APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000610-39.2021.4.03.6138
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: CARLOS ROBERTO SETONYE DE CAMPOS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: RUBENS HARUMY KAMOI - SP137700-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000610-39.2021.4.03.6138 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CARLOS ROBERTO SETONYE DE CAMPOS Advogado do(a) APELADO: RUBENS HARUMY KAMOI - SP137700-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação, interposta pela União, contra sentença que julgou procedente o pedido de declaração de inexistência de relação jurídico tributária, que obrigue o autor ao pagamento de Imposto de Renda sobre valores recebidos por ele, Tabelião de Protestos, e repassados aos credores. CARLOS ROBERTO SETONYE DE CAMPOS, Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Bebedouro/SP, ajuizou ação de rito ordinário, com pedido de tutela de urgência, em face da UNIÃO FEDERAL, para obter a declaração de não incidência tributária sobre os valores recebidos pelo Tabelionato de Protestos e repassados aos credores. Segundo alega, os citados valores foram considerados e incluídos no conceito de renda pela Solução de Consulta 94/2020 da Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil (COSIT) (ID 203714076). A tutela de urgência foi indeferida (ID 203714585). A União foi devidamente citada, tendo apresentado contestação (ID 203714614). A Sentença jugou procedente o pedido “para declarar a inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue o autor a pagar imposto de renda sobre os valores de dívidas recebidas pelo Tabelionato de Protestos e repassados aos credores na forma da lei de protestos, afastando, nesse ponto específico e exclusivamente em relação ao autor, o entendimento da solução de consulta nº 94/2020 da Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil (COSIT)”. Por outro lado, deferiu o pedido de tutela de urgência. Por fim, condenou a União ao pagamento de honorários advocatícios, fixado de forma equitativa em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cujo valor deverá ser atualizado na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal (ID 203714619). Apela a União, pugnando pela reforma da Sentença, sustentando que a teor dos artigos 68 e 69 do RIR de 2018, todas as receitas e despesas provenientes de trabalho não assalariado recebidas por contribuintes, inclusive os titulares dos serviços notariais e de registro, deverão ser escrituradas em livro caixa. Por outro lado, alega que especificamente em relação aos valores das dívidas recebidos por Tabeliães e posteriormente repassados aos respectivos credores, que a Solução da Consulta COSIT 94, em razão da legislação, determina que estes devem ser escriturados como rendimentos tributáveis, estando sujeitos ao recolhimento mensal do Imposto de Renda, sendo que os valores repassados poderão ser contabilizados como despesas dedutíveis (ID 203714621). O autor apresentou contrarrazões de apelação, requerendo o não provimento do recurso (ID 203714627). Vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000610-39.2021.4.03.6138 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CARLOS ROBERTO SETONYE DE CAMPOS Advogado do(a) APELADO: RUBENS HARUMY KAMOI - SP137700-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de ação de rito ordinário, visando a declaração de não incidência tributária sobre os valores de dívidas recebidos por Tabelionato de Protestos e repassados aos credores. Inicialmente, assinalo que o artigo 19 da Lei nº 9.492/1997 determina que o pagamento dos valores de dívidas apresentado a protesto serão feitos diretamente ao Tabelionato de Protesto, que o disponibilizará ao credor no primeiro dia subsequente ao do recebimento, conforme pode ser verificado no dispositivo abaixo: Art. 19. O pagamento do título ou do documento de dívida apresentado para protesto será feito diretamente no Tabelionato competente, no valor igual ao declarado pelo apresentante, acrescido dos emolumentos e demais despesas. § 1º Não poderá ser recusado pagamento oferecido dentro do prazo legal, desde que feito no Tabelionato de Protesto competente e no horário de funcionamento dos serviços. § 2º No ato do pagamento, o Tabelionato de Protesto dará a respectiva quitação, e o valor devido será colocado à disposição do apresentante no primeiro dia útil subseqüente ao do recebimento. § 3º Quando for adotado sistema de recebimento do pagamento por meio de cheque, ainda que de emissão de estabelecimento bancário, a quitação dada pelo Tabelionato fica condicionada à efetiva liquidação. § 4º Quando do pagamento no Tabelionato ainda subsistirem parcelas vincendas, será dada quitação da parcela paga em apartado, devolvendo-se o original ao apresentante. Assim, os valores recebidos pelo Tabelião transitam temporariamente no seu patrimônio, pois deverão ser repassados ao efetivo credor. Consequentemente, não pode ser acolhido o entendimento do Fisco, constante da solução COSIT nº 94/2020, que os valores de dívidas recebidos pelos Tabelionatos de Protesto e repassados aos credores consistiriam em renda tributável. Ocorre que, por transitarem temporariamente, os citados valores não integram definitivamente o patrimônio dos Tabeliães, sendo eles mero intermediários, posto que deverão oportunamente repassá-los ao efetivo credor, assim não se enquadram no conceito de renda constante do artigo 38 do atual RIR (Decreto nº 9.580/2018), dispositivo que transcrevo: Art. 38. São tributáveis os rendimentos do trabalho não assalariado, tais como (Lei nº 5.172, de 1966 - Código Tributário Nacional, art. 43, § 1º; e Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 4º): I - honorários do livre exercício das profissões de médico, engenheiro, advogado, dentista, veterinário, professor, economista, contador, jornalista, pintor, escritor, escultor e de outras que lhes possam ser assemelhadas; II - remuneração proveniente de profissões, ocupações e prestação de serviços não comerciais; III - remuneração dos agentes, dos representantes e outras pessoas sem vínculo empregatício que, ao tomar parte em atos de comércio, não os pratiquem por conta própria; IV - emolumentos e custas dos serventuários da Justiça, como tabeliães, notários, oficiais públicos e outros, quando não forem remunerados exclusivamente pelo erário; V - corretagens e comissões de corretores, leiloeiros e despachantes, e de seus prepostos e seus adjuntos; VI - lucros da exploração individual de contratos de empreitada unicamente de lavor, de qualquer natureza; VII - direitos autorais de obras artísticas, didáticas, científicas, urbanísticas, projetos técnicos de construção, instalações ou equipamentos, quando explorados diretamente pelo autor ou pelo criador do bem ou da obra; e VIII - remuneração pela prestação de serviços no curso de processo judicial. § 1º Na hipótese de serviços prestados a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada em país ou dependência com tributação favorecida e nas operações realizadas em regime fiscal privilegiado, o rendimento tributável será apurado em conformidade com o disposto nos art. 238, art. 254 e art. 255, respectivamente (Lei nº 9.430, de 1996, art. 19, art. 24 e art. 24-A). § 2º Na hipótese de prestação de serviços, a emissão do recibo ou do documento equivalente será efetuada, para efeito da legislação do imposto sobre a renda, no momento da efetivação da operação (Lei nº 8.846, de 21 de janeiro de 1994, art. 1º, caput). § 3º A Secretaria da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda instituirá modelo de documento fiscal a ser emitido por profissionais liberais (Lei nº 9.250, de 1995, art. 37, caput, inciso I). Além disso, deve ser observado que a solução fazendária, constante da Solução COSIT 94/20202, pode causar uma incorreta tributação do Imposto de Renda, uma vez o recebimento de dívidas por Tabelião e a devolução do respectivo valor ao credor poderá não ocorrer no mesmo mês, contudo a exação do IR incidirá sobre os rendimentos auferidos em cada mês. Portanto, apesar de existir previsão legal para a dedução dos valores repassados, isso poderá não ocorrer no mesmo período de arrecadação, o que causará prejuízo ao contribuinte, sendo que não existe previsão legal para a devolução administrativa da exigência indevida. Desta forma, mostra indevida a exigência de Imposto de Renda sobre os valores de dívidas recebidas pelo Tabelionato de Protestos e repassados aos credores. Ante o exposto, nego provimento à apelação, mantendo o julgado contido na Sentença. É como voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 3ª REGIÃO
E M E N T A
TRIBUTÁRIO – TABELIÃO DE PROTESTO – RECEBIMENTO DE VALORES DE DÍVIDAS – RESTITUIÇÃO AO CREDOR – IMPOSTO DE RENDA – VALOR TIDO COMO RECEITA TRIBUTÁVEL – EXIGÊNCIA INDEVIDA – APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. O artigo 19 da Lei nº 9.492/1997 determina que o pagamento dos valores de dívidas apresentado a protesto serão feitos diretamente ao Tabelionato de Protesto, que o disponibilizará ao credor no primeiro dia subsequente ao do recebimento.
2. Os valores recebidos pelo Tabelião transitam temporariamente no seu patrimônio, pois deverão ser repassados ao efetivo credor.
3. Não pode ser acolhido o entendimento do Fisco, constante da solução COSIT nº 94/2020, que os valores de dívidas recebidos pelos Tabelionatos de Protesto e repassados aos credores consistiriam em renda tributável. Ocorre que, por transitarem temporariamente, os citados valores não integram definitivamente o patrimônio dos Tabeliães, sendo eles mero intermediários, posto que deverão oportunamente repassá-los ao efetivo credor, assim não se enquadram no conceito de renda constante do artigo 38 do atual RIR (Decreto nº 9.580/2018).
4. Deve ser observado que a solução fazendária, constante da Solução COSIT 94/20202, pode causar uma incorreta tributação do Imposto de Renda, uma vez o recebimento de dívida por Tabelião e a devolução do valor ao credor poderá não ocorrer no mesmo mês, contudo a exação do IR incidirá sobre os rendimentos auferidos em cada mês. Portanto, apesar de existir previsão legal para a dedução dos valores repassados, isso poderá não ocorrer no mesmo período de arrecadação, o que causará prejuízo ao contribuinte, sendo que não existe previsão legal para a devolução administrativa da exigência indevida.
5. Mostra-se indevida a exigência de Imposto de Renda sobre os valores de dívidas recebidas pelo Tabelionato de Protestos e repassados aos credores.
6. Apelação não provida.