APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004978-52.2020.4.03.6130
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: CELOCORTE EMBALAGENS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIA GODEGHESE - SP207830-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM OSASCO//SP
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004978-52.2020.4.03.6130 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: CELOCORTE EMBALAGENS LTDA Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIA GODEGHESE - SP207830-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM OSASCO//SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por CELOCORTE EMBALAGENS LTDA em face de r. sentença que denegou a segurança pleiteada. O mandado de segurança subjacente foi impetrado contra ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL em Osasco/SP, com pedido de liminar inaudita altera parte a fim de assegurar à empresa impetrante o alegado direito líquido e certo de deduzir os créditos relativos a despesas financeiras para fins de apuração da contribuição ao PIS e da COFINS devidos, no sistema da não cumulatividade, conforme estabelecido no art. 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03, sendo ao final concedida a segurança pleiteada e confirmada a liminar requerida, assegurando-se, ainda, a compensação dos valores tidos por indevidamente quitados (quer via recolhimento, quer via compensação) a título dessas contribuições sociais, em virtude da não dedução dos créditos relativos a despesas financeiras, desde o quinquênio anterior à impetração deste mandamus, regularmente corrigidos pela Taxa SELIC ou outro índice que vier a substituí-la, com quaisquer tributos e contribuições administradas pela Receita Federal do Brasil. Atribuído à causa, para fins de alçada, o valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) à data da propositura da ação mandamental (Id 197579360). Sustentou, em síntese, a impetrante, sujeita ao regime de apuração não cumulativo, a ilegalidade e inconstitucionalidade da vedação à dedução de créditos relativos a despesas financeiras. Aduziu ofensa ao princípio constitucional da não cumulatividade, assegurado pelo art. 195, § 2º, da Constituição Federal/88, violando, outrossim, os arts. 1º e 3º, II, das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, art. 110 do CTN, art. 145, §1º da CF/88, art. 27, caput, da Lei nº 10.865/04, arts. 311 e 398 do Decreto nº 9.580/18, art. 11, III, “c” da LC nº 95/98, arts. 14, III, “c” do Decreto nº 9.191/17, e ainda o art. 63, II, “c” do Decreto nº 4.524/02. Aduziu que as despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos tomados de pessoa jurídica amoldam-se ao conceito de insumos por serem essenciais à execução das atividades da empresa impetrante, motivo pelo qual teria direito à tomada de crédito de PIS e COFINS em relação a tais gastos. Alegou, ainda, que a possibilidade de restabelecimento da tributação das receitas financeiras, como no caso do Decreto nº 8.426/2015 somente seria viável com a correspondente restauração do direito ao creditamento das despesas financeiras. Postergada a apreciação do pedido liminar para após a vinda das informações da autoridade coatora. Prestadas as informações pela autoridade impetrada (Id 197579487), pugnando pelo indeferimento do pleito da impetrante. Regularmente intimada, a União Federal (Fazenda Nacional) requereu seu ingresso no feito, nos termos do artigo 7º, inciso II, da Lei nº 12.016/2009 (Id 197579488). Indeferido o pedido de liminar (Id 197579489). Por sua vez, o MM. Juiz de origem julgou improcedente o pedido, com fundamento no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, e denegou a segurança pleiteada. Custas na forma da lei. Sem honorários advocatícios, a teor do disposto no art. 25 da Lei nº 12.016/09 (Id 197579490) Irresignada, a parte impetrante interpôs apelação, pugnando pelo provimento do recurso para que seja reformada integralmente a r. sentença recorrida, sendo-lhe reconhecido o direito de deduzir os créditos relativos às despesas financeiras para fins de apuração da contribuição ao PIS e da COFINS devidos, no sistema da não cumulatividade (arts. 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03), bem como o de compensar os valores indevidamente quitados (via recolhimento ou via compensação) a título de tais contribuições, em virtude da não dedução dos créditos relativos a despesas financeiras, corrigidos pela Taxa SELIC ou outro índice que vier a substituí-la, com quaisquer tributos e contribuições administradas pela Receita Federal do Brasil, observada a prescrição quinquenal, nos termos da exordial (Id 197579500). Com contrarrazões (Id 197579506) da União (Fazenda Nacional), subiram os autos a esta Corte. O Ministério Público Federal, constatando a inexistência de hipótese de intervenção meritória do Parquet, restituiu os autos para regular prosseguimento do feito (Id 199661150). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004978-52.2020.4.03.6130 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: CELOCORTE EMBALAGENS LTDA Advogado do(a) APELANTE: GLAUCIA GODEGHESE - SP207830-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM OSASCO//SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A presente ação mandamental foi ajuizada com o escopo de assegurar à empresa impetrante a dedução de créditos da contribuição ao PIS e da COFINS sobre despesas financeiras, bem como compensar valores supostamente recolhidos indevidamente a título das alegadas contribuições. Como é cediço, o mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88 c/c art. 1º da Lei nº 12.016/2009) destinado à proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública. Inicialmente, cumpre mencionar que a Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social - COFINS, bem como ao Programa de Integração Social - PIS, previstas, respectivamente, nas Leis Complementares nºs 70/91 e 7/70, encontram-se regidas pelos princípios da solidariedade financeira e da universalidade, a teor dos artigos 194 (incisos I, II, V) e 195 da Constituição Federal/88. Por sua vez, a contribuição ao PIS/COFINS no regime não cumulativo foi instituída pelas Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, prevendo hipótese de incidência, base de cálculo e alíquotas. Os referidos diplomas legais estabeleceram a exigibilidade da contribuição ao PIS à alíquota de 1,65% (artigo 2º da Lei nº 10.637/2002) e da COFINS no percentual de 7,6% (artigo 2º da Lei nº 10.833/2003), ambos a incidirem sobre o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica. Com a edição da Lei nº 10.865/2004, sobreveio, em seu artigo 27, § 2º, autorização para o Poder Executivo reduzir, bem como restabelecer aos limites anteriores, as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras obtidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo dessas contribuições. Assim, durante a vigência dos Decretos nºs 5.164/2004 e 5.442/2005, as alíquotas dessas contribuições foram reduzidas a zero. Por seu turno, no dia 1º/4/2015 foi publicado o Decreto nº 8.426, revogando expressamente, a partir de 1º de julho de 2015, o Decreto nº 5.442/2005, e restabelecendo a incidência da contribuição ao PIS e da COFINS sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa às alíquotas de 0,65% para o PIS e 4% para a COFINS. Ao alterar as alíquotas de tais contribuições, o Decreto nº 8.426/2015 não criou nova contribuição e tampouco aumentou a alíquota da exação, mas tão somente restabeleceu, com fulcro na expressa dicção do artigo 27, § 2º, da Lei nº 10.865/2004, a incidência de alíquotas a título de PIS/COFINS sobre receitas financeiras, o que ocorreu nos percentuais de 0,65% (PIS) e 4% (COFINS), patamares inferiores aos originariamente previstos nas Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, não havendo de se cogitar em ilegalidade. Assim, dispôs o art. 27, caput, e §§ 1º e 2º, da Lei nº 10.865/2004, in verbis: Art. 27. O Poder Executivo poderá autorizar o desconto de crédito nos percentuais que estabelecer e para os fins referidos no art. 3º das Leis nºs 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e relativamente às despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos, inclusive pagos ou creditados a residentes ou domiciliados no exterior. § 1º Poderão ser estabelecidos percentuais diferenciados no caso de pagamentos ou créditos a residentes ou domiciliados em país com tributação favorecida ou com sigilo societário. § 2º O Poder Executivo poderá, também, reduzir e restabelecer, até os percentuais de que tratam os incisos I e II do caput do art. 8º desta Lei, as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar” (grifos meus). Ademais, não se extrai do dispositivo legal supramencionado a interpretação normativa no sentido de que só caberia alteração (restabelecimento de alíquotas) se houvesse concomitante previsão de aproveitamento de créditos, mas, sim, que a lei delegou ao Poder Executivo a “faculdade” (...poderá...) tanto para autorizar desconto de crédito quanto para reduzir e restabelecer até os percentuais de que tratam os incisos I e II do caput do art. 8º da Lei nº 10.865/2004, as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar. Insta salientar que o contribuinte tem apenas direito ao creditamento nos limites impostos pela lei, considerando tratar-se de benefício fiscal, sendo plenamente válida a revogação de determinada hipótese de desconto de crédito de acordo com a política tributária adotada à época, desde que chancelada por lei. O fato de a Lei nº 10.865/2004 (art. 37) ter revogado a possibilidade de creditamento e ao mesmo tempo possibilitado ao Executivo reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/COFINS sobre receitas financeiras insere-se na hipótese acima elencada, traduzindo opção política não passível de exame pelo Judiciário, até porque inexistente qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme explanado. Cumpre mencionar que não cabe ao Judiciário atuar como legislador positivo para ampliar ou restringir o alcance da norma legal aplicável para fins de dedução ou creditamento de tributo devido, alterando os critérios preconizados por lei para autorizar benefícios fiscais. Na esteira desse entendimento, trago à colação julgado desta Corte, in verbis: MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. PIS/COFINS. DECRETO 8.426/2015. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. RECEITAS FINANCEIRAS. CREDITAMENTO. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS. 1. Tanto a instituição da alíquota zero quanto o restabelecimento das alíquotas do PIS/COFINS, por meio de decreto, decorreram de autorização prevista no artigo 27, §2°, da Lei 10.865/2004. 2. O PIS/COFINS não cumulativos foram instituídos pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, prevendo hipótese de incidência, base de cálculo e alíquotas, não cabendo alegar ofensa à legalidade ou delegação de competência tributária na alteração da alíquota dentro dos limites legalmente fixados, pois, definidas em decreto por força de autorização legislativa (artigo 27, §2°, da Lei 10.865/2004), acatando os limites previstos nas leis instituidoras dos tributos. 3. Tampouco cabe cogitar de majoração da alíquota do tributo através de ato infralegal, pois não houve alteração para além do que havia sido fixado na Lei 10.637/2002 para o PIS (1,65%) e a prevista na Lei 10.833/2003 para a COFINS (7,6%). Ao contrário, o Decreto 8.426/2015, ao dispor sobre a aplicação de alíquotas de 0,65% e 4% para o PIS e para a COFINS, respectivamente, ainda assim promove a tributação reduzida através da modificação da alíquota, porém, dentro dos limites definidos por lei. Note-se que o artigo 150, I, da CF/88 exige lei para majoração do tributo, nada exigindo para alteração do tributo a patamares inferiores (já que houve autorização legislativa para a redução da alíquota pelo Poder Executivo). 4. Evidencia-se a extrafiscalidade do PIS/COFINS definida a partir da edição da Lei 10.865/2004, que não se revela inconstitucional, mesmo porque não há alteração da alíquota em patamar superior (ao contrário) ao legalmente definido, vale dizer, não há ingerência sobre o núcleo essencial de liberdade do cidadão, intangível sem lei que o estabeleça de forma proporcional. 5. Se houvesse inconstitucionalidade na alteração da alíquota por decreto com obediência aos limites fixados na lei instituidora do tributo e na lei que outorgou tal delegação, a alíquota zero que as apelantes pretendem ver restabelecida, também fixada em decreto, sequer seria aplicável. Tanto o decreto que previu a alíquota zero como aquele que restabeleceu alíquotas, tiveram a mesma base legal, cuja eventual declaração de inconstitucionalidade teria por efeito torná-las inexistentes, determinando a aplicação da alíquota prevista na norma instituidora das contribuições, em percentuais muito superiores aos fixados nos decretos ora combatidos. 6. Nem se alegue direito subjetivo ao creditamento de despesas financeiras, com fundamento na não-cumulatividade, para desconto sobre o valor do tributo devido, cuja previsão estaria ausente no Decreto 8.426 /2015. Tal decreto não instituiu o PIS e a COFINS, tendo o sido pela Lei 10.637/2002 e Lei 10.833/03, que na redação original de seus artigos 3°, V, previam que da contribuição apurada seria possível o desconto de créditos calculados em relação a "despesas financeiras decorrentes de empréstimos, financiamentos e contraprestações de operações de arrendamento mercantil de pessoas jurídicas, exceto de optante pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES". 7. A previsão de creditamento de despesas financeiras foi, contudo, revogada pelo artigo 37 da Lei 10.865/2004, e não pelo decreto, não se mostrando ofensiva ao princípio da não-cumulatividade. Os termos do artigo 195, §12, da CF/88, revelam que a própria Carta Federal outorgou à lei autorização para excluir de determinadas despesas/custos na apuração do PIS e da COFINS, definindo, desta forma, quais despesas serão ou não cumulativas para fins de tributação, não sendo possível, pois, alegar inconstitucionalidade (grifos meus). 8. A alteração pela Lei 10.865/04 do inciso V do artigo 3° da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que deixou de prever a obrigatoriedade de desconto de créditos em relação a despesas financeiras, não excluiu a possibilidade de o Executivo permitir o desconto de tal despesa, como previu o artigo 27. Exatamente pela possibilidade de ser definido o desconto de tais créditos pelo Poder Executivo, através de tais critérios, é que não cabe antever qualquer ilegalidade no Decreto 8.426/2015 que, afastando a alíquota zero, deixou de prever tal desconto. 9. As Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003 instituíram o PIS/COFINS sobre as receitas financeiras definindo como base de cálculo o faturamento mensal, assim entendido o total das receitas auferidas pelas pessoas jurídicas no regime não-cumulativo, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, à alíquota de 1,65% para o PIS e de 7,6% para a COFINS. Portanto, existe autorização constitucional e legal para a incidência do PIS/COFINS sobre as receitas financeiras. 10. Apelação e remessa oficial providas. (ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO / SP 5018385-89.2018.4.03.6100, Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO; Terceira Turma; Data do Julgamento: 06/06/2019; Data da Publicação/Fonte - Intimação via sistema DATA: 11/06/2019). No mesmo sentido, vale citar entendimento do E. STJ no REsp 1810630 / PR, de relatoria do Excelentíssimo Ministro HERMAN BENJAMIN (Segunda Turma; Data do Julgamento: 11/06/2019; Data da Publicação/Fonte: DJe 01/07/2019). Por sua vez, o Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, em julgamento do RE 1.043.313 / RS (Repercussão Geral – Tema 939), em 10/12/2020 (DJE de 25/03/2021), de Relatoria do Min. DIAS TOFFOLI, pacificou o entendimento no tocante ao tema em discussão, fixando, por maioria, a seguinte tese: “é constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”. Confira-se: EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral. Direito Tributário. Princípio da legalidade tributária. Necessidade de análise de cada espécie tributária e de cada caso concreto. Contribuição ao PIS/PASEP e à Cofins. Parágrafo 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04. Possibilidade de o Poder Executivo reduzir e restabelecer alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não-cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar. Presença de função extrafiscal a ser desenvolvida. Não cumulatividade. Revogação de norma que concedia direito a apuração de crédito. Possibilidade. 1. A observância do princípio da legalidade tributária é verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz de cada caso concreto, sendo certo que não existe ampla e irrestrita liberdade para o legislador realizar diálogo com o regulamento no tocante aos aspectos da regra matriz de incidência tributária. 2. Para que a lei autorize o Poder Executivo a reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, é imprescindível que o valor máximo dessas exações e as condições a serem observadas sejam prescritos em lei em sentido estrito, bem como exista em tais tributos função extrafiscal a ser desenvolvida pelo regulamento autorizado. 3. Na espécie, o § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04 permite ao Poder Executivo reduzir e restabelecer, até os percentuais legalmente fixados, as alíquotas da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade dessas contribuições, nas hipóteses que fixar. Além da fixação de tetos, houve, na lei, o estabelecimento das condições para que o Poder Executivo possa alterar essas alíquotas. Ademais, a medida em tela está intimamente conectada à otimização da função extrafiscal presente nas exações em questão. Verifica-se, ainda, que o diálogo entre a lei tributária e o regulamento se dá em termos de subordinação, desenvolvimento e complementariedade. 4. É constitucional a Lei nº 10.865/04 na parte em que, ao dar nova redação ao inciso V do art. 3º das Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03, revogou as normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança das referidas contribuições, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos. A alteração vale para todos aqueles que estão submetidos à sistemática não cumulativa de cobrança da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins. Ademais, tal mudança não desnatura o próprio modelo não cumulativo dessas contribuições. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. 6. Tese proposta para o Tema 939 da sistemática de repercussão geral: “É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”. Por derradeiro, não há previsão expressa, na Lei Maior, determinando a obrigatoriedade de dedução de créditos relativos a todo e qualquer bem ou serviço adquirido e utilizado nas atividades da empresa, de modo que a legislação infraconstitucional pode limitar as hipóteses de creditamento, não havendo de se cogitar em ofensa ao princípio da não cumulatividade. Vale mencionar que o disposto no § 12, do art. 195 da Constituição Federal determina tão-somente que a lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições sociais serão não cumulativas. Portanto, em relação às contribuições sociais, a Constituição Federal não disciplina de forma plena o princípio da não cumulatividade, cabendo à lei ordinária disciplinar a matéria, podendo estabelecer, inclusive, restrições ao sistema de créditos em relação às empresas. Ressalte-se que § 12, do artigo 195 da Constituição Federal, (introduzido pela Emenda Constitucional n° 42/03) não instituiu o regime não-cumulativo de forma generalizada às contribuições sociais previstas nos incisos 1, “b”, e IV, caput, do referido artigo, reservando à legislação ordinária a sua regulamentação. Diferentemente da técnica utilizada no regime de não-cumulatividade do IPI e do ICMS, em que se compensa o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores, a sistemática de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS baseia-se no desconto de créditos calculados sobre “itens”, tal como os previstos no art. 3° das Leis n°s 10.637/02 e 10.833/03: Por seu turno, a Lei 10.865/2004 (art. 37) excluiu a possibilidade de apurar os créditos das mesmas contribuições sobre as despesas financeiras ao dar nova redação ao inciso V do citado preceito legal. Nenhum vício afigura-se em tal procedimento, já que é dado à lei estabelecer as despesas passíveis de gerar créditos, bem como sua forma de apuração, introduzindo novas hipóteses de creditamento ou revogando outras. Consoante orientação firmada em repetitivo no STJ (REsp 1.221.170/PR, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018) e nas circunstâncias delineadas pelo Tribunal de origem, os custos incorridos não se incluem no conceito de insumo. Cumpre ressaltar que o julgamento do REsp nº 1.221.170 assentou entendimento no tocante ao “conceito de insumo” a que se refere o inc. II, do art. 3º, das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, para fins de aferir a possibilidade de creditamento a título de PIS/COFINS, frise-se, em conformidade com os referidos comandos legais, os quais permanecem hígidos. Desse modo, não demonstrada a existência de ilegalidade ou inconstitucionalidade no restabelecimento das alíquotas da contribuição ao PIS/COFINS, a teor do disposto no § 2º, do art. 27 da Lei nº 10.865/2004, bem como revogada a possibilidade de desconto de crédito (PIS/COFINS) sobre despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos, nos termos do art. 37 da Lei nº 10.865/2004, não restou comprovado o alegado direito líquido e certo da ora apelante, não havendo de se cogitar em direito à compensação de valores supostamente recolhidos indevidamente a esse título, sendo de rigor, portanto, a manutenção da r. sentença tal como lançada. Ante o exposto, nego provimento à apelação. É como voto.
EMENTA
MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. PIS. COFINS. DESPESAS FINANCEIRAS. CREDITAMENTO. VEDAÇÃO. DECRETO Nº 8.426/2015. RESTABELECIMENTO DE ALÍQUOTAS. LEGITIMIDADE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO COMPROVADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. A presente ação mandamental foi ajuizada com o escopo de assegurar à empresa impetrante a dedução de créditos da contribuição ao PIS e da COFINS sobre despesas financeiras, bem como compensar valores supostamente recolhidos indevidamente a título das alegadas contribuições.
2. Como é cediço, o mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88 c/c art. 1º da Lei nº 12.016/2009) destinado à proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública.
3. Inicialmente, cumpre mencionar que a Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social - COFINS, bem como ao Programa de Integração Social - PIS, previstas, respectivamente, nas Leis Complementares nºs 70/91 e 7/70, encontram-se regidas pelos princípios da solidariedade financeira e da universalidade, a teor dos artigos 194 (incisos I, II, V) e 195 da Constituição Federal/88. Por sua vez, a contribuição ao PIS/COFINS no regime não cumulativo foi instituída pelas Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, prevendo hipótese de incidência, base de cálculo e alíquotas. Os referidos diplomas legais estabeleceram a exigibilidade da contribuição ao PIS à alíquota de 1,65% (artigo 2º da Lei nº 10.637/2002) e da COFINS no percentual de 7,6% (artigo 2º da Lei nº 10.833/2003), ambos a incidirem sobre o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica.
4. Com a edição da Lei nº 10.865/2004, sobreveio, em seu artigo 27, § 2º, autorização para o Poder Executivo reduzir, bem como restabelecer aos limites anteriores, as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras obtidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo dessas contribuições. Assim, durante a vigência dos Decretos nºs 5.164/2004 e 5.442/2005, as alíquotas dessas contribuições foram reduzidas a zero.
5. Por seu turno, no dia 1º/4/2015 foi publicado o Decreto nº 8.426, revogando expressamente, a partir de 1º de julho de 2015, o Decreto nº 5.442/2005, e restabelecendo a incidência da contribuição ao PIS e da COFINS sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de apuração não cumulativa às alíquotas de 0,65% para o PIS e 4% para a COFINS.
6. Ao alterar as alíquotas de tais contribuições, o Decreto nº 8.426/2015 não criou nova contribuição e tampouco aumentou a alíquota da exação, mas tão somente restabeleceu, com fulcro na expressa dicção do artigo 27, § 2º, da Lei nº 10.865/2004, a incidência de alíquotas a título de PIS/COFINS sobre receitas financeiras, o que ocorreu nos percentuais de 0,65% (PIS) e 4% (COFINS), patamares inferiores aos originariamente previstos nas Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003, não havendo de se cogitar em ilegalidade.
7. Ademais, não se extrai do dispositivo legal supramencionado a interpretação normativa no sentido de que só caberia alteração (restabelecimento de alíquotas) se houvesse concomitante previsão de aproveitamento de créditos, mas, sim, que a lei delegou ao Poder Executivo a “faculdade” (...poderá...) tanto para autorizar desconto de crédito quanto para reduzir e restabelecer até os percentuais de que tratam os incisos I e II do caput do art. 8º da Lei nº 10.865/2004, as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar.
8. Insta salientar que o contribuinte tem apenas direito ao creditamento nos limites impostos pela lei, considerando tratar-se de benefício fiscal, sendo plenamente válida a revogação de determinada hipótese de desconto de crédito de acordo com a política tributária adotada à época, desde que chancelada por lei. O fato de a Lei nº 10.865/2004 (art. 37) ter revogado a possibilidade de creditamento e ao mesmo tempo possibilitado ao Executivo reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/COFINS sobre receitas financeiras insere-se na hipótese acima elencada, traduzindo opção política não passível de exame pelo Judiciário, até porque inexistente qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme explanado.
9. Cumpre mencionar que não cabe ao Judiciário atuar como legislador positivo para ampliar ou restringir o alcance da norma legal aplicável para fins de dedução ou creditamento de tributo devido, alterando os critérios preconizados por lei para autorizar benefícios fiscais.
10. No mesmo sentido, vale citar entendimento do E. STJ no REsp 1810630 / PR, de relatoria do Excelentíssimo Ministro HERMAN BENJAMIN (Segunda Turma; Data do Julgamento: 11/06/2019; Data da Publicação/Fonte: DJe 01/07/2019).
11. Por sua vez, o Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, em julgamento do RE 1.043.313 / RS (Repercussão Geral – Tema 939), em 10/12/2020 (DJE de 25/03/2021), de Relatoria do Min. DIAS TOFFOLI, pacificou o entendimento no tocante ao tema em discussão, fixando, por maioria, a seguinte tese: “é constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”.
12. Por derradeiro, não há previsão expressa, na Lei Maior, determinando a obrigatoriedade de dedução de créditos relativos a todo e qualquer bem ou serviço adquirido e utilizado nas atividades da empresa, de modo que a legislação infraconstitucional pode limitar as hipóteses de creditamento, não havendo de se cogitar em ofensa ao princípio da não cumulatividade.
13. Vale mencionar que o disposto no § 12, do art. 195 da Constituição Federal determina tão-somente que a lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições sociais serão não cumulativas. Portanto, em relação às contribuições sociais, a Constituição Federal não disciplina de forma plena o princípio da não cumulatividade, cabendo à lei ordinária disciplinar a matéria, podendo estabelecer, inclusive, restrições ao sistema de créditos em relação às empresas. Ressalte-se que § 12, do artigo 195 da Constituição Federal, (introduzido pela Emenda Constitucional n° 42/03) não instituiu o regime não-cumulativo de forma generalizada às contribuições sociais previstas nos incisos 1, “b”, e IV, caput, do referido artigo, reservando à legislação ordinária a sua regulamentação.
14. Diferentemente da técnica utilizada no regime de não-cumulatividade do IPI e do ICMS, em que se compensa o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores, a sistemática de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS baseia-se no desconto de créditos calculados sobre “itens”, tal como os previstos no art. 3° das Leis n°s 10.637/02 e 10.833/03.
15. Por seu turno, a Lei 10.865/2004 (art. 37) excluiu a possibilidade de apurar os créditos das mesmas contribuições sobre as despesas financeiras ao dar nova redação ao inciso V do citado preceito legal. Nenhum vício afigura-se em tal procedimento, já que é dado à lei estabelecer as despesas passíveis de gerar créditos, bem como sua forma de apuração, introduzindo novas hipóteses de creditamento ou revogando outras.
16. Consoante orientação firmada em repetitivo no STJ (REsp 1.221.170/PR, Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018) e nas circunstâncias delineadas pelo Tribunal de origem, os custos incorridos não se incluem no conceito de insumo. Cumpre ressaltar que o julgamento do REsp nº 1.221.170 assentou entendimento no tocante ao “conceito de insumo” a que se refere o inc. II, do art. 3º, das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, para fins de aferir a possibilidade de creditamento a título de PIS/COFINS, frise-se, em conformidade com os referidos comandos legais, os quais permanecem hígidos.
17. Desse modo, não demonstrada a existência de ilegalidade ou inconstitucionalidade no restabelecimento das alíquotas da contribuição ao PIS/COFINS, a teor do disposto no § 2º, do art. 27 da Lei nº 10.865/2004, bem como revogada a possibilidade de desconto de crédito (PIS/COFINS) sobre despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos, nos termos do art. 37 da Lei nº 10.865/2004, não restou comprovado o alegado direito líquido e certo da ora apelante, não havendo de se cogitar em direito à compensação de valores supostamente recolhidos indevidamente a esse título, sendo de rigor, portanto, a manutenção da r. sentença tal como lançada.
18. Apelação não provida.