERO reiterou diversas vezes a necessidade de integral adimplência para adesão às medidas de mitigação, tendo a apelante inclusive pedido, à vista da excepcionalidade do período, a dispensa do requisito. Assim, é inequívoco que a empresa conta com débitos em atraso, e não somente o de junho/2020, o qual reputa pago. Quanto os demais argumentos, cumpre observar que, embora o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos, marcado pela teoria da imprevisão (artigo 65, II, “d”, da Lei 8.666/1993; e artigo 85, VI, Lei 13.303/2016 no caso das estatais), seja imponível nas relações com a própria Administração Pública, disto não resulta que possa a parte ser dispensada do cumprimento de regras previstas de forma geral e isonômica, aplicadas a todos as concessionárias, de maneira a criar benefício particularizado, incorrendo em ilegalidade e inconstitucionalidade por tratamento não isonômico. Ademais, verificou-se, na espécie, a adoção pela Administração Pública de medida de adequação, por critério de conveniência e oportunidade, do cumprimento do contrato administrativo, face à circunstância excepcional transcorrida e, portanto, sem que exista ilegalidade ou abuso de poder, não é cabível ao Judiciário substituir-se ao administrador na previsão de requisitos para a gestão de política adotada para enfrentar no âmbito de concessões públicas os efeitos da crise sanitária. Descabe, pois, ao Poder Judiciário determinar, à revelia da competência discricionária do concedente, a suspensão contratual ou alteração da forma de remuneração para índices não previstos expressamente na legislação ou no contrato. Cabe registrar que, a respeito da matéria, tem sido reconhecida pela Turma a razoabilidade das medidas editadas pela INFRAERO, rejeitando, de outro lado, assertivas de que houve omissão, negligência ou inércia do órgão em combater os efeitos econômicos deletérios da pandemia de coronavírus. Neste sentido: AI 5000037-82.2021.4.03.0000, Rel. Des. Fed. ANTONIO CEDENHO, DJEN 19/10/2021: “PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. PANDEMIA DE COVID-19. CONCESSÃO DE USO DE ÁREA EM AEROPORTO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA A SUSPENSÃO DO CONTRATO E MUDANÇA DA FORMA DE REMUNERAÇÃO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE INÉRCIA DA INFRAERO. SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA DE REVISÃO CONTRATUAL. RAZOABILIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Os impactos da pandemia do novo coronavírus sobre a aviação civil e serviços auxiliares – área no aeroporto destinada à exploração comercial – não têm sido negligenciados pela INFRAERO, a ponto de causarem desequilíbrio contratual e justificarem a intervenção do Poder Judiciário. 2. A empresa pública federal, diante da álea econômica extraordinária e extracontratual – emergência sanitária de importância internacional e imposição estatal de quarentena -, tem dado solução administrativa à paralisação dos serviços auxiliares de aviação, prorrogando o vencimento de remunerações devidas pela concessionária por cinco meses e instituindo desconto de 50% nas prestações. 3. Conforme os ofícios circulares, a postergação e o abatimento abrangeram praticamente todas as parcelas do exercício de 2020 e a duração dos contratos já foi prorrogada por quatro meses, em resposta à vigência do estado de calamidade pública. 4. As medidas equivalem, de certa forma, à própria suspensão das concessões de uso de área, porquanto a concessionária não pagará remuneração por cinco meses e obterá um desconto nas próprias prestações que foram prorrogadas. 5. Não se pode dizer, nas circunstâncias, que a INFRAERO tem sido indiferente aos efeitos da calamidade, canalizando todos os prejuízos para as concessionárias, como se houvesse inexecução voluntária de obrigações contratuais. A empresa pública federal ficará desprovida das remunerações pelo período e receberá apenas metade das prestações adiadas, com a assunção de parte dos riscos do negócio. 6. Nessas condições, inexiste omissão do Poder Público na absorção e repartição das consequências de álea econômica extraordinária e extracontratual (artigo 65, II, d, da Lei nº 8.666/1993). A INFRAERO tem dado solução administrativa à concessão de uso de área, tornando descabida e precipitada qualquer intervenção do Poder Judiciário. 7. A INFRAERO tem tomado as decisões de prorrogação e desconto e não descartou a possibilidade de novos atos, caso o panorama não varie, com a restrição de circulação de passageiros. A solução administrativa para a calamidade pública permanece e torna descabida qualquer presunção de que ela será insuficiente, autorizando desde já a intervenção do Poder Judiciário. 8. Ademais, a concessão de uso de área, enquanto contrato administrativo a que se aplicam subsidiariamente as normas civis e comerciais (artigo 54, caput, da Lei nº 8.666/1993), passa a seguir a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que prevê intervenção mínima e excepcionalidade de revisão nas relações contratuais (artigo 421, parágrafo único, do CC). 9. A INFRAERO não tem se omitido na absorção e repartição dos efeitos da calamidade pública; suspendeu o pagamento de remunerações condicionadas pelo fluxo de passageiros e já previu desconto definitivo para as prestações prorrogadas, sem prejuízo de novas medidas conforme o andamento da pandemia. 10. A intervenção do Poder Judiciário, nessas circunstâncias, não seria extraordinária e mínima, mas intrusiva, invalidando a solução administrativa e assumido o status de revisão contratual. 11. A INFRAERO não vem descumprindo a sua parte na concessão de uso, com a ocorrência da exceção do contrato não cumprido; ela ponderou a redução do fluxo de passageiros, que é condicionante do cálculo dos preços devidos pela concessionária, suspendendo o pagamento das prestações e dando desde já o desconto de algumas, sem prejuízo, como já se disse, de novas providências diante da persistência da calamidade pública. 12. A empresa pública federal também tem sofrido queda de receitas, como se pode depreender dos próprios descontos dos preços, das limitações orçamentárias do governo federal e dos ingressos diretamente influenciados pela normalidade da navegação área – tarifas aeroportuárias, dependentes da frequência de embarques, pousos, permanência, armazenagem, capatazia e conexão, nos termos do artigo 3º da Lei nº 6.009/1973. 13. Tampouco se pode verificar um típico contrato comercial, a ser ajustado de forma totalmente isonômica entre as partes. A concessão de uso de área no aeroporto envolve um bem da União (infraestrutura aeroportuária) e segue o regime dos contratos administrativos, sem que configure uma atividade secundária e complementar à da administração de aeroporto (artigos 1º e 2º da Lei nº 6.009/1973). 14. Incidem, assim, as prerrogativas impostas pelo interesse público, especificamente a inviabilidade de suspensão e rescisão do contrato pela mera superveniência de calamidade pública (artigo 78, XIV e XV, da Lei nº 8.666/1993). A única restrição é a garantia de equação econômico-financeira, que, porém, tem sido respeitada pela INFRAERO, mediante prorrogação do vencimento de remunerações devidas e concessão de desconto para as prestações adiadas. 15. Agravo de instrumento parcialmente provido." Como visto, o colegiado reconheceu o momento calamitoso tanto do ponto de vista da concessionária quanto do poder concedente. Contudo, explicitou a razoabilidade das medidas administrativas adotadas pela INFRAERO para absorção de prejuízos financeiros com a finalidade de mitigar consequências extraordinárias que exigiram solução jurídica e econômica apropriada (OFÍCIOS CIRCULARES SBSP-OFC-2020/00012, 2020/00021 e 2020/000196). Portanto, é indeclinável o entendimento de que a INFRAERO encaminhou solução administrativa a ser aplicada no período excepcional, buscando de forma proativa a equação econômica e financeira dos contratos de concessão, com o diferimento prorrogação de prazos de pagamento, bem como concessão de descontos. Assim, não cabe intervenção do Poder Judiciário no sentido de alterar a gestão de tais contratos, uma vez que não verificada ilegalidade ou abuso de poder, não servindo a genérica alusão ao equilíbrio econômico-financeiro como base para atender exclusivamente o interesse da concessionária, em detrimento do interesse público, sem atentar, portanto, para as exigências do consequencialismo judicial, contidas nos artigos 20 e 21 da LINDB, incluído pela Lei 13.655/2018). A sentença é, assim, mantida na integralidade. Em razão da sucumbência recursal, condena-se a apelante em verba honorária pelo decaimento nesta instância, a ser acrescida à originária, no equivalente a 5% do valor atualizado da causa, observados os critérios do grau de zelo profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado e tempo exigido, em conformidade com o artigo 85, § 11, CPC. Ante o exposto, nego provimento à apelação. É como voto.
APELADO: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. NULIDADES INEXISTENTES. INFRAERO. CONCESSÃO DE USO DE ÁREA. MEDIDAS DE ENFRENTAMENTO À COVID-19. DESCUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. RECONHECIMENTO JUDICIAL DA AUSÊNCIA DE OMISSÃO OU INÉRCIA ESTATAL. RAZOABILIDADE DAS MEDIDAS ADOTADAS.
1. Inexistente nulidade no julgamento, por cerceamento de defesa no indeferimento de prova pericial, pois motivada a decisão judicial, à luz do artigo 5º, LIV e LV, da CF, cabendo ao Juízo avaliar a utilidade e pertinência da diligência para a solução do caso concreto, nos termos do artigo 464, §1º, CPC.
2. Consta dos autos que a INFRAERO, poder concedente, expediu ofícios circulares sucessivos, objetivando minimizar as consequências dos severos efeitos econômicos que atingiram o setor aeronáutico, abrangendo concessionárias de espaços comerciais nos aeroportos (Ofício Circular SBSP-OFC-2020/00012, e Ofícios Circulares SEDE-OFC-2020/00196, SEDEOFC-2020/00029, e SEDE-OFC-2020/00038), veiculando, gradualmente, a cada comunicação, reduções de valores devidos pelas concessionárias. Assim, inicialmente houve diferimento de pagamentos a partir da competência março/2020, com vencimento em abril/2020, bem como redução de 50% no valor da garantia mínima do boleto com vencimento em 10/05/2020 (competência abril), com a prorrogação do vencimento deste para 10/10/2020. Para as competências de maio a julho, houve redução de 50% do valor do boleto, e diferimento do pagamento em 05 meses. As concessionárias interessadas deveriam manifestar interesse por tais medidas até 30/03/2020, provando a adimplência do contrato.
3. No caso dos autos, porém, restou comprovado que a autora desatendeu os requisitos de adesão em relação às várias competências em negociação, inclusive as posteriores à inicial, de março/2020.
5. A própria autora, bem como a INFRAERO, trouxeram aos autos relatórios em que discriminados valores devidos e em atraso que foi, inclusive, objeto de depósito judicial oferecido em sede de tutela de urgência. Ademais, nos e-mails trocados entre as partes, a INFRAERO reiterou diversas vezes a necessidade de integral adimplência para adesão às medidas de mitigação, oportunidade em que a autora requereu, à vista da excepcionalidade do período, dispensa do cumprimento de tal requisito, reconhecendo e não regularizando a inadimplência.
6. Embora o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos, marcado pela teoria da imprevisão (artigo 65, II, “d”, da Lei 8.666/1993; e artigo 85, VI, Lei 13.303/2016 no caso das estatais), seja imponível nas relações com a própria Administração Pública, disto não resulta que possa a parte ser dispensada do cumprimento de regras previstas de forma geral e isonômica, aplicadas a todos os concessionários, de maneira a criar benefício particularizado, incorrendo em ilegalidade e inconstitucionalidade por tratamento não isonômico. Descabe, pois, ao Poder Judiciário determinar, à revelia da competência discricionária do concedente, soluções como as de suspensão contratual, alteração da forma de remuneração para índices não previstos expressamente na legislação ou no contrato, ou instituir regra de cumprimento exclusivamente a favor de uma concessionária em detrimento das demais e do próprio interesse público.
7. A propósito, é reconhecida pela Turma a razoabilidade das medidas editadas pela INFRAERO, rejeitando, de outro lado, assertivas de que houve omissão, negligência ou inércia do órgão em combater os efeitos econômicos deletérios da pandemia de coronavírus.
8. Não cabe intervenção do Poder Judiciário no sentido de alterar a gestão de tais contratos, uma vez que não verificada ilegalidade ou abuso de poder, não servindo a genérica alusão ao equilíbrio econômico-financeiro como base para atender exclusivamente o interesse da concessionária, em detrimento do interesse público, sem atentar, portanto, para as exigências do consequencialismo judicial, contidas nos artigos 20 e 21 da LINDB, incluído pela Lei 13.655/2018.
9. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios do artigo 85, §§ 2º a 6º, e 11, do Código de Processo Civil.
10. Apelação desprovida.