APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002466-93.2015.4.03.6119
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
Advogado do(a) APELANTE: MURILLO TEIXEIRA DE MELLO - SP3
APELADO: PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO DE GUARULHOS SA PROGUARU
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002466-93.2015.4.03.6119 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) APELANTE: MURILLO TEIXEIRA DE MELLO - SP3 APELADO: PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO DE GUARULHOS SA PROGUARU Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela União Federal contra sentença que julgou procedente o pedido formulado na inicial, para determinar o cancelamento das inscrições nº 80.7.14.028650-92 (PIS/PASEP) e 80.6.14.118506-66 (COFINS) e a consequente anulação do respectivo crédito tributário. A presente ação anulatória foi proposta pela empresa Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos S.A., sob o rito ordinário, em face da União Federal, objetivando, em sede de antecipação dos efeitos da tutela, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário e a consequente expedição da Certidão da Regularidade Fiscal RFB/PGFN (Negativa ou Positiva com Efeitos de Negativa). Narra a inicial que a Secretaria da Receita Federal do Brasil instaurou o Mandado de Procedimento Fiscal nº 08.1.11.00-201200401-0 para apurar possíveis ilícitos tributários correspondentes à apuração e ao recolhimento do PIS e da COFINS, em especial em razão das informações contábeis apuradas e demonstradas ao Fisco apontarem a existência de uma quantia de R$ 97.700.000,00, declarados a título de “Receitas Isentas e Demais Receitas Sem Incidência na Contribuição”, no Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais do ano de 2010. Relata que o Fisco, a partir das informações prestadas durante o trabalho fiscal, chegou à conclusão de que a demandante teria praticado conduta ilícita, em razão da falta de recolhimento daqueles tributos, no ano de 2010, devidos em razão de contraprestação de serviços prestados, sujeitos à incidência de PIS e COFINS. Ressalta que o procedimento fiscal foi finalizado em 18/02/2014, com a expedição do termo de verificação e constatação de irregularidade e a lavratura do auto de infração e imposição de multa de R$ 19.011.114,39. Alega que a autora foi intimada para pagar o crédito ou oferecer defesa administrativa, oportunidade na qual optou pela impugnação do lançamento tributário, ao fundamento de que o crédito foi constituído indevidamente, por se tratar de verba do Município de Guarulhos destinada à autora como repasse isento de PIS e COFINS, nos termos do art. 46, I da IN SRF nº 247, de 21/11/02, e no art. 14, I c/c o §1° da Medida Provisória n° 2.158-35, de 24/08/01. Sustenta que a impugnação foi julgada intempestiva e por tal razão, o crédito foi inscrito em dívida ativa, impedindo a emissão da necessária certidão negativa de débitos federais. Requer a suspensão da presente demanda até que sejam protocoladas as decisões administrativas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF, nos processos n° 16095000879/2008-83, que trata da competência de 2003, e 16095.000115/2009-79, que trata das competências 2004, 2005 e 2006. No mérito, pleiteia o cancelamento das inscrições n° 80.7.14.028650-92 (PIS/PASEP) e 80.6.14.118506-66 (COFINS) e a consequente anulação do respectivo débito tributário. Foi indeferido o pedido de tutela antecipada às fls. 25/28, ID 89865964. Regularmente processado o feito, sobreveio sentença que julgou procedente o pedido, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I do CPC, para determinar o cancelamento das inscrições 80.7.14.028650-92 (PIS/PASEP) e 80.6.14.118506-66 (COFINS) e a consequente anulação do respectivo crédito tributário. Ainda, o juízo de origem deixou de condenar a ré ao pagamento das custas processuais em razão da isenção prevista no art. 4º, I da Lei nº 9.289/96 e condenou a ré ao pagamento de honorários advocatícios, no percentual de 4% sobre R$ 19.353.954,34, correspondente ao proveito econômico obtida pela autora (crédito tributário declarado nulo nesta sentença). Irresignada, a União Federal interpôs apelação, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido formulado na inicial, ao fundamento de que o ato administrativo de autuação da autora se afigura correto e pautado na legalidade. Alega que todos os valores recebidos pela empresa autora decorreram do pagamento pelos serviços específicos por ela prestados ao Município de Guarulhos, motivo pelo qual não há que se falar em isenção do recolhimento de PIS e COFINS. Sustenta que há vinculação entre o pagamento recebido pela autora e o serviço por ela prestado, o que descaracteriza o repasse, transformando-o em pagamento por contraprestação de serviço. Requer a redução dos honorários advocatícios ao patamar mínimo legal. Contrarrazões da parte autora (fls. 23/33, ID 89866395). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002466-93.2015.4.03.6119 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) APELANTE: MURILLO TEIXEIRA DE MELLO - SP3 APELADO: PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO DE GUARULHOS SA PROGUARU Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Presentes os pressupostos de admissibilidade, devem ser conhecidas a remessa necessária e o recurso de apelação da União (Fazenda Nacional). Cinge-se a controvérsia em saber acerca da legalidade das inscrições 80.7.14.028650-92 (PIS/PASEP) e 80.6.14.118506-66 (COFINS), ou melhor explicando, se os recursos recebidos pela parte autora do Município de Guarulhos são, ou não, isentos de PIS e COFINS. Segundo o contribuinte, ele se enquadraria nas benesses do art. 14, I e §1° da Medida Provisória n. 2158-35/2001, bem como na IN/SRF 247, art. 46, I (vigente à época dos fatos). Já a União, entende que os valores recebidos seriam pagamentos pela contraprestação de serviços prestados ao Município de Guarulhos e não repasse, de modo que incidem sobre eles PIS e COFINS. Com efeito, dispõe os aludidos dispositivos que (destaquei): “Art. 14. Em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1o de fevereiro de 1999, são isentas da COFINS as receitas: I - dos recursos recebidos a título de repasse, oriundos do Orçamento Geral da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, pelas empresas públicas e sociedades de economia mista; (...) § 1o São isentas da contribuição para o PIS/PASEP as receitas referidas nos incisos I a IX do caput.” “Art. 46. São isentas do PIS/Pasep e da Cofins as receitas: I - dos recursos recebidos a título de repasse, oriundos do Orçamento Geral da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, pelas empresas públicas e sociedades de economia mista;” Nos termos do art. 175 da Constituição Federal, “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. A parte autora (PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO DE GUARULHOS SA PROGUARU – PROGUARU) foi criada como Sociedade de Economia Mista, pela Lei Municipal n. 2045/79 (redação original, conforme data dos fatos indicados na exordial), com os seguintes objetivos: “Art. 1º Fica criado o Fundo para o Progresso de Guarulhos - FPG objetivando a acumulação sistematizada de recursos destinados a concretização de programas de desenvolvimento sócio-econômico do Município, ampliação e aperfeiçoamento dos serviços públicos municipais. (...) Art. 8º Fica o Poder Executivo autorizado a constituir a “Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos S/A. - PROGUARU”, Sociedade de Economia Mista, por ações, de Capital Autorizado, destinada a realização das seguintes atividades de caráter econômico-social e industrial, ligadas aos superiores interesses do Município de Guarulhos: I - Execução dos serviços públicos de coleta e remoção de lixo, fabricação de asfalto, blocos e pré-moldados, pavimentação, guias, sarjetas, iluminação pública, travessias, construção de galerias, canalizações, pontes, obras e serviços correlatos, inclusive as já contratadas; (NR - Lei nº 2.315/1979) II - promoção de estudos e elaboração de projetos relacionados com as atividades sociais; III - planejamento, promoção e adoção de medidas tendentes ao incentivo de atividades industrias e comerciais para a consecução do objetivo social; IV - execução de serviços gráficos, de informática, ampliação, reforma e manutenção de próprios municipais, administração de velórios, mercados, estádios, execução de serviços de emplacamento de logradouros públicos, exploração de publicidade em próprios públicos e particulares; (NR - Lei nº 3.998/1991) V - promoção e desenvolvimento de programas habitacionais de interesse social, sob a supervisão da Secretaria Municipal de Habitação. (NR - Lei nº 6.149/2006) § 1º A Sociedade realizará as atividades enumeradas no caput deste artigo, mediante estruturação departamental, vedada, outrossim, a organização de subsidiárias. § 2º Os serviços públicos de natureza econômica, inclusive os atualmente executados, direta ou indiretamente pela Administração Municipal, poderão ser incorporados, com o seu respectivo patrimônio, à Sociedade cuja constituição ora é autorizada, na medida em que tal incorporação for julgada conveniente, mediante proposta do Executivo. § 3º VETADO. § 4º Fica o Executivo autorizado a realizar no momento que julgar oportuno, o capital social subscrito através de cessão e transferência a Sociedade de bens e equipamentos já existentes especialmente a fábrica de Pré-Moldados” Como se vê, a atividade precípua da recorrida é a prestação de serviços públicos essenciais e exclusivos do Estado, embora não sejam os únicos, tais como notadamente saneamento básico, manutenção e limpeza das vias públicas, iluminação pública e promoção de infraestrutura. O simples fato de tais serviços serem executados por uma sociedade de economia mista – PROGUARU – não afasta a natureza desses, tampouco leva à conclusão de que seu desempenho de tais atividades visa, de forma eminente, ao lucro, como afirmado pela apelante. O Supremo Tribunal Federal, a propósito, possui consolidado entendimento no sentido da possibilidade de uma sociedade de economia mista gozar de imunidade tributária, no que se refere ao PIS/COFINS, a depender do caso concreto, senão vejamos: “Terceiro agravo regimental em ação cível originária. Direito tributário. Discussão quanto ao regime de recolhimento do PIS/COFINS devido por sociedade de economia mista abarcada pela imunidade tributária recíproca. Ausência de questão constitucional e de conflito federativo atrativo da competência originária da Corte. Possibilidade de arbitramento de honorários advocatícios (art. 85, § 8º, do CPC). 1. A questão referente à mudança no regime de recolhimento do PIS e COFINS não guarda feição constitucional e não pode atrair a competência do STF, tendo em vista a ausência de potencial para abalar o pacto federativo. Nesse sentido: ACO nº 2.243/DF-AgR-segundo, Tribunal Pleno, DJe de 27/5/16. 2. A condenação em honorários mediante a aplicação do percentual legal mínimo (art. 85, § 3º, do CPC) sobre o elevado valor atribuído à presente causa resultaria em quantia desproporcional e injusta, não condizente com a relativa baixa complexidade da demanda, destacando-se, ademais, que figuram como partes sociedade de economia mista prestadora de serviço público essencial, sujeita à imunidade tributária recíproca, e estado-membro. Possibilidade de invocação do art. 85, § 8º, do CPC para se arbitrarem honorários advocatícios por apreciação equitativa. Nessa direção: RE nº 1.334.614/DF-ED, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 20/9/19; ACO nº 3.039/DF-ED, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 12/3/20; ACO nº 2.304/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 1º/12/17. 3. Agravo regimental não provido. Majoração da verba honorária em valor equivalente a 10% (dez por cento) do total daquela já fixada (art. 85, § 11, do CPC). (ACO 3254 AgR-terceiro, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 02/03/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-053 DIVULG 18-03-2022 PUBLIC 21-03-2022)” Agravos regimentais em ação cível originária. Imunidade tributária recíproca. Artigo 150, VI, a, da CF/88. Possibilidade de reconhecimento a sociedade de economia mista, atendidos os pressupostos fixados pelo Supremo Tribunal Federal. Competência para apreciação da causa. Artigo 102, I, f, da CF/88. Interpretação restritiva. Exclusão de município do polo passivo. Direito a repetição do indébito e ao reenquadramento do sistema de PIS/COFINS. Matérias de ordem infraconstitucional inaptas a abalar o pacto federativo. Agravos regimentais não providos. 1. Nos autos do RE nº 253.472/SP, esta Corte firmou o entendimento de que é possível a extensão da imunidade tributária recíproca às sociedades de economia mistas prestadoras de serviço público, desde que observados os seguintes parâmetros: (i) a imunidade tributária recíproca, quando reconhecida, se aplica apenas à propriedade, bens e serviços utilizados na satisfação dos objetivos institucionais imanentes do ente federado; (ii) atividades de exploração econômica destinadas primordialmente a aumentar o patrimônio do Estado ou de particulares devem ser submetidas à tributação, por se apresentarem como manifestações de riqueza e deixarem a salvo a autonomia política; e c) a desoneração não deve ter como efeito colateral relevante a quebra dos princípios da livre concorrência e do exercício de atividade profissional ou econômica lícita. 2. É possível a concessão de imunidade tributária recíproca à Companhia de Saneamento de Alagoas (CASAL), pois, em que pese ostentar, como sociedade de economia mista, natureza de ente privado: (i) executa serviço público de abastecimento de água e tratamento de esgoto; e (ii) o faz de modo exclusivo; (iii) o percentual de participação do Estado de Alagoas no capital social da empresa é de 99,96%; (iv) trata-se de empresa de capital fechado. São, ademais, tais premissas que, juntamente com o dispositivo do decisum, formam a coisa julgada, não havendo, destarte, que se falar que a mera possibilidade de alteração no quadro societário da empresa seria impedimento à prolação de decisão concessiva da imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista. 3. Em face da literalidade da norma inscrita no art. 102, I, f, da Carta Maior, não compete a esta Corte, em sede originária, processar e julgar causas na qual antagonizem sociedade de economia mista estadual e município, ainda que se trate de demanda versante sobre imunidade tributária recíproca em cujo polo passivo se situe também a União. 4. Questões referentes à repetição do indébito tributário e à mudança no regime de recolhimento do PIS e COFINS não guardam feição constitucional e não são aptas a atrair a competência do STF, ante a ausência de potencial para abalar o pacto federativo. 5. Agravos regimentais não providos. (ACO 2243 AgR-segundo, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-108 DIVULG 25-05-2016 PUBLIC 27-05-2016) No mesmo sentido: RE nº 647.881/RS-AgR, Segunda Turma, Relator a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 5/10/12; ARE n° 640.788/PR, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 28/3/12; e RE n° 596.744/PR, Relator o Ministro Ayres Britto , DJe de 3/2/12. Frise-se que a própria apelante reconhece, de modo expresso em seu apelo, que o “único ‘pagador’ é o Município de Guarulhos”. Ou seja, a PROGUARU a manutenção das atividades da PROGUARU depende, exclusivamente, de transferências orçamentárias do ente da Administração Direta que o instituiu. Nesse sentido, confira-se relevante excerto da sentença, com o qual adiro in totum (destaquei): “Nesse contexto, tem-se a seguinte situação: 1) a PROGUARU foi criada para realizar atividades de caráter econômico -social e industrial, ligadas aos interesses do Município de Guarulhos, especificadas nos incisos do artigo 8° da Lei ti" 2.305/79; 2) o Município prevê em Lei Orçamentária o montante a ser destinado a tais atividades, através do Fundo para o Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos - FPG, o que, para o exercício de 2010, foi previsto na Lei n° 6.627, de 28/12/09. No Anexo "Quadro de Detalhamento de Despesa", há valores orçados para o Fundo para o Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos - FPG - para as seguintes ações: i) manutenção e conservação de unidades municipais, ii) ampliação e modernização do sistema de drenagem urbana, iii) ampliação e modernização do sistema viário urbano, iv) manutenção do sistema de drenagem urbana, v) manutenção do sistema viário urbano e vi) varrição e limpeza urbana. Dessa forma, a verba prevista na Lei n° 6.627, de 28/12/09 para as atividades acima mencionadas só poderiam ser destinadas à PROGUARU, que, por sua vez, por expressa previsão legal, tem obrigação de realizá-las, independentemente de lucros e/ou resultados. Estamos, portanto, diante de uni caso sei generis, que não pode ser analisado à letra fria da Lei n° 4.320/64, como fez a autoridade fiscal no Termo de Verificação e Constatação de irregularidades Fiscais (fis. 72). De fato, por uma análise literal da natureza jurídica da PROGUARU (sociedade de economia mista, entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei para a exploração de atividade econômica) e da documentação apresentada tanto na esfera administrativa quanto nestes autos (notas de empenhos, Os. 198/216, ofícios, as. 217/228, e recibos, Os. 229/334), na qual consta o teimo "serviços prestados", até poderia cogitar-se que a PMG transferiu os recursos a título de contraprestação de serviços. Todavia, conforme já dito, a. finalidade precípua da PROGUARU é a realização de serviços públicos essenciais ao Município de Guarulhos, que, por sua vez, só podem ser realizados com verba repassada pelo Município, já que prevista especificamente lei orçamentária. Na verdade, tendo a PROGUARU sido criada para a realização de atividades de caráter econômico -social e industrial, ligadas aos interesses do Município de Guarulhos, este sequer poderá contratar outra empresa para prestar os serviços elencados no alugo 8° da citada lei. Ou seja, a dotação orçamentária prevista para tais serviços só pode ser destinada a PROGUARU. Por tais motivos, embora o termo usado na documentação apresentada pela PROGUARU seja "serviços prestados" para referir-se às atividades elencadas no artigo 8° da Lei n° 2.305/79, não me parece razoável considerar que os recursos foram repassados pela PMG para a PROGUARU a título de contraprestação de serviços, mas sim de repasse. (...) Finalmente, verifico que as notas de empenhos, fis. 198/216, ofícios, fis. 217/228, e recibos, fls. 229/334, retratam o montante de R$ 97.700.000.00, declarado pela autora a título de "Receitas Isentas e Demais Receitas Sem Incidência da Contribuição" no Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais (DACON) do ano de 2010, objeto do Mandado de Procedimento Fiscal n°08.1.11.00- 201200401-0. Assim sendo, tendo aquele montante sido recebido pela PROGUARU a título de repassa da PMG, é isento de PIS e de COFINS, conforme previsão contida no inciso I do artigo 46 da IN SRF n° 247, de 21/11/02, e no inciso I do artigo 14 cc. § 1° da Medida Provisória n°2.158-35, de 24/08/01.” Registre-se, ainda, que a classificação contábil dos recursos não pode prevalecer perante a destinação dos mesmos ao atendimento de interesse eminentemente público, este sim requisito para o gozo da exclusão tributária. Forçoso concluir, dessa forma, que os valores recebidos da Prefeitura de Guarulhos para fazer frente aos serviços públicos, é dizer, atribuições configurarem atividades próprias do ente municipal, não se enquadram no conceito de faturamento, pois não representam contraprestação ou remuneração pelo desempenho de suas atividades, mas mera fonte de custeio da pessoa jurídica de direito público (PROGRARU). Logo, não podem integrar a base de cálculo de PIS e da COFINS, conforme bem concluído pelo Magistrado a quo. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO EM AÇÃO ORDINÁRIA. TRIBUTÁRIO. EXAME DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO EM COBRANÇA E JÁ OBJETO DE PARCELAMENTO. POSSIBILIDADE. ISENÇÃO DO PIS/COFINS FRENTE A RECURSOS MUNICIPAIS TRANSFERIDOS À SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA VOLTADA À CONSECUÇÃO DE ATIVIDADES PRÓPRIAS DO MUNICÍPIO. ART. 14, CAPUT E § 1º, DA MP 2.158/99 (ATUAL MP 2.158-35/01)ADOÇÃO DE CONCEITO AMPLO DE REPASSE FRENTE À JURISPRUDÊNCIA DO STF RECONHECENDO A IMUNIDADE RECÍPROCA ÀS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA NA SITUAÇÃO AVENTADA. REEXAME E RECURSO DESPROVIDOS (HONORÁRIOS MANTIDOS). 1. Sob o regime de recursos repetitivos, o STJ decidiu que a confissão de débitos para fins de parcelamento não impede a Administração de verificar os aspectos jurídicos de sua constituição ou a existência de defeito apto a causar a nulidade da confissão - como o erro, dolo ou simulação(REsp 1133027 / SP / STJ - PRIMEIRA SEÇÃO / MIN. MAURO CAMPBELL MARQUES / DJe 16/03/2011). Partindo desta premissa, conclui-se pela possibilidade do exame do meritum causae, cujo fundamento cinge-se ao dever de pagamento do PIS/COFINS desde fevereiro de 1999. 2. O STF tem jurisprudência consolidada reconhecendo que a imunidade tributária recíproca dos entes federativos abrange as sociedades de economia mista quando prestadoras de serviço público, observados os seguintes parâmetros: (i) a imunidade cinge-se à propriedade, bens e serviços voltados à satisfação do interesse público do ente federado; (ii) a atividade de exploração econômica, visando o aumento do patrimônio deve ser submetida à tributação; e (iii) e respeito à livre concorrência e ao livre exercício da atividade profissional ou econômica. Precedentes. 3. A autora preenche os aludidos requisitos, consistindo seu objeto social em: "I) incumbir-se da execução, direta ou indireta, de obras e ou serviços que lhe forem delegados ou cometidos; II) promover estudos e projetos relacionados com o desenvolvimento econômico-social e urbanístico de São Vicente e de outros interessados; III) organizar pesquisas e cadastramento de dados, relativos às suas próprias atividades, às da administração pública em geral, direta ou indireta, de qualquer nível, bem como às da administração de atividades privadas; IV) planejar, promover e adotar medidas de incentivo à indústria de turismo no Município; V) organizar e administrar sistemas de processamento de dados, relativos às atividades referidas no inciso III deste artigo". 4. Cinge-se, portanto, a consecução de múnus público do ente municipal ao qual está vinculado. Deu o Município feição privada a parte de suas atribuições ao constituir a CODESAVI, mas o fato daquelas atribuições configurarem atividades próprias do ente municipal, não providas de empresariedade ou de concorrência no âmbito privado, permite invocar a interpretação constitucional sedimentada pelo STF como norte para a solução da controvérsia tributária discutida nos autos. 5. À luz do art. 150, VI, a, da CF, não deve prevalecer a tese restritiva adotada pela União Federal quanto ao conceito de repasse contido no art. 14, I, da MP 2.158/99 (atual MP 2.158-35/01), para fins de isenção do PIS/COFINS. A desobrigatoriedade do pagamento das contribuições sociais deve ter por pressuposto a vinculação das receitas transferidas pelo Município à execução dos serviços públicos delegados à CODESAVI, independentemente daquelas receitas configurarem contraprestação. A classificação contábil dos recursos não pode prevalecer perante a destinação dos mesmos ao atendimento de interesse eminentemente público, este sim requisito para o gozo da exclusão tributária. 6. Reconhecida a aplicabilidade da norma de isenção, mister reconhecer que a autora não era obrigada ao pagamento da COFINS a partir de fevereiro de 1999, e do PIS a partir de 30.06.99, consoante o disposto no art. 14, caput e § 1º, da MP 2.158/99. Registre-se, nada obstante não constar pedido nesse sentido, que o reconhecimento da isenção não traduz reconhecimento do direito de repetir tributo eventualmente recolhido em todo o período aventado, porquanto deve ser observada a prescrição quinquenal frente ao ajuizamento da ação. Precedentes. 7. Honorários mantidos. (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2262414 - 0005199-63.2015.4.03.6141, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 08/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2018 ) TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. EMPRESA PÚBLICA MUNICIPAL (EMURB). PRESTADORA DE SERVIÇOS PÚBLICOS. PIS. BASE DE CÁLCULO. TRANSFERÊNCIAS CORRENTES (SUBVENÇÕES). NÃO INCIDÊNCIA. I. Trata-se de apelação de sentença que julgou procedente o pedido, reconhecendo excesso na execução, determinando que a União retifique o valor do crédito exequendo, excluindo o montante referente à incidência da contribuição para o PIS sobre as receitas decorrentes das subvenções oriundas do Município de Aracajú, devendo prosseguir a execução fiscal quanto ao restante até o final da satisfação. II. Sustenta a recorrente que o executado pode alegar através dos embargos à execução toda e qualquer matéria pertinente à sua defesa, desde que o direito de ação que dispõe alegá-la não esteja fulminado pela prescrição. Argumenta que o embargante não pode mais ser responsabilizado por débitos futuros, mas deve responder por débitos passados constituídos mediante ato administrativo que não podem ser mais atacados na via judicial. III. A Fazenda Nacional procura receber débitos referentes ao PIS tendo como base de cálculo da contribuição toda a receita orçamentária da empresa executada (EMURB), inclusive sobre as provenientes de transferências correntes advindas do Município de Aracajú, a título de subvenções sociais ou econômicas, que não integram o conceito de faturamento. IV. A embargante (EMURB) é empresa pública instituída pelo Poder Público Municipal de Aracaju/SE, mediante autorização em lei específica (Lei Municipal nº. 429, de 22/09/19758, alterada pela Lei nº. 1994, de 17/06/19939), com capital exclusivamente público e tem por finalidade e atribuições: "Implantar planos urbanísticos, executar o programa de obras da Administração Pública Municipal e realizar serviços de caráter econômico, inclusive fora do âmbito do Município de Aracaju, produzir e comercializar artigos manufaturados e executar programas habitacionais". V. A Empresa Municipal de Serviços Urbanos (EMSURB) é prestadora de serviço público essencial e exclusivo do Estado e para a consecução de suas atividades recebe subvenções econômicas do Município de Aracajú definidas na Lei nº 4.320/64. O artigo 12, parágrafo 2°, da Lei no 4.320/64 classifica como transferências correntes as dotações para as despesas as quais não correspondam à contraprestação direta em bens e serviços, inclusive para contribuições e subvenções destinadas a atender a manutenção de outras entidades de direito público ou privado. Portanto, as transferências correntes tem por objetivo a consecução das finalidades públicas, sejam as efetuadas por entidades de natureza pública ou privada. VI. O recebimento de transferência corrente não se enquadra no conceito de faturamento previsto no art. 2º da Lei Complementar nº 70/1991, pelo que não pode servir de base de cálculo do PIS. VII. Não há que se falar em prescrição do direito de desconstituir o débito, uma vez que não se está tirando o direito da exequente ao pagamento do PIS, mas determinando que não deve incidir na base de cálculo as transferências correntes (subvenções) oriundas do Município. VIII. Apelação improvida. (PROCESSO: 200685000031751, APELAÇÃO CIVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO CARVALHO, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 26/09/2017, PUBLICAÇÃO: 29/09/2017) No que se referem aos honorários advocatícios, pretende a União seja a condenação seja reduzida ao mínimo legal. A sentença condenou a ré ao pagamento de verba honorária nos seguintes termos: “Condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixado em 4% (quatro por cento) sobre R$ 19.353.954,34 (dezenove milhões, trezentos e cinquenta e três mil, novecentos e cinquenta e quatro reais e trinta e quatro centavos), que é o proveito econômico obtido pela parte autora (crédito tributário declarado nulo nesta sentença), nos termos do artigo 85, §§ 2° e 3°, IV, do CPC.” Neste ponto, assiste razão à apelante. Com efeito, considerando mormente o elevado valor da base de cálculo dos honorários advocatícios (R$ 19.353.954,34 – proveito econômico); a natureza e a relativa baixa complexidade da demanda, que não demandou produção de outras provas que não as juntadas pelas partes; o tempo de tramitação da causa e, ainda; o local de sua prestação, bem como, a fim de garantir remuneração proporcional sem oneração excessiva da parte vencida, considero razoável e adequada a redução dos honorários advocatícios para o mínimo legal, isto é, 3% sobre o valor da condenação, na forma do art. 85, §§ 2º e 3º, IV, devendo, ainda, ser observado o disposto no § 5º, deste dispositivo legal. Ante o exposto, dou parcial provimento à remessa necessária e à apelação da União (Fazenda Nacional) apenas no tocante à redução da verba honorária a qual esta foi condenada, nos termos da fundamentação supra. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA CRIADA COM O FIM DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS. ISENÇÃO DE PIS/COFINS. POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DE VERBA HONORÁRIA. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. Cinge-se a controvérsia em saber acerca da legalidade das inscrições 80.7.14.028650-92 (PIS/PASEP) e 80.6.14.118506-66 (COFINS), ou melhor explicando, se os recursos recebidos pela parte autora do Município de Guarulhos são, ou não, isentos de PIS e COFINS.
2. Nos termos do art. 175 da Constituição Federal, “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.
3. A parte autora (PROGRESSO E DESENVOLVIMENTO DE GUARULHOS SA PROGUARU – PROGUARU), criada como Sociedade de Economia Mista, pela Lei Municipal n. 2045/79, possui como atividade precípua da recorrida a prestação de serviços públicos essenciais e exclusivos do Estado, embora não sejam os únicos, tais como notadamente saneamento básico, manutenção e limpeza das vias públicas, iluminação pública e promoção de infraestrutura.
2. O simples fato de tais serviços serem executados por uma sociedade de economia mista – PROGUARU – não afasta a natureza desses, tampouco leva à conclusão de que seu desempenho de tais atividades visa, de forma eminente, ao lucro, como afirmado pela apelante.
3. O Supremo Tribunal Federal possui consolidado entendimento no sentido da possibilidade de uma sociedade de economia mista gozar de imunidade tributária, no que se refere ao PIS/COFINS, a depender do caso concreto.
4. No caso concreto, própria apelante reconhece, de modo expresso em seu apelo, que o “único ‘pagador’ é o Município de Guarulhos”. Ou seja, a PROGUARU a manutenção das atividades da PROGUARU depende, exclusivamente, de transferências orçamentárias do ente da Administração Direta que o instituiu.
5. A classificação contábil dos recursos não pode prevalecer perante a destinação dos mesmos ao atendimento de interesse eminentemente público, este sim requisito para o gozo da exclusão tributária.
6. No caso em análise, os valores recebidos da Prefeitura de Guarulhos para fazer frente aos serviços públicos, é dizer, atribuições configurarem atividades próprias do ente municipal, não se enquadram no conceito de faturamento, pois não representam contraprestação ou remuneração pelo desempenho de suas atividades, mas mera fonte de custeio da pessoa jurídica de direito público (PROGRARU).
7. Considerando mormente o elevado valor da base de cálculo dos honorários advocatícios (R$ 19.353.954,34 – proveito econômico); a natureza e a relativa baixa complexidade da demanda, que não demandou produção de outras provas que não as juntadas pelas partes; o tempo de tramitação da causa e, ainda; o local de sua prestação, bem como, a fim de garantir remuneração proporcional sem oneração excessiva da parte vencida, é razoável e adequada a redução dos honorários advocatícios para o mínimo legal, isto é, 3% sobre o valor da condenação, na forma do art. 85, §§ 2º e 3º, IV, devendo, ainda, ser observado o disposto no § 5º, deste dispositivo legal.
8. Remessa necessária e apelação parcialmente providas.